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Algumas considerações sobre o desenvolvimento organizacional

ARTIGOS

Algumas considerações sobre o desenvolvimento organizacional

Fernando C. Prestes Motta

Professor-assistente do Departamento de Administração Geral e Relações Industriais da Escola de Administração de Empresas, de São Paulo, da Fundação Getúlio Vargas

Simon, Smithburg e Thompson, procurando explicar a relação entre duas tendências no estado da administração, quais sejam, o estudo do comportamento humano nas organizações e das técnicas utilizáveis para torná-las mais eficientes, recorrem a uma analogia com a medicina e a biologia, afirmando que da mesma forma que a prática da medicina só pode progredir à medida que progride o conhecimento científico da biologia, as técnicas da organização eficiente não podem desenvolver-se se não progredir a teoria do comportamento humano na organização.1 1 Simon, Herbert A., Smithburg, Donald W. & llhompson, Victor A. Administración pública. San Juan, Ediciones de la Universidad de Puerto Rico, 1956. p. 35.

O interesse dessa analogia é múltiplo. Em primeiro lugar, porque procura mostrar o caráter simplista da maioria dos manuais de administração, que apresentam "soluções de bolso" para todos os problemas administrativos, sugerindo a necessidade prévia do conhecimento científico para a articulação de uma estratégia de atuação sobre d realidade. Em segundo lugar, porque não se limita ao pressuposto ingênuo de que basta conhecer d realidade para atuar sobre ela. Finalmente, porque tem o dom quase profético de imaginar que no momento em que a teoria das organizações atingisse um nível apreciável de formalização, clamaria, ela própria, pela operacionalização de seus conceitos.

É nesse último aspecto que concentraremos nossa atenção. Nossa hipótese básica de trabalho é a de que a teoria das organizações vem atingindo níveis cada vez mais altos de formalização e de que a fase das "escolas", das teses frontalmente contrárias, da inexistência de métodos científicos já se está tornando um capítulo interessante da história do pensamento administrativo. Com isso não queremos afirmar que não haja lugar para controvérsias no atual estágio da teoria das organizações. Isto significaria a morte de qualquer esforço científico. As controvérsias persistem, mas partem de algumas teses que já são aceitas pelos estudiosos mais respeitados da área.

Isto posto, podemos traçar as linhas fundamentais da teoria das organizações aplicada, recorrendo sempre àqueles que, em função da posição conquistada na pesquisa, no magistério e na experiência profissional de consultores, começaram d se dedicar de corpo e a|ma ao desenvolvimento do novo campo. Entre esses estão Warren G. Bennis, Edgar H. Schein, Richard Beckhard, Paul R. LaWrence, Jay W. Lorsch, Chris Argyris, Rensis Likert, Robert Blake e muitos outros. Todavia, queremos deixar desde já bem claro que não pretendemos resumir as obras desses autores. As opiniões que manifestarmos no transcurso deste artigo são de responsabilidade exclusivamente nossa, ainda que baseadas no acervo de conhecimentos que vem sendo sempre aumentado pelos pesquisadores e estudiosos em geral da teoria das organizações. Acreditamos, todavia, que antes de prosseguirmos é de todo conveniente a identificação dos antecedentes do movimento em que se enquadra este artigo. A idéia de modificar a realidade é muito antiga na teoria das organizações. Porém, é com a escola de relações humanas que tal ideal começa a receber embasamento científico. Mesmo assim, entretanto, pensava-se em ação sobre pequenos grupos e não a nível da organização como um todo. De qualquer forma, porém, a contribuição dos psicólogos que se dedicaram aos estudos da dinâmica grupai e especialmente a de Kurt Lewin, em seus estudos sobre' a redemocratização da sociedade alemã no pós-guerra, foi vital. É nossa opinião, contudo, que o desenvolvimento organizacional só ganhou o significado que hoje apresenta, no momento em que a teoria das organizações foi submetida ao tratamento sistêmico que reconciliou o estrutural com o comportamental. Warren Bennis teve, nesse sentido, um papel altamente significativo. Muito do que esse autor previu fez-se teoria em Likert, Lawrence e Lorsch e outros.

1. O conceito de desenvolvimento organizacional

Parece incontestável que estamos em plena era da mudança. Muda a tecnologia, a estrutura social, mudam as necessidades, as pessoas. Concomitantemente, alterações profundas vão sendo verificadas no sistema cultural. A mudança passa a ser sempre mais valorizada, a estabilidade passa a ser vista como suspeita, e se procura imaginar novos tipos de estabilidade que atendam à necessidade de mudança. Começa-se a falar em equilíbrio dinâmico.2 2 Katz. D. & Kahn. R. L. The social psychology of organizations. New York, John Wiley and Sons, Inc., p. 25.

Seria ingênuo imaginar que em uma época de mudanças e de valorização dessas mudanças, as microestruturas que compõem a sociedade não precisassem mudar. A mudança nessas estruturas é, ao mesmo tempo, condição para sua sobrevivência e condição para o desenvolvimento econômico, social e político. Nesse aspecto se percebe, claramente, o caráter bilateral das transações contínuas da organização com seu ambiente.

Nossa área de interesse situa-se no nível organizacional. Ocupar-nos-emos da mudança, enquanto aspecto das organizações. Tal colocação nos obriga desde logo a uma explicação. Parece-nos que seria inútil prosseguir sem antes explicitar o que entendemos por mudança organizacional.

Arnold S. Judson define mudança de forma bastante ampla, como qualquer alteração, iniciada pela administração, na situação ou no ambiente de trabalho de um indivíduo. A partir dessa definição, o autor lista os tipos de mudança que considera mais comuns, classificados da forma seguinte, considerando que todos eles estão orientados para seis objetivos a longo prazo, que têm maiores probabilidades de criarem a necessidade de mudanças dentro das empresas; tipo de organização em que centraliza sua atenção. Tais objetivos seriam: melhorar o produto, melhorar o volume de vendas e os serviços, aumentar a rentabilidade, melhorar a imagem junto ao público, melhorar as relações humanas dentro da organização e melhorar a capacidade organizacional de resposta a situações futuras. Os tipos de mudanças seriam:

1. Mudanças nos métodos de operação:

a) maneiras pelas quais o trabalho é realizado;

b) localização do trabalho;

c) disposição das áreas de trabalho;

d) natureza dos materiais usados;

e) natureza da fábrica e das instalações;

f) maquinaria, ferramentas e equipamentos;

g) práticas de segurança e de manutenção, e

h) normas operacionais.

