Acessibilidade / Reportar erro

Administração de pessoal: prática versus teoria

ARTIGOS

Administração de pessoal: prática versus teoria

Julio Lobos

Professor do Centro de Desenvolvimento em Administração da Fundação João Pinheiro; Professor do Centro de Pós-Graduação em Administração da Faculdade de Ciências Econômicas da UFMG

Há pouco tempo, um colega contou-me a seguinte história: convidado para diagnosticar a necessidade de desenvolvimento gerencial, pela chefia de relações industriais de certa empresa, recomendou que se iniciasse o experimentado gerente de manufatura nas técnicas de dinâmica de grupo. Dessa forma, o gerente melhoraria seu relacionamento com o pessoal de vendas e engenharia de produto, relacionamento esse crítico para a eficiência das operações produtivas da empresa.

A empresa cumpriu cegamente a recomendação de meu colega. No entanto, após o retorno do gerente a suas tarefas habituais, os conflitos interdepartamentais agravaram-se. O grau de "desenvolvimento" atingido pelo gerente demonstrou ser superior ao que seus colegas e superiores na empresa estavam dispostos a aceitar. Pouco tempo depois, o nosso homem apresentava sua demissão.

É possível que a situação descrita seja excepcional, pois que os resultados dos esforços de desenvolvimento gerencial nem sempre são desastrosos. Mas o caso sugere a presença de algumas falhas crônicas na atuação do profissional de administração de pessoal (AP), que talvez pudessem ser generalizadas a todo seu campo de ação. Tais falhas relacionam-se com a exagerada ênfase dada por ele à procura de "soluções práticas" para os complexos problemas de comportamento organizacional com os quais se defronta.

Ao que parece, a orientação "prática" do profissional de AP caracteriza também suas próprias expectativas de desenvolvimento. A queixa do professor coordenador de um curso de extensão de recursos humanos, oferecido recentemente por prestigiosa faculdade paulista, é ilustrativa. Apesar dos alunos terem sido inicialmente informados sobre a natureza analítica do curso, continuavam exigindo a inclusão no currículo de "coisas práticas", tais como "a preparação dos formulários de avaliação de desempenho". Finalmente, minha própria experiência, ao perguntar a uma conhecida casa editora do seu interesse numa coletânea de artigos inéditos sobre comportamento organizacional. A editora nem chegou a olhar os originais. "Os executivos que lidam com AP", fui informado, "só gostam de coisas práticas".

Mas o que há de errado em se atacarem os problemas de AP pelo lado prático? A resposta é óbvia: nada e muito pelo contrário, desde que essa abordagem seja bem sucedida. No entanto, minha impressão é que esse não é exatamente o caso. De fato, muitos profissionais de AP, além de serem criticados furiosamente por seus colegas e superiores, desempenham inúmeros serviços supérfluos; e pior ainda, devido a seu modesto status organizacional, são os primeiros a sofrer o corte de seu orçamento operacional, logo que a empresa decida controlar os custos.

Essa ordem de coisas exige que o profissional de AP adote uma posição mais criativa frente aos seus problemas, isto é, proceda analiticamente no momento de decidir sobre quando, como e a quem aplicar as técnicas que lhe são familiares. Longe de apoiar-se na "regra do polegar", entretanto, tal esforço analítico resulta da sua acertada compreensão das teorias do comportamento organizacional (motivação, liderança, conflito etc), incluindo as descobertas empíricas das quais essas teorias se alimentam.

Numa tentativa de sustentar essa observação, examinaremos várias funções de AP, mencionando problemas denunciados pelo conhecimento teórico e empírico, à medida que as "práticas" os apresentarem. Para facilitar a exposição, registramos três tipos de problemas, de que trataremos a seguir.

1. APLICAÇÃO LIMITADA DAS TÉCNICAS

O profissional prefere ignorar a existência (ou a gravidade) de um problema, porque desconhece a técnica para solucioná-lo.

Esse fipo de dificuldade caracteriza as funções de AP que implicam planejamento de recursos com base na estratégia da empresa, ou seja, o planejamento de recursos humanos e estrutura organizacional.

