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"Carrossel constitucional" & grandes tendências em 2011

SEÇÕES ESPECIAIS

A CONJUNTURA DAS ESCOLHAS PÚBLICAS

"Carrossel constitucional" & grandes tendências em 2011

Jorge Vianna Monteiro

Professor de políticas públicas da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da Fundação Getulio Vargas (Ebape/FGV). Professor associado do Departamento de Economia da PUC-Rio. Endereço: PUC-Rio, Departamento de Economia - Rua Marquês de São Vicente, 225 - Gávea - CEP 22453-900, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. E-mail: jvinmont@econ.puc-rio.br.

Um comentário estabelecido a partir do modelo analítico da public choice - uma vertente da moderna economia política que considera as políticas públicas resultado da interação social, sob instituições de governo representativo.

I. Introdução

O jogo de escolhas públicas tem nas regras constitucionais o conjunto mais abrangente e estável de suas induções. Afinal, são essas regras que se aplicam a todos os que estejam em solo brasileiro, independentemente do papel que exerçam nesse jogo, e estão sujeitas a um crivo de quatro votações no Congresso Nacional e quórum de maioria qualificada para serem afinal alteradas. Isso, se de todo puderem ser modificadas, uma vez que algumas dessas regras só poderão ser mudadas por deliberação de uma nova Convenção Constituinte. Inclui-se nessa ressalva o sistema de separação de poderes. Com o passar dos anos, esse sistema foi sendo trivialmente recondicionado pela própria feitura das leis, na extensão em que se atribui ao Executivo farto e abrangente poder de emissão de leis: as medidas provisórias.

Todavia, na recente transição governamental ocorrida no Brasil, observa-se outra fonte de enfraquecimento da separação de poderes, como tratado na seção II deste texto.

Já a seção III apresenta grandes tendências que, a partir deste começo de 2011, podem ser antecipadas na economia política contemporânea, ainda sob o impacto da crise inaugurada em 2008, e que, igualmente, também podem ter substanciais implicações para a distribuição do poder governamental.

II. O carrossel constitucional

Nos anos de 1990, com a execução da política de estabilização econômica ("Plano Real"), o sistema da separação de poderes foi sendo continuadamente desabilitado, sem que para tanto se tivesse revogado a cláusula constitucional da imutabilidade desse sistema (Monteiro, 2000; 2004). Em certa medida, e ainda que por implicações distintas, as medidas provisórias seguem sendo perversas à estabilidade desse sistema (Monteiro, 2007: Apêndice B).

Em outra frente, no entanto, um fator adicional de abalo na separação de poderes está em evidência, desde o final de 2010. Esse é um mecanismo mais sutil e perigoso, uma vez que não se apoia em nenhuma regra estritamente enumerada ou que tenha o seu propósito explicitado na Constituição. Na formação do novo governo empossado em janeiro de 2011, volta a ocorrer a prática que se tornou trivial na democracia representativa brasileira: o trânsito de representantes eleitos entre departamentos de governo, mais especificamente o de deputados e senadores que deixam suas posições no Congresso para assumirem postos na alta gerência do Executivo federal, sem que, em razão disso, percam seu mandato eletivo.

Diferentemente do caso norte-americano, em que há regra constitucional que veda expressamente esse tipo de intercâmbio,1 1 Art. I, Seção 6, (2), da Constituição dos EUA. no Brasil essa flexibilidade apresenta traços surpreendentes:

não há limite preestabelecido para a quantidade de detentores de mandato eletivo que possam fazer esse trânsito.

A aceitação de posto no Executivo pode ocorrer sem que o representante eleito sequer chegue a exercer efetivamente seu mandato no Congresso.

A permanência do político no posto burocrático pode ser interrompida a qualquer momento, sempre que a estratégia de votação legislativa indique ser o titular do posto mais confiável, do ponto de vista de alinhar-se às preferências do Governo, do que sua suplência na Câmara ou no Senado.2 2 E mais: sem prejuízo que, logo que concluída a votação legislativa, o caminho inverso possa ser feito, com o deputado ou senador reassumindo sua posição na hierarquia do Executivo.

