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Dinâmica Política da Formulação da Política de Acesso à Informação no Brasil

Resumo

A formulação da política de acesso à informação no Brasil é retratada como uma “história de sucesso”. Dados sobre a aderência da legislação brasileira aos padrões internacionais indica que suas instituições de acesso estão entre as dez primeiras na dimensão substantiva, mas são as últimas entre elas na dimensão processual. Que mecanismo conduziu esse processo para produzir tal ambivalência? Este estudo assume que a formulação da política de acesso no Brasil representou um processo ambíguo de emulação baseado em legitimidade, orientado para a homogeneização frente ao campo internacional, mas sem quebrar o controle governamental da informação. Este artigo se baseia em trabalhos teóricos sobre difusão de políticas com foco na emulação e aborda teorias sobre conflitos e negociação pelo poder como condutores da formulação de políticas. Os resultados sugerem que a dinâmica política de disputas e acomodação de interesses forjaram esse processo e seus resultados derivaram de trade-offs políticos entre atores-chave em questões controversas. Desta forma, materializaram as preferências dos atores não-governamentais por maior abrangência e nenhum “sigilo eterno”, mas também asseguraram a órgãos públicos as prerrogativas de implementação e decisão final sobre recursos. Este caso pode representar um fenômeno mais amplo, considerando que dados comparativos indicam que essa ambivalência na adesão entre as dimensões substantiva e processual da América Latina é maior do que em outras regiões.

Palavras-chave:
dinâmica política; acesso à informação; transparência; formulação de política; difusão de políticas.

Abstract

Freedom of information (FOI) policymaking in Brazil is portrayed as a “successful story.” Data on adherence of the Brazilian legislation to international standards indicates its FOI institutions are in the top-ten group in the substantive dimension of FOI but are the last when it comes to the procedural dimension. What mechanism has driven this process to produce such ambivalence? This study assumes that FOI policymaking in Brazil represented an ambiguous legitimacy-based emulation process, oriented toward homogenization to the international field, but without breaking the governmental control over information. It draws on theoretical work on policy diffusion focusing on emulation and uses theories on conflicts and negotiation for power as drivers of policymaking. The results suggest this process was forged by political dynamics of disputes and compromises, and its outcomes derived from political trade-offs between key actors on controversial issues. Thus, the results materialized the preferences of non-governmental actors for a larger scope and no “eternal secrecy” and assured government offices’ prerogatives on implementation and their final decision on appeals. This case may represent a broader phenomenon, considering that comparative data indicates that this ambivalence in adherence between substantive and procedural dimensions is more significant in Latin America than in other regions.

Keywords:
political dynamics; freedom of information; transparency; policymaking; policy diffusion

Resumen

La formulación de la política de acceso a la información en Brasil se presenta como una “historia de éxito”. Los datos sobre la adhesión de la legislación brasileña a los estándares internacionales indican que sus instituciones de acceso están entre las diez primeras en la dimensión sustantiva, pero son las últimas entre ellas en la dimensión procesal. ¿Qué mecanismo impulsó este proceso para producir tal ambivalencia? Este estudio asume que la formulación de la política de acceso en Brasil representó un proceso de emulación basado en una legitimidad ambigua, orientado a la homogeneización frente al campo internacional, pero sin romper el control gubernamental de la información. Este artículo se basa en el trabajo teórico sobre la difusión de políticas con un enfoque en la emulación y aborda las teorías del conflicto y la negociación del poder como impulsores de la formulación de políticas. Los resultados sugieren que la dinámica política de disputas y acomodación de intereses forjó este proceso y sus resultados derivaron de las compensaciones políticas entre actores clave en temas controvertidos. De esta manera, materializaron las preferencias de los actores no gubernamentales por mayor alcance y ningún “secreto eterno”, pero también aseguraron a los organismos públicos las prerrogativas de implementación y decisión final sobre los recursos. Este caso puede representar un fenómeno más amplio, considerando que los datos comparativos indican que esta ambivalencia en la adhesión entre las dimensiones sustantiva y procesal en América Latina es mayor que en otras regiones.

Palabras clave:
dinámica política; acceso a la información; transparencia; formulación de políticas; difusión de políticas

1. INTRODUÇÃO

Uma difusão global de políticas de transparência e acesso à informação emergiu com as agendas de direitos humanos e da “boa governança”. Trabalhos sobre essa difusão indicam que ela resultou principalmente de processos baseados em transferência de padrões internacionais baseados no pressuposto de que “transparência reduz corrupção” (S.Costa, 2013Costa,S. (2013).Do Freedom of Information Laws Decrease Corruption?Journal of Law, Economics & Organization,29(6),1317-1340. https://doi.org/10.1093/jleo/ews016
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;Fox, 2007Fox,J.(2007).The uncertain relationship between transparency and accountability.Development in Practice,17(4),663-671. https://doi.org/10.1080/09614520701469955
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;Oliveira & F. L. Costa, 2020Oliveira,T. Jr. &Costa,F. L. (2020).Reforma do Estado e Política de Acesso à Informação no Brasil. InP.Cavalcante, &M. S.Silva (Eds.),Reformas do Estado no Brasil: trajetórias, inovações e desafios(pp.365-390).Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada.).

O Brasil é retratado como uma “história de sucesso” e oferece um relevante estudo de caso. Dados sobre a aderência da legislação de acesso à informação a tais padrões indicam que o Brasil está no grupo dos dez primeiros em tópicos associados à precedência do direito à informação, ao escopo e à promoção do acesso. Mas, entre os países nesta posição de topo correspondente à dimensão substantiva, o Brasil é um dos últimos em relação aos procedimentos para efetivação do acesso à informação.

Como se deu a formulação das políticas de acesso à informação no Brasil? Que se impulsionaram este processo, levando-o a produzir tamanha ambivalência? A literatura recente sobre acesso à informação no Brasil concentra sua explicação nas preferências das coalizões “vencedoras”. Em suma, enquanto os estudos focados em atores não-governamentais analisam a relação entre sua agência e a expansão do acesso, aqueles que se concentram nas coalizões pró-governo exploram como as novas instituições reproduzem suas escolhas e visões (Michener, 2014Michener,G. (2014).How Cabinet Size and Legislative Control Shape the Strength of Transparency Laws.Governance: An International Journal of Policy, Administration, and Institutions,28(1),77-94. https://doi.org/10.1111/gove.12075
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;Pereira, 2016Pereira,T. C. (2016).A Formação da Agenda da Lei de Acesso à Informação Pública no Brasil: o papel do Executivo e o controle da burocracia pública(Dissertação de Mestrado).Universidade de São Paulo,São Paulo,SP,Brasil. https://doi.org/10.11606/D.100.2016.tde-09082016-131041
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).

Uma análise documental preliminar indicou que esse processo ocorreu entre 2003 e 2012, por meio de cinco canais de decisão administrativa e legislativa. Houve quatro tipos de atores engajados: organizações intergovernamentais (OIGs), organizações não governamentais (ONGs) brasileiras e internacionais, órgãos governamentais e alianças parlamentares. As controvérsias mais significativas entre tais atores foram relacionadas a quatro questões: 1) o escopo do acesso à informação; 2) o prazo máximo de sigilo admitido; 3) a autonomia do órgão responsável pela coordenação da implementação; e 4) a independência na decisão final sobre recursos a negativas a pedidos de acesso à informação (Câmara dos Deputados, 2003Câmara dos Deputados. (2003).Projeto de lei nº 0219, de 2003.https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=105237
https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb...
; Controladoria-Geral da União [CGU],2007Article 19. (2007, 24 de abril).Iniciativa da sociedade civil pelo acesso à informação é lançada no Brasil.https://artigo19.org/2007/04/24/definindo-difamacao/
https://artigo19.org/2007/04/24/definind...
,2015Controladoria-Geral da União. (2015).Documentos de Reuniões.http://www.cgu.gov.br/assuntos/transparencia-publica/conselho-da-transparencia/documentos-de-reunioes
http://www.cgu.gov.br/assuntos/transpare...
;Senado Federal, 2010Senado Federal. (2010).Projeto de Lei da Câmara n° 41, de 2010.https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/96674
https://www25.senado.leg.br/web/atividad...
).

Os resultados destas questões controversas na nova política de acesso à informação correspondem à ambivalência mencionada acima. Por um lado, o amplo escopo do acesso e a limitação do sigilo a 50 anos, eliminando qualquer possibilidade de “sigilo eterno”, representaram uma maior adesão aos padrões internacionais, empoderando as ONGs e outros atores sociais. Por outro, a coordenação não autônoma e a decisão final não independente retratam uma menor adesão e a continuidade das prerrogativas de controle goverrnamental da informação, existentes desde as instituições anteriores. Trabalhos sobre transparência e acesso à informação no Brasil afirmam que tais resultados impactaram no poder, na discricionariedade e na reputação dos atores engajados, destacando que a opacidade e o monopólio governamental da informação marcam a trajetória da relação sociedade-governo no país (Angélico, 2012Angélico,F. (2012).Lei de Acesso à Informação Pública e seus Possíveis Desdobramento à Accountability Democrática no Brasil(Dissertação de Mestrado).Fundação Getulio Vargas,São Paulo,SP,Brasil.;Cunha, 2017Cunha,M. C. Filho. (2017).The Right to Information System in Brazil: Tensions between Transparency and Control of Information.Law and Politics in Africa, Asia and Latin America,4,412-434. https://doi.org/10.5771/0506-7286-2017-4-412
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;Jardim, 2000Jardim,J. M. (2000).Transparência e opacidade do estado no Brasil: usos e desusos da informação governamental.EdUFF.;Michener, 2014Michener,G. (2014).How Cabinet Size and Legislative Control Shape the Strength of Transparency Laws.Governance: An International Journal of Policy, Administration, and Institutions,28(1),77-94. https://doi.org/10.1111/gove.12075
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;Pereira, 2016Pereira,T. C. (2016).A Formação da Agenda da Lei de Acesso à Informação Pública no Brasil: o papel do Executivo e o controle da burocracia pública(Dissertação de Mestrado).Universidade de São Paulo,São Paulo,SP,Brasil. https://doi.org/10.11606/D.100.2016.tde-09082016-131041
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).