2. Mudanças nos produtos:

a) especificação dos produtos;

b) especificação de processos;

c) materiais componentes, e

d) padrões de qualidade.

3. Mudanças na organização:

a) estrutura da organização e atribuição de respon sabilidades;

b) níveis de supervisão;

c) extensão de delegação de padrões;

d) tamanho e natureza dos grupos de trabalho;

e) supervisão dos grupos de trabalho, e

f) colocação de indivíduos em tarefas específicas.

4. Mudanças no ambiente de trabalho:

a) condições de trabalho;

b) sistemas de recompensa e punição;

c) padrões de desempenho, e

d) diretrizes e métodos de ação.3 3 Judson, Arnold S. Relações humanas e mudanças organizacionais. São Paulo, Editoru Atlas S.A., 1969. p. 24-6.

Em que pese à aparente praticidade desse tipo de definição e classificação, ela parece padecer de algumas deficiências graves: em primeiro lugar, ela não se dá conta de que mudança só pode ser entendida a partir da compreensão do comportamento organizacional. Como conseqüência dessa falha básica, ela também não se dá conta de que a mudança apresenta características semelhantes em qualquer tipo de organização, seja uma empresa industrial ou um órgão público, e que falar de mu dança em empresas industriais só tem sentido como especificação. Com isso queremos afirmar que existe uma área muito ampla de aspectos comuns à mudança, qualquer que seja a organização em que ocorrer, e que esse é o filão a ser explorado inicialmente. Uma inversão dessa atitude significa um risco aumentado de incorrer em erros e conclusões precipitadas. Outro resultado da deficiência básica é o não entendimento de que existem mudanças extremamente importante que não advêm de alterações iniciadas pela administração, mas sim de um processo dialético que ocorre nas organizações de forma absolutamente natural, quer a administração interfira ou não. Sobre esse processo, Peter M. Blau e W. Richard Scott escrevem com grande discernimento em seu livro Organizações formais, quando tratam dos três dilemas básicos enfrentados pelas organizações: coordenação versus comunicação, disciplina burocrática versus especialização profissional e planejamento administrativo versus iniciativa. Para Blau e Scott, tais dilemas traduzem a inevitabilidade do conflito e da mudança, já que, por exemplo, a solução de um problema de comunicação pode implicar o surgimento de um problema de coordenação, e assim por diante.4 4 Blau, Peter M. & Scott, W. Richard. Organizações formais. Editora Atlas S.A., 1970. cap. 9. Em segundo lugar, a perspectiva que o autor demonstra dos problemas organizacionais parece limitada. Quando considera mudanças na organização como uma classe entre outras de mudanças, ele parece não perceber que tal classe abrange todas as demais, que mudanças no ambiente de trabalho, nos produtos ou nos métodos de operação são também mudanças na organização. Tal modo de ver a organização e os problemas organizacionais leva a crer que o autor não se libertou completamente do ponto de vista da escola clássica da administração, embora tudo nos leve a situá-lo no grupo de "relações humanas".

Nosso objetivo ao colocar e criticar essa conceituação de mudança é apresentar a perspectiva tradicional do problema e indicar os caminhos mediante os quais suas deficiências vêm sendo superadas. A escolha de Judson deve-se simplesmente ao fato de ter estudado o tema de forma bem sistematizada, explicitando o que outros autores pensavam e deixavam transparecer nas entrelinhas. O valor intrínseco do trabalho de Judson, evidentemente, só pode ser avaliado de forma adequada considerando-se as premissas em que se baseia: características de um outro momento da teoria das organizações.

A nosso ver, a definição de Judson poderia ser mantida com a supressão de algumas poucas palavras, mesmo porque ela é suficientemente ampla para tornar impossível uma discordância mais frontal. Naturalmente, porém, tal afirmação não é válida para sua classificação. Já não discordaríamos de uma definição como a seguinte: mudança organizacional é um conjunto de alterações na situação ou no ambiente de trabalho de uma organização, entendendo ambiente de como ambiente técnico, social e cultural.

Ocorre, porém, que a conceituação de mudança organizacional é apenas um passo para nosso objetivo: conceituar desenvolvimento organizacional. Alguns autores já se preocuparam com essa tarefa. É, portanto, de todo conveniente que analisemos pelo menos uma conceituação que nos pareça típica. Para Warren G. Bennis, desenvolvimento organizacional é uma estratégia educacional adotada para trazer à tona uma mudança organizacional planejada, exigida pelas demandas às quais a organização tenta responder, e que enfatiza o comportamento baseado na experiência. Outras características são as relacionadas com os agentes de mudança. Assim, esses agentes são, na maior parte dos casos, externos à organização, trabalhando em colaboração com seus participantes. Além disso, eles compartilham de uma filosofia social, ou seja, de um conjunto de valores referentes ao mundo e às organizações, que influi nas suas estratégias, determinam suas intervenções e governa em (grande parte suas respostas à organização. Finalmente, em decorrência dessa filosofia social compartilhada, os agentes de mudança participam também de um conjunto de metas normativas. As metas geralmente procuradas são:

1. Aprimoramento nas relações interpessoais;

2. Transformação nos valores, para que o fator humano venha a ser considerado legítimo e digno de atenção;

3. Aprimoramento do entendimento inter e intragrupal no sentido de reduzir tensões;

4. Desenvolvimento de uma equipe administrativa mais eficiente;

5. Desenvolvimento de melhores métodos de solução de conflitos, e

6. Substituição de sistemas mecânicos por orgânicos.5 5 Bennis, Warren G. Organization development: ist nature, origins and prospects. Readings, Massachusetts, Addison-Wesley Publishing Company, 1969. p. 10-5.