Tal vício institucional habilita uma estratégia política no jogo de escolhas públicas que, desde sua fase ainda de formação, uma nova administração federal pode condicionar o funcionamento do sistema da separação de poderes e, assim, acomodar todo tipo de alinhamento de forças políticas, mesmo com as de oposição ao governo.3 3 E, por certo, ampliar as possibilidades de deturpação de regras vigentes nas escolhas públicas. Veja-se, por exemplo, a facilidade com que pôde ocorrer o "acerto" na contabilidade das campanhas eleitorais de 2010. Na verdade, essa é uma camuflagem que assume características de volumoso repasse a posteriori de recursos públicos aos partidos políticos: após as eleições de 2010, esses repasses poderão ser aumentados de R$ 165 milhões para R$ 265 milhões em 2011, facilitando aos partidos contornarem os déficits orçamentários das candidaturas de seus membros (CONGRESSO "estatiza" dívidas de campanha ao turbinar verba pública para partidos. O Estado de S.Paulo, 14 jan. 2011. Nacional, A4). A propósito, esse tipo de ocorrência muito qualifica a recorrente proposta de adoção de financiamento público de campanhas eleitorais no Brasil.

Ao alocar parcela de seus principais postos na alta gerência pública a deputados e senadores, independentemente de seu tempo de mandato, geram-se distorções como:

criar uma moeda de troca pode redefinir o apoio partidário com que o governo contará no Congresso, à margem do que efetivamente tenha resultado por via eleitoral.

Condiciona muito tipicamente a autonomia decisória do Congresso.4 4 Esse condicionamento se sobrepõe ao controle da agenda legislativa do Congresso, por força da cronologia de emissão de medidas provisórias que acaba por "trancar" a agenda de uma (ou de ambas) das casas do Congresso (Monteiro, 2007: Apêndice B).

E, mais uma vez, contorna-se a independência de poderes além do que as regras constitucionais vigentes formalmente reconhecem.

Um representante eleito pode participar do jogo de políticas públicas simultaneamente como membro do Congresso, ainda que licenciado transitoriamente, e burocrata em atuação no processo decisório do Executivo. Confundem-se, portanto, os papéis de burocrata e político. Por via indireta, o Congresso tende a se tornar mais tolerante diante das preferências de políticas públicas reveladas pelo Executivo e, muito especialmente, mais receptivo à instrumentação dessas políticas por meio da emissão de medidas provisórias - uma peculiaridade do presidencialismo brasileiro.

O remanejamento de recém-eleitos por seus suplentes (ou na fila de espera) ajuda a trazer para a nova legislatura políticos de maior expressão na organização partidária que não tenham obtido o número de votos suficiente para integrarem, em primeira opção, a Câmara.

Essa é, por outro lado, uma forma de violar a revelação de preferências dos eleitores, em um sentido ainda mais amplo, sem que o eleitorado seja diretamente consultado sobre a reorientação do sentido que atribuiu a seu voto a um determinado legislador. Mais ainda quando, logo após a diplomação, o político se esquiva da função para a qual foi eleito, migrando para a posição executiva.

Com efeito, pode-se conjecturar que o voto é uma manifestação por parte do eleitor sinalizando virtudes de político-legislador que ele reconhece em um determinado participante da competição eleitoral, e não de aptidões gerenciais e administrativas desse candidato. Ademais, a decisão de voto é ambientada na configuração de forças políticas mais preferidas pelo eleitor e que ele acredita ser a mais adequada na formação da futura legislatura. A reconfiguração de poder partidário acarretada pela atribuição de postos governamentais a legisladores (sob acordos das lideranças partidárias) pode frustrar esse importante elemento do cálculo da estratégia de voto do eleitor.

Desse modo, esse carrossel institucional (Lowi, 1998), em que a separação de poderes se redefine a cada volta, deturpa o cálculo de estratégias do cidadão-eleitor - uma vez que ele não é consultado quanto a isso ser de seu agrado ou não!