Este estudo assume que a formulação da política de acesso no Brasil representa um processo ambíguo de emulação baseado em legitimidade, orientado para homogeneização em relação ao campo internacioal, mas que não rompeu com a lógica de controle governamental da informação das instituições anteriores. Neste sentido, a ambivalência destacada resultou de uma dinâmica de disputas e acomodação de interesses entre preferências de poder dos atores pela mudança (+ aderência) ou pela continuidade (- aderência) em relação às questões controversas. O objetivo é analisar como tal dinâmica política forjou a formulação da política de acesso à informação no Brasil, produzindo diferentes níveis de aderência entre as dimensões substantivas e processuais das novas instituições em relação com os padrões internacionais que as fundaram.

Este trabalho se baseia na literatura sobre difusão e transferência de políticas, focada em processos de emulação baseados em legitimidade (Bugdahn, 2007Bugdahn,S. (2007).Does the EU Stifle Voluntary Policy Transfer? A study of the introduction of Freedom of Informatio in Portugal and Ireland.Public Administration,85(1),123-142. https://doi.org/10.1111/j.1467-9299.2007.00637.x
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;Marsh & Sharman, 2009Marsh,D., &Sharman,J. C. (2009).Policy diffusion and policy transfer.Policy Studies,30(3),269-288. https://doi.org/10.1080/01442870902863851
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;Radaelli, 2000Radaelli,C. M. (2000).Policy Transfer in the European Union: Institutional Isomorphism as a Source of Legitimacy.Governance: An International Journal of Policy and Administration,13(1),25-43. https://doi.org/10.1111/0952-1895.00122
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). Adicionalmente, utilizam-se teorias e conceitos sobre conflitos e negociações de poder como impulsionadores da tomada de decisão como bases teóricas sobre processos de políticas públicas (Allison & Zelikow, 1999Allison,G., &Zelikow. (1999).Essence of Decision: Explaining the Cuban Missile Crisis.Longman.;Peters, 2001Peters,B. G. (2001).The Politics of Bureaucracy(5a ed.).Routledge.;Zittoun, 2014Zittoun, P. (2014).The Political Process of Policymaking: A Pragmatic Approach to Public Policy.Palgrave Macmillan.. Considerando que os resultados refletem as complexidades de mudanças incrementais e de resistências de sistemas institucionais, exploram-se ideias sobre dependência de trajetória, mudanças on-path e retornos crescentes (Deeg, 2005Deeg,R. (2005).Change from Within: German and Italian Finance in the 1990s. InW.Streeck, &K.Thelen(Eds.),Beyond Continuity: Institutional Change in Advanced Political Economics(pp.169-202).Oxford University Press.;Pierson, 2000Pierson,P. (2000).Increasing Returns, Path Dependence, and the Study of Politics.American Political Science Review,94(2),251-267. https://doi.org/10.2307/2586011
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,2004Pierson,P. (2004).Politics in Time: history, institutions, and social analysis.Princeton University Press.).

A metodologia adota o referencial do delineamento de processo (process-tracing) com análise documental e entrevistas como técnicas de pesquisa a partir do exame de como disputas e acomodações subjacentes forjaram a trajetória do processo (Beach & Pedersen, 2013Beach,D., &Pedersen,R. B. (2013).Process-tracing methods: foundations and guidelines. University of Michigan Press.;Falleti & Lynch, 2009Falleti,T. G., &Lynch,J. F. (2009).Context and Causal Mechanisms in Political Analysis.Comparative Political Studies,42(9),1143-1166. https://doi.org/10.1177/0010414009331724
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;Mahoney, 2016Mahoney,J. (2016).Mechanisms, Bayesianism, and process tracing.New Political Economy,21(5),493-499. https://doi.org/10.1080/13563467.2016.1201803
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). Este trabalho se segue com cinco seções: um panorama da trajetória do acesso à informação; a fundamentação teórica e metodológica; a narrativa da formulação da política de acesso; a demonstração da dinâmica política como mecanismo causal; e considerações finais.

2. PANORAMA DA TRAJETÓRIA DO ACESSO À INFORMAÇÃO NO BRASIL

Entre as décadas de 1990 e 2000, diferentes organizações começaram a promover padrões e melhores práticas que associavam liberdade de informação e combate à corrupção com direitos humanos e democracia. Embora seja marcante a associação entre a liberdade de informação e a liberdade de expressão, a disseminação da agenda da “boa governança” representou o principal motor que impulsionou a convergência aos padrões de acesso (Angélico, 2012Angélico,F. (2012).Lei de Acesso à Informação Pública e seus Possíveis Desdobramento à Accountability Democrática no Brasil(Dissertação de Mestrado).Fundação Getulio Vargas,São Paulo,SP,Brasil.;Oliveira & F. L. Costa, 2020Oliveira,T. Jr. &Costa,F. L. (2020).Reforma do Estado e Política de Acesso à Informação no Brasil. InP.Cavalcante, &M. S.Silva (Eds.),Reformas do Estado no Brasil: trajetórias, inovações e desafios(pp.365-390).Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada.).

Em 1999, a Article 19 - uma organização não governamental internacional de direitos humanos focada na liberdade de expressão e informação - publicou um documento indicando nove princípios que representam o núcleo central de tais padrões neste período (Angélico, 2012Angélico,F. (2012).Lei de Acesso à Informação Pública e seus Possíveis Desdobramento à Accountability Democrática no Brasil(Dissertação de Mestrado).Fundação Getulio Vargas,São Paulo,SP,Brasil.;Mendel, 2003Mendel,T. (2003).Freedom of information: a comparative legal survey.UNESCO.https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000134191.locale=en
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). Esses princípios afirmam a: 1) divulgação máxima; 2) a obrigação de publicar; 3) o governo aberto; 4) escopo limitado de exceções ao acesso; 5) a concessão do acesso razoável e justo, 6) custos baixos para os solicitantes; 7) reuniões abertas; 8) a precedência da divulgação; e 9) a proteção para denunciantes. Conforme indicado, estes princípios visavam apresentar “uma contribuição para melhorar a governança e a accountability e fortalecer a democracia em todo o mundo” (Article 19, 2016Article 19. (2016).The Public’s Right to Know: Principles on Freedom of Information Legislation.https://www.article19.org/data/files/pdfs/standards/righttoknow.pdf
https://www.article19.org/data/files/pdf...
).

Outros padrões que foram significativos para a convergência dos países latinoamericanos ao acesso à informação foram a Convenção Interamericana contra a Corrupção da Organização dos Estados Americanos (Organization of American States [OAS],1996Organization of American States. (1996).Inter-American Convention Against Corruption.https://www.oas.org/en/sla/dil/inter_american_treaties_B-58_against_Corruption.asp
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) e a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção (United Nations, 2004United Nations. (2004).United Nations Convention Against Corruption.https://www.unodc.org/documents/brussels/UN_Convention_Against_Corruption.pdf
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). A primeira visa promover a integridade, exigindo que os signatários estimulem a participação da sociedade e das ONGs e criem “órgãos de supervisão” destinados a prevenir e combater a corrupção (OAS, 1996Organization of American States. (1996).Inter-American Convention Against Corruption.https://www.oas.org/en/sla/dil/inter_american_treaties_B-58_against_Corruption.asp
https://www.oas.org/en/sla/dil/inter_ame...
). A segunda define compromissos para promover a transparência e o acesso à informação, bem como aponta sobre a criação de “órgãos preventivos anticorrupção” (United Nations, 2004United Nations. (2004).United Nations Convention Against Corruption.https://www.unodc.org/documents/brussels/UN_Convention_Against_Corruption.pdf
https://www.unodc.org/documents/brussels...
).

O Brasil é retratado como uma “história de sucesso” na formulação de políticas de acesso de informação baseadas em tais padrões. AFigura 1 mostra os resultados de uma análise comparativa dos dados sobre o nível de aderência das legislações nacionais de acesso aos padrões internacionais, que indica que as instituições brasileiras estão no grupo das dez primeiras em tópicos associados à precedência e à titularidade do direito à informação, ao escopo e à promoção da acesso. Mas entre os países de topo em relação à dimensão substantiva, o Brasil é um dos últimos quanto à dimensão processual da disponibilização da informação (pedidos de informação, exceções, recursos e sanções).

FIGURA 1
ADERÊNCIA DOS PAÍSES ENTRE AS DIMENSÕES SUBSTANTIVA (X) E PROCESSUAL (Y) DO DIREITO À INFORMAÇÃO

O processo de formulação da política de acesso à informação no Brasil transcorreu entre 2003 e 2012, por meio de cinco canais de decisão. Os canais de decisão administrativa foram o Conselho da Transparência Pública e Combate à Corrupção (CTPCC), as “reuniões fechadas” lideradas pela Casa Civil da Presidência da República e as “discussões” que resultaram no veto presidencial do projeto da lei de acesso à informação (LAI) e em seu decreto de implementação. Os canais legislativos foram a Câmara dos Deputados e o Senado Federal.

Neste processo, houve oito organizações e alianças parlamentares engajadas as quais promoveram e defenderam padrões internacionais e debateram diretamente sobre sua adaptação aos arranjos institucionais no Brasil. A tomada de posição de tais atores indica que estes constituíram duas coalizões principais. Do lado não governamental estavam a Article 19, a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), a Transparência Brasil, a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) e uma frente parlamentar formal chamada Frente Parlamentar pelo Acesso, guiadas pela busca da expansão do direito à informação de ONGs e outros atores sociais.