1.1 Planejamento de recursos humanos

Como se sabe, no período de 1973/74, a oferta de mãode-obra especializada retraiu-se alarmantemente no mercado de trabalho paulista. Segundo informações do diretorgerente de uma grande empresa automobilística, essa situação influiu negativamente em alguns planos empresariais: "somente depois que decidimos implantar o plano de expansão é que percebemos não haver mão-de-obra suficiente na praça. Tivemos que nos contentar em programar o start up escalonado das novas operações, ao contrário do instantâneo, como teríamos preferido".

Certamente muitos planos de expansão, "decididos" no período citado, estão agora engavetados. Mas a surpreendente indolência com que o problema do planejamento de mão-de-obra foi então considerado ainda prevalece, amparada nos fartos níveis de oferta de mão-de-obra que caracterizam a presente contração econômica.

As publicações especializadas sobre planejamento de mão-de-obra, no entanto, fornecem ferramentas analíticas e operacionais úteis para o homem de ação.

Heneman e Seltzer (1), por exemplo, formulam um modelo analítico que supõe as necessidades de mão-deobra como dependentes da procura estimada do produto. O relacionamento entre essas variáveis, por sua vez, é influenciado por variações na produtividade, expansão, tecnologia e disponibilidade de recursos financeiros e oferta de mão-de-obra interna e externa da empresa. Assim, um acréscimo da produtividade, devido à expansão e/ou mudança tecnológica, reduzirá as necessidades de mão-deobra por unidade adicional de produto. O mesmo acréscimo, entretanto, poderá reduzir o preço do produto, de forma que um aumento das vendas eventualmente amplie as necessidades de mão-de-obra. Obviamente, o efeito prático do aumento da produtividade sobre as necessidades de mão-de-obra dependerá tanto da magnitude desse aumento, como da elasticidade do preço do produto.

Preocupado com aspectos mais operacionais, Kingstrom (2) desenvolveu uma pesquisa sobre as técnicas de planejamento de recursos humanos utilizadas por 84 empresas americanas de grande porte. O método de planejamento da Standard Oil, citando um exemplo qualquer, consiste em:

a) selecionar um "fator estratégico" para cada área funcional da empresa, isto é, um fator organizacional cujas variações afetem proporcionalmente as necessidades de mão-de-obra (exemplo: nível de vendas, capacidade de produção, plano de expansão etc);

b) determinar os níveis histórico e futuro apresentados pelo(s) fator(es) estratégico(s);

c) determinar os níveis históricos de mão-de-obra por área funcional;

d) projetar os níveis futuros de mão-de-obra para cada área funcional, correlacionando-os com a projeção dos níveis (históricos e futuros) do fator estratégico correspondente.

Ainda outras empresas, como a IBM, preferem calcular suas necessidades totais de mão-de-obra com base em projeções relativas apenas a certos segmentos (ou famílias) de cargos da sua força de trabalho.

1.2 Planejamento organizacional

Ao comentar as dificuldades enfrentadas*pelo profissional de AP, ao planejar os recursos humanos, Heneman e Seltzer (1) mencionam o seu limitado acesso a informações sobre as mudanças tecnológicas ou estruturais adotadas pela direção da empresa. Todavia, no caso de mudanças estruturais, admito a existência dessa dificuldade e sustento que resulta mais da falta de iniciativa do profissional de AP do que do sigilo de seus colegas superiores. Aliás, é provável que esses últimos até celebrassem a intervenção de alguém que lhes apresentasse várias alternativas de mudança estrutural, cada uma delas acompanhada da' correspondente análise de custo-benefício social e econômico.

Desde os anos 60, a literatura sobre comportamento organizacional tem contribuído à análise e desenho da estrutura organizacional, tanto a nível de grupo quanto da organização como um todo.

A nível da organização como um todo, tem-se demonstrado que as incertezas provenientes de fatores ambientais, isto é, o sistema produtivo, o know-how tecnológico disponível, o sistema de propriedade etc, influenciam a estrutura organizacional da empresa. A esse respeito, uma pesquisa recentemente dirigida por mim, em São Paulo, demonstra que a estrutura organizacional das empresas automobilísticas apresenta um padrão característico diferente daquele das empresas químicas, devido a diferenças nos respectivos sistemas produtivos. Assim, em geral observamos que a empresa "reage" às incertezas ambientais, adotando uma estrutura organizacional mais ou menos burocrática. Finalmente, uma outra descoberta complementar é que a configuração da estrutura organizacional - expressa em termos de comprimento da linha de comando, amplitude de controle dos gerentes etc. - influi sobre as atitudes e comportamento dos empregados. Assim, numa conferência, na Harvard Business School, o Prof. J. Lawrence demonstrou que uma estrutura organizacional achatada ao contrário de outra mais comprida, facilita as comunicações interpessoais dos empregados, gera atitudes positivas e orienta seu comportamento para a efetiva solução dos problemas.

A nível de grupo, por exemplo, inúmeras pesquisas concluíram não existir um único estilo de liderança mais eficiente, mas um que varia conforme as características da situação. No seu famoso artjgo "Organizações desumanas", o Prof. Leavitt (3) confirma isso, ao explicar que uma estrutura de comunicações grupais de tipo piramidal é menos apropriada a tarefas incertas do que uma de comunicações circulares.

2. APLICAÇÃO ERRADA DAS TÉCNICAS

O mau profissional gasta tempo e dinheiro na utilização de técnicas cuja eficiência é comprovada pelo simples "bom senso", forçando a obtenção de dados "objetivos" que lhe permitam legitimar suas decisões. Aplica cegamente a técnica, sem validá-la de modo sistemático no contexto peculiar da sua empresa.

Esse tipo de problema afeta particularmente as funções de AP relacionadas com seleção, avaliação de desempenho e administração salarial.

2.1 Seleção

Problemas éticos, mais do que econômicos, fazem com que o processo dé seleção tenha sido despersonalizado até ao absurdo por muitas empresas. O profissional de AP procura tranqüilizar o superior do cargo a ser preenchido e/ou a sua própria consciência, apoiando-se em "profetas científicos" do desempenho futuro do candidato. Entre esses "profetas" estão os testes de seleção.

O Prof. M. Haire (4) do MIT, publicou uma brilhante crítica a respeito da validade dos testes de seleção (por validade entende-se a capacidade dos testes para prognosticar corretamente o desempenho do candidato).

Baseado nessa crítica e na minha própria experiência, seria conveniente mencionar o seguinte:

1. Nem sempre, como o supõem os testes de seleção, as características pessoais (habilidades, aptidões etc.) distribuem-se normalmente. De fato, o âmbito de distribuição dessas características num grupo de candidatos às vezes é tão pequeno que, pelo menos enquanto característica medida pelo teste, não faz diferença para a empresa escolher qualquer deles.

2. A construção do teste baseia-se numa análise das características pessoais requeridas por um cargo (ou família de cargos). Entretanto, as atividades e responsabilidades do cargo variam de empresa para empresa ou, ao longo do tempo, dentro da mesma empresa Isso implica a necessidade tanto de permanecer alerta a tais variações, quanto de controlar a validade dos testes para cada empresa, antes que venham a ser utilizados rotineiramente. Ambas as condições representam um esfirço analítico e econômico considerável.

3. A maioria dos testes de seleção mede características pessoais apenas presentes e parciais. Assim, embora rejeitado hoje, o candidato ainda pode obter um ótimo desempenho futuro, se desenvolver habilidades adicionais e/ou se lograr apoiar-se em outros traços (não medidos pelo teste) que lhe sejam instrumentais nesse sentido.

4. Finalmente, é preciso considerar que todo teste de seleção refere-se, direta ou indiretamente, a um certo critério de "bom desempenho". Seja é muito difícil especificar o que tal critério significa "aqui e agora", imaginemos quão difícil seria defini-lo, a longo prazo.

As observações anteriores não clamam pela eliminação dos testes de seleção (nem das entrevistas de seleção, que também apresentam problemas de validade semelhantes aos testes). No entanto, elas sugerem a apücação criteriosa desses "profetas" por profissionais habilitados para essa finalidade. Por um lado, as alternativas de aplicar um teste ou de proceder conforme o "bom senso" devem sempre ser comparadas a priori em termos de custo-benefício. Por outro lado, os resultados dos testes devem ser examinados junto a antecedentes obtidos por outros instrumentos menos exóticos (e freqüentemente mais válidos), tais como a experiência e o salário no emprego anterior, a história de estabilidade no trabalho e as referências de terceiros. Apesar de óbvias, muito poucas empresas têm incorporado sistematicamente ambas as recomendações em sua abordagem "prática" aos problemas de seleção.

2.2 Avaliação de desempenho

No meado do ano passado, uma grande empresa paulista resolveu modificar a sua política de avaliações de desempenho. A tradicional avaliação feita pelo superior imediato foi criticada como pouco digna de confiança. Nomearam-se "comissões" para avaliar cada profissional ou gerente. Curiosamente, a iniciativa não demorou em apresentar falhas, que terminaram por decretar a sua extinção. O que tinha acontecido? Simplesmente, os diversos integrantes das "comissões de avaliação" não conseguiram concordar quanto ao "critério de desempenho" apropriado para cada caso. O gerente financeiro, por exemplo, achava que um engenheiro de compras era "bom" se fazia rigorosa triagem dos pedidos de compra enviados por produção. Para o gerente de produção, ao contrário, o mais importante era apenas a rapidez com que os pedidos de compra eram atendidos.

Assim, o primeiro problema que afeta a função de avaliação de desempenho é o fato do próprio conceito de "desempenho" ser uma abstração normalmente inventada pelo profissional de AP. É certo que para contornar esse problema utilizam-se "fatores indicadores de desempenho" (exemplo: capacidade de relacionamento interpessoal, responsabilidade orçamentária etc). No entanto, não é menos certo que diversas pesquisas denunciam o conjunto de tais fatores como representando (se corretamente) apenas uma parcela do que seria o conhecimento total de desempenho.

Em segundo lugar, está a limitada confiabilidade dos mecanismos tradicionais de avaliação de desempenho, isto é, dos ratings construídos pelo superior imediato do empregado com base num questionário previamente preparado (por "confiabilidade" entende-se um alto coeficiente de concordância entre diversos avaliadores de um mesmo indivíduo). Com base nos resultados de duas pesquisas, descobriu-se que até os sistemas de avaliação mais sofisticados entregam ratings distorcidos pelos avaliadores, devido a:

a) efeito de halo - a tendência a avaliar qualquer aspecto de uma pessoa conforme a(s) sua(s) característica(s) mais marcante(s), como boa presença;

b) interpretação heterogênea dos critérios de desempenho;

c) tendência a avaliar com base no desempenho mais recente;

d) tendência natural a não reconhecer a existência de diferenças interpessoais;

e) simples distorção pessoal.

Em terceiro lugar, encontramos deficiências no próprio processo comportamental que sustenta a avaliação de desempenho. Elas são mencionadas num artigo, publicado recentemente pela Harvard Business Review (5), que comenta uma pesquisa orientada para controlar a eficiência do método tradicional:

As avaliações anuais de desempenho global têm valor limitado. Tanto os superiores quanto os subordinados são inclinados a trocar idéias sobre o tema com maior freqüência. (Cada indivíduo parece ter um nível de tolerância quanto ao número de críticas que pode fazer ou receber de uma só vez.)

A reação do subordinado médio às críticas do seu superior é consistentemente defensiva. Aliás, quanto maior a crítica recebida, mais defensiva a reação, que influi negativamente sobre a disposição do indivíduo para melhorar o seu desempenho futuro.

Objetivos ambíguos e/ou definidos unilateralmente pelo superior são simplesmente ignorados pelo subordinado (a menos que exista uma situação de franca coerção).

4. As entrevistas de avaliação de desempenho, que incluem discussão de salário ou promoção, demandam grande esforço emocional da parte do indivíduo. Assim, ele dificilmente vai preocupar-se em associar a crítica de suas ações passadas ao aprimoramento do seu desempenho futuro.

2.3 Administração salarial

O sistema de administração salarial é habitualmente criticado apenas pelas suas falhas estruturais. As bases da estrutura salarial, mencionam os críticos, não são muito válidas desde que associadas intimamente a um sistema de classificação de cargos. Como ocorre na avaliação de desempenho, o conceito central que sustenta o sistema (neste caso, o cargo) é uma abstração. Assim, a validade dos conhecidos "fatores de classificação de cargos" é tão discutível quanto a dos "fatores de avaliação de desempenho". (Não é preciso fazer uma pesquisa para detectar a escandalosa troca de manuais de classificação de cargos, mantida por muitos profissionais de AP, nem para destacar as repercussões negativas dessa prática absurda sobre as estruturas salariais das diferentes empresas.)

Um outro problema "estrutural" do sistema de administração salarial refere-se à confiabilidade estatística dos dados pesquisados periodicamente no mercado de trabalho, para atualizar a curva salarial. Essa confiabilidade vêse freqüentemente prejudicada por deficiências nas amostras, ora das empresas pesquisadas (exemplo: será que as funções do analista de custos são as mesmas numa empresa automobilística e numa empresa farmacêutica? ), ora do número de observações levantadas para cada cargo (exemplo: a representatividade de qualquer indicador estatístico construído a partir de apenas meia dúzia de observações é irrelevante).

Os problemas "estruturais" mencionados condicionam o salário do empregado e, através dele, a sua satisfação e desempenho no trabalho. No entanto, muitas empresas demonstram escassa imaginação ao explorar essa situação. Segundo os Profs. R.L. Opsahl e M. D. Dunnette (6) um exemplo disso é a política de concessão de aumentos salariais por mérito. Após consultarem inúmeras pesquisas sobre o tema, esses autores concluíram que as práticas salariais das empresas americanas não assumem abertamente uma associação entre os conceitos de desempenho e aumento salarial. A mesma atitude é extensiva a não poucas empresas brasileiras, se consideramos o costume paternalista de aplicar o mesmo percentual sobre o salário-base de cada gerente, ao calcular o seu bônus anual pelo conceito de mérito. Finalmente, cita-se o caso da grande empresa automobilística que, depois de investir fortemente num método de cálculo de aumentos salariais por mérito baseado no desempenho, viu seus próprios gerentes sabotarem essa iniciativa, temerosos de "criar atritos interpessoais" ou de confrontar a reação dos subordinados que ficaram descontentes.

Um último aspecto importante, relacionado à aparente incapacidade das empresas para explorar o valor motivacional do salário, é de ordem qualitativa e diz respeito à forma como é comunicado aos empregados. A controvertida descoberta do Prof. Herzberg (7), no sentido do salário não possuir valor motivacional, explica-se pelas irritantes práticas com que as empresas tentam proteger, exageradamente, a confidencialidade do salário. As pesquisas indicam que o sistema de administração salarial é um dos tantos "mistérios" monopolizados (aliás inefetivamente) por alguns profissionais de AP, que assim agem com o propósito de fortalecer sua precária posição de poder na empresa.

3. INTERPRETAÇÃO ERRADA DOS RESULTADOS

O profissional deposita expectativas impossíveis no alcance dos resultados obtidos pelas técnicas, de forma que o "fracasso" é inevitável.

Esse tipo de problema caracteriza as atividades de treinamento e, particularmente, as de desenvolvimento gerencial.

A principal falha do conceito de desenvolvimento gerencial reside no seu pressuposto básico: após ser submetido a uma experiência de desenvolvimento (exemplo: curso estruturado, grupo Tetc), o gerente mudará a sua atitude e comportamento (nessa ordem) no sentido desejado pela direção da empresa. O problema é que o conhecimento científico existente sobre a mudança atitudinal e/ou comportamental indica que ela é mais fortemente influenciada por fatores situacionais (exemplo: a organização) do que circunstanciais (exemplo: a experiência de desenvolvimento). Assim, a mudança atitudinal do gerente de manufatura, comentada no começo deste artigo, provocada pela experiência em dinâmica de grupos, não foi reforçada pelas expectativas de outros participantes na situação de trabalho. Expressa logo em termos de comportamento, essa situação conflitiva terminou por deixar ao gerente o dilema: retomar à sua atitude original ou deixar a organização.

Baseados nos comentários anteriores, os acadêmicos vêm recentemente alertando os profissionais de AP sobre as grandes limitações apresentadas pelos programas de desenvolvimento gerencial quanto a ativar (ou reforçar) um processo de mudança organizacional. Aparentemente, requer-se dos profissionais uma reorientação dos seus esforços em duas direções diferentes. Uma orientação de tipo conservadora sugere que os programas de desenvolvimento gerencial enfatizem experiências reais de trabalho (exemplo: rodízio de cargos). Uma outra, muito mais radical, advoga pela implantação inicial na organização de mudanças estruturais capazes de provocar outras de comportamento. