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Navegando nas ondas da educação online: competências do designer educativo

DOCUMENTO

Mestre em educação e cultura contemporânea pela Universidade Estácio de Sá (Unesa), especialista em administração e em recursos humanos pela Fundação Getulio Vargas. Professora nos cursos do FGV Management da Fundação Getulio Vargas. Endereço: Rua Cosme Velho, 415, ap. 605 - Cosme Velho - CEP 22041-090, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. E-mail: amaral@fgv.br

1. Introdução

As tecnologias digitais possibilitaram o florescer da cibercultura1 1 Conjunto de técnicas (materiais e intelectuais), de práticas, de atitudes, de modos de pensamento e de valores que se desenvolvem juntamente com o crescimento do ciberespaço (novo espaço de comunicação que emerge da interconexão mundial dos computadores) (Lévy, 1999:17). ao inter-relacionar os mais variados setores da sociedade, como o político, o econômico e o cultural. Se por um lado esses avanços tecnológicos contribuem para o bem-estar da humanidade, à medida que as pessoas podem trocar mercadorias, serviços e informações, por outro, fazem crescer a assimetria social, econômica e ambiental entre as nações, o que implica exclusão social e exclusão digital (Boff, 1998; Dreifuss, 1996; Lemos, 2003; Lévy, 2001; Quéau, 1998; entre outros).

Lidar com essa realidade envolve desafios e riscos, especialmente em países em desenvolvimento, carentes de infraestrutura e de capacitação tecnológica, e exige dos governos uma política de inclusão consistente, que garanta aos indivíduos o direito à informação e aos seus benefícios, dado que essas tecnologias só terão valor se apreendidas e utilizadas de maneira eficiente e eficaz. Para Canclini (2005), o processo de globalização, longe de integrar, reordena diferenças e desigualdades que, embora acentuadas, são consideradas "normais" para a reprodução do capitalismo, impactando de forma significativa o mundo dos negócios, do trabalho e do ensino.

Na busca de vantagem competitiva, as empresas procuram melhorar a qualidade de seus processos, produtos e serviços, aumentar a produtividade, enxugar suas estruturas e reduzir seus custos operacionais, o que acarreta o agravamento do desemprego e o crescimento da informalidade.

Pochmann (2008) afirma que, atualmente, a região Sudeste apresenta os piores indicadores de produção e do emprego, deixa de ser o centro privilegiado do movimento migratório e se transforma no principal polo de expulsão de mão de obra do Brasil. "Agora são as regiões de fronteira agropecuária e de extrativismo mineral que possuem os melhores resultados na evolução do PIB [Produto Interno Bruto] e, por conta disso, a maior absorção de migrantes de todo o país" (Pochmann, 2008:3).

Em face dessa realidade, ganha força o trabalho cooperativo, dando lugar a equipes autogeridas e interdisciplinares de projetos. Surgem, ainda, outros tipos de contratação, como os serviços temporários, terceirizados, cooperativados e as jornadas parciais. O mundo do trabalho ganha outros contornos: novas formas de gestão mais ágeis e flexíveis, equipes de projetos, formação de parcerias, entre outras, aproximam o poder econômico de outros poderes, como o do conhecimento, o da informação e o da competência.

um terço da força humana mundial disponível para o ato colaborativo está exercendo trabalhos parciais, precários, temporários ou já vivencia as agruras do não-trabalho, do desemprego estrutural. (...). Mais de um bilhão de homens e mulheres padecem as vicissitudes da precarização do trabalho, dos quais centenas de milhões têm seu cotidiano moldado pelo desemprego estrutural.

(Antunes, 2005:13)

Nesse ambiente de transformação, o diferencial competitivo das organizações já não reside no seu capital financeiro e material. O saber que até então privilegiava o capital econômico desloca-se para o saber que valoriza o capital intelectual e o mercado de trabalho coloca em evidência três tendências, com reflexos na educação: a) a preocupação dos profissionais com seu desenvolvimento e empregabilidade; b) a incorporação crescente do uso da internet na realização dos negócios empresariais; e c) o aumento da competitividade, que exige dos profissionais o domínio de competências que lhes permita o exercício de suas funções e da cidadania.

A volatilidade dos conhecimentos e a rapidez com que essas competências desaparecem, transformam-se ou se renovam exigem que os profissionais se mantenham atualizados, mediante um processo de educação continuada. Essas demandas somadas às dificuldades de deslocamento das pessoas, dos seus postos de trabalho para programas presenciais de ensino, impulsionam a procura por cursos online, fazendo surgir novos profissionais ressignificados com a emergência da internet, como, por exemplo, o designer educativo, responsável pela concepção, desenvolvimento, implementação, avaliação e gerenciamento de cursos oferecidos via web (online), e que também necessita ter suas competências desenvolvidas, a fim de responder aos desafios impostos pela atualidade.

Spector e La Teja (2001) (apud Romiszowski, 2001) argumentam que inexiste, em nível de bacharelado, um programa específico para formação de designers educativos e ressaltam a importância desse profissional nos programas via web, em virtude dessa carência, especialmente no Brasil, dada a pouca oferta de cursos voltados à sua formação.

Ao analisar o estado do conhecimento em educação e tecnologia, com base em 331 documentos, entre dissertações, teses e artigos elaborados entre 1996 e 2002, Barreto (2006) menciona que a palavra competência, ainda que menos frequente nesses trabalhos, aparece como chave importante, por vezes reivindicando o estatuto de conceito, princípio de organização curricular e critério de avaliação (certificação). O desenvolvimento de competências e habilidades aparece vinculado diretamente a meios e recursos; ou seja, as dissertações e teses tendem a pensar as tecnologias da informação e da comunicação na educação a distância com base nas competências e habilidades que, somadas, apontam para o desempenho docente projetado. Sobre competências para atuação dos designers educativos nenhuma pesquisa foi encontrada nas referidas áreas de estudo.

Em contrapartida, nos últimos anos tem havido um crescimento considerável do número de dissertações e teses sobre o tema "competências" na área de administração de empresas. De acordo com dados da FGV (2002), trabalhos apresentados nos Enanpad (Encontro Nacional da Anpad, Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração) e artigos publicados nos periódicos RAE (Revista de Administração de Empresas) e RAC (Revista de Administração Contemporânea), entre 1997 e 2002, apresentam abordagens parciais e fragmentadas das competências: alguns estudos versam sobre competências individuais e outros sobre competências organizacionais ou essenciais.

O que ressalta na leitura dessas dissertações é que o foco de preocupação dos pesquisadores está voltado para os resultados empresariais. Em geral, deixam de relacionar as questões referentes à estratégia e à competência, numa perspectiva sistêmica da gestão de pessoas (Ubeda, 2003; Barbieri, 2003; Cury, 2003; Miranda, 2003; Bitencourt, 2005; Harb, 2005; Zamberlan, 2006; entre outros).

Com efeito, o objetivo central deste artigo consiste em apresentar os resultados da pesquisa intitulada "Proposta de mapeamento de competências para atuação de designers educativos" (Amaral, 2007), que teve como foco os segmentos corporativo e de pós-graduação (MBA) do Programa FGV Online da Fundação Getulio Vargas.

2. Metodologia do estudo

A arte da navegar exige saberes fundantes. Barcos são construídos com precisão, astronomia se aprende à luz da geometria e o domínio das velas requer familiaridade com tecidos, amarras e ventos. Assim como o conhecimento dos componentes do barco e suas inter-relações é fundamental ao navegador, o processo de investigação científica pressupõe o exercício intelectual do pesquisador na busca do conhecimento, revelador de sua leitura, reflexão e interpretação de uma realidade específica, o que implica investimento em tempo e energia, e comprometimento com os resultados pretendidos.