Transparência Brasil e Abraji foram as ONGs brasileiras engajadas. A primeira foi amplamente reconhecida por seu pioneirismo na defesa da transparência e do combate à corrupção. Também desempenhou um papel central na discussão da primeira minuta do projeto de lei da liberdade de informação apresentado pelo governo federal (Abramo, 2009Abramo,C. W.(2009, 07 de abril).A César o que é de César (mas devagar com o andor).Observatório da Imprensa.https://www.observatoriodaimprensa.com.br/educacao-e-cidadania/caderno-da-cidadania/a-cesar-o-que-e-de-cesar-mas-devagar-com-o-andor/
https://www.observatoriodaimprensa.com.b...
; CGU, 2015). A Abraji defendeu o acesso à informação com grande foco na liberdade de expressão e na defesa do jornalismo, promovendo seminários e divulgando notícias, cartas abertas e protestos na imprensa e nas redes sociais (Angélico, 2012Angélico,F. (2012).Lei de Acesso à Informação Pública e seus Possíveis Desdobramento à Accountability Democrática no Brasil(Dissertação de Mestrado).Fundação Getulio Vargas,São Paulo,SP,Brasil.;Brasil Aberto, 2011Brasil Aberto. (2011, 28 de junho).Carta aberta à Presidente.https://abaixosigiloeterno.wordpress.com/carta-aberta-a-presidente/
https://abaixosigiloeterno.wordpress.com...
).

A Frente Parlamentar pelo Acesso se constituiu como aliança parlamentar formal de deputados federais e atuou em defesa de um amplo escopo para o acesso à informação - alcançando todos os poderes e níveis de governo - e pela eliminação de qualquer hipótese de “segredo eterno”. Tanto o deputado que propôs, em 2003, o primeiro projeto da LAI na Câmara dos Deputados, Reginaldo Lopes, quanto o relator da discussão do projeto de lei naquela casa legislativa, Mendes Filho, eram membros dessa aliança (Article 19, 2007Controladoria-Geral da União. (2007).Processo 00190.009300/2007-49.;Abraji, 2017Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo. (2017).Notícias.https://www.abraji.org.br/noticias
https://www.abraji.org.br/noticias...
).

Do lado do governo, a primeira organização foi a Controladoria-Geral da União (CGU) e a segunda foi a Casa Civil da Presidência da República. A CGU se constituia como órgão de governo anticorrupção da Presidência, responsável pela implementação de convenções e pela representação do Brasil em fóruns internacionais associados a suas competências legais. Este órgão também elaborou projetos de leis relacionadas ao combate à anticorrupção, acompanhou o seus progressos no Congresso e desenvolveu planos para implementação. A CGU foi o órgão que propôs o decreto presidencial, com a assistência da UNESCO, para estabelecer as regras e procedimentos para a implementação da LAI. Mesmo apoiando a CGU, importa destacar que este escritório da ONU defendia posicionamentos pela redução o controle governamental da informação (CGU, 2010Controladoria-Geral da União. (2010).Projeto de Cooperação Técnica entre o Governo Brasileiro e a UNESCO: Política Brasileira de Acesso à Informações Públicas.).

A Casa Civil liderava a coordenação das coalizões do governo federal com os partidos, tendo papel central para estabilidade visto que o sistema político no Brasil impõe ao Presidente a necessidade de amplas coalizões políticas para manter a governabilidade. Este gabinete também seria o que melhor representaria as preferências e visões do Presidentes e atuou como responsável pela decisão final dos projetos de lei presidenciais enviados ao Congresso (Lei nº 10.683, 2003Lei nº 10.683, de 28 de maio de 2003. (2003).Dispõe sobre a organização da Presidência da República e dos Ministérios, e dá outras providências.https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/l10.683.htm
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/le...
). O papel da Casa Civil na formulação da política de acesso foi decisivo tanto no conteúdo dos resultados das questões controversas acima mencionadas quanto no ritmo dado a este processo.

Há indícios nas entrevistas de que uma aliança informal para a “segurança nacional” foi constituída por senadores orientados a manter as prerrogativas de setores governamentais específicos para controlar informações sensíveis relacionadas à defesa, serviços de inteligência e política externa. Essa aliança foi formada durante a análise do projeto da LAI na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional no Senado Federal, liderada pelo ex-presidente Fernando Collor e composta pelo ex-presidente José Sarney e pelos senadores Marcelo Crivella, Blairo Maggi e Sérgio Souza. As preferências dessa aliança nos temas polêmicos eram, em certa medida, semelhantes às da CGU e da Casa Civil (Angélico, 2012Angélico,F. (2012).Lei de Acesso à Informação Pública e seus Possíveis Desdobramento à Accountability Democrática no Brasil(Dissertação de Mestrado).Fundação Getulio Vargas,São Paulo,SP,Brasil.;Senado Federal, 2010Senado Federal. (2010).Projeto de Lei da Câmara n° 41, de 2010.https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/96674
https://www25.senado.leg.br/web/atividad...
).

Foram quatro as questões sobre as quais houve maiores disputas entre os atores-chave durante o desenrolar do processo entre os canais de decisão e cujos resultados nas novas instituições corresponderam à ambivalência acima mencionada. Por um lado, o amplo escopo atribuído ao acesso à informação e o limite máximo de sigilo em 50 anos representaram uma maior aderência aos padrões internacionais, que empoderaram as ONGs e outros atores sociais. Por outro lado, a delegação da coordenação da implementação e da decisão final das apelações a órgãos de governo (não autônomos e não independentes) retrata uma menor aderência aos padrões e a manutenção do controle governamental da informação, representando continuidade da lógica das instituições anteriores.

A literatura sobre transparência e liberdade da informação no Brasil aponta que tais resultados impactaram no poder, na discrionariedade e na reputação dos atores envolvidos. Além disso, destaca que a opacidade e o monopólio governamental da informação marcam a trajetória da relação sociedade-governo no país (Angélico, 2012Angélico,F. (2012).Lei de Acesso à Informação Pública e seus Possíveis Desdobramento à Accountability Democrática no Brasil(Dissertação de Mestrado).Fundação Getulio Vargas,São Paulo,SP,Brasil.;Cunha, 2017Cunha,M. C. Filho. (2017).The Right to Information System in Brazil: Tensions between Transparency and Control of Information.Law and Politics in Africa, Asia and Latin America,4,412-434. https://doi.org/10.5771/0506-7286-2017-4-412
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;Jardim, 2000Jardim,J. M. (2000).Transparência e opacidade do estado no Brasil: usos e desusos da informação governamental.EdUFF.;Michener, 2014Michener,G. (2014).How Cabinet Size and Legislative Control Shape the Strength of Transparency Laws.Governance: An International Journal of Policy, Administration, and Institutions,28(1),77-94. https://doi.org/10.1111/gove.12075
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;Pereira, 2016Pereira,T. C. (2016).A Formação da Agenda da Lei de Acesso à Informação Pública no Brasil: o papel do Executivo e o controle da burocracia pública(Dissertação de Mestrado).Universidade de São Paulo,São Paulo,SP,Brasil. https://doi.org/10.11606/D.100.2016.tde-09082016-131041
https://doi.org/10.11606/D.100.2016.tde-...
). OQuadro 1 mostra essas questões controversas indicando as dimensões correspondentes (substantiva ou processual) e como as instituições relacionadas ao livre acesso à informação anteriormente existentes, os padrões internacionais e as instituições resultantes no Brasil trataram cada uma dessas questões.

QUADRO 1
QUESTÕES CONTROVERSAS NA FORMULAÇÃO DE POLÍTICA DE ACESSO À INFORMAÇÃO NO BRASIL

3. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA E METODOLÓGICA

Este estudo assume que a formulação da política de acesso à informação no Brasil representou um processo ambivalente de emulação baseado na legitimidade, orientado para a homogeneização em relação ao campo internacional, mas que não rompeu com a lógica do controle governamental da informação estabelecida em instituições anteriores. A hipótese é que as disputas e acomodações de preferências de poder entre os atores-chave forjaram tal processo, produzindo a destacada ambivalência resultante na política.

Aqui, adota-se a perspectiva de transferência de políticas que considera este conceito e seu correlato - a difusão - como representativos de fenômenos ligados à relação dialética estrutura/agência. Sendo um processo complexo, ocorre através de decisões e ações de múltiplos atores (IGOs, ONGs, órgãos, etc.) baseadas em diferentes mecanismos e lógicas (aprendizagem/isomorfismo e consequencialidade/adequação) (Dolowitz & Marsh, 2000Dolowitz,D., &Marsh,D. (2000).Learning from Abroad: The Role of Policy Transfer in Contemporary Policy-Making.Governance: An International Journal of Policy and Administration,13(1),5-24. https://doi.org/10.1111/0952-1895.00121
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;Marsh & Sharman, 2009Marsh,D., &Sharman,J. C. (2009).Policy diffusion and policy transfer.Policy Studies,30(3),269-288. https://doi.org/10.1080/01442870902863851
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).

Esta multiplicidade de fatores que permeiam tais processos está ligada às tensões inerentes entre as normas internacionais e as instituições internas retratadas pelo jogo de preferências de poder dos atores envolvidos. Neste sentido, mesmo os processos de elaboração de políticas resultantes de transferência de políticas, baseadas na emulação por conta de forças isomórficas, reproduzirão estas tensões pelo poder que se refletirão como ambiguidades em seus resultados (DiMaggio & Powell, 1991DiMaggio,P. J., &Powell,W. W. (1991).Introduction. InW. W.Powell, &P. J.DiMaggio(Eds.),The new institutionalism in organizational analysis.Chicago Press University.;Marsh & Sharman, 2009Marsh,D., &Sharman,J. C. (2009).Policy diffusion and policy transfer.Policy Studies,30(3),269-288. https://doi.org/10.1080/01442870902863851
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;Radaelli, 2000Radaelli,C. M. (2000).Policy Transfer in the European Union: Institutional Isomorphism as a Source of Legitimacy.Governance: An International Journal of Policy and Administration,13(1),25-43. https://doi.org/10.1111/0952-1895.00122
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).

Conforme indicado na hipótese, pressupõe-se que a política brasileira de acesso à informação resultou de uma transferência de padrões internacionais (I) baseada na legitimidade, impulsionada principalmente por disputas e acomodações de preferências de poder. Esta dinâmica política que envolveu os atores engajados representa o mecanismo causal (M) que explica como tal processo produziu a ambivalência (O) destacada na política resultante em relação aos padrões que a fundamentaram.

Adotando os principais pontos propostos porBeach e Pedersen (2013Beach,D., &Pedersen,R. B. (2013).Process-tracing methods: foundations and guidelines. University of Michigan Press.),Falleti e Lynch (2009Falleti,T. G., &Lynch,J. F. (2009).Context and Causal Mechanisms in Political Analysis.Comparative Political Studies,42(9),1143-1166. https://doi.org/10.1177/0010414009331724
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) eMahoney (2016Mahoney,J. (2016).Mechanisms, Bayesianism, and process tracing.New Political Economy,21(5),493-499. https://doi.org/10.1080/13563467.2016.1201803
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), esta hipótese é representada pela fórmula “I → M → O”. Abrindo-se a “caixa preta” do mecanismo causal, “M” pode ser decomposto em preferências de poder (P), como variável independente, e recursos de poder (R) e regras de tomada de decisão (D), como variáveis intervenientes. A fórmula final é “I → (P → R + D) → O.” Portanto, não são apenas os padrões (I) e as preferências (P) que importam para os resultados, mas também as regras sobre a tomada de decisões e as competências, reputação e influência mobilizadas pelos atores-chave envolvidos.

Este estudo adota o quadro analítico proposto porBeach e Pedersen (2013Beach,D., &Pedersen,R. B. (2013).Process-tracing methods: foundations and guidelines. University of Michigan Press.) como referência primária para conceituar a dinâmica política do processo de formulação da política de acesso à informação no Brasil como um mecanismo causal. O quadro que propõem, dividido em cinco partes, visa analisar como as preferências de poder de burocracias estatais forjaram políticas externas resultantes de processos de difusão/transferência. Estas partes caracterizam a transmissão causal indicando: preferências de poder dos atores, batalhas pelos canais de decisão, debates dentro do canal, a mobilização de recursos de poder e a reprodução das preferências dos “vencedores” nos resultados (Beach & Pedersen, 2013Beach,D., &Pedersen,R. B. (2013).Process-tracing methods: foundations and guidelines. University of Michigan Press.).

Aqui, adapta-se esta referência para incluir organizações governamentais e não governamentais e grupos específicos, bem como a existência de uma hierarquia entre as preferências de poder de cada um desses atores e ainda uma perspectiva multicanal sobre os processos políticos que considera as batalhas por posições em cada um de tais canais e o impacto das mudanças exógenas e endógenas no decorrer do processo. A literatura sobre administração pública, análise de políticas públicas e relações internacionais tem proposto o estudo das preferências ligadas a diferentes tipos de atores. As organizações governamentais procuram melhorar ou garantir suas posições de poder no arranjo estatal, buscando principalmente aumentar ou assegurar as suas competências e áreas de influência (F. L.Costa, 2010Costa,F. L. (2010).Reforma do Estado e contexto brasileiro: críticado paradigma gerencialista.Editora FGV.;Peters, 1998Peters,B. G. (1998).Managing Horizontal Government: the politics of co-ordination.Public Administration,76 (2),295-311. https://doi.org/10.1111/1467-9299.00102
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,2001Peters,B. G. (2001).The Politics of Bureaucracy(5a ed.).Routledge.). As alianças de membros do Congresso tendem a seguir o núcleo ideológico dos seus líderes e, de uma forma significativamente pragmática, as preferências dos seus apoiantes e da base eleitoral. É uma situação comum no Brasil devido ao seu sistema político baseado no “presidencialismo de coalizão” e na força das representações subnacionais (Nunes, 2010Nunes,E. (2010).A gramática política no Brasil: clientelismo e insulamento burocrático.Jorge Zahar Ed.;Power & Zucco, 2011Power,T., &Zucco,C. Jr. (2011).Ouvindo os Próprios Parlamentares. InT. J.Power, &C. ZuccoJunior(Eds.),O Congresso por el emesmo: autopercepções da classe política brasileira (pp.11-36).Editora UFMG.).

As preferências das ONGs costumam estar mais associadas à relevância de suas agendas e ao seu protagonismo. Como estes atores dependem de doações, é vital para eles o reconhecimento das agendas que defendem e do seu papel fundamental na elaboração e implementação de políticas. As preferências das organizações intergovernamentais tendem a reproduzir a necessidade de estabelecimento de agendas relacionadas às suas áreas de influência. Neste sentido, necessitam garantir a legitimidade dos padrões que fornecem para manter a sua influência nas políticas e instituições dos países sob o seu âmbito (Barnett, 2004Barnett,M. (2004).Rules for the World: International Organizations in Global Politics.Cornell University Press.;Simmons et al., 2006Simmons , B., Dobbin, F., & Garrett, G. (2006).The Global Diffusion of Markets and Democracy.Cambridge University Press.).

Sobre os canais de decisão e ação,Allison e Zelikow (1999Allison,G., &Zelikow. (1999).Essence of Decision: Explaining the Cuban Missile Crisis.Longman.) eBlomdahl (2016Blomdahl,M. (2016).Bureaucratic Roles and Positions: Explaining the United States Libya Decision.Diplomacy & Statecraft, 27(1), 142-161. http://dx.doi.org/10.1080/09592296.2016.1137739
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) indicam que eles representam espaços regularizados para a construção de ações coletivas sobre questões específicas. Neste estudo, esses canais representam as arenas específicas onde ocorrem decisões e ações formais sobre determinadas questões por meio de polarizações e coalizões entre atores legitimados. As instituições que regulam esses canais constituem regras particulares quanto à entrada de sujeitos, à participação de atores decisores e de advocacy e à tomada de decisões (Beach & Pedersen, 2013Beach,D., &Pedersen,R. B. (2013).Process-tracing methods: foundations and guidelines. University of Michigan Press.).

Certos atores podem ter mais vantagens nos debates e na tomada de decisões dependendo do canal selecionado. A interpretação das regras que regulam esses canais ou as instituições-alvo sob discussão também podem produzir benefícios de poder e legitimidade para atores específicos (Zittoun, 2014Zittoun, P. (2014).The Political Process of Policymaking: A Pragmatic Approach to Public Policy.Palgrave Macmillan.). Além disso, o equilíbrio dos recursos de poder entre os atores nos canais é outra fonte importante para a explicação. Considerando que mudanças exógenas e endógenas podem afetar as preferências dos atores e alterar o jogo de interpretação e o equilíbrio de poder, os reflexos de tais mudanças nas polarizações e coalisões nos canais devem ser considerados. Portanto, a sequência e os intervalos entre as mudanças relevantes e os movimentos dos principais atores são importantes. Juntos, refletem disputas e acomodação de preferências de poder que representam elementos de transmissão de “força causal” através do mecanismo causal da dinâmica política.

Resultados, batalhas e negociações sobre os “significados” dos assuntos e possíveis resultados de mudanças devem surgir durante os debates e influenciam as decisões finais (Beach & Pedersen, 2013Beach,D., &Pedersen,R. B. (2013).Process-tracing methods: foundations and guidelines. University of Michigan Press.). Os resultados desses “jogos” de interpretação de instituições e mobilização de competências, reputação e influência em cada um dos canais são transmitidos até o último canal, que deverá produzir os resultados de interesse que reflitam a disposição das tomadas de posição dos diferentes atores e suas preferências de poder (Zittoun, 2014Zittoun, P. (2014).The Political Process of Policymaking: A Pragmatic Approach to Public Policy.Palgrave Macmillan.).

A próxima seção narra os “eventos de interesse” que caracterizam disputas e acomodações de preferências de poder, coletados a partir de pesquisa documental e entrevistas. As fontes da primeira foram diretrizes internacionais, normas formais, processos administrativos e legislativos, atas de reuniões, notícias e relatórios de simpósios e seminários. As entrevistas foram realizadas junto a membros de ONGs e IGOs, servidores de órgãos públicos e congressistas, que participaram do processo de formulação. Utilizaram-se, também, dados de trabalhos científicos anteriores sobre o acesso à informação no Brasil. Apesar da dificuldade inerente de apreensão de informações que caracterizam os eventos da dinâmica política, tal combinação metodológica permite desenvolver inferências causais e obter evidências sobre cadeias entre fenômenos políticos e resultados de políticas públicas (Beach & Pedersen, 2013Beach,D., &Pedersen,R. B. (2013).Process-tracing methods: foundations and guidelines. University of Michigan Press.;Falleti & Lynch, 2009Falleti,T. G., &Lynch,J. F. (2009).Context and Causal Mechanisms in Political Analysis.Comparative Political Studies,42(9),1143-1166. https://doi.org/10.1177/0010414009331724
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;Mahoney, 2016Mahoney,J. (2016).Mechanisms, Bayesianism, and process tracing.New Political Economy,21(5),493-499. https://doi.org/10.1080/13563467.2016.1201803
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).