III. Grandes tendências

2011 é o quarto ano da crise econômica oficialmente datada em meados de 2008. Desse modo, vale refletir sobre os grandes desdobramentos econômicos e não econômicos observados até aqui. A mais clamorosa evidência é a baixa eficiência das políticas econômicas já tentadas em uma variedade de sistemas econômicos, com a agravante de que nos EUA, paraíso do liberalismo econômico, a crise não apenas recrudesce ou, na melhor das interpretações, mantém-se ainda intensa, como igualmente imprime uma trajetória de grande incerteza quanto ao futuro de curto e médio prazo.5 5 Com a expectativa corrente de agravamento, em razão da elevação no preço mundial do petróleo, em razão dos acontecimentos no Oriente Médio, ao começo de 2011, que volta a elevar o preço do galão de gasolina automotiva no mercado interno norte-americano acima do patamar crítico de U$ 3.

Em grande parte, isso decorre do fato de que as medidas anticrises acabaram por ampliar substancialmente a intrusão governamental na economia privada, em especial na redefinição da regulação em setores substantivos (mercado financeiro, sistema de saúde e previdência e mercado automotivo, por exemplo). Assim, na medida em que o repertório convencional da teoria macroeconômica persista em supor um cenário de estabilidade institucional, os governos nacionais passam a operar em "território não mapeado",6 6 Em que, ao contrário, as regras do jogo tornam-se instáveis. para usar uma apta metáfora de Christina Romer que, até meados 2010, chefiava a assessoria econômica do presidente Obama.7 7 ECONOMIST Christina Romer serves up dismal news at her farewell luncheon. Washington Post, 1 Sept. 2010.

Muito desse esforço de regulação acaba associado a uma igualmente significativa ampliação do gasto público, seja pela injeção direta de volumosas somas em dinheiro (por vezes alcançando cifras de centenas de bilhões de dólares), seja pela sustentação de onerosos e exclusivos esquemas de desonerações tributárias. Em ambos os casos, por diferentes e complexos mecanismos institucionais, tais instrumentos de política repercutem e repercutirão no desequilíbrio das contas públicas presentes e futuras. E a economia brasileira não é exceção a isso, como se pode ver pelo circunspecto início do governo Dilma Rouseff. Portanto, é ingenuidade pensar-se que a carga de impostos poderá ser aliviada em sua incidência no bem-estar do contribuinte individual, ou que, mais adiante, não se vá observar variadas decorrências provocadas por elevados níveis de desequilíbrio nas contas públicas.8 8 E por seus reflexos na estabilidade de preços.

Em fevereiro de 2011, essa tendência acaba de se materializar na economia brasileira com a forte e bem-sucedida resistência do Executivo em ceder em suas metas de correção em 4,5% nos valores da tabela de descontos do IRPF e do novo nível do salário mínimo em R$ 545.9 9 Muito mais significativo no texto do projeto de lei aprovado é a adoção de um mecanismo que transfere ao Executivo, de ora em diante e até 2015, a competência de fixar por decreto os novos níveis anuais do salário mínimo, segundo regra já em vigor: correção pela taxa da inflação do ano anterior, adicionada da taxa de crescimento do PIB observada dois anos antes (APÓS 7 horas de debate, Senado confirma mínimo de R$545. Jornal do Senado, XVII, 3392, 24 fev. 2011).

Já na economia dos EUA, os rumorosos cortes promovidos pelo estado de Winconsin nas despesas educacionais10 10 WISCONSIN gov. Walker threatens to trigger layoffs for thousands of public workers. Washington Post, 26 Feb. 2011; WISCONSIN lawmakers take step toward resolution of budget standoff. Washington Post, 25 Feb. 2011. (estendendo-se pela demissão de professores públicos, aumento da relação aluno/professor, elevação de encargos tributários e previdenciários desse segmento de mão de obra e - mais significativamente ainda - retirando dos servidores públicos grande parte de seus direitos de barganha coletiva).11 11 A suspensão do mecanismo de negociação sindical na fixação da política de remuneração do funcionalismo público é um precendente de expressiva inovação institucional que poderá vir a se propagar por outras economias nacionais, na tentativa de neutralizar efeitos negativos da crise econômica, como os já referidos desequilíbrios nas contas públicas.