Barcos e pesquisa são feitos com ciência. A navegação e a construção do conhecimento com sonhos. É preciso sonhar para se decidir sobre o caminho a percorrer e o destino a que se quer chegar. Da mesma forma, é necessário praticar, a fim de que esses saberes possam ser confirmados, ajustados, modificados e enriquecidos.

Nessa perspectiva, o objetivo da pesquisa consistiu em identificar as competências requeridas pelo programa para a atuação do designer educativo e o nível necessário a cada uma delas. Para a concretização do referido estudo, tomou-se como premissa a necessidade de essas competências estarem alinhadas às competências da organização, refletidas em seu MVVE (missão, visão, valores e estratégias). Foi utilizada pesquisa bibliográfica, tendo em vista produzir um quadro referencial teórico capaz de dar sustentabilidade às análises, comentários e proposta apresentada, o que possibilitou ao pesquisador melhor compreensão da realidade focalizada e definição da linha metodológica de análise no tratamento dos dados obtidos.

Imprimiu-se ao estudo um caráter qualitativo, dada à interdependência entre a objetividade do mundo (realidade complexa, cujo conhecimento não pode ser obtido mediante "recortes" que não considerem essa característica) e a subjetividade do pesquisador. Nesse sentido, foram realizadas visitas à instituição, para observações informais e consultas a documentos referentes ao seu acervo (ou ainda sob a responsabilidade de pessoas), tais como descritor de cargo, check-list de processos, diretrizes para elaboração de curso e inserção de conteúdos, versão beta de cursos, vídeo institucional, CD, prospectos e comunicações informais, entre outros, a fim de se levantar informações quanto à atividade de designer educativo e suas competências técnicas.

Também foram usados instrumentos de natureza quantitativa, com vistas ao diálogo entre essas duas vertentes metodológicas, de forma coerente, e na dimensão crítica da análise realizada, eliminando-se, assim, a subjetividade e as generalizações existentes nos processos usuais de mapeamento de competências.

Na busca dos resultados pretendidos na pesquisa foram desenvolvidas e aplicadas duas ferramentas práticas e acessíveis para identificação e mensuração das competências necessárias ao exercício da função de designer educativo em cursos online da Fundação Getulio Vargas, tendo sido considerados dois níveis distintos, que se entrecruzaram: o técnico, expresso no manual de cargos da instituição, e o comportamental, mediante o levantamento dos indicadores de competências, à luz do MVVE da organização.

Para identificação dessas competências aplicou-se o inventário comportamental para mapeamento de competências, metodologia desenvolvida por Leme (2005) e adaptada para esse estudo. Esse instrumento consiste numa lista de indicadores de comportamento, que objetiva traduzir a conduta do comportamento ideal desejado e necessário, alinhado à organização.

Dado o caráter exploratório da pesquisa, foi necessário desenvolver um instrumento que pudesse contemplar dimensões voltadas para o saber, saber- fazer e saber-ser. Sua elaboração teve como ponto de partida uma listagem com os indicadores de competências (comportamentos) apontados no IBSTPI (International Board of Standards for Training, Performance and Instruction), como relevantes para o exercício das funções de designer educativo, expressos nas dimensões: fundamentos da profissão; planejamento e análise; design e desenvolvimento; e implementação e gerenciamento. No entanto, esse mode- lo enfatiza as competências cognitivas e as habilidades técnicas obtidas por meio de educação formal, treinamentos e experiência profissional, em detri- mento das competências comportamentais e político-sociais, e não leva em conta o contexto em que os designers exercem suas atividades. Dessa forma, optou-se por mesclar tais comportamentos a outros que melhor pudessem ex- pressar o cotidiano da organização, tendo sido incorporadas a essa listagem as competências expressas no manual de cargos - descritores de perfis da FGV, além daquelas geralmente presentes na literatura disponível sobre o tema e preconizadas pelas diretrizes curriculares nacionais - DCN (Graminha, 2002; Deluiz, 2004; Depresbiteres, 2005; Leme, 2005; Fagundes, 2007). Inicialmente, foram levantados 83 indicadores.

Após essa etapa, confrontaram-se esses indicadores, com vistas a sua depuração, utilizando-se alguns critérios estabelecidos por Tironi (1991) para geração de indicadores, como relevância, simplicidade e clareza, abrangência, comparabilidade, entre outros, resultando numa lista final contendo 58 indicadores de competência (comportamentos). Enfatiza-se que essa formulação considerou, além do MVVE da instituição, a possibilidade de inserção, pelos participantes, de outros indicadores importantes ausentes no instrumento.2 2 Ao final de cada dimensão (seis, no total), foi inserida a categoria "Outras".

Esse documento foi dividido em duas seções:

▼ dados de identificação, com o objetivo de caracterizar os participantes da pesquisa, na busca de semelhanças e diferenças entre eles. A técnica utilizada baseou-se na formulação de questões de múltipla escolha, o que facilitou sua quantificação. Esses dados foram organizados em tabelas e apresentados sob a forma de figuras;

▼ o inventário comportamental, contendo os 58 indicadores que foram submetidos à avaliação da população escolhida (num total de 22 designers educativos) do Programa FGV Online.

Com base numa escala de importância, expressa num continuum de 1 (nenhuma importância) a 5 pontos (extrema importância), e de acordo com sua percepção, os participantes indicaram o grau de importância atribuído pela FGV aos comportamentos relacionados a conhecimentos, habilidades e atitudes descritos no referido instrumento. Foram considerados prioritários para a organização os indicadores que alcançaram médias iguais ou superiores a três pontos: extremamente importantes, muito importantes e importantes. Esse levantamento deu origem aos indicadores de comportamento correspondentes às competências organizacionais.

Um segundo documento, planilha de mapeamento de comportamentos, aplicado apenas aos coordenadores de projetos, objetivou identificar, tendo em vista um melhor desempenho dos designers educativos, o grau de intensidade e necessidade dos comportamentos apontados pelos respondentes no inventário comportamental. Nesse caso, também foi utilizada uma escala de importância para classificação dos diferentes atributos, com base nos seguintes níveis: muito forte, forte, normal e não aplicável. Os dois primeiros níveis são autoexplicativos, pois evidenciam a necessidade do comportamento em questão. Da mesma forma, o nível não aplicável se refere ao comportamento não necessário para a função e o nível normal se relaciona àqueles comportamentos que não merecem destaque, originando 46 indicadores de comportamento correspondentes às competências da função.

Para o alcance dos resultados pretendidos, dado que até então todas as referências eram feitas a comportamentos, foi necessário associar cada um desses indicadores apontados, como prioritários, às competências profissionais. Dessa forma, empreendeu-se um esforço analítico significativo, no sentido de relacionar e categorizar esses indicadores, utilizando-se, para isso, o quadro referencial proposto por Deluiz (2004), que classifica as referidas competências em: intelectuais e técnicas, organizacionais, comunicativas, sociais, comportamentais e políticas. O resultado dessa apuração consistiu numa lista de competências, cada uma com quantidade diferente de indicadores, que possibilitaram calcular o nível requerido de cada uma delas para o exercício da função de designer educativo na FGV. Esclareça-se que o termo "competências" foi entendido, nesse estudo, como o conjunto de conhecimentos, habilidades, atitudes e experiências, mobilizado pelo indivíduo em função de uma ação realizada no momento adequado e na situação adequada, tendo em vista agregar um valor social para ele e um valor econômico para a organização (Fleury e Fleury, 2000).

De acordo com Alves-Mazzotti (2004:165-166), as escalas "permitem estimar o grau em que um determinado comportamento ocorre e fazer um julgamento qualitativo sobre esse comportamento ou atividades". No caso particular desse estudo, e de acordo com a metodologia do inventário comportamental, para se calcular o nível de cada competência necessário ao exercício da função de designer educativo foi utilizada uma escala de zero a cinco pontos - variante da escala padrão Likert, 3 3 Escala desenvolvida por Rensis Likert, em 1930, que consiste num conjunto de itens apresentados, de forma afirmativa, diante do qual se pede aos respondentes que externem suas reações,escolhendo um dos cinco ou sete pontos de uma escala. na qual 100% de uma competência equivalem ao nível cinco da escala (nível máximo).