4. NARRANDO A DINÂMICA POLÍTICA DA FORMULAÇÃO DA POLÍTICA DE ACESSO NO BRASIL

Em 2003, o primeiro mandato do presidente Lula começou sem maioria no Congresso. Seu partido, o Partido dos Trabalhadores (PT), era reconhecido por seu compromisso com agendas relacionadas aos direitos humanos, liberdade de expressão e integridade. Sua proposta para as eleições de 2002 baseou-se em um programa específico de prevenção à corrupção que se seguiu a uma campanha promovida pela Transparência Brasil para comprometer os candidatos a melhorar os mecanismos de controle social e transparência (Abramo, 2002Abramo,C. W(2002, 09 de agosto).Para além do discurso.Folha de S. Paulo.http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz0908200210.htm
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).

Em fevereiro de 2003, o deputado federal Lopes, do PT, engajado em movimentos sociais pelos direitos humanos, propôs a primeira versão do projeto de lei de acesso à informação justificando que se baseava principalmente na experiência da lei de acesso e demais instituições mexicanas (Angélico, 2012Angélico,F. (2012).Lei de Acesso à Informação Pública e seus Possíveis Desdobramento à Accountability Democrática no Brasil(Dissertação de Mestrado).Fundação Getulio Vargas,São Paulo,SP,Brasil.). Tal proposta não indicava categorias de informações, prazos de sigilo e órgãos responsáveis pela implementação da política de acesso e pelas decisões sobre recursos (Câmara dos Deputados, 2003Câmara dos Deputados. (2003).Projeto de lei nº 0219, de 2003.https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=105237
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). Os órgãos governamentais não participaram desta primeira proposta (Angélico, 2012Angélico,F. (2012).Lei de Acesso à Informação Pública e seus Possíveis Desdobramento à Accountability Democrática no Brasil(Dissertação de Mestrado).Fundação Getulio Vargas,São Paulo,SP,Brasil.;Rodrigues, 2004Rodrigues,F. (2004, 18 de dezembro).Uma chance para Lula. Uol Notícias.https://noticias.uol.com.br/fernandorodrigues/041218/
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).

Em maio de 2003, a CGU recebeu competências relacionadas à promoção da transparência e foi criado o Conselho de Transparência Pública, para debater e propor melhorias para a prevenção da corrupção (Decreto nº 4.923, 2003Decreto nº 4.923 de 18 de dezembro de 2003. (2003).Dispõe sobre o Conselho de Transparência Pública e Combate à Corrupção, e dá outras providências.https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2003/D4923.htm
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/de...
). Entre seus membros estavam representantes da CGU, que dirigia este conselho, da Casa Civil e de outros oito órgãos, bem como de sete ONGs, entre elas a Transparência Brasil (Decreto nº 4.923, 2003Decreto nº 4.923 de 18 de dezembro de 2003. (2003).Dispõe sobre o Conselho de Transparência Pública e Combate à Corrupção, e dá outras providências.https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2003/D4923.htm
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). A CGU selecionou as ONGs que comporiam este conselho com base na importância que este órgão lhes atribuiu em relação aos seus esforços de prevenção e combate à corrupção (Decreto nº 4.923, 2003Decreto nº 4.923 de 18 de dezembro de 2003. (2003).Dispõe sobre o Conselho de Transparência Pública e Combate à Corrupção, e dá outras providências.https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2003/D4923.htm
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).

Em junho de 2005, o presidente Lula promulgou a Lei nº 11.111 (2005Lei nº 11.111, de 5 de maio de 2005. (2005).Regulamenta a parte final do disposto no inciso XXXIII do caput do art. 5º da Constituição Federal e dá outras providências.https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11111.htm
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), que manteve critérios da legislação anterior que permitiam a renovação ilimitada da classificação “ultrassecreta”, representando uma hipótese de “sigilo eterno” (Abraji, 2017). Essa lei atribuiu a uma comissão mista liderada pela Casa Civil e composta por órgãos do Poder Executivo Federal “não independentes” a responsabilidade pela decisão final sobre informações classificadas (Lei nº 11.111, 2005Lei nº 11.111, de 5 de maio de 2005. (2005).Regulamenta a parte final do disposto no inciso XXXIII do caput do art. 5º da Constituição Federal e dá outras providências.https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11111.htm
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).

Desde então, a Abraji ampliou sua campanha iniciada em 2003 contra o “segredo eterno” (Abraji, 2017Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo. (2017).Notícias.https://www.abraji.org.br/noticias
https://www.abraji.org.br/noticias...
). No mês seguinte, por sugestão da Transparência Brasil, o Conselho de Transparência Pública passou a discutir uma nova proposta de projeto de lei de acesso à informação (CGU, 2015Controladoria-Geral da União. (2015).Documentos de Reuniões.http://www.cgu.gov.br/assuntos/transparencia-publica/conselho-da-transparencia/documentos-de-reunioes
http://www.cgu.gov.br/assuntos/transpare...
;Abramo, 2009Abramo,C. W.(2009, 07 de abril).A César o que é de César (mas devagar com o andor).Observatório da Imprensa.https://www.observatoriodaimprensa.com.br/educacao-e-cidadania/caderno-da-cidadania/a-cesar-o-que-e-de-cesar-mas-devagar-com-o-andor/
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,2018Abramo,C. W. (2018, 28 de julho).Risco de retrocesso na proteção de dados pessoais.Folha de S. Paulo.https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2018/07/claudio-weber-abramo-risco-de-retrocesso.shtml
https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/20...
). A reputação desta ONG permitiu que o seu representante fosse o relator deste debate (CGU, 2015Controladoria-Geral da União. (2015).Documentos de Reuniões.http://www.cgu.gov.br/assuntos/transparencia-publica/conselho-da-transparencia/documentos-de-reunioes
http://www.cgu.gov.br/assuntos/transpare...
). Evidências apontam que os membros do conselho tinham conhecimento do projeto de lei de acesso à informação do deputado Reginaldo Lopes, mas não há informações de que tenham procurado levar essa proposta à Câmara dos Deputados (Angélico, 2012Angélico,F. (2012).Lei de Acesso à Informação Pública e seus Possíveis Desdobramento à Accountability Democrática no Brasil(Dissertação de Mestrado).Fundação Getulio Vargas,São Paulo,SP,Brasil.;CGU, 2015Controladoria-Geral da União. (2015).Documentos de Reuniões.http://www.cgu.gov.br/assuntos/transparencia-publica/conselho-da-transparencia/documentos-de-reunioes
http://www.cgu.gov.br/assuntos/transpare...
).

A proposta resultante dos trabalhos do conselho indicava os três níveis de governo no escopo do acesso à informações e um prazo máximo de sigilo de 30 anos. No entanto, não reproduzia todos os princípios do Article 19 e da lei de acesso mexicana, relacionadas à autonomia na coordenação na implementação e à independência da decisão final sobre apelações (Abramo, 2009Abramo,C. W.(2009, 07 de abril).A César o que é de César (mas devagar com o andor).Observatório da Imprensa.https://www.observatoriodaimprensa.com.br/educacao-e-cidadania/caderno-da-cidadania/a-cesar-o-que-e-de-cesar-mas-devagar-com-o-andor/
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,2018Abramo,C. W. (2018, 28 de julho).Risco de retrocesso na proteção de dados pessoais.Folha de S. Paulo.https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2018/07/claudio-weber-abramo-risco-de-retrocesso.shtml
https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/20...
). Este texto foi enviado para análise da Casa Civil e os membros do conselho, exceto a CGU, não obtiveram qualquer informação a seu respeito até março de 2009 (Abramo, 2009Abramo,C. W.(2009, 07 de abril).A César o que é de César (mas devagar com o andor).Observatório da Imprensa.https://www.observatoriodaimprensa.com.br/educacao-e-cidadania/caderno-da-cidadania/a-cesar-o-que-e-de-cesar-mas-devagar-com-o-andor/
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;CGU, 2015Controladoria-Geral da União. (2015).Documentos de Reuniões.http://www.cgu.gov.br/assuntos/transparencia-publica/conselho-da-transparencia/documentos-de-reunioes
http://www.cgu.gov.br/assuntos/transpare...
).

Durante as “reuniões fechadas” lideradas pela Casa Civil, alguns acontecimentos aumentaram a pressão pela aprovação de uma lei brasileira de acesso. Grandes escândalos de corrupção marcaram a campanha pela reeleição do presidente Lula, em 2006, que prometeu apresentar o projeto de lei de acesso à informação ao Congresso o mais rápido possível (Abramo, 2009Abramo,C. W.(2009, 07 de abril).A César o que é de César (mas devagar com o andor).Observatório da Imprensa.https://www.observatoriodaimprensa.com.br/educacao-e-cidadania/caderno-da-cidadania/a-cesar-o-que-e-de-cesar-mas-devagar-com-o-andor/
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). Em 2007, seu segundo mandato começou com uma maioria confortável no Congresso. Desde este ano, a Article 19, a Abraji e outras ONGs buscaram ampliar a coalizão pelo acesso à informação, resultando na criação da Frente Parlamentar no Congresso (Article 19, 2007Article 19. (2007, 24 de abril).Iniciativa da sociedade civil pelo acesso à informação é lançada no Brasil.https://artigo19.org/2007/04/24/definindo-difamacao/
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).

No início de 2009, a Casa Civil enviou versão de novo texto do projeto de lei de acesso aos membros do Conselho de Transparência Pública, destacando que ele refletia as ideias centrais da lei mexicana (CGU, 2015Controladoria-Geral da União. (2015).Documentos de Reuniões.http://www.cgu.gov.br/assuntos/transparencia-publica/conselho-da-transparencia/documentos-de-reunioes
http://www.cgu.gov.br/assuntos/transpare...
). Em março de 2009, esses membros e outras ONGs brasileiras e internacionais fizeram quatro críticas principais a tal proposta:

  1. ) A redução do escopo na nova versão, que passou a ser limitada ao Poder Executivo Federal, que era a principal reivindicação da Transparência Brasil.