Em outra frente, a incapacidade de se antecipar tanto à ocorrência quanto à intensidade da crise12 12 Como já mencionado acima neste texto. indica que a perspectiva de lidar com os problemas econômicos seja correntemente ainda atabalhoada e cheia de recorrências e incertezas:

mesmo em economias super-reguladas, como é o caso da União Europeia, fatos indicam um grau de surpresa inaceitável, quando se revelaram ao longo de 2010 desequilíbrios nas finanças públicas na Irlanda, Grécia, Portugal, Espanha e Itália. Outra vez, a teoria econômica subjacente às práticas da UE se mostra insuficiente, diante do desempenho evidenciado por essas economias nacionais.13 13 A serem por certo agravadas, com as projeções que se fazem para o mercado mundial do petróleo, diante dos acontecimentos no Oriente Médio, uma vez que as economias da UE são fortemente dependentes das importações de petróleo dessa região conflagrada. Ao começo de 2011 estima-se ser ainda elevado o risco de problemas no sistema bancário e na dívida pública em várias economias da UE (IMF: Europe poses the key risk to blobal economy. Washington Post, 25 Jan. 2011. Political Economy).

No caso americano - o fiasco analítico mais grave e espetacular do período 2008-10 - nem as seguidas intervenções regulatórias e orçamentárias do governo central têm possibilitado produzir efeitos positivos mais acelerados (Monteiro, 2011).

Em tal circunstância, o custo político associado à crise torna-se igualmente elevado: o enfraquecimento político do governo Obama (apenas decorrido metade de seu mandato), em razão da perda do controle da Câmara dos Representantes, perda significativa de apoio de governos estaduais e redução da maioria no Senado. Ao mesmo tempo, ainda que, por ora, simbolicamente, a nova liderança oposicionista tenha sido capaz de anular na Câmara dos Representantes a reforma do sistema de saúde tão laboriosamente construída e aprovada meses atrás.14 14 HOUSE Votes for repeal of health law in symbolic act. New York Times, 19 Jan. 2011. A credibilidade de futuras ações do governo Obama fica por certo muito abalada, limitando os graus de liberdade com que passa a atuar nos dois anos finais de seu mandato.

Neste começo de 2011, é uma grande incógnita intelectual entender em que horizonte de tempo as economias do Primeiro Mundo irão se reaprumar, com redução significativa nas taxas de desemprego da mão de obra, e sustentação de crescimentos do PIB em níveis pré-crise, ou com países emergentes distanciando-se, enfim, de políticas de juros elevados e de valorização de suas moedas nacionais, ainda que exibam taxas de crescimento bem mais elevadas do que as economias do Primeiro Mundo.

Esse é o mundo atual de um desempenho macroeconômico em "duas velocidades".15 15 IMF: Europe poses the key risk to global economy. Washington Post, 25 Jan. 2011. Political Economy.

IV. Conclusão

Em certo sentido, o que a prática institucional brasileira analisada na seção II põe em relevo é que os departamentos de governo acabam por tentar empreender ações que não requerem de todo a anuência um do outro. Essas são ações de caráter legislativo que não implicam que as duas instâncias independentes compartilhem poder. Tome-se a passividade com que o Congresso brasileiro acata a produção de medidas provisórias pelo Executivo: o papel reservado ao Congresso de converter uma medida provisória em lei tornando-se meramente protocolar.16 16 No caso, o uso de MP, o fato de não haver confrontos abertos entre as duas instâncias decisórias se explica pelo mútuo interesse de oposição e situação em terem à sua disposição uma peculiar estratégia legislativa: a de poder contrariar os interesses da outra parte, seja pela paralisação dos trabalhos legislativos, seja por poder obstaculizar o andamento de projetos de lei de interesse do governo.

Já no intercâmbio de papéis entre Executivo e Congresso (seção II), a deturpação é mais grave, uma vez que corrompe internamente as virtudes com que poderia operar o sistema da separação de poderes, reduzindo a qualidade e a representatividade das escolhas públicas diante das preferências expressas por via eleitoral.

Quanto às sequelas da crise econômica em curso desde 2008, o sentido do reaprendizado (tanto para acadêmicos, quanto para policy makers) que se requer parece claro:

como lidar com a nova realidade de uma participação tão substancialmente elevada do governo na economia nacional? Sobretudo quando, desde os anos de 1980, a ideologia econômica mais difundida no mundo vinha sendo a da redução das dimensões do Estado.

