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Síndrome de Horner transitória após bloqueio paravertebral em injeção única

Resumo

Justificativa

O bloqueio paravertebral torácico pode proporcionar analgesia para cirurgia torácica unilateral e está associado a um baixo índice de complicações. A síndrome de Horner (também denominada paralisia oculossimpática) é uma constelação neurológica clássica de blefaroptose ipsilateral, miose pupilar e anidrose facial devido a distúrbio da via simpática que fornece inervação para a cabeça, os olhos e o pescoço.

Relato de caso

Apresentamos o caso de um paciente com síndrome de Horner transitória ipsilateral após a administração de injeção única de 15 mL de levobupivacaína a 0,25% para bloqueio paravertebral torácico ao nível de T5-6 guiado por ultrassom.

Conclusões

Devemos considerar que mesmo um bloqueio paravertebral torácico bem-sucedido com a administração de injeção única e guiado por ultrassom pode ser complicado com a síndrome de Horner devido à distribuição imprevisível do anestésico local.

PALAVRAS-CHAVE
Síndrome de Horner; Bloqueio paravertebral; Cirurgia torácica videoassistida

Abstract

Background

Thoracic paravertebral block can provide analgesia for unilateral chest surgery and is associated with a low complication rate. Horner syndrome also referred to as oculosympathetic paresis, is a classic neurologic constellation of ipsilateral blepharoptosis, pupillary miosis, and facial anhidrosis resulting from disruption of the sympathetic pathway supplying the head, eye, and neck.

Case report

We present a patient with an ipsilateral transient Horner syndrome after ultrasound guided single shot of 15 mL 0.25% levobupivacaine for thoracic paravertebral block at T5–6 level.

Conclusions

It should be kept in mind that even a successful ultrasound guided single shot thoracic paravertebral block can be complicated with Horner syndrome due to unpredictable distribution of the local anesthetic.

KEYWORDS
Horner's syndrome; Paravertebral block; Video assisted thoracic surgery

Introdução

O bloqueio paravertebral torácico (BPVT) proporciona excelente analgesia para uma grande variedade de procedimentos cirúrgicos. Esse bloqueio resulta em um perfil hemodinâmico mais balanceado em comparação com o bloqueio peridural torácico. O BPVT é uma boa opção para anestesia geral e bloqueio peridural torácico devido a sua segurança e aos efeitos adversos menos frequentes.11 Beyaz SG, Ergonenc T, Altıntoprak F, et al. Thoracal paravertebral block for breast surgery. Dicle Med J. 2012;3:594-603.

A síndrome de Horner (SH) ipsilateral ou bilateral transitória pode ocorrer se o anestésico local atingir o gânglio estrelado ipsilateral ou as fibras pré-ganglionares dos primeiros segmentos da medula espinhal torácica, enquanto a dispersão paravertebral contralateral ocorre pela via pré-vertebral.22 Karmakar MK, Kwok WH, Kew J. Thoracic paravertebral block: radiological evidence of contralateral spread anterior to the vertebral bodies. Br J Anaesth. 2000;84:263-5.

Relatamos um caso de SH transitória após a administração de BPVT para analgesia no pós-operatório de cirurgia torácica vídeoassistida, feita com o paciente posicionado em decúbito lateral direito.

Relato de caso

Paciente do sexo masculino, 24 anos, 75 kg, ASA I, apresentou-se com pneumonia necrotizante complicada por empiema loculado. Foi submetido a uma cirurgia torácica videoassistida (VATS) uniportal para drenagem do empiema e lise de aderências. Um bloqueio paravertebral guiado por ultrassom (US) foi feito com o objetivo de proporcionar analgesia no período pós-operatório. Antes do procedimento, ECG, PANI, SpO2 foram usados para monitoração de rotina e o paciente recebeu sedação e analgesia com midazolam (0,03-0,05 mg.kg−1) e fentanil (0,5-1 mcg.kg−1, IV). O procedimento foi feito com o paciente em posição sentada. A sonda linear de 5-12 MHz do ultrassom (General Electric, Logic P5, EUA) foi colocada entre dois processos transversos das vértebras T5 e T6 no plano paramediano no lado ipsilateral da porta de entrada planejada. Processos transversais, ligamento costotransversal superior e pleura foram visualizados. A pele e o tecido subcutâneo foram anestesiados com infiltração de lidocaína a 2%. Uma agulha calibre 18G de 50 mm (Pajunk®, Geisingen, Alemanha) foi introduzida e avançada no plano até o ligamento costotransversal superior. Após garantir a ausência de sangramento com pressão negativa, levobupivacaína a 0,25% (15 mL) foi injetada no nível de T5. Depressão pleural com bolus de anestésico local foi observada. Em seguida, o paciente foi posicionado em decúbito dorsal para indução da anestesia geral com propofol (2–3 mg.kg-1) e rocurônio (0,6 mg.kg-1). Um tubo endotraqueal de duplo lúmen foi colocado com ventilação seletiva do pulmão bem-sucedida. A manutenção da anestesia foi obtida com uma mistura gasosa de sevoflurano a 2%, 50% de O2 e 50% de ar ambiente. VATS uniportal esquerda foi feita para drenagem do empiema localizada e lise de aderências. Acetaminofeno (1 g IV) foi administrado 30 minutos antes da suspensão dos anestésicos.

Foram administrados 1.500 mL de lactato de sódio composto foi administrado IV. A perda de sangue foi insignificante. No fim da cirurgia, observamos sinais ipsilaterais (lado direito) clássicos da síndrome de Horner (ptose, miose, enoftalmia e anidrose) na sala de operação após a extubação. O paciente estava totalmente alerta e confortável e os sinais vitais estavam dentro dos limites normais. Durante as quatro horas seguintes os achados da síndrome de Horner desapareceram gradualmente.

Discussão

Uma injeção paravertebral torácica pode dispersar-se para os níveis contíguos acima e abaixo, lateralmente para o espaço intercostal, medialmente para o espaço peridural, ou para uma combinação desses ou pode permanecer situado no local da injeção. A injeção afeta os nervos somáticos e simpáticos ipsilaterais, inclusive o ramo primário posterior em vários dermátomos torácicos contíguos, caso se disperse dessa forma.33 Karmakar MK. Thoracic paravertebral block. J Am Soc Anesthesiol. 2001;95:771-80.

Experiências clínicas, estudos de cadáveres e estudos radiográficos formam a base para as recomendações atuais. Em média, o bloqueio somático de três dermátomos e o bloqueio simpático de oito dermátomos são obtidos com uma única injeção de 15 mL de anestésico local. A dispersão de anestésico injetado no espaço paravertebral é menor em mulheres do que em homens.44 Tighe SQM, Greene MD, Rajadurai N. Paravertebral block. Contin Educ Anaesth Crit Care Pain. 2010;10:133-7.

Dois casos de SH resultante de bloqueio paravertebral contínuo em T2–3 foram relatados por Renes et al.55 Renes SH, Van Geffen GJ, Snoeren MM, et al. Ipsilateral brachial plexus block and hemidiaphragmatic paresis as adverse effect of a high thoracic paravertebral block. Reg Anesth Pain Med. 2011;36:198-201. Um desses pacientes apresentou complicação adicional com paralisia ipsilateral do diafragma.

Em um estudo que comparou a eficácia da anestesia geral versus bloqueio paravertebral em T4 com injeção única em 86 pacientes submetidas à cirurgia de mama, SH ocorreu em uma das pacientes no grupo bloqueio paravertebral.66 Pusch F, Freitag H, Weinstabl C, et al. Single-injection paravertebral block compared to general anaesthesia in breast surgery. Acta Anaesthesiol Scand. 1999;43:770-4.

A literatura médica e os relatos de casos indicam o sexo feminino, grande volume de anestésico local, nível alto de bloqueio e infusão contínua como fatores de risco para a incidência de SH após BPVT. Em nosso caso, a síndrome de Horner ocorreu apesar do nível mais baixo de bloqueio, injeção de bolus único, uso de ultrassom como guia e o paciente ser do sexo masculino. Em nossa opinião, o posicionamento do paciente em decúbito lateral e leve Trendelenburg pode ter facilitado a dispersão cefálica do agente anestésico.

Conclusão

Devemos ter em mente que mesmo um bloqueio paravertebral torácico, guiado por ultrassom e bem-sucedido, pode apresentar complicações temporárias raramente observadas como a síndrome de Horner devido à distribuição imprevisível do anestésico local.

References

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    Beyaz SG, Ergonenc T, Altıntoprak F, et al. Thoracal paravertebral block for breast surgery. Dicle Med J. 2012;3:594-603.
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    Karmakar MK, Kwok WH, Kew J. Thoracic paravertebral block: radiological evidence of contralateral spread anterior to the vertebral bodies. Br J Anaesth. 2000;84:263-5.
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    Karmakar MK. Thoracic paravertebral block. J Am Soc Anesthesiol. 2001;95:771-80.
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    Tighe SQM, Greene MD, Rajadurai N. Paravertebral block. Contin Educ Anaesth Crit Care Pain. 2010;10:133-7.
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    Renes SH, Van Geffen GJ, Snoeren MM, et al. Ipsilateral brachial plexus block and hemidiaphragmatic paresis as adverse effect of a high thoracic paravertebral block. Reg Anesth Pain Med. 2011;36:198-201.
  • 6
    Pusch F, Freitag H, Weinstabl C, et al. Single-injection paravertebral block compared to general anaesthesia in breast surgery. Acta Anaesthesiol Scand. 1999;43:770-4.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sep-Oct 2018

Histórico

  • Recebido
    4 Jun 2016
  • Aceito
    23 Ago 2016
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