  2. ) O fato de que a CGU, e não um órgão independente, seria responsável pela coordenação da implementação e pelo exame das recusas na primeira instância de recurso.

  3. ) A decisão final sobre apelações caberia à Comissão Mista de Reavaliação de Informações, denominada CMRI, que, assim como a comissão anterior criada pela Lei nº 11.111 (2005Lei nº 11.111, de 5 de maio de 2005. (2005).Regulamenta a parte final do disposto no inciso XXXIII do caput do art. 5º da Constituição Federal e dá outras providências.https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11111.htm
    https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_a...
    ), seria liderada pela Casa Civil e composta por órgãos não independentes do Poder Executivo Federal.

  4. ) O poder do CMRI de renovar sem limites a classificação de informações “ultrassecretas” representava um “segredo eterno”, hipótese que foi a principal crítica da Abraji, do Article 19, da UNESCO e da Frente Parlamentar (Abramo, 2009Abramo,C. W.(2009, 07 de abril).A César o que é de César (mas devagar com o andor).Observatório da Imprensa.https://www.observatoriodaimprensa.com.br/educacao-e-cidadania/caderno-da-cidadania/a-cesar-o-que-e-de-cesar-mas-devagar-com-o-andor/
    https://www.observatoriodaimprensa.com.b...
    , 2017;Angélico, 2012Angélico,F. (2012).Lei de Acesso à Informação Pública e seus Possíveis Desdobramento à Accountability Democrática no Brasil(Dissertação de Mestrado).Fundação Getulio Vargas,São Paulo,SP,Brasil.;Article 19, 2009Article 19. (2009, agosto 06).Projeto de Lei que regulamenta acesso à informação deve ser pauta no Congresso no segundo semestre.https://artigo19.org/2009/08/06/projeto-de-lei-que-regulamenta-acesso-a-informacao-deve-ser-pauta-no-congresso-no-segundo-semestre/
    https://artigo19.org/2009/08/06/projeto-...
    ).

Em abril de 2009, a Abraji promoveu um seminário com o objetivo de debater tais críticas. Participaram dirigentes da Casa Civil, da CGU, da Câmara dos Deputados e do Supremo Tribunal Federal e representantes do México, do Chile e dos EUA, além de ONGs e IGOs, como Transparência Brasil e UNESCO (Article 19, 2009Article 19. (2009, agosto 06).Projeto de Lei que regulamenta acesso à informação deve ser pauta no Congresso no segundo semestre.https://artigo19.org/2009/08/06/projeto-de-lei-que-regulamenta-acesso-a-informacao-deve-ser-pauta-no-congresso-no-segundo-semestre/
https://artigo19.org/2009/08/06/projeto-...
;Contas Abertas, 2009Contas Abertas. (2009).CGU deve ser reestruturada para lei de acesso a informação ter sucesso, afirma fórum.http://www.contasabertas.com.br/website/arquivos/2333
http://www.contasabertas.com.br/website/...
;FreedomInfo, 2009FreedomInfo. (2009, April 07).Brazil Pledges to Pass Right to Information Bill.http://www.freedominfo.org/2009/04/brazil-pledges-to-pass-right-to-information-bill/
http://www.freedominfo.org/2009/04/brazi...
). Naquela época, a imprensa oficial publicou notícias indicando que a elaboração daquele projeto teria sido uma iniciativa de órgãos governamentais. Esse fato desencadeou uma reação da Transparência Brasil, que reivindicou o reconhecimento de seu papel de liderança nesse processo (Abramo, 2009Abramo,C. W.(2009, 07 de abril).A César o que é de César (mas devagar com o andor).Observatório da Imprensa.https://www.observatoriodaimprensa.com.br/educacao-e-cidadania/caderno-da-cidadania/a-cesar-o-que-e-de-cesar-mas-devagar-com-o-andor/
https://www.observatoriodaimprensa.com.b...
,2018Abramo,C. W. (2018, 28 de julho).Risco de retrocesso na proteção de dados pessoais.Folha de S. Paulo.https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2018/07/claudio-weber-abramo-risco-de-retrocesso.shtml
https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/20...
). Sob tais críticas, a Casa Civil e a CGU alteraram a proposta, ampliando o escopo para todos os poderes e níveis de governo. O presidente Lula enviou o projeto ao Congresso em maio de 2009 (Câmara dos Deputados, 2003Câmara dos Deputados. (2003).Projeto de lei nº 0219, de 2003.https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=105237
https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb...
).

A CGU permaneceu como órgão central para implementação do acesso à informação e exame de recursos em primeira instância com base em três argumentos. Primeiro, este órgão tinha competências para implementar padrões internacionais e representar o Brasil em questões de prevenção e combate à corrupção. Em segundo lugar, os seus resultados em projetos e atividades destinados a promover a transparência proativa foram amplamente reconhecidos, inclusive pela UNESCO e pela Transparência Brasil. Terceiro, a criação de um novo órgão autônomo geraria alterações na lei orçamentária que só poderiam entrar em vigor se previstas no ano anterior.

Há indícios nas entrevistas de que a proposta de limitação do escopo do acesso à informação ao Poder Executivo Federal e da composição da CMRI visava reduzir a resistência de representantes de governos subnacionais e de membros de outros poderes. Há também informações de que tal composição resultou de decisão política da Casa Civil, que tinha superioridade hierárquica sobre todos os demais ministérios, inclusive sobre a CGU. Dessa forma, poderia ter como objetivo manter sob seu controle a decisão final sobre o acesso às informações em poder dos órgãos do Poder Executivo Federal.

O debate e a aprovação do projeto da LAI na Câmara dos Deputados ocorreram entre maio de 2009 e abril de 2010 e foram acompanhados de perto pela CGU. O deputado Reginaldo Lopes solicitou a apensação deste projetoà sua proposta anterior e que seu debate ocorresse por meio de uma comissão especial. Esses pedidos foram aprovados e esse processo legislativo, que quase não havia avançado desde 2023, passou a ser vigorosamente debatido. O relator indicado foi o deputado Mendes Filho, jornalista ligado a ONGs que defendiam a liberdade de expressão, como Abraji e Article 19, e membro da Frente Parlamentar (Abraji, 2017;Angélico, 2012Angélico,F. (2012).Lei de Acesso à Informação Pública e seus Possíveis Desdobramento à Accountability Democrática no Brasil(Dissertação de Mestrado).Fundação Getulio Vargas,São Paulo,SP,Brasil.). Nesse período, a CGU cultivou sua reputação com base nos resultados positivos de suas políticas anticorrupção, enfatizando iniciativas de transparência proativa, principalmente o Portal da Transparência (CGU, 2009Controladoria-Geral da União. (2009).Prêmios.http://www.portaldatransparencia.gov.br/sobre/Premios.asp
http://www.portaldatransparencia.gov.br/...
).

Em audiências públicas, representantes da CGU, da Casa Civil e de outros órgãos executivos federais indicaram os “excelentes resultados” deste primeiro órgão. Representantes da UNESCO, da Transparência Brasil, da Article 19 e da Abraji afirmaram a importância da aprovação do projeto de lei de acesso enviado pelo presidente Lula. Apesar disso, também destacaram a limitação relacionada à continuidade do “segredo eterno” e o empoderamento da CGU e da Casa Civil, caso ficasse na liderança da CMRI (Câmara dos Deputados, 2003Câmara dos Deputados. (2003).Projeto de lei nº 0219, de 2003.https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=105237
https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb...
).

O projeto de lei foi aprovado e enviado ao Senado Federal em abril de 2010 sem alterações relacionadas à coordenação não autônoma de implementação. No entanto, houve três alterações aprovadas pela comissão especial. Primeiro, os órgãos que recusassem o acesso a informações sobre direitos humanos ou orçamento deveriam enviar as informações sobre tal recusa aos respectivos ministérios públicos e tribunais de contas. Em segundo lugar, a CMRI também seria composta por representantes de outros poderes da esfera federal, que não estariam subordinados à Casa Civil. Terceiro, a limitação de uma única renovação da classificação “ultrassecreta”, eliminando o “segredo eterno” (Câmara dos Deputados, 2003Câmara dos Deputados. (2003).Projeto de lei nº 0219, de 2003.https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=105237
https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb...
).

Essas alterações não agradaram aos órgãos governamentais e demais órgãos do Poder Executivo Federal. Os dois últimos foram os mais polêmicos na tramitação no Senado Federal (Angélico, 2012Angélico,F. (2012).Lei de Acesso à Informação Pública e seus Possíveis Desdobramento à Accountability Democrática no Brasil(Dissertação de Mestrado).Fundação Getulio Vargas,São Paulo,SP,Brasil.). Mesmo com essa modificação, a CGU assinou um Projeto de Cooperação com a UNESCO visando a elaboração de um plano de implementação da nova política de acesso à informação para o Poder Executivo Federal, que seria formalizado por meio de decretos presidenciais (CGU, 2010Controladoria-Geral da União. (2010).Projeto de Cooperação Técnica entre o Governo Brasileiro e a UNESCO: Política Brasileira de Acesso à Informações Públicas.).

A tramitação do projeto de lei no Senado Federal ocorreu entre maio de 2010 e outubro de 2011 e foi marcada pela troca do chefe do governo federal. A presidente Dilma Rousseff, ex-ministra da Casa Civil da Presidência, teve alta aprovação popular e a mais significativa coalizão de apoio naquela casa legislativa desde a redemocratização, até então. A tramitação se deu de forma regular nas três primeiras comissões do Senado Federal. Para as audiências públicas, os senadores não convidaram nenhuma ONG. No entanto, ouviram o representante do Itamaraty, bem como da CGU e da UNESCO, que já haviam participado de audiências na Câmara dos Deputados (Senado Federal, 2010Senado Federal. (2010).Projeto de Lei da Câmara n° 41, de 2010.https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/96674
https://www25.senado.leg.br/web/atividad...
).