A partir da consolidação das competências organizacionais, dado que cada competência possui uma quantidade específica de indicadores, foi possível calcular o peso de cada um, de acordo com a fórmula:

Peso do indicador = nível máximo da escala/Qtde. de indicadores da competência

O próximo passo foi identificar o "quanto" dessas competências a função necessita: as competências da função. Mediante uma listagem com todos os indicadores apurados (sem mencionar as competências), os coordenadores, juntamente com os designers educacionais (dois representantes de cada segmento), apontaram a necessidade desses comportamentos, classificando-os como "muito forte", "forte", "normal" ou "não se aplica".

Considerando-se que os comportamentos apontados como "muito forte" e "forte" são os necessários para a função, para cada competência aplicou-se a fórmula NCF (nível de competência para a função), ou seja:

NCF = (nível máximo da escala/Qtde. de indicadores da competência) x Qtde. de indicadores "muito forte" e "forte" para a função

Dessa maneira foi possível calcular, com mais precisão, "o quanto", ou seja, o nível de competência requerido para o exercício de determinada função e, mais importante, o significado daquele nível, expresso pelos indicadores de competência.

Tendo como objetivo confirmar as informações coletadas e verificar como tais competências se expressam no trabalho cotidiano foram realizadas entrevistas "semiestruturadas" ou "focalizadas", com os quatro coordenadores de projetos e com representantes dos designers educativos (três do segmento corporativo e dois da pós-graduação), com base em um roteiro "oculto", previamente construído, em função dos objetivos da pesquisa. Tais entrevistas também serviram para aprofundar algumas questões relacionadas às competências requeridas para o exercício da função e sua triangulação com o design instrucional permitiu uma análise qualitativa dos resultados obtidos.

Os aspectos qualitativos da pesquisa foram tratados mediante a técnica de análise temática de conteúdo, 4 4 Conjunto de técnicas de análise das comunicações, por meio de procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não), com vistas à identificação do que está sendo dito sobre um determinado tema (Bardin, 2003). aplicada às entrevistas, a fim de se estudar e analisar a comunicação de forma objetiva, sistemática e qualitativa, a partir das falas e escritas dos participantes, buscando-se inferências confiáveis de dados e informações sobre o contexto analisado.

3. Resultados da pesquisa

Para que um pescador seja respeitado em seu meio, deve demonstrar "a excelência de sua força através dos belos resultados de seus empreendimentos marinhos, exibindo o seu 'troféu' - um grande peixe - perante os seus companheiros deofício", dado que "grandes pescas representam a dignidade e o valor do homem do mar" (Bittencourt, 2008). Da mesma forma, como um processo de construção coletiva, o que se aspira nesta seção é apresentar os resultados e conclusões obtidos na pesquisa, estabelecendo uma discussão mais ampla com o meio acadêmico, pois como afirma Popper (1975a), a objetividade que se pode almejar num estudo dessa natureza é fruto de sua exposição à crítica dos pares.

Assim, a aplicação de formulários e a realização de entrevistas possibilitaram a identificação de semelhanças e diferenças entre esses profissionais, quanto à qualificação, à faixa etária, ao tempo no mercado de trabalho, ao tempo no programa, à função exercida atualmente, ao tempo na função e ao tipo de vinculação com a empresa, além das competências organizacionais e da função; quanto ao cálculo do nível requerido de cada uma dessas competências e seu mapeamento; e quanto ao estudo das motivações, opiniões, atitudes, valores e tendências dos participantes, reunidos numa rede de conceitos emergentes em suas falas, relacionados tanto às questões abordadas na fundamentação teórica como às obtidas na primeira etapa da pesquisa, conforme análises e interpretações apresentadas neste estudo e agrupadas nos temas e subtemas do quadro.

Formação e experiência profissional

Área de formação

Em relação à qualificação inicial, constatou-se que, no segmento corporativo, 57% dos respondentes são oriundos da área de educação e 43% provêm de outras áreas. Na pós-graduação, essa proporção é de 27% em educação e 73% em outras áreas. No total, 64% dos respondentes são provenientes de outras áreas de formação, havendo um número significativo de profissionais formados em letras e comunicação, como demonstra a figura 1.


Considerando que a construção do conhecimento na cibercultura se faz em rede, o design instrucional (planejamento do curso, propriamente dito) exige uma equipe interdisciplinar, composta de diversos especialistas que atuam na produção de materiais didáticos. Nesse contexto, cabe ao designer educativo analisar e acompanhar o projeto em toda a sua extensão, com vistas a desenvolver ações relativas à metodologia de ensino online, destacando-se a arquitetura de distribuição dos conteúdos, as estratégias de redação, a concepção pedagógica de ambientes online, a estética dos materiais didáticos e a coordenação geral dos trabalhos.

Campos (2001) afirma que uma equipe de desenvolvimento de projetos de educação online deve possuir competências variadas, como habilidades de comunicação, relacionamento interpessoal, proficiência linguística, habilidades de organização e planejamento, e familiaridade com as novas tecnologias.

Cabe ressaltar que a força motriz de uma organização são as pessoas que a constituem, a forma como atuam e sua contribuição na geração dos resultados; a eficácia organizacional depende da eficácia de cada indivíduo que a integra. Dessa maneira, quando integrada à estratégia organizacional, a formação individual constitui-se num elemento crucial para o desenvolvimento das competências profissionais.

O recrutamento e a seleção desses profissionais na FGV orientam-se por critérios relacionados à experiência com as tecnologias, à competência na área da linguagem - importante para a função que será exercida - às potencialidades dos candidatos e à disponibilidade para o treinamento em serviço, como se pode constatar na fala dos participantes (respondentes) a seguir:

R2. Buscam-se, então, alunos nas universidades ou recém-formados (faixa etária baixa) e, após a análise dos curriculum vitae, eles são submetidos a um processo de seleção, que leva em consideração uma prova de linguagem e revisão textual, quebra do texto em partes e colocação de títulos, além da ortografia e da capacidade de síntese. Se aprovados, começam a ser treinados para o exercício da função, sob a supervisão de um DI experiente.

R4. Na pós-graduação se trabalha com muito mais informação do texto. Nesse sentido, os profissionais devem ter uma boa capacidade de leitura em qualquer área do conhecimento e trabalhar com o texto, a fim de torná-lo mais claro e simples. E quem faz isso melhor é o pessoal de letras, porque são bons leitores; todos os DI e consultores de linguagem são formados em letras. Os DI externos atuam na pré-produção do texto - recebem o texto bruto vindo do conteudista, trabalham-no em telas, numa linguagem mais acessível e inteligível, porque os cursos são para graduados em geral, independente da área em que atuem. Encerrada essa etapa, o material é encaminhado aos designers internos.

Faixa etária

Conforme mostra a figura 2, ressalta-se o investimento da instituição em pessoas mais jovens: 82% dos respondentes estão na faixa etária entre 20 e 40 anos, sendo 86% no segmento corporativo e 80% na pós-graduação.


Considerando que as empresas necessitam de profissionais que se adaptem às mudanças e às incertezas do mundo atual, que dificultam a tomada de decisão e tornam os conhecimentos e as competências rapidamente obsoletos, essa preferência se deve ao fato de os jovens, em geral, dominarem as novas ferramentas tecnológicas, gostarem de desafios, demonstrarem vontade de crescer profissionalmente e, ainda, apresentarem maior maleabilidade em relação à cultura organizacional.