Essa conceituação de desenvolvimento organizacional é extremamente interessante porque lista suas características básicas. Acreditamos, porém, que as metas relacionadas com as alterações comportamentais estão supervalorizadas. Embora a transformação do homem possa ser encarada como objetivo primordial, ela não pode ocorrer serrt alterações de ordem estrutural. Não estamos imaginando que Bennis haja omitido tais alterações. Já pudemos verificar que se refere a elas, quando citamos a substituição de sistemas mecânicos por orgânicos. Simplesmente estamos chamando atenção para o fato de que a última meta apresentada pelo autor é, entre as seis, a única que se refere a alterações estruturais. Um outro aspecto dessa conceituação baseada na listagem das características é a quantidade excessiva de informações, que¡ talvez pudessem ser melhor absorvidas por intermédio do método lógico-dedutivo. Nesse particular, entretanto, cumpre lembrar que estamos diante de um dado cultural: os norte-americanos raramente definem, preferindo apresentar o máximo de informações pertinentes ao objeto, deixando ao leitor sua organização.

De qualquer modo, acreditamos que nossa forma de ver o desenvolvimento organizacional difere um pouco daquela do autor citado, e, além disso, preferimos uma definição curta que ofereça o gênero próximo e a diferença específica do que se está tratando. Já definimos mudança organizacional como um conjunto de alterações na situação ou no ambiente de trabalho de uma organização. A partir disso, não é difícil a definição do desenvolvimento organizacional se não nos furtarmos posteriormente a seu detalhamento. Nessa linha, nossa definição seria simples: desenvolvimento organizacional é a mudança organizacional planejada.

Definido desenvolvimento organizacional como mudança organizacional planejada e mudança organizacional como um conjunto de alterações nó ambiente de trabalho de uma organização, resta citar os principais tipos de alterações que caracterizam o desenvolvimento.

Há dois tipos fundamentais de alterações: estruturais e comportamentais. Tais alterações são geralmente interdependentes e um trabalho eficiente de desenvolvimento raramente pode ocupar-se de apenas um de seus tipos. O desenvolvimento organizacional, porém, deve ser entendido como um processo essencialmente dinâmico que pode ser mais ou menos completo, conforme o grau desejado de mudança. Assim, muitas vezes, não são utilizadas todas as técnicas disponíveis, embora uma combinação de alterações estruturais e comportamentais seja quase sempre desejável, mesmo porque umas suportam as outras na busca de um determinado objetivo, em geral, o aumento da eficiência ou eficácia organizacional.

Em outras palavras, poderíamos afirmar que o desenvolvimento organizacional depende da situação que requer e condiciona um determinado tipo de mudança. Dessa afirmação, imediatamente podemos deduzir que um dos esforços desse tipo de trabalho é o levantamento da situação e, portanto, do tipo de mudança requerido. Poderíamos ainda afirmar que o levantamento da situação é a primeira etapa do processo de desenvolvimento organizacional. Essa primeira etapa deve iniciar-se por um levantamento das relações da organização com seu ambiente. É, em geral, desse levantamento que as principais alterações estruturais nascem. O segundo passo é o levantamento das relações entre grupos de participantes. Desse levantamento nascem tanto alterações estruturais, quanto comportamentais. Finalmente, o terceiro passo é o levantamento das relações entre os participantes individuais e a organização. Desse, costumam surgir alterações de ordem comportamental.

Lawrence e Lorsch propõem, além do levantamento da situação, outras três etapas: planejamento da mudança, implementação e follow-up, e avaliação. Tal processo, porém, funciona como um circuito fechado, isto é, o resultado da avaliação implica alteração do diagnóstico e assim por diante. Evidentemente, há um momento em que o processo ganha uma dinâmica própria, sem necessidade de interferência externa.

Esses autores ainda consideram os diversos níveis em que a mudança pode ser planejada e implementada, tendo-se em conta as alterações comportamentais envolvidas. Tais considerações são apresentadas no quadro 2.


Um ponto interessante nesse quadro 2 é a relação entre alterações estruturais e expectativas de papel. Tal relação leva-nos a enfatizar um cuidado especial para o fato de que alterações na organização formal implicam alterações na organização informal, ou ainda, de que alterações estruturais planejados, implicam alterações comportamentais, mesmo que não previstas. Daí a dificuldade de se trabalhar nessa área com apenas um tipo de alteração. Do resto, tais relações entre aspectos formais e informais das organizações têm sido bastante enfatizadas pelos estruturalistas.8 8 Etzioni, Amitai. Modern organizations. New Jersey, Prentice-Hall, Inc., 1964.

2. O campo das alterações estruturais

Durante muito tempo o mundo conheceu apenas um tipo de estrutura organizacional, tipo esse que Max Weber analisou, identificando suas principais características. Tal estrutura, que ficou conhecida como burocrática, representou em dado momento histórico um grande passo em direção à racionalidade. Representou, em todos os aspectos, uma substituição de critérios tradicionais por critérios racionais. O quadro 3 dá uma idéia dessa substituição.


Esse tipo de estrutura tinha no exército prussiano o seu exemplo mais típico. É basicamente uma estrutura de cargos, onde prevalece o padrão monocrático de chefia e ocupantes dos cargos desempenham papéis rigorosamente definidos. Uma representação gráfica dessa estrutura seria semelhante àquela apresentada no quadro 4.


No gráfico do quadro 4, os círculos representariam os cargos com suas respectivas esferas de competência, e as linhas, o fluxo de autoridade de cima para baixo. Todavia, a estrutura burocrática logo revelou sua inadequação para um número muito grande de organizações, inadequação essa sentida especialmente no tocante à dificuldade de reunir em um ocupante de cargo todo o conhecimento especializado necessário ao desempenho do seu papel.

Tal dificuldade levou ao surgimento de um segundo tipo de estrutura que ficou conhecida como "linha-estafe", que poderia ser representada da forma expressa no quadro 5.