Na quarta e última, a Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, houve intenso debate entre abril e outubro de 2011, mesmo sem audiências públicas. O ex-presidente da República Fernando Collor liderava essa comissão e assumiu a posição de relator do projeto (Senado Federal, 2010Senado Federal. (2010).Projeto de Lei da Câmara n° 41, de 2010.https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/96674
https://www25.senado.leg.br/web/atividad...
). Durante esse debate, Collor e os senadores Marcelo Crivella, Blairo Maggi, Sérgio Souza e o outro ex-presidente, José Sarney, que também era presidente do Congresso, formaram uma aliança informal (Senado Federal, 2010Senado Federal. (2010).Projeto de Lei da Câmara n° 41, de 2010.https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/96674
https://www25.senado.leg.br/web/atividad...
).

Por um lado, há indicações nas entrevistas de que essa “aliança para a segurança nacional” representava os receios e resistências de partidos da oposição e de setores governamentais que detinham informações sensíveis associados a defesa, serviços de inteligência e relações externas. Por outro lado, o seu poder sobre o ritmo de aprovação do projeto nesta última comissão permitiu que alguns membros barganhassem sobre diferentes questões, inclusive sobre posições de liderança em empresas estatais.

A tramitação perdeu ritmo e o ex-presidente Fernando Collor e outros membros da “Aliança para a Segurança Nacional” propuseram alterações sustanciais. Estas modificações incluíam retomar o “segredo eterno”, redução de escopo, descentralizar a coordenação da implementação e passar a decisão final sobre apelações a uma comissão composta por todos os chefes das Forças Armadas e representantes de todos os poderes políticos no nível federal (Angélico, 2012Angélico,F. (2012).Lei de Acesso à Informação Pública e seus Possíveis Desdobramento à Accountability Democrática no Brasil(Dissertação de Mestrado).Fundação Getulio Vargas,São Paulo,SP,Brasil.; Senado Federal, 2010). Em junho de 2011, Abraji, Transparência Brasil e Article 19 iniciaram uma vasta campanha para que se fizesse valer o texto aprovado pela Câmara dos Deputados (Brasil Aberto, 2011Brasil Aberto. (2011, 28 de junho).Carta aberta à Presidente.https://abaixosigiloeterno.wordpress.com/carta-aberta-a-presidente/
https://abaixosigiloeterno.wordpress.com...
).

Evidências apontam que o convite feito, em julho de 2011, pelo governo dos EUA para que o Brasil compartilhasse a liderança da iniciativa global “Parceria Governo Aberto” (OGP) levou a Casa Civil e a CGU a mobilizar o apoio político do governo federal para aprovar o projeto da LAI. Um dos requisitos para a co-liderança da OGP era a existência de legislação de acesso à informação (Angélico, 2012Angélico,F. (2012).Lei de Acesso à Informação Pública e seus Possíveis Desdobramento à Accountability Democrática no Brasil(Dissertação de Mestrado).Fundação Getulio Vargas,São Paulo,SP,Brasil.).

Considerando que quaisquer alterações nesta última casa legislativa tornariam necessária uma nova revisão do projeto na Câmara dos Deputados, a Casa Civil e a CGU conseguiram levá-lo a votação rápida para derrubar as emendas da “Aliança pela Segurança Nacional”. Tal decisão dos órgãos governamentais de acelerar a aprovação do projeto de lei com foco na co-liderança da OGP resultou na manutenção do texto da Frente Parlamentar que ampliou o escopo, estabelecendo um prazo máximo de sigilo de 50 anos e conferindo maior independência à decisão final sobre apelações (Angélico, 2012Angélico,F. (2012).Lei de Acesso à Informação Pública e seus Possíveis Desdobramento à Accountability Democrática no Brasil(Dissertação de Mestrado).Fundação Getulio Vargas,São Paulo,SP,Brasil.).

A presidente Dilma Rousseff promulgou a LAI em 18 de novembro de 2011, mesmo dia em que criou a Comissão da Verdade destinada a investigar abusos de direitos humanos ocorridos durante a ditadura civil-militar no Brasil (1964-1985) (Angélico, 2012Angélico,F. (2012).Lei de Acesso à Informação Pública e seus Possíveis Desdobramento à Accountability Democrática no Brasil(Dissertação de Mestrado).Fundação Getulio Vargas,São Paulo,SP,Brasil.). A promulgação da LAI ocorreu com o veto presidencial a duas alterações incluídas na comissão especial da Câmara dos Deputados:

  1. ) O primeiro veto eliminou a obrigação de que os órgãos que recusassem acesso à informação sobre direitos humanos ou orçamento enviassem informações sobre tal recusa aos ministérios públicos e tribunais de contas.

  2. ) O segunda excluiu a composição compartilhada do CMRI com representantes de outros poderes da esfera federal (Mensagem nº 523, 2011Mensagem nº 523, de 18 de novembro de 2011. (2011).Veta parcialmente a LAI.https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/msg/vep-523.htm
    https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_a...
    ).

Tal veto foi proposto pela CGU, Casa Civil da Presidência e outros ministérios, reforçando a preferência de tais órgãos em monopolizar a decisão final sobre recusas de acesso relacionadas ao Poder Executivo Federal. Há indicações nas entrevistas de que a falta de reclamações sobre elas indica que os membros do ministério público e de tribunais de contas não tinham interesse mais significativo na política de acesso à informação, naquele momento.

O decreto de implementação da LAI, que a CGU elaborou com a assistência da UNESCO (CGU, 2010Controladoria-Geral da União. (2010).Projeto de Cooperação Técnica entre o Governo Brasileiro e a UNESCO: Política Brasileira de Acesso à Informações Públicas.), estabeleceu que a CMRI seria chefiada pela Casa Civil e que seria composta apenas por órgãos do Poder Executivo Federal, com maior participação de setores que detinham informações sensíveis (defesa, relações exteriores e serviços de inteligência) (Decreto nº 7.724, 2012). Confirmou-se que a CGU seria o órgão responsável pela coordenação da implementação do LAI e pela análise de recursos de primeiro nível (Decreto nº 7.724, 2012Decreto nº 7.724, de 16 de maio de 2012. (2012).Regulamenta a Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011, que dispõe sobre o acesso a informações previsto no inciso XXXIII do caput do art. 5º, no inciso II do § 3º do art. 37 e no § 2º do art. 216 da Constituição.https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/decreto/d7724.htm
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_a...
).

5. DEMONSTRAÇÃO DA DINÂMICA POLÍTICA COMO MECANISMO CAUSAL

Centrando-se na dinâmica política narrada da seção anterior, a demonstração do mecanismo causal exige: 1) revelar as disputas e acomodações; 2) como as preferências de poder dos atores orientaram estes eventos; e 3) como os resultados refletem as contradições e trade-offs entre essas preferências.

Nesse sentido, esta demonstração visa apresentar o papel de tal dinâmica política durante o processo de formulação da política de acesso, indicando como as preferências, os poderes mobilizados e os impactos das regras de decisão explicam os resultados de cada um dos canais de decisão. Esta demonstração é baseada nas seguintes informações:

  1. OQuadro 1 apresenta os resultados das questões polêmicas em cada canal de decisão e os atores-chave que tiveram suas preferências por eles atendidas, resumindo o conteúdo das Quadros A, B e C, no Apêndice;

  2. ) O Quadro A, no Apêndice, apresenta os atores-chave, suas orientações, prioridades (preferências primárias) e preferências secundárias sobre as questões controversas e os recursos de poder de que dispuseram;

  3. ) O Quadro B, no Apêndice, traz informações sobre as partes do mecanismo de dinâmica política de cada canal e seus resultados, que representaram insumos para o próximo; e

  4. ) O Quadro C, no Apêndice, apresenta os resultados de interesse indicando suas correspondências com as preferências de poder dos atores-chave, separadas em prioridades e preferências secundárias sobre as questões controversas.

As informações dos quadros acima mencionadas correspondem às variáveis da fórmula “I → (P → R + D) → O”, que representa a hipótese de que a política brasileira de acesso à informação resultou de um processo ambíguo de transferência de padrões internacionais baseado na legitimidade (I), impulsionado por disputas e acomodações entre as preferências de poder (P) dos atores-chave envolvidos, mediados por seus recursos de poder (R) e pelas regras de tomada de decisão aplicáveis (D) em cada um dos canais de decisão no caminho da formulação de política, produzindo ambivalências (O) na política resultante em relação aos próprios padrões que a fundamentaram.

Os achados apresentados nos quadros anteriores indicam que o mecanismo proposto explica adequadamente a ambivalência produzida pela formulação da política de acesso à informação. Mostram a transmissão de forças causais entre as preferências dos atores-chave e a sua reprodução através dos vários canais. OQuadro 1, abaixo, e a Quadro C, no Apêndice, indicam que a LAI e seu decreto de implementação resultaram de uma acomodação silenciosa e prolongada entre as preferências dos atores engajados.

QUADRO 2
EVOLUÇÃO DAS QUESTÕES CONTROVERSAS EM CADA CANAL E ATORES COM PREFERÊNCIAS ATENDIDAS

Quadro 2
continuação

Centrando-se nos atores não ligados ao governo brasileiro, que provieram os padrões internacionais ou os defenderam, é necessário considerar a pouca resistência contra o “descompasso” que o empoderamento da CGU e da Casa Civil representou frente ao princípio do 5º da Article 19. Embora a ONU e seus escritórios não possam afetar formalmente a soberania dos países e as ONG tenham geralmente menor poder de barganha com os governos, os esforços dos atores relacionados a estes dois tipos para eliminar o “segredo eterno” foram consideravelmente maiores do que em relação às demais questões. Este achado indica que tais organizações podem considerar alguns princípios e padrões de acesso à informação mais importantes do que outros, e de que a luta por todos ao mesmo tempo e na mesma proporção poderia resultar na não adoção dos mais relevantes. Seguindo essa ideia de preferências secundárias do lado não governamental, cabe destacar que esses atores admitiram que a CGU seria a melhor organização para liderar a implementação da política de acesso à informação no Poder Executivo Federal, mesmo que isso reduzisse a aderência aos padrões internacionais.