O desenvolvimento das TIC resultou na expansão do setor de serviços e novos profissionais foram surgindo, como o webdesigner, webwriter, webmaster, designer educativo, atraindo muitos jovens para o mercado de trabalho. Geralmente, as empresas que atuam nesse ramo não questionam o tipo de formação acadêmica do profissional, mas sua disposição para aprender. Case (2001) afirma que tais contratações são, em geral, mais baratas para as empresas e os jovens mais atualizados. E conclui que as pessoas mais velhas e "mais preparadas" cobram caro demais; e o custo para treiná-las nas novas tecnologias também é alto.

Sobre esse tema, os participantes da pesquisa expressam sua visão, apontando aspectos como a familiaridade com as novas linguagens virtuais e o tempo dos programas e-learning que, ainda recentes, não contam com um número expressivo de profissionais experientes, entre outros fatores, que justificam a preferência por gente jovem.

R5. A faixa etária concentrada no pessoal mais jovem se deve à questão da mídia. A galera lida com a internet todo o tempo; conhece bem navegação; domina essa linguagem e sempre está buscando coisas novas. Já os mais velhos demonstram resistência ao uso de computador. (...) O mercado de e-learning é relativamente novo; por isso a concentração na faixa de cinco a 15 anos, no corporativo. As pessoas com mais tempo, provavelmente migraram da tradicional EAD para a educação online - e já estão no mercado.

Tempo no mercado de trabalho

Do total de profissionais participantes da pesquisa, 36% têm entre cinco e 15 anos de experiência no mercado de trabalho, o que se constitui num percentual significativo, quando se considera que a maioria (82%), como mostrado, tem idade entre 20 e 40 anos, sendo que 27% dos respondentes estão no mercado há 16 anos ou mais (figura 3).


Planejar e desenvolver cursos na web não é o mesmo que planejar e desenvolver cursos presenciais. Para tanto, é necessário possuir competências específicas, já que essa mudança implica a transposição de um paradigma calcado no discurso do professor, numa relação "um para todos" para uma cultura de rede, baseada na relação "todos para todos" (Silva, 2003). O enfrentamento dessa nova realidade exige do designer educativo que se capacite para o exercício dessa função e isso demanda tempo.

R3. Não se consegue no mercado pessoal com formação em DI; no máximo profissionais com experiência em DI. Assim, ao mesmo tempo que procuramos treiná-los para o trabalho de produção, pp. dito, procuramos levá-los a conhecer os demais processos, como, por exemplo, quem é o público-alvo do curso, como uma determinada disciplina se inclui no projeto como um todo, quais as implicações provenientes de atrasos em alguma etapa, no resultado final, o que lhes garante uma visão ampla do processo.

O número reduzido de profissionais do design instrucional no mundo em geral e, particularmente, na realidade brasileira, aliado ao fato de não haver no mercado uma instituição que qualifique esse tipo de profissional (Spector e La Teja [2001] apud Romiszowski, 2001), justifica o investimento do Programa FGV Online na formação em serviço (on the job), tendo em vista habilitar os designers educativos a desempenharem suas funções, de forma mais produtiva e com maior qualidade.

Ressalte-se, no entanto, o esforço despendido pela instituição no sentido de desenvolver suas competências para o exercício da função, especialmente se levarmos em conta que o jovem, em geral, é detentor tão somente de conhecimentos técnicos elementares e/ou de conhecimentos técnicos básicos (Fagundes, 2007). Sua preparação, portanto, depende fundamentalmente do processo cumulativo do conhecimento, o que demanda tempo e o mercado de trabalho, altamente competitivo, acaba por cooptar esses profissionais quando "prontos", obrigando as empresas a buscarem formas alternativas de manutenção e retenção de seu capital humano, como se evidencia na fala de um dos respondentes.

R4. O mercado está aquecido para esses profissionais e a demanda por procura e contratação se torna agressiva. Ninguém quer perder tempo com curva de aprendizagem. As empresas buscam pessoal pronto. Dessa forma, acabamos por perder as pessoas mais experientes e tendo de reiniciar todo o processo com investimento em pessoas novas. A estratégia de trazer pessoas prontas não deu certo porque se esbarra com o problema da cultura organizacional, que requer adaptação e flexibilidade, o que é mais difícil.

Tempo no Programa FGV Online

Conforme mostra a figura 4, 36% dos respondentes têm entre um e três anos no programa (maior concentração). Os demais estão distribuídos na faixa entre quatro e seis anos ou mais (32%), e abaixo de um ano (32%). O resultado é bastante positivo, quando se leva em conta que o Programa FGV Online foi criado há menos de sete anos, começando com uma pequena célula de trabalho, que foi se ampliando gradativamente.


De acordo com dados do Anuário Brasileiro Estatístico de Educação Aberta e a Distância (AbraEAD) (2007), de projetos para excluídos digitais até cursos para executivos de empresas, o crescimento da EAD tem sido significativo em todas as instituições educacionais do país.

A educação corporativa, por seu turno, já tem uma história extensa no Brasil e, no conceito avançado de universidade corporativa (UC), que supera a ideia do simples treinamento para incorporar o de formação educacional do funcionário (...). No ano de 2006, só entre as 27 empresas que praticam educação corporativa ouvidas por este Anuário, mais de 300 mil pessoas estudaram a distância.

(AbraEAD, 2007:149)

Considerando-se tão somente "os projetos que apresentam maior visibilidade de acordo com os critérios de abrangência (nacionais e/ou regionais), temporalidade (têm mais de um ano) e credibilidade de seus mantenedores", em 2006 o número de brasileiros matriculados em cursos de EAD foi de 2.279.070, o que justifica a crescente demanda por esses profissionais (AbraEAD, 2007:150).

Tempo na função

Do total de designers educativos, 77% têm até três anos na função. Tendo em vista a necessidade de renovação de seus quadros funcionais, devido não somente ao crescimento da demanda por cursos online, mas, também, à perda de alguns profissionais experientes para a concorrência, a instituição desenvolve programas de estágios. Isso confirma sua filosofia de que o investimento em jovens talentos e na formação em serviço possibilita preparar lideranças para o futuro, alinhadas às suas estratégias (figura 5).


Função exercida atualmente

De acordo com a figura 6, em relação à função desempenhada por esses profissionais no programa, a concentração se dá nos dois níveis iniciais da carreira. Muito embora no setor corporativo 57% dos profissionais se encontrem no nível sênior, (43%) ainda estão alocados no nível júnior. Na pós-graduação, no entanto, há uma forte concentração (60%) nos níveis iniciais da carreira: designers instrucionais trainees e juniores. É importante considerar que, no conjunto dos 22 designers educativos, cinco exercem, atualmente, funções de coordenação e se encontram no nível sênior da carreira.


A formação em serviço adotada pela FGV permite que o indivíduo interaja com seus pares e aprenda pela ação, praticando a reflexividade. Nesse sentido, pode reformular suas práticas, ao longo de sua intervenção (refletir na ação), pensando e agindo de forma flexível e aberta, construindo e comparando novas estratégias e novos modos de enfrentar e definir os problemas. Esse processo implica, além do conhecimento técnico, conhecimentos intuitivo e artístico. Por outro lado, a reflexão sobre sua ação, realizada a posteriori, possibilita sua reconstrução, com base na observação, descrição e análise dos fatos, o que, em última instância, permite-lhe compreender sua prática cotidiana (Shön, 2000).

Depresbiteris (2005) afirma que, na prática, o conceito de competências vem sendo aplicado numa perspectiva funcionalista, focada na aprendizagem de funções e subfunções para o mercado de trabalho. A concentração desses profissionais nos níveis iniciais da carreira - 77% exercem a função há três anos (no máximo) - reforça a afirmação da autora, muito embora a pesquisa tenha identificado certa preocupação desenvolvimentista, na medida em que a instituição possibilita aos profissionais que revelam talento migrarem para outras funções gerenciais. A estratégia de "aprender fazendo" facilita a contratação de pessoas jovens que podem ser admitidas como estagiárias, com carga horária de quatro horas ou seis horas diárias. Ressalte-se, porém, que, em geral, esses estagiários, ao final de um ano no programa, são promovidos a designer instrucional trainee, primeiro nível do cargo na FGV. O conteúdo das falas dos respondentes fortalece a afirmação.