Nesse tipo de estrutura, os cargos representados por círculos compõem a linha e detêm autoridade, enquanto que os representados por retângulos compõem o estafe e têm como única função o aconselhamento em matéria especializada, nem nenhuma autoridade ou responsabilidade na execução. Cumpre lembrar que como a complexidade das tarefas organizacionais parece aumentar continuamente, a necessidade da existência de um número muito grande de cargos com papéis extremamente especializados acabou criando a necessidade de agrupálos de acordo com determinados critérios, permitindo dessa forma uma coordenação mais eficiente. Entre tais critérios, aquele que se difundiu mais rápida e amplamente foi o critério funcional, isto é, o agrupamento dos cargos relacionados a determinadas funções, como vendas, produção, finanças, etc. Outros critérios como território, clientes, produtos, etc, são também importantes e muito comuns. É fácil perceber, porém, que embora essa estrutura aparentemente solucione o problema da separação do conhecimento especializado da autoridade, cria a possibilidade de conflito entre linha e estafe.

Além disso, tal estrutura implica dificuldade de controle, já que algumas subfunções dependem de mais de uma função para seu desempenho eficiente em termos da organização como um todo. Da mesma forma, o desempenho de uma subfunção pode comprometer uma função que não tenha seu controle. Também a duplicação de funções parece ser estimulada nesse tipo de estrutura, com todas as suas inconveniências, inclusive a da dificuldade de padronização.

Uma tentativa de solução desses problemas é a chamada estrutura funcional, na qual um cargo ou unidade administrativa tem autoridade sobre outra em um campo restrito e especializado, mesmo que não haja relação de linha. Tal estrutura poderia ser representada pelo quadro 6.


Como bem observa Wickesberg, a estrutura funcional dá a um indivíduo ou função geralmente entendida como de estafe muito mais poder e influência. Note-se o caso do diretor de pessoal no exemplo dado.10 10 Wickesberg, Albert K. Administração organizada. São Paulo, Editora Brasiliense, 1969. p. 75.

A estrutura funcional é, sem dúvida alguma, a forma de organização mais difundida tanto no setor privado como no setor público. Sua utilização possibilita um elevado nível de especialização, mas provoca ao mesmo tempo uma grande competição pelos recursos da organização. Assim mesmo, essa estrutura é a que mais se adapta a determinados tipos de organização, como teremos oportunidade de demonstrar.

Entretanto, tanto a estrutura linha-estafe quanto a funcional são apenas variações da estrutura burocrática, não solucionando os seus principais problemas, todos eles relacionados com sua incompatibilidade básica com as condições conducentes à criatividade. Tais condições foram vistas com grande clareza por Victor A. Thompson em Bureaucracy and inovation11 11 Thompson, Victor A. Bureaucracy and inovation. University of Alabama Press, 1969. e poderiam ser listados do seguinte modo:

1. Segurança psicológica;

2. Diversidade de insumos;

3. Compromisso interno ou pessoal em buscar a solução;

4. Alguma estrutura ou limites à situação de busca de solução; e

5. Alguma competição positiva.

É verdade que a rigidez burocrática, a excessiva centralização de autoridade, podem ser bastante minimizadas pela opção por uma variação da estrutura funcional, a que se pode chamar estrutura funcional descentralizada, que apresenta uma essência aparentemente contraditória: autoridade amplamente delegada e controle centralizado. Essa é basicamente a filosofia administrativa chinesa, o seu "centralismo democrático": um sistema hierárquico rígido ao lado de independência, criatividade e autocrítica local. É também a filosofia administrativa de algumas grandes empresas do mundo capitalista, entre as quais a General Motors. Nesse tipo de estrutura, além das unidades funcionais, existem divisões territoriais ou de produtos. Às unidades funcionais cabe a definição dos objetivos a serem atingidos, e estabelecimento de diretrizes gerais, a coordenação das atividades das divisões e o seu assessoramento. Às divisões são dadas ampla liberdade operacional, responsabilidade pelo êxito ou fracasso e possibilidade de comprar e vender fora da organização sempre que tal procedimento significar economia.12 12 Breaser Pereira, L. C, O processo de descentralização. São Paulo, Escola de Administração de Empresa? de São Paulo, Fundação Getúlio Vargas.

De qualquer forma, em todas as organizações que adotam estruturas do tipo burocrático puro, linha-estafe ou funcional, há a predominância da "ideologia da produção" baseada na "racionalidade econômica" e o controle é definido em termos de confiabilidade. É evidente que toda a ênfase se coloca na previsibilidade e a inovação só pode ser vista como não confiável, uma vez que não se submete a controles prévios. Ocorre que no mundo moderno, quando as organizações operam em ambientes cada vez mais turbulentos, a criatividade é fundamental. Nesses tipos de estrutura de inspiração burocrática, o desenvolvimento pessoal não é favorecido, a organização informal e o surgimento de problemas imprevistos não são levados em consideração, os sistemas de controle e autoridade são ultrapassados, não há meios adequados para a solução de conflitos entre níveis hierárquicos e grupos funcionais, a comunicação é dificultada pelas divisões hierárquicas, predominam a suspeita e o medo, não existe capacidade de assimilação do influxo de nova tecnologia e o homem transforma-se num ser psicologicamente condicionado.13 13 Bennis, Warren G. Changing organizations. MdGraw-Hill, 1966. cap. 1.

Talvez todas essas críticas pudessem ser resumidas na observação do que as estruturas de inspiração burocrática baseiam-se em uma concepção da organização como um sistema fechado, adequada a um ambiente estável e não diferenciado, o que não é mais verdade para um grande número de organizações, que têm em suas transações com o ambiente a principal fonte de sobrevivência e crescimento.