Como estabelecer estratégias, na circunstância de que os governos detêm, ainda que potencialmente, tão mais fortes e variados instrumentos de ação contra "falhas de mercado"? E, de todo, como se entenderá daqui em diante o que seja uma "falha de mercado"?

Como todas essas ocorrências estarão associadas a significativas mudanças nas instituições políticas que deem nova arquitetura ao que conhecemos presentemente como democracia representativa?17 17 Observe o leitor que a citada ocorrência no estado norte-americano de Wisconsin, eliminando as negociações coletivas no mercado de trabalho dos servidores públicos, é um exemplo significativo desse tipo de mudança.

Essa visão de mundo (Monteiro, 2011) não é apenas relevante para os policy makers, mas, por certo, também é essencial para os agentes que operam nos mercados de bens e serviços, uma vez que ela redimensiona a extensão de suas nonmarket strategies, ou seja, perspectivas de ação que lhes permitam lidar com maior e mais complexa regulação desses mercados originada no processo político.

Em outra instância, mais ampla, é de se duvidar que a ordem constitucional vigente permaneça intocável. A persistência de muitas dessas interferências governamentais levará a que elas sejam acomodadas no conjunto de regras constitucionais, conduzindo a que reformas, intrinsecamente econômicas, redundem em reformas do próprio processo político.18 18 Outra vez, a trajetória que se observa nos EUA com a "nova ordem" republicana pode prenunciar um padrão de reação que o processo político acaba por revelar, diante do colapso econômico.

Esse tipo de mudança tem sido encaminhado em duas frentes analíticas:

a extensão em que regras constitucionais vigentes tornam-se obsoletas, ao garantir tanta autonomia decisória ao Executivo.

A necessidade de se ter um bloco de regras ad hoc que venha a ser ativado em conjunturas de crise, algo como uma "constituição para emergências".

Em ambos os casos, experiências nacionais dos últimos anos têm sido recorrentes em mostrar que essas são situações já experimentadas, muito mais do que virtuais, embora suas lições não tenham sido até aqui adequadamente entendidas.

Na economia brasileira dos anos de 1990, um sistema fundamental como a separação de poderes foi desabilitado por anos seguidos, com a transferência de poder de feitura de leis do Congresso para a área de competência da alta gerência do Executivo - sem que regras constitucionais fossem formalmente alteradas, criando-se um substancial "déficit de democracia" (Monteiro, 2007: Apêndice B). Na economia norte-americana, por igual, em duas frentes autônomas as regras constitucionais também têm sido postas em suspensão, sem que para tanto tenha ocorrido a aprovação de emenda formal à Constituição: (i) a prática dos chamados signing statements (Lund, 2009), por parte do presidente da República, segundo os quais leis votadas pelo Congresso podem não ser inteiramente postas em vigor, por mera decisão discricionária do presidente da República, (ii) após 2001, a implementação de ações antiterrorismo tem viciado a garantia das liberdades individuais na sociedade dos EUA.

Coordenação: Jorge Vianna Monteiro

  • LOWI, T. Constitutional merry-go-round: the first time tragedy, the second time farce. In: ESKRIDGE, W.; LEVINSON, S. (Ed.). Constitutional stupidities, constitutional tragedies. New York: New York University Press, 1998.
  • LUND, N. Resolved, presidential signing statements threaten to undermine the rule of law and the separation of powers. George Mason University Law and Economics Research Paper Series, n. 09-57, 2009.
  • MONTEIRO, J.V. As regras do jogo: o Plano Real, 1997-2000. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2000.
  • _ Lições de economia constitucional brasileira. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2004.
  • _ Como funciona o governo: escolhas públicas na democracia representativa. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2007.
  • _ Governo e crise. 2011 (no prelo).
  • 1
    Art. I, Seção 6, (2), da Constituição dos EUA.
  • 2
    E mais: sem prejuízo que, logo que concluída a votação legislativa, o caminho inverso possa ser feito, com o deputado ou senador reassumindo sua posição na hierarquia do Executivo.
  • 3
    E, por certo, ampliar as possibilidades de deturpação de regras vigentes nas escolhas públicas. Veja-se, por exemplo, a facilidade com que pôde ocorrer o "acerto" na contabilidade das campanhas eleitorais de 2010. Na verdade, essa é uma
    camuflagem que assume características de volumoso repasse
    a posteriori de recursos públicos aos partidos políticos: após as eleições de 2010, esses repasses poderão ser aumentados de R$ 165 milhões para R$ 265 milhões em 2011, facilitando aos partidos contornarem os déficits orçamentários das candidaturas de seus membros (CONGRESSO "estatiza" dívidas de campanha ao turbinar verba pública para partidos.
    O Estado de S.Paulo, 14 jan. 2011. Nacional, A4). A propósito, esse tipo de ocorrência muito qualifica a recorrente proposta de adoção de financiamento público de campanhas eleitorais no Brasil.
  • 4
    Esse condicionamento se sobrepõe ao controle da agenda legislativa do Congresso, por força da cronologia de emissão de medidas provisórias que acaba por "trancar" a agenda de uma (ou de ambas) das casas do Congresso (Monteiro, 2007: Apêndice B).
  • 5
    Com a expectativa corrente de agravamento, em razão da elevação no preço mundial do petróleo, em razão dos acontecimentos no Oriente Médio, ao começo de 2011, que volta a elevar o preço do galão de gasolina automotiva no mercado interno norte-americano acima do patamar crítico de U$ 3.
  • 6
    Em que, ao contrário, as regras do jogo tornam-se instáveis.
  • 7
    ECONOMIST Christina Romer serves up dismal news at her farewell luncheon.
    Washington Post, 1 Sept. 2010.
  • 8
    E por seus reflexos na estabilidade de preços.
  • 9
    Muito mais significativo no texto do projeto de lei aprovado é a adoção de um mecanismo que transfere ao Executivo, de ora em diante e até 2015, a competência de fixar por decreto os novos níveis anuais do salário mínimo, segundo regra já em vigor: correção pela taxa da inflação do ano anterior, adicionada da taxa de crescimento do PIB observada dois anos antes (APÓS 7 horas de debate, Senado confirma mínimo de R$545.
    Jornal do Senado, XVII, 3392, 24 fev. 2011).
  • 10
    WISCONSIN gov. Walker threatens to trigger layoffs for thousands of public workers.
    Washington Post, 26 Feb. 2011; WISCONSIN lawmakers take step toward resolution of budget standoff.
    Washington Post, 25 Feb. 2011.
  • 11
    A suspensão do mecanismo de negociação sindical na fixação da política de remuneração do funcionalismo público é um precendente de expressiva inovação institucional que poderá vir a se propagar por outras economias nacionais, na tentativa de neutralizar efeitos negativos da crise econômica, como os já referidos desequilíbrios nas contas públicas.
  • 12
    Como já mencionado acima neste texto.
  • 13
    A serem por certo agravadas, com as projeções que se fazem para o mercado mundial do petróleo, diante dos acontecimentos no Oriente Médio, uma vez que as economias da UE são fortemente dependentes das importações de petróleo dessa região conflagrada. Ao começo de 2011 estima-se ser ainda elevado o risco de problemas no sistema bancário e na dívida pública em várias economias da UE (IMF: Europe poses the key risk to blobal economy.
    Washington Post, 25 Jan. 2011. Political Economy).
  • 14
    HOUSE Votes for repeal of health law in symbolic act.
    New York Times, 19 Jan. 2011.
  • 15
    IMF: Europe poses the key risk to global economy.
    Washington Post, 25 Jan. 2011. Political Economy.
  • 16
    No caso, o uso de MP, o fato de não haver confrontos abertos entre as duas instâncias decisórias se explica pelo mútuo interesse de oposição e situação em terem à sua disposição uma peculiar estratégia legislativa: a de poder contrariar os interesses da outra parte, seja pela paralisação dos trabalhos legislativos, seja por poder obstaculizar o andamento de projetos de lei de interesse do governo.
  • 17
    Observe o leitor que a citada ocorrência no estado norte-americano de Wisconsin, eliminando as negociações coletivas no mercado de trabalho dos servidores públicos, é um exemplo significativo desse tipo de mudança.
  • 18
    Outra vez, a trajetória que se observa nos EUA com a "nova ordem" republicana pode prenunciar um padrão de reação que o processo político acaba por revelar, diante do colapso econômico.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      30 Maio 2011
    • Data do Fascículo
      Abr 2011
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