R1. Damos preferência, sempre que necessário, a promover o estagiário a trainee e contratar um novo estagiário. Isso ocorreu com a maioria dos designers instrucionais internos. Os mais experientes na sua área de atuação, não necessariamente em design instrucional (isso a gente ensina), são prestadores de serviço externos. As pessoas que se destacam na função acabam assumindo uma gerência, supervisão ou coordenação de projetos.

R4. É muito difícil encontrar esse profissional no mercado. Aqui, a preferência é por buscar pessoas recém-saídas da faculdade e desenvolvê-las. Isso aconteceu comigo. Entrei como DI terceirizado, pessoa jurídica em tempo integral, e passei a funcionário. Em princípio, meu trabalho se restringia a produção de storyboards e agora gerencio a produção; portanto, houve um enriquecimento de minhas funções. Outras pessoas podem assumir coordenações ou supervisões no próprio segmento (...).

Nessa perspectiva, a formação em serviço ganha relevo quando ligada às estratégias da corporação que, inclusive, toma emprestado da literatura e traz para o seu interior a visão de competência organizacional, capaz, assim como a competência humana, de alavancar resultados.

Vínculo empregatício

Em relação ao vínculo empregatício, 64% desses profissionais se relacionam com a instituição como funcionários ou como pessoas jurídicas em regime interno, de tempo integral. Os demais 36% são terceirizados, ou seja, prestadores de serviço externos (figura 7).


A busca de profissionais bem preparados e experientes, que possam imprimir maior qualidade ao material didático elaborado pelos conteudistas, justifica a opção da FGV pela terceirização. Da mesma forma, esse tipo de contratação possibilita a redução de seus custos operacionais, fator relevante a ser considerado, em face dos desafios da competitividade (Porchmann, 2008; Case, 2000).

Competências profissionais

Competência tem sido cada vez mais objeto de discussão, seja nos meios educacionais ou empresariais (Prahalad e Hamel, 1990; Tardif, 2000 e 2002; Perrenoud, 2000; Deluiz, 2001; Rabaglio, 2001; Fleury e Fleury, 2001; Leme, 2005; entre outros). Dado o caráter polissêmico do termo "competências", diversas conceituações têm surgido, ao longo do tempo, possibilitando que se confunda a noção de competências com a de saberes e conhecimentos no âmbito da educação ou da qualificação profissional.

No mundo empresarial, o processo de recrutamento e seleção tem levado em conta as competências requeridas pelo cargo/função a ser preenchido(a) e o desempenho profissional dos empregados tem sido avaliado, sistematicamente, mediante a abordagem por competência.

A competência passa a estar no princípio da organização do trabalho, no lugar da qualificação/profissão. (...) Significa dizer que uma gestão fundada na competência encerra a ideia de que um assalariado deve se submeter a uma validação permanente, dando constantemente provas de sua adequação ao posto, de seu direito a uma promoção ou a uma mobilidade promocional.

(Ramos, 2001:194)

Ainda que a preparação do indivíduo para o mercado de trabalho se diferencie da adequada às empresas, haja vista que estas têm interesses particulares, individuais e individualizantes, em geral, opostos aos da maioria da sociedade, não se pode ignorar a urgência de o indivíduo dialogar com o mundo empresarial, razão pela qual se defende que a construção do conhecimento e a avaliação da aprendizagem devam estar diretamente associadas à realidade do trabalho, o que torna relevante o alinhamento das competências individuais e organizacionais.

Ao se referir aos desafios da formação profissional no contexto da globalização econômica, de novas formas de organização da produção e do trabalho, e dos crescentes processos de democratização da sociedade, Deluiz (2004) desenvolve uma tipologia de competências composta por cinco grandes dimensões e afirma que a qualificação real do trabalhador vai além das dimensões cognitivas das competências intelectuais e técnicas para englobar as competências organizacionais ou metódicas, comunicativas, sociais e comportamentais, necessárias aos sistemas produtivos. Entretanto, enfatiza a autora que a essas competências devem ser acrescentadas as competências políticas, pois não levam em consideração a perspectiva de expansão das potencialidades humanas, e o processo de emancipação individual e coletiva, que permitem "aos trabalhadores agir como cidadãos produtores de bens e de serviços e como atores na sociedade civil, atendendo a critérios de equidade e democratização sociais" (Deluiz, 2004:3-4).

Rabaglio (2006) argumenta que é possível medir ou mensurar o comportamento, mediante o uso de indicadores, dado que o comportamento consiste em qualquer atividade passível de observação e implica alterações no ambiente. Assim, pode-se, no mínimo, classificá-lo como adequado ou não, além de se definir quais aspectos podem ser melhorados e o quanto.

Como anteriormente mencionado, para o cálculo do nível necessário a cada competência utilizou-se a escala de 0 a 5 pontos, em que 100% de uma determinada competência equivalia ao nível 5 da escala. Os resultados dessa aplicação são demonstrados na figura 8 a seguir.


Observa-se que as competências consideradas essenciais à função de designer educativo e seus níveis foram, respectivamente: conhecimentos e habilidades (NCF = 4,6); comunicação e relacionamento interpessoal (NCF = 5,0); planejamento, organização e proatividade (NCF = 3,6); criatividade, liderança e trabalho em equipe (NCF = 5,0); foco em pessoas e em resultados (NCF = 5,0) e ética (NCF = 3,7); e as de natureza social e política (NCF = 3,6).

Tais resultados podem parecer óbvios e ao menos familiarizados com a metodologia empregada na pesquisa. Afinal, tais competências não seriam comuns aos profissionais, de uma forma geral? A questão possui duas respostas: sim e não, pois o que gera a capacidade de produzir resultados é o conhecimento aplicado; por isso, a importância de se identificar, no próprio ambiente de trabalho, as competências pertinentes às várias funções existentes nas organizações, com base em indicadores comportamentais; esse sim é o alicerce que diferencia as competências nas diferentes organizações e se constitui em fator de vantagem competitiva.

Assim, a identificação e o mapeamento dessas competências, bem como o aproveitamento do potencial dos profissionais, fundamentam a necessidade de se gerir esse "capital", mediante ferramentas e métodos apropriados, alinhando-o às estratégias das organizações, tendo em vista conviver e evoluir com o novo cenário mundial.

O tema "competências profissionais" foi o que apresentou os dados mais significativos na referida pesquisa. Palavras, expressões e frases recorrentes nas falas dos entrevistados agrupadas nos subtemas "linguagem e produção textual", "equipes multifuncionais" e "comprometimento individual e organizacional" possibilitaram compreender como tais competências se expressam no cotidiano da organização foco da pesquisa.

Linguagem e produção textual

Variável relacionada à "dimensão intelectual e técnica" representada pelas competências referentes a conhecimentos e habilidades emergiu, de forma expressiva, nas falas dos participantes, que enfatizaram a necessidade dos designers educativos terem proficiência na arte de ler e escrever, e de se comunicarem, com clareza, em contextos formal e informal, tendo em vista que a interação entre professor e alunos, nos cursos online, efetiva-se por meio do material didático preparado pela equipe.

Silva (2002) afirma que com a popularização da internet qualquer pessoa, em qualquer parte do mundo, independentemente de cultura e da experiência que possua, pode acessar o mesmo conteúdo presente na rede, interagindo com o objeto de aprendizagem e com outros sujeitos, e, assim, ampliar cada vez mais seus conhecimentos. Ressalte-se, porém, que se este princípio não for considerado, a relação com a máquina se faz predominantemente mecanicista.