Existem algumas questões críticas em relação ao trade-off político para as organizações governamentais, que abriram mão do “segredo eterno” para manter o poder na coordenação da implementação e na decisão final sobre recusas de acesso às informações detidas pelos órgãos do Poder Executivo Federal.

Primeiro, a LAI extinguiu o sigilo das informações sobre abusos de direitos humanos, tornando-as acessíveis a qualquer pessoa, o que representou um dos compromissos mais significativos do Partido dos Trabalhadores e dos ex-presidentes Lula e Dilma Rousseff.

Em segundo lugar, esta nova lei extinguiu o “sigilo eterno”, mas os prazos de classificação permitiram que informações ultrassecretas permanecessem sob restrição por até 50 anos, o que permite que informações “classificadas” permaneçam sob segredo por um prazo até 2,5 vezes maior do que o recomendado pelos padrões internacionais.

Terceiro, embora não tenha sido atendida a preferência da “Aliança para a Segurança Nacional” de que a decisão final sobre os recursos fosse dada a uma comissão com maior presença das forças armadas, a comissão resultante foi constituída com maior participação de setores governamentais que detinham informações sensíveis (defesa, serviços de inteligência e políticas externas). Sobre tal aliança, também é necessário ressaltar a informação de que alguns de seus membros podem ter desacelerado o ritmo do projeto da LAI na última comissão do Senado para possíveis preferências cruzadas de poder relacionadas a cargos em empresas estatais.

O último ponto refere-se às mudanças nas posições dos órgãos governamentais após o convite do governo dos EUA para a co-liderança da OGP. A prioridade imediata relacionada à rápida aprovação do projeto da LAI fez com que eles abandonassem temporariamente sua primeira preferência associada à decisão final sobre os recursos. No momento seguinte à aprovação do Congresso, propuseram então à Presidente que impusesse um veto contra o texto da composição da CMRI para depois estabelecer uma nova composição por meio de um decreto presidencial - o que representaria uma possível estratégia de “veto presidencial substitutivo”, já que exclui por veto e inclui por decreto um texto que constava de lei aprovada pelo Congresso.

Essa revelação do mecanismo causal da dinâmica política - que explica como as ambivalências na aderência da política de acesso à informação no Brasil aos padrões internacionais que a fundaram resultaram de disputas e acomodação de preferências de poder entre atores não estatais internacionais e nacionais e organizações governamentais brasileiras engajadas no processo de formulação - contribui para estudos sobre acesso à informação e para literatura sobre transferência de políticas públicas.

Relativamente à agenda de pesquisa sobre acesso à informação, a ambivalência dos resultados dos mecanismos causais indica que a política e as instituições são importantes e que não houve “vencedores levando tudo”. Embora novas regras e procedimentos caracterizem a manutenção do controle governamental da informação, eles também reproduzem as preferências dos atores não estatais em limitar esse poder. E ainda tratando dos ganhos para os estudos sobre acesso à informação, é relevante apontar que os mesmos padrões e atores internacionais envolvidos na formulação da política de acesso no Brasil também influenciaram a difusão de tais políticas em outros países latino-americanos. Os dados utilizados no gráfico daFigura 1 indicam que a “lacuna” entre o nível de aderência em temas associados à dimensão substantiva e aqueles relacionados aos procedimentos de “disponibilização de informações” nesta região do globo - não apenas no Brasil - é maior do que no resto do mundo.

No que diz respeito às contribuições para a literatura sobre transferência de políticas públicas (e difusão, convergência, tradução etc.), mesmo assumindo estes fenômenos políticos como movimentos isomórficos baseados na lógica da adequação, este estudo sugere que tais processos não representam mecanismos de emulação pura e sem contradições. Conforme indicado, a política brasileira de acesso resultou de um processo de transferência que reproduziu em seu traçado e resultados as ambiguidades dos processos dialéticos estrutura-agência envolvendo as tensões inerentes entre instituições internacionais e domésticas que ocorreram através dos jogos de preferências de poder de atores engajados.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este estudo apontou que a dinâmica política forjou a formulação da política de acesso à informação no Brasil, indicando que seu resultado descreve o produto de um trade-off político entre os atores-chave em relação às questões controversas. Pressupõe-se que a política brasileira de acesso tenha resultado de um processo ambíguo de transferência de padrões internacionais (I) baseado na legitimidade, impulsionado por disputas e acomodações entre as preferências de poder (P) dos atores engajados, mediado por seus recursos de poder (R) e pelas regras de tomada de decisão aplicáveis (D), produzindo ambivalências (O) na política resultante em relação aos padrões internacionais que a fundamentaram, o que é representado pela fórmula “I → (P → R + D) → O”.

Observando a política de acesso resultante, concretizaram-se as preferências mais significativas das organizações e grupos pelos direitos humanos e pelo acesso à informação relacionadas à expansão do escopo do direito à informação e à eliminação de qualquer possibilidade de “segredo eterno”. Por outro lado, garantiu-se a continuidade das prerrogativas dos órgãos governamentais de coordenar a implementação e de “dar a palavra final” sobre os recursos a negativas de pedidos de informação. Tais resultados explicam a ambivalência na aderência entre temas relacionados à dimensão substantiva do direito à informação na política brasileira de acesso e aqueles ligados aos procedimentos de “disponibilização de informações”.

Esta revelação do mecanismo causal da dinâmica política demonstra que aspectos relevantes da formulação da política de acesso no Brasil contribuem para a agenda de pesquisa sobre acesso à informação e para a literatura sobre transferência de políticas públicas.

No que diz respeito à agenda sobre acesso, a ambivalência indica que a política e as instituições são importantes para explicar o processo de formulação analisado. Os comportamentos dos atores foram altamente orientados para o poder e a legitimidade e “nenhum vencedor levou tudo”. Também é relevante destacar que os mesmos padrões e atores internacionais envolvidos na formulação da política de acesso no Brasil também influenciaram a difusão do acesso à informação em outros países latino-americanos. Além disso, a “lacuna” entre o nível de aderência da dimensão substantiva e os procedimentos de “disponibilização da informação” nesta região - não apenas no Brasil - é maior do que no resto do mundo.

Sobre as contribuições para a literatura sobre transferência de políticas públicas (e difusão, convergência, tradução, etc.), mesmo assumindo esses fenômenos políticos como movimentos isomórficos baseados na lógica da adequação, este estudo sugere que tais processos não representam mecanismos de emulação pura e sem contradições. Conforme indicado, a política brasileira de liberdade de informação resultou de uma transferência que reproduziu em seu traçado e resultados as ambiguidades da dialética estrutura-agência, envolvendo as tensões entre instituições internacionais e domésticas que ocorreram através dos jogos de preferências de poder de atores engajados.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem os comentários e sugestões de Richard Deeg, Frederico Lustosa da Costa, Francisco Duarte, Tulia Falleti, Fernando Filgueiras, Jonathan Fox, Eduardo Gomes, Charles Pessanha e Matthew Taylor. Os dados, achados e análises aqui contidos são de responsabilidade dos autores e não refletem opiniões ou pontos de vista de qualquer organização governamental, intergovernamental ou não governamental.

APÊNDICE

QUADRO A
OS ATORES ENGAJADOS, A ORIENTAÇÃO NO PROCESSO, AS PREFERÊNCIAS PARA AS QUESTÕES CONTROVERSAS E OS RECURSOS DE PODER

Quadro A
continuação

QUADRO B
DISPUTAS E ACOMODAÇÕES DE PREFERÊNCIAS NOS CANAIS DE DECISÃO

Quadro B
continuação

Quadro B
continuação

QUADRO C
RESULTADOS ASSOCIADOS ÀS PRIORIDADES E PREFERÊNCIAS SECUNDÁRIAS

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    O conjunto de dados que suporta os resultados deste estudo está disponível mediante solicitação de informações ao autor correspondente, Temístocles Murilo de Oliveira Júnior (tmurilo@edu.ulisboa.pt), ou às organizações governamentais e não governamentais nele mencionadas. O conteúdo das entrevistas não está disponível publicamente por conter informações que podem comprometer a privacidade dos participantes da pesquisa.
  • 14
    [Versão traduzida]

Pareceristas:

  • 17
    Maria Irene da Fonseca e Sá (Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro / RJ - Brasil) https://orcid.org/0000-0002-7077-4664
  • 18
    Ariadne Chloe Mary Furnival (Universidade Federal de São Carlos, São Carlos / SP - Brasil) https://orcid.org/0000-0002-2344-4400
  • 19
    Um dos revisores não autorizou a divulgação de sua identidade.

Editado por

Alketa Peci (Fundação Getulio Vargas, Rio de Janeiro / RJ - Brasil) https://orcid.org/0000-0002-0488-1744
Mauricio Ivan Dussauge Laguna (Facultad Latinoamericana de Ciencias Sociales, Ciudad de México / CDMX - México) https://orcid.org/0000-0001-7630-1879

Disponibilidade de dados

O conjunto de dados que suporta os resultados deste estudo está disponível mediante solicitação de informações ao autor correspondente, Temístocles Murilo de Oliveira Júnior (tmurilo@edu.ulisboa.pt), ou às organizações governamentais e não governamentais nele mencionadas. O conteúdo das entrevistas não está disponível publicamente por conter informações que podem comprometer a privacidade dos participantes da pesquisa.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Mar 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    17 Fev 2023
  • Aceito
    21 Set 2023
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