O leitor certamente terá notado que a todo momento estamo-nos referindo a estruturas que são adequadas ou não a determinados tipos de organização. Na verdade, essa idéia decorre da evolução da teoria das organizações, que chamando a atenção para suas semelhanças, evidenciou também suas diferenças. A nosso ver, a escolha do tipo certo de estrutura para uma dada organização ou unidade é uma das tarefas fundamentais do especialista em desenvolvimento organizacional. Essa é uma tese também esposada por Lawrence e Lorsch, mjas que tem merecido pouca atenção por parte de outros autores. Para Lawrence e Lorsch, o desenvolvimento organizacional não é apenas uma estratégia {educacional, mas também uma intervenção nos aspectos estruturais da organização, isto é, na divijsão do trabalho, na rede de comunicações, etc, berh como na estratégia das transações com o ambiente.14 14 Lawrence, Paul R. & Lorwsh, Jay W. Developing organizations: diagnosis and actions, cit.

Antes de apresentarmos algumas alternajtivas à estrutura burocrática e suas adaptações, acreditamos ser conveniente a consideração das pr ncipais diferenças entre os diversos tipos de organizações, para, em seguida, identificar aquelas que, geralmente, pedem uma estrutura burocrática, e àquelas que pedem uma outra solução.

Entre as inúmeras tipologias de organizações que têm sido apresentadas por estudiosos da área, há uma de Thompson e Bates em Technology, organization and administration,15 15 Prestes Motta, Fernando C. ADM-L-269. Material baseado em Thompson & Bates. Technology, organisation and administration. São Paulo, EAESP, 1970. que nos parece de especial interesse para o desenvolvimento organizacional. Para esses autores, não só a elaporação da tecnologia leva a uma maior complexidade da organização que a utiliza, como também o tipo de tecnologia disponível para o atingimento dê determinados objetivos condiciona os tipos de estrutura apropriados à organização, à formulação de sua política administrativa global e à administração de seus recursos. Thompson e Bates entendem que existem dois tipos básicos de tecnologia: flexível e fixa. Refere-se à flexibilidade da extensão iem que as máquinas, o conhecimento técnico e dp matérias-primas podem ser utilizados para o atingimento de outros objetivos. As influências da (tecnologia, seja ela flexível ou fixa, são mais perceptíveis quando associadas ao tipo de objetivo ou produto da organização. Tais objetivos ou produtos, por sua vez, podem ser classificados em concretos e abstratos, entendendo-se por concretos aqueles que podem ser descritos com grande precisão identificados com grande especificidade, medidos e avaliados. É com base nessas tipologias binarias de tecnologia e de objetivos-produtos que Thompson e Bates constroem sua tipologia:

1. Tecnologia fixa - produto concreto;

2. Tecnologia fixa - produto abstrato;

3. Tecnologia flexível - produto concreto, e

4. Tecnologia flexível - produto abstrato.

Essa tipologia permite, desde logo, a identificação do ponto focal da política administrativa em cada uma das classes de organizações, como apresentado no quadro 7.


A segunda consideração diz respeito às estruturas mais adequadas a cada uma dessa classes. Nesse particular, a análise de Lawrence e-Lorsch em Organização e ambiente é de grande utilidade.

A partir de pesquisa junto à indústria de containers, de plásticos e de alimentos empacotados, esses autores desenvolveram o que chamamos de "modelo de integração e diferenciação". Em linhas amplas, tal modelo parte da idéia de que o ambiente em que opera uma organização é diferenciado. Dessa forma, cada subsistema da organização corresponde a uma tarefa especializada, que por sua vez corresponde a um setor especializado do ambiente. Tais setores ambientais diferenciam-se em grau maior ou menor, requerendo dos subsistemas organizacionais uma diferenciação igualmente maior ou menor, paralelamente, quanto maior for a diferenciação requerida, maior será a necessidade de utilizar meios de integração diferentes daqueles utilizados tradicionalmente. Por outro lado, organizações com baixa diferenciação requerida são geralmente bem sucedidas com estruturas altamente burocratizadas. O ambiente nesses casos é geralmente muito previsível e estável, o que implica pouca necessidade de mudança; a qualidade do processo decisório é menos importante que sua rapidez, e as tarefas altamente rotinizadas exigem pouca criatividade. Quando as condições são inversas, porém, surge a necessidade de estruturas alternativas. Katz e Kahn em The social psychology of organizations,16 16 Katz, Daniel & Kahn, Robert L. The social psychology of organizations. New York, John Wiley and Sons, Inc., 1970. p. 211-5. apresentam a estrutura democrática, em oposição à estrutura burocrática. A estrutura democrática de Katz e Kahn é no entanto um tipo ideal, cujas principais características são a promulgação de regras, o poder de voto e a admissão e demissão de pessoal nas mãos do conjunto dos participantes.

Outros autores, entretanto, já têm considerado o problema imaginando características adicionais do que chamam organizações pós-burocráticas e outros, ainda, já têm imaginado formas de operacionalização que já vêm sendo testadas na prática.

Entre as estruturas imaginadas e criadas para satisfazer às novas necessidades, quais sejam: tecnologia muito complexa, especialização crescente, criatividade e interdependência, a que está-se difundindo mais rapidamente é a chamada estrutura matricial, cuja principal característica é a sobreposição de uma estrutura por projetos a uma estrutura funcional, isto é, os departamentos convencionais continuam a existir, servindo inclusive de estoques de especialistas para os diversos projetos, que funcionam em uma base não hierarquizada e congregam elementos advindos dos diversos departamentos, sob a liderança de um gerente. Projeto terminado, o pessoal retorna aos seus departamentos, onde desempenham atividades preestabelecidas, participam de programas de treinamento e esperam novas designações.18 18 Lodi, João B. A estrutura matricial e a estrutura sistêmica: dois novos tipos de organização. Revista de Administração de Empresas, v. 10, n. 4, 1970, EAESP, FGV.