De acordo com Fagundes (2007), essas competências englobam os conhecimentos elementares relacionados a tarefas simples e rotineiras; aquisição de um vocabulário específico da área de atuação e de conhecimentos fundamentais; além daqueles mais aprofundados, que favorecem a prática de pesquisa, o pensamento estratégico, aplicação, transferência, generalização do conhecimento e a tomada de decisão diante de situações novas, entre outros.

As competências em pauta são expressas, no FGV Online, pelos seguintes indicadores de comportamento observáveis requeridos dos designers: analisar as características do ambiente de aprendizagem e da população-alvo; desenvolver materiais consistentes com as análises de conteúdo, objetivos, tecnologias propostas, métodos de comunicação e estratégias de estudo; criar mensagens apropriadas às necessidades e características dos alunos, do conteúdo e dos objetivos; projetar estratégias de ensino que reflitam uma compreensão da diversidade dos alunos como indivíduos ou grupos e de interfaces gráficas para usuários de várias mídias e voltadas para a arquitetura de informação educacional; analisar as características de tecnologias existentes e emergentes e seu uso em ambientes instrucionais; planejar a implementação eficaz dos produtos e programas instrucionais; determinar a abrangência e o grau de profundidade do tratamento de determinado conteúdo, dadas as restrições do projeto instrucional; desenvolver instrumentos de avaliação da aprendizagem; pensar estrategicamente e demonstrar habilidades administrativas na gestão do design instrucional.

Tais competências são consideradas importantes (NCF = 4,6) pela instituição. Entretanto, o que se espera do designer educativo, ao ingressar no programa, é que seja um bom leitor, possua conhecimentos sólidos da linguagem escrita e da linguagem oral, e alguma familiaridade com a tecnologia e com práticas pedagógicas comumente utilizadas. O desenvolvimento na arte do design instrucional, propriamente dito, é possibilitado pela formação em serviço.

Relevante ressaltar a importância de os materiais produzidos apresentarem uma linguagem dialógica que, em face da ausência física do professor, garanta um tom coloquial e uma leitura leve e motivadora, que funcione como um pilar de sustentação para o aprendiz, na realização de tarefas individuais. Pimenta (2007) afirma que a interface educacional é a porta de entrada que liga o usuário ao sistema; mas se mal elaborada, pode se tornar, de imediato, a porta de saída. Portanto, deve ser criada em função do sistema. Nesse contexto, a "dimensão comunicativa" (comunicação e relacionamento interpessoal) foi considerada muito importante pelos respondentes (NCF = 5,0).

Tavares (2006) alerta que, além do contato direto e do diálogo entre os membros da equipe de projetos online, para o atendimento das demandas os cursos online devem enfatizar a interatividade com o conteúdo, mediante o uso de diferentes formas de linguagem e de seus diversos recursos, tais como: a linguagem escrita (textual), a linguagem falada (vídeos, simulações narradas, teleconferências) e a linguagem visual (imagens, simulações, animações). Nessa perspectiva, é comum o conteudista, professor não familiarizado com o ambiente online, aplicar, no desenvolvimento do conteúdo, o mesmo princípio utilizado no ensino presencial, podendo gerar vários fragmentos justapostos que, desarticulados entre si, dificultam o entendimento, a aprendizagem e a construção de conhecimento por parte do aluno. Assim, objeto do trabalho do designer educativo se relaciona à correção linguística (ortográfica, gramatical e sintática) e a eficácia dos processos de comunicação.

Outro ponto que mereceu destaque diz respeito à necessidade de se desenvolver um bom relacionamento com o cliente externo, tratar as pessoas com o devido respeito e ser capaz de negociar, agindo com flexibilidade, em face de situações diversas e pontos de vista diferenciados. Também foi ressaltada a importância da cooperação; o que pressupõe que o outro perceba o quanto você pode ser uma possibilidade para ele e, a partir daí, trabalharem juntos, o que, em síntese, demanda sedução e diálogo (comunicação).

A seguir, são transcritas falas relacionadas a esse tema:

R3. nosso grande foco era nossa experiência na área de linguagem, dentro de uma perspectiva macro, quando se trabalha num sentido semiótico, em que o texto não é só o registro escrito; o texto é tudo: um composto de linguagem escrita, recursos visuais, estratégia de construção de diálogos nas diferentes interfaces. E isso é uma coisa que o pessoal de letras trabalha com relativa facilidade.

R5. Mais importante do que a área de formação são as competências que o indivíduo deve ter para trabalhar com os diferentes conteúdos e materiais que tem de usar no dia a dia de suas atividades. Apesar de nosso setor enfatizar as estratégias pedagógicas, uma competência fundamental é saber trabalhar com o texto, para torná-lo inteligível aos seus usuários.

Tais manifestações encontram respaldo nos indicadores comportamentais apontados, inerentes aos fundamentos da profissão, como, por exemplo, desenvolver materiais instrucionais consistentes com as análises de conteúdo, objetivos, tecnologias propostas, métodos de comunicação e estratégias de estudo; projetar estratégias de ensino que reflitam uma compreensão da diversidade dos alunos como indivíduos ou grupos; desenvolver instrumentos de avaliação da aprendizagem; criar mensagens apropriadas às necessidades e características dos alunos, do conteúdo e dos objetivos; comunicar-se efetivamente, por meio visual, oral ou por escrito; redigir textos interativos; aplicar os princípios de bom design de mensagens no layout de páginas e telas, e diferentes mídias para cenários instrucionais diversos; desenvolver um adequado relacionamento interpessoal e sinergia entre as áreas de negócio da instituição, em caso de implantação de projetos de educação corporativa; entre outros.

Equipe multifuncional

Relacionada à "dimensão comportamental", inclui as competências ligadas à criatividade, liderança, trabalho em equipe, foco em pessoas e em resultados, e ética, tangenciando ainda a dimensão comunicativa.

Ao tratar da articulação de saberes na educação online, Santos (2003) estabelece distinção entre multidisciplinaridade, pluridisciplinaridade e interdisciplinaridade. Argumenta que enquanto na multidisciplinaridade o "objeto é visto sob diferentes olhares, em forma de agrupamentos disciplinares, mas sem a integração de conceitos, procedimentos e atitudes, trabalho cooperativo", na pluridisciplinaridade "os sujeitos da ação podem, em momentos específicos e pontuais, estabelecer algumas relações de comunicação entre os saberes. (...). Existe (...) um certo nível de cooperação, mas não uma coordenação intencional dos vínculos" (Santos, 2003:220). Para a autora, no entanto, o trabalho pautado por experiências intencionais de interação entre a equipe do design instrucional, envolvendo intercâmbios, enriquecimentos mútuos e produção coletiva de conhecimentos, caracteriza a prática interdisciplinar.

Muito embora a expressão "equipe multidisciplinar" apareça reiteradamente nas falas dos entrevistados, prefere-se entendê-la como "equipe interdisciplinar", dado que o conhecimento se faz em rede e se orienta para um trabalho de cooperação entre os profissionais de diferentes campos do conhe-cimento, emergindo, nesse processo, a figura do designer educativo como mediador da equipe de especialistas e da construção coletiva do conhecimento, o que implica atitude comunicacional interativa.

A importância da interdisciplinaridade evidenciou-se na percepção do grupo (enfatizada pelos coordenadores de projetos) sobre os comportamentos essenciais à função de designers no Programa FGV Online, registrada em diversos indicadores, como, por exemplo, tratar as pessoas com respeito; colaborar com a equipe de trabalho durante todo o processo de desenvolvimento; compartilhar conhecimentos adquiridos, trazer soluções criativas para resolver problemas do dia a dia, comprometer-se com o alcance de resultados efetivos, sustentar-se em valores éticos e morais, gerando credibilidade e confiança no ambiente em que trabalha; entre outros. Cabe assinalar que outros indicadores presentes no estudo, além dos já citados, apontam para esse tema, como, por exemplo, saber dar e receber feedback; reconhecer e respeitar os direitos de propriedade intelectual de outros; compartilhar os conhecimentos recebidos e ser capaz de negociar, agindo de forma flexível, adaptando-se a terceiros e a situações diversas.

Saliente-se que a dimensão comportamental é, na atualidade, um diferencial entre as organizações tradicionais e as chamadas organizações de aprendizagem, gestoras do conhecimento, dado que, no cenário de globalização em que as empresas atuam e as mudanças ocorrem com extrema rapidez, faz-se necessária a utilização de estratégias ágeis e esforços concentrados para enfrentar os desafios diários.

Senge (2004) afirma que a "organização que aprende" deve propiciar, aos seus colaboradores, um ambiente no qual possam exercitar sua criatividade, ampliar sua capacidade de resolver problemas e trabalhar em equipe, entre outros, preparando-os para conviverem com as incertezas. Assim, a capacidade de liderança possibilita influenciar pessoas em diferentes situações e contextos, compatibilizando as necessidades individuais às demandas das orientações estratégicas da organização. Se bem exercida, estimula os indivíduos e os (re)direciona para o alcance dos objetivos pretendidos. Foco em pessoas e resultados e ética são competências essenciais para as organizações e se atrelam às estratégias institucionais. Como observam Fleury e Fleury (2000), a mobilização dessas competências, numa situação de trabalho, deve agregar valor social ao indivíduo e um valor econômico às organizações.

Tanto as competências relacionadas à criatividade, liderança e trabalho em equipe (NCF = 5,0) - representadas por indicadores referentes à resolução de problemas, cooperação, compartilhamento de conhecimentos e flexibilidade e inovação - como aquelas relacionadas a foco em pessoas e resultados (NCF = 5,0) - como, por exemplo, o bom relacionamento com o cliente interno e o cliente externo e o alinhamento aos objetivos organizacionais - são bastante enfatizadas pela instituição.

As competências relacionadas à ética não mereceram do grupo o mesmo destaque (NCF = 3,7) do que as anteriores, ainda que as falas dos entrevistados sinalizem para a importância de se tratar bem as pessoas e conquistar os clientes, inspirando-lhes credibilidade e confiança.

Deluiz (1994) ressalta a necessidade de que a qualificação real dos trabalhadores, seja no setor industrial ou de serviço, englobe também competências de natureza social e política, representadas neste trabalho por indicadores, tais como adaptabilidade, capacidade de trabalhar com informações e avaliar o impacto das decisões a serem tomadas, transferir conhecimentos e relacionar-se com outros profissionais.

O resultado apresentado neste item (NCF = 3,6) sugere que tais competências precisam ser mais trabalhadas no âmbito do programa, para que os designers educativos possam participar, com maior grau de liberdade, na organização, gestão e decisão dos processos produtivos, tendo em vista a valorização de suas potencialidades e o estímulo à intervenção crítica no contexto social e no contexto profissional.

R4. Em nosso setor não estamos atuando com alguém que tem todas as capacidades necessárias à realização do trabalho. Estamos lidando com um DI que tem mais competência na área da linguagem. Preferimos, dessa forma, que ele interaja, dentro de um objeto de aprendizagem, com outros profissionais que detenham outros tipos de competências, trabalhando juntos.

R5. Numa organização que atua de forma focada no cliente, buscando desenvolver trabalhos inovadores e criativos com o objetivo de atender às necessidades de capacitação das empresas, é fundamental ter uma equipe multidisciplinar com pessoas que tenham muita facilidade de relacionamento interpessoal.

R7. Para coletar o conteúdo de matemática financeira, tive de fazê-lo junto a uma pessoa idosa, que nem sequer sabia lidar com o mouse: eu precisava ter uma boa compreensão do conteúdo que teria de ser ensinado, ao mesmo tempo em que tinha de fazê-lo entender o meu trabalho; por isso, a importância do relacionamento interpessoal e da comunicação.

Comprometimento individual e organizacional

Importante que a organização valorize seus colaboradores, pois o comprometimento dos indivíduos, em geral, incide positivamente sobre a produtividade, dado que tendem a dar mais de si e, em contato com os clientes, têm mais condições de influenciá-los e conquistar sua confiança. Diversos atributos podem estreitar relacionamentos, afirma Sennett (2005 apud Vergara, 2007), como lealdade, confiança e ajuda mútua, o que pode favorecer a orientação de ações em um curso de EAD.

Neste estudo foram sublinhados indicadores de comportamentos, como: administrar o tempo, de forma adequada; ser objetivo na execução de suas tarefas; demonstrar energia e iniciativa para resolver problemas; estar atento às tendências e mudanças do mercado, propondo inovações e buscar atualizar-se constantemente entre outros, deixando evidente o comprometimento individual necessário à consecução das estratégias empresariais.

No contexto da seriedade e competência profissional, aspectos bem interessantes que são valorizados na instituição e têm implicações sérias quando não observados consistem no comprometimento com os prazos, na pontualidade aliada à qualidade do trabalho desenvolvido e na necessidade de a organização buscar novas estratégias de valorização de seu capital humano, como podem ser percebidos nas falas abaixo:

R5. A empresa espera muito de cada profissional em termos de comprometimento, que pode ser expresso no sentido de colaboração com os colegas, na forma como você representa a empresa junto aos clientes e na qualidade do produto que entrega. Os prazos são muito cobrados; por isso é preciso honrar os compromissos [grifo nosso], sem perda da qualidade. Muitas vezes, quando o conteudista atrasa, aprova-se a estrutura do curso e coloca-se em produção módulo a módulo para garantir os resultados.

R3. O mercado está aquecido para esses profissionais e a demanda por procura e contratação se torna agressiva. As empresas buscam pessoal pronto. Assim, a organização tem de se posicionar, tendo em vista o desenvolvimento de estratégias de conservação e manutenção desse corpo de trabalho. Do contrário, vamos continuar perdendo esses profissionais.

Entretanto, a "dimensão organizacional ou metódica", envolvendo as competências relacionadas ao planejamento, organização e proatividade, não foi tão enfatizada pelos respondentes, de um modo geral (NCF = 3,6). O resultado constitui-se, aparentemente, numa contradição, na medida em que, no processo de criação de um curso, o designer educativo precisa documentar seu trabalho, desde as questões mais simples e burocráticas até as mais complexas. Além disso, é fundamental administrar o tempo, tendo em vista o cumprimento de prazos; executar tarefas com objetividade e ter atitude proativa, propondo inovações. Ressalte-se que tais competências são fundamentais na fase de design e desenvolvimento do curso, na medida em que o não cumprimento de prazos pode acarretar o seu cancelamento.

Ressalte-se que, durante as entrevistas, alguns participantes deixaram clara sua importância, não obstante os resultados apontarem para a pouca representatividade dessas competências.

As falas dos entrevistados ajudam a entender o porquê dessa aparente contradição.

R1. O DI precisa ser organizado para cumprir e cobrar prazos; verificar todos os manuais, fazer o checklist de produção de todas as disciplinas. A iniciativa é muito requerida e avaliada aqui, até por conta das inúmeras relações que o DI tem de ter com outras pessoas e outras áreas. Não basta trazer os problemas, é preciso evitar a acomodação, ser proativo, trabalhar com novas ferramentas e trazer novas ideias e soluções.

R3. Essas competências não são imediatamente percebidas por esses profissionais, que ainda estão num processo de formação em serviço, em face do pouco tempo no exercício da atividade. É preciso intervenção das coordenações.

4. Conclusão

A globalização econômica e o desenvolvimento das TICs impactaram o mercado de trabalho, com reflexos significativos para a educação. A busca contínua da melhoria da qualidade de processos, produtos e serviços, e do aumento da produtividade, aliada a uma crescente demanda social pela qualidade de vida no trabalho, tem levado as instituições a adotarem novos métodos, instrumentos e formas de gestão.

Os indivíduos, por sua vez, buscam a capacitação e a atualização, seja por meio da educação continuada ou mesmo pela formação em serviço, a fim de garantirem sua empregabilidade. Nesse contexto cresce a procura por cursos a distância, fazendo surgir novos profissionais ressignificados com a emergência da internet, como, por exemplo, o designer educativo, responsável pela concepção, implementação e gerenciamento de cursos oferecidos via web, e que também necessita ter suas competências desenvolvidas, a fim de responder aos desafios impostos pela atualidade.

Este artigo apresentou os resultados da pesquisa realizada no âmbito do Programa FGV Online da Fundação Getulio Vargas, em que se procurou mapear as competências dos designers educativos, entendendo-se competências profissionais como um conjunto de recursos (conhecimentos, habilidades, atitudes, experiências) mobilizado pelo indivíduo em função de uma ação, no momento certo e na situação adequada, que agregue um valor social para ele e um valor econômico para a organização. Na busca dos resultados pretendidos foram aplicados formulários de base quantiqualitativa e realizadas entrevistas com 22 designers educativos.

O entendimento e o mapeamento das competências necessárias ao exercício da profissão de designer educativo na FGV tomaram como pressuposto básico a triangulação das dimensões humana (o profissional e suas características), institucional (FGV) e contextual (design instrucional).

Considerando que inexiste um programa específico para formação desses profissionais, nos segmentos analisados, os designers educativos são provenientes, basicamente, das áreas de comunicação, letras e educação. Isso se justifica pela relevância da linguagem, no processo de comunicação com o usuário, possibilitada por uma relação interativa e dialógica, além da necessidade de se conhecer e aplicar, de forma adequada, estratégias pedagógicas que estimulem o aluno, aproximando-o do objeto de aprendizagem. O estudo mostrou também que a instituição investe no pessoal mais jovem. Entre outras razões apontadas para tal, destacam-se a dificuldade de se recrutar designers educativos experientes disponíveis no mercado, a familiaridade dos jovens com as tecnologias digitais e sua rápida adaptação à cultura organizacional.

O fato de o mercado e-learning ainda ser muito recente e o Programa FGV Online não ter completado sete anos, associado às razões anteriormente apresentadas, levou a instituição a adotar a formação em serviço (on the job). Essa prática, que considera como marco as competências técnicas iniciais, visa ao treinamento dos profissionais para o cargo, mediante a sistemática do "aprender fazendo", sob a supervisão de um designer educativo mais experiente, o que lhes possibilita agir, refletir e aperfeiçoar suas ações, de forma contínua. O aspecto relacionado ao desenvolvimento dos indivíduos também é trabalhado pela instituição. Seu desempenho é acompanhado no dia a dia de suas atividades. Tais observações servem de base para a avaliação semestral realizada pela instituição, tendo em vista os processos de treinamento, de promoção e avaliação de potencial, o que permite a revelação de talentos.

Em relação às competências mapeadas, e de acordo com os participantes, a dimensão intelectual e técnica, representada pelas competências referentes a "conhecimentos e habilidades", é muito requerida pela instituição (NCF = 4,6), dado que a criação de um curso exige do designer educativo uma visão ampla, que envolve diversas áreas do conhecimento. Entretanto, de maneira geral, o que lhe é exigido, inicialmente, é um conhecimento técnico básico, que lhe permita trabalhar a linguagem textual e algumas estratégias pedagógicas. Conhecimentos e habilidades inerentes ao design instrucional, propriamente dito, são desenvolvidos em serviço.

A dimensão comunicativa, que engloba as competências de comunicação e relacionamento interpessoal, foi apontada como fundamental para o bom termo de um projeto dessa natureza (NCF = 5,0). Os processos comunicacionais, como um espaço de interação e interatividade entre os interlocutores, possibilitam a construção de uma rede de informações e trocas. Essa ambiência, por onde circulam valores e crenças que dão sentido ao mundo, é favorecida pela "dialogicidade", seja no campo virtual (relação dos indivíduos com o design instrucional), ou presencial (relação entre os profissionais do design).

Da mesma forma, a dimensão comportamental, envolvendo a "criatividade", a "liderança", o "trabalho em equipe" (NCF = 5,0) e o "foco em pessoas e resultados" (NCF = 5,0), foi muito enfatizada, nas diversas etapas da pesquisa, como aquela que faz a diferença e propicia vantagem competitiva às organizações na atualidade.

A dimensão ética, representada neste estudo por indicadores relacionados à integridade e bom senso no trato com as pessoas, respeito aos direitos de propriedade intelectual, compromisso com resultados, entre outros, não mereceu muita atenção na visão dos respondentes (NCF = 3,7), apesar de algumas falas tangenciarem esse tema. No entanto, enfatiza-se a relevância dessa questão, tendo em vista que, hoje, a avaliação de uma instituição passa por referenciais intangíveis, tais como imagem, confiabilidade e prestígio, que são decisivos para sua preferência e continuidade.

A dimensão metódica, referente às competências "planejamento", "organização" e "proatividade", na visão dos participantes, é menos requerida pela instituição (NCF = 3,6). No entanto, o conteúdo das falas dos entrevistados deixa claro que essas competências constituem o "nó górdio" da atuação do designer educativo, precisando ser fortalecidas, a fim de que os processos de trabalho possam fluir nos prazos estabelecidos, sem perda de qualidade, e os resultados pretendidos sejam alcançados.

A dimensão político-social, caracterizada pelas competências sociais e políticas, por sua vez, pouco valorizada na percepção dos respondentes (NCF = 3,6), também necessita ser trabalhada, no âmbito do programa, tendo em vista o desenvolvimento da autonomia e da emancipação individual e coletiva desses profissionais.

Assim, retorna-se ao cais, na certeza de que este estudo não se esgota em si mesmo. Ele é apenas o ponto de partida para novas descobertas nos férteis e profundos oceanos do saber, mediante investigação científica.

Enfatiza-se, porém, que o mapeamento de competências deve considerar: a) as especificidades dos postos de trabalho e o perfil de competências necessário a sua ocupação; b) o alinhamento das competências individuais às competências organizacionais; c) a adquirida necessidade de seu aperfeiçoamento/aprimoramento constante; d) que sempre haverá a demanda para o desenvolvimento de novas competências, razão pela qual esse movimento deve ser acompanhado mediante revisões periódicas.

Finalmente, acredita-se que esta pesquisa possa ser aprofundada, no futuro, com vistas à identificação do nível de competências de cada um desses profissionais, o que favorecerá o processo de avaliação de desempenho e de gestão do conhecimento, e permitirá a redução de eventuais desníveis, mediante treinamento e desenvolvimento, de forma precisa e objetiva.

Artigo recebido em dez. 2008 e aceito em ago. 2009.

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  • Navegando nas ondas da educação online: competências do designer educativo

    Mirian Maia do Amaral
  • 1
    Conjunto de técnicas (materiais e intelectuais), de práticas, de atitudes, de modos de pensamento e de valores que se desenvolvem juntamente com o crescimento do ciberespaço (novo espaço de comunicação que emerge da interconexão mundial dos computadores) (Lévy, 1999:17).
  • 2
    Ao final de cada dimensão (seis, no total), foi inserida a categoria "Outras".
  • 3
    Escala desenvolvida por Rensis Likert, em 1930, que consiste num conjunto de itens apresentados, de forma afirmativa, diante do qual se pede aos respondentes que externem suas reações,escolhendo um dos cinco ou sete pontos de uma escala.
  • 4
    Conjunto de técnicas de análise das comunicações, por meio de procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não), com vistas à identificação do que está sendo dito sobre um determinado tema (Bardin, 2003).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      19 Fev 2010
    • Data do Fascículo
      Dez 2009
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