A lista de estruturas que aqui apresentamos e que de forma alguma pretende incluir todas as alternativas possíveis, dá apenas uma idéia das possibilidades do especialista em desenvolvimento organizacional no que se refere a alterações estruturais amplas. Existem, porém, inúmeras outras alterações desse tipo que devem ser consideradas. Os estudos modernos de organização, por exemplo, estão sempre a nos lembrar que diferentes unidades de uma mesma organização podem pedir diferentes tipos de estrutura. Além disso, o especialista em desenvolvimento organizacional nem sempre se defronta com um caso de mudança de estrutura, mas sim com o trabalho de racionalização de uma estrutura preexistente, adequada, em linhas gerais, ao tipo de organização. Nada existe pior do que tentar substituir uma estrutura correta, quando a única necessidade é de aperfeiçoá-la.

3. O campo das alterações comportamentais

As alterações comportamentais têm merecido grande destaque nos estudos e nos trabalhos de desenvolvimento organizacional. Parece predominante a idéia de que é mais fácil mudar pessoas do que estruturas. A nosso ver, tal pressuposto é extremamente discutível e qualquer adaptação forçada significará, a médio prazo, insatisfação e conflito latente ou mesmo manifesto. Ademais, as estruturas não são mudadas apenas para satisfazer os participantes de uma organização, mas simplesmente porque existem, como já pudemos frisar, estruturas que são mais ou menos eficientes para determinados tipos de organizações.

As alterações comportamentais, por outro lado, são também de grande importância, e justificam-se sempre que a eficiência real de uma dada organização é menor que sua eficiência potencial, isto é, sempre que a organização adote a estrutura e a tecnologia mais adequadas e não atinja os resultados previstos, mantidas constantes as variáveis ambientais. Também se justificam as alterações comportamentais sempre que uma organização tiver passado por alterações estruturais que requeiram adaptação do seu pessoal, ou ainda quando, utilizando estrutura e tecnologia adequadas, não consegue responder às mudanças no ambiente.

Em geral, as alterações comportamentais são dirigidas para o desenvolvimento da comunicabilidade e da criatividade, para a formação de equipes administrativas coesas e homogêneas, para a quebra de resistência à mudança, para a valorização dos aspectos humanos do trabalho e! assim por diante. . . De modo geral, quase todas as metas do desenvolvimento organizacional explicitadas por Bennis são, na verdade, metas das aliterações comportamentais.

Da mesma forma que as opções estruturais são limitadas pela natureza do problema que a organização enfrenta, também as opções em termos, de alterações comportamentais estão limitadas por determinados problemas que se pretende enfrentar. A diferença, porém, está no fato de! que o problema que condiciona a opção estrutural é permanente; é, em última análise, o atingimènto do objetivo para o qual se orienta a organização; enquanto que aqueles que condicionam as alterações comportamentais são, em boa parte, circunstanciais. De modo geral, nós poderíamos afirmar que as alterações comportamentais devem agir no sentido de tornar dinâmica uma dada estrutura, visto que a eficiência real de uma organização será determinada muito mais pelas pessoas do que pela própria estrutura.

Existem muitas técnicas de alteração comporta mental, cada qual com seus objetivos, suas vantagens e desvantagens. Como este artigo pretende dar aos seus leitores uma visão ampla das potencialidades do desenvolvimento organizacional, não haverá possibilidade de analisar minuciosamente todas essas técnicas. Podemos, entretanto, a exemplo do que fizemos com o campo das alterações estruturais, tentar uma listagem comentada. Há, em primeiro lugar, a idéia generalizada de. que se pode promover alterações comportamentais por meio do que se convencionou chamar de suprimento de informações adicionais. Imagina-se que quanto mais insumos cognitivos o indivíduo receber, maior será sua possibilidade de organizar os dados e agir criativamente. Ocorre, porérfi, que o suprimento de informações por si só não garante a ação criativa, além do que não favorece a mudança planejada.

Um outro grupo de técnicas de alteração com portamental relaciona-se com a terapia e o aconselhamento individual. A idéia nesses casos é a de complementar o suprimento de informações com o desenvolvimento da capacidade de insigpt e com uma mudança duradoura nas atitudes dos indivíduos. Tais técnicas nem sempre surtem o efeito desejado. Em organizações muito burocratizadas, podem, inclusive, levar a um desajustamento do indivíduo. Além disso, toda pessoa participa de um conjunto de papéis no seu ambiente de trabalho e uma mudança muito grande nas suas atitudes tende a romper o equilíbrio do conjunto.

Há ainda técnicas que enfocam a influência dos pares sobre o indivíduo. As principais dificuldades que tal perspectiva enfrenta relacionam-se com o fato de que cada componente de um grupo de pares pertence a um segmento organizacional específico e é relativamente fácil o surgimento de conflitos entre as influências do grupo de pares e os insights que o indivíduo desenvolve a partir de sua experiência no seu segmento organizacional Todavia é possível imaginar que em muitos casos tais conflitos se resolvam nó próprio grupo de pares. Mais uma vez convém lembrar que o conflito pode ser, ele próprio, um agente de mudança.

Edgar H. Schein, em seu livro Process consultation: its role in organization development descreve situações em que técnicas semelhantes são utilizadas. Nesses casos, porém, o ponto principal é a tarefa, não sendo o grupo chamado a participar de uma situação "semidesestruturada", antes que o instrutor esteja consciente de seu amadurecimento e da absoluta necessidade da experiência. Na verdade, descrevendo sua própria experiência em desenvolvimento organizacional, o referido autor sistematiza sua atuação em um contínuo que se inicia com o simples acompanhamento de uma reunião com agenda. Tal acompanhamento permite algumas intervenções que poderão ser utilizadas na medida em que se fizerem necessárias:

a) colocação de questões que dirigem a atenção do grupo para aspectos interpessoais;

b) criação de períodos para a análise do processo utilizado;

c) revisão da agenda e teste de procedimentos;

d) criação de reuniões dedicadas aos processos interpessoais, e

e) apresentação e discussão de aspectos teóricos relevantes para a tarefa do grupo.

De um modo geral, todavia, à medida que tal estratégia é implementada com sucesso, o grupo vai tendendo a tornar-se sensível a seus processos internos e interessado na análise desses processos. Assim, são colocadas questões do tipo: a decisão X, da forma como foi tyomada, satisfez a todos? As respostas a tais perguntas poderão levar ao estabelecimento de períodos para análise de problemas de adequação do tipo de comunicação, da utilização dos recursos dos participantes, etc. Finalmente, pode-se perceber que uma simples modificação de agenda ou de procedimentos não venha a melhorar substancialmente os problemas analisados. Nesses casos, tratando-se de um grupo maduro e bastante interessado no aperfeiçoamento de seus processos interpessoais, pode-se pensar em reuniões fora do local de trabalho, sem uma tarefa administrativa a ser desempenhada, etc.19 19 Schein, Edgar H. Process consultations: its role in organization development. Reading, Massachusetts, Addison-Wesley Publishing Company, 1969. p. 103-10. Pode-se mesmo pensar nos "laboratórios de sensibilidade", técnica muito difundida nos últimos anos.

"O laboratório de sensibilidade é uma comunidade residencial temporária, estruturada de acordo com os requisitos de aprendizagem dos participantes. O termo laboratório é intencional e significa que o treinamento se dá em comunidade dedicada a apoiar a mudança e a aprendizagem experimentais. Novos padrões de comportamento são inventados e testados num clima que favorece a mudança e onde os participantes estão protegidos das conseqüências práticas da ação inovadora. A parte central dessa espécie de treinamento é uma inovação educacional chamada T-Group, grupo relativamente não estruturado no qual os indivíduos participam como aprendizes. Os dados para cada aprendizagem estão dentro dos indivíduos e decorrem de sua experiência imediata no T-Group: são as transações entre os participantes, seu próprio comportamento no grupo, à medida que se esforçam em criar uma organização produtiva e viável, uma sociedade em miniatura, e à medida que eles procuram estimular e apoiar a aprendizagem recíproca dentro dessa sociedade. Os membros do T-Group precisam estabelecer um processo de investigação no qual os dados acerca de seu próprio comportamento sejam coletados e analisados, simultaneamente com sua experiência geradora. A aprendizagem assim conseguida é testada e generalizada para uso contínuo.20 20 Bueno de Azevedo, Cândido. Os laboratórios do sensibilidade e o desenvolvimento das organizações. Revista de Administração de Empresas, v. 9, n. 3, p. 45 e 46, 1969. Fundação Getúlio Vargas.

Os objetivos principais do laboratório são o desenvolvimento do autoconhecimento, do conhecimento do impacto que o indivíduo exerce sobre as outras pessoas e o aperfeiçoamento da comunicação em geral, devido à eliminação de suas barreiras. Tais laboratórios, como vimos, pressupõem o afastamento da situação organizacional e a inexistência de relações prévias entre os participantes. Uma série de adaptações desta técnica vem sendo realizada, para que sua aplicação não fique limitada à área interorganizacional. Assim, laboratórios já têm sido realizados com participantes de uma mesma orgarffzação, apesar das relações preexistentes. Geralmente, tais laboratórios começam pelos níveis hierárquicos mais altos, sendo depois levados a toda a administração. Também, em outros casos são selecionadas diagonais compostas de indivíduos de vários níveis hierárquicos, sem que participem do mesmo grupo indivíduos que mantenham relação de mando e subordinação. A grande dificuldade do laboratório é a volta do indivíduo à situação de trabalho, quando a autenticidade da comunicação atingida pode trazer problemas, mormente se os demais não passaram pelo mesmo tipo de treinamento.

Na linha das alterações grupais também têm sido realizadas algumas experiências terapêuticas. A terapia grupai nas organizações têm sido bem sucedida em vários casos. Sua maior limitação está no pressuposto de que os conflitos organizacionais são expressão de características e neuroses individuais.

Finalmente, uma outra técnica de alteração comportamental são as "famílias organizacionais". A técnica é simples: cada superior reúne-se com seus subordinados a fim de receber o feedback de sua gestão. Como quase todos os participantes da organização são, ao mesmo tempo, superiores e subordinados, o feedback atravessa toda a hierarquia.

É fácil verificar que todas essas técnicas estão relacionadas com a incapacidade que tem a organização de estrutura burocrática de lidar com a mudança. Poderíamos mesmo afirmar que sua utilização é tão mais adequada, quanto mais mutável for o ambiente em que a organização opera, menos rotinizadas forem as tarefas, mais complexa for a tecnologia e mais importante a qualidade do processo decisório. Em suma, embora tais técnicas possam ser úteis para organizações que funcionam eficientemente com estruturas burocráticas, sua adoção é mais necessária quando as características da organização pedem tipos alternativos de estrutura.

4. Considerações finais

Desenvolvimento organizacional é uma subárea da teoria das organizações que procura estudar a operacionalização dos seus conceitos. Desenvolvimento organizacional é também a própria aplicação daqueles conceitos.

Embora muito esteja senão escrito sobre desenvolvimento organizacional, não há concordância absoluta quanto ao seu significado. Para muitos autores, desenvolvimento e mudança são sinônimos; para outros, desenvolvimento é tão-somente um processo de aplicação sistemática de técnicas de dinâmica grupai nas organizações. De modo geral, a maioria dos autores seguem esta linha.

Para nós, desenvolvimento e mudança são conceitos bastante diversos. A mudança é um processo mais amplo, que pode independer dos objetivos da administração e de seus acessores, uma vez que a organização tem condições de mudar por si mesma. Já o desenvolvimento pode ser entendido como algo bastante dirigido, em conformidade com um plano. Também, no que se refere à ênfase na mudança de comportamento, encontrada na maior parte dos trabalhos sobre desenvolvimento organizacional, acreditamos que é exagerada, que não leva em consideração os problemas de inadequação estrutural de uma organização e que, pelo contrário, desvia nossa atenção desses problemas, tratando precipuamente de desajustes individuais ou grupais. Tal tratamento tem sido inclusive responsável pela generalização da idéia de que desenvolvimento organizacional é sinônimo de laboratório de sensibilidade. Essa idéia é errônea, já que, como tivemos oportunidade de observar, o laboratório é apenas uma das técnicas de alteração comportamental, à disposição do especialista em desenvolvimento organizacional para aplicarão em determinadas situações. O processo de desenvolvimento das organizações envolve tanto altjerações estruturais quanto comportamentais.

Finalmente, cumpre observar que no Brasil muito pouco tem sido feito nesse campo. Os trabalhos são em geral parciais e muitas empresas de assessoria parecem ter algumas soluções que procuram aplicar a toda e qualquer situação.

Acreditamos, de qualquer forma, que há muito por fazer e somos otimistas quanto à potencialidade do novo campo, que parece contribuir para tornar os instrumentos da administração mais flexíveis e mais adaptáveis a situações e condições diversas.

  • 1 Simon, Herbert A., Smithburg, Donald W. & llhompson, Victor A. Administración pública. San Juan, Ediciones de la Universidad de Puerto Rico, 1956. p. 35.
  • 2 Katz. D. & Kahn. R. L. The social psychology of organizations. New York, John Wiley and Sons, Inc., p. 25.
  • 3 Judson, Arnold S. Relações humanas e mudanças organizacionais. São Paulo, Editoru Atlas S.A., 1969. p. 24-6.
  • 4 Blau, Peter M. & Scott, W. Richard. Organizações formais. Editora Atlas S.A., 1970. cap. 9.
  • 5 Bennis, Warren G. Organization development: ist nature, origins and prospects. Readings, Massachusetts, Addison-Wesley Publishing Company, 1969. p. 10-5.
  • 6 Lawrence, Paul R. & Lorsch, Jay W. Developing organizations: diagnosis and action. Readings, Massachusetts, Addison-Wesley Publishing Company, 1969. p. 89.
  • 8 Etzioni, Amitai. Modern organizations. New Jersey, Prentice-Hall, Inc., 1964.
  • 10 Wickesberg, Albert K. Administração organizada. São Paulo, Editora Brasiliense, 1969. p. 75.
  • 11 Thompson, Victor A. Bureaucracy and inovation. University of Alabama Press, 1969.
  • 13 Bennis, Warren G. Changing organizations. MdGraw-Hill, 1966. cap. 1.
  • 16 Katz, Daniel & Kahn, Robert L. The social psychology of organizations. New York, John Wiley and Sons, Inc., 1970. p. 211-5.
  • 18 Lodi, João B. A estrutura matricial e a estrutura sistêmica: dois novos tipos de organização. Revista de Administração de Empresas, v. 10, n. 4, 1970,
  • 19 Schein, Edgar H. Process consultations: its role in organization development. Reading, Massachusetts, Addison-Wesley Publishing Company, 1969. p. 103-10.
  • 20 Bueno de Azevedo, Cândido. Os laboratórios do sensibilidade e o desenvolvimento das organizações. Revista de Administração de Empresas, v. 9, n. 3, p. 45 e 46, 1969.
  • 1
    Simon, Herbert A., Smithburg, Donald W. & llhompson, Victor A.
    Administración pública. San Juan, Ediciones de la Universidad de Puerto Rico, 1956. p. 35.
  • 2
    Katz. D. & Kahn. R. L.
    The social psychology of organizations. New York, John Wiley and Sons, Inc., p. 25.
  • 3
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    Relações humanas e mudanças organizacionais. São Paulo, Editoru Atlas S.A., 1969. p. 24-6.
  • 4
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    Organizações formais. Editora Atlas S.A., 1970. cap. 9.
  • 5
    Bennis, Warren G. Organization
    development: ist nature, origins and prospects. Readings, Massachusetts, Addison-Wesley Publishing Company, 1969. p. 10-5.
  • 6
    Lawrence, Paul R. & Lorsch, Jay W.
    Developing organizations: diagnosis and action. Readings, Massachusetts, Addison-Wesley Publishing Company, 1969. p. 89.
  • 7
    Lawrence, Paul R. & Lorsch, Jay W.
    Developing organizations: diagnosis and action, cit. p. 87.
  • 8
    Etzioni, Amitai.
    Modern organizations. New Jersey, Prentice-Hall, Inc., 1964.
  • 9
    Baseado em material da Graduate School of Business and Public Administration, Cornell University, Ithaca, 1969.
  • 10
    Wickesberg, Albert K.
    Administração organizada. São Paulo, Editora Brasiliense, 1969. p. 75.
  • 11
    Thompson, Victor A.
    Bureaucracy and inovation. University of Alabama Press, 1969.
  • 12
    Breaser Pereira, L. C, O processo
    de descentralização. São Paulo, Escola de Administração de Empresa? de São Paulo, Fundação Getúlio Vargas.
  • 13
    Bennis, Warren G.
    Changing organizations. MdGraw-Hill, 1966. cap. 1.
  • 14
    Lawrence, Paul R. & Lorwsh, Jay W. Developing
    organizations: diagnosis and actions, cit.
  • 15
    Prestes Motta, Fernando C. ADM-L-269. Material baseado em Thompson & Bates.
    Technology, organisation and administration. São Paulo, EAESP, 1970.
  • 16
    Katz, Daniel & Kahn, Robert L.
    The social psychology of organizations. New York, John Wiley and Sons, Inc., 1970. p. 211-5.
  • 17
    Baseado em material da Graduate School of Butiness and Public Administration, Cornell University, Ithaca, 1969.
  • 18
    Lodi, João B. A estrutura matricial e a estrutura sistêmica: dois novos tipos de organização.
    Revista de Administração de Empresas, v. 10, n. 4, 1970, EAESP, FGV.
  • 19
    Schein, Edgar H.
    Process consultations: its role in organization development. Reading, Massachusetts, Addison-Wesley Publishing Company, 1969. p. 103-10.
  • 20
    Bueno de Azevedo, Cândido. Os laboratórios do sensibilidade e o desenvolvimento das organizações.
    Revista de Administração de Empresas, v. 9, n. 3, p. 45 e 46, 1969. Fundação Getúlio Vargas.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      14 Maio 2015
    • Data do Fascículo
      Jun 1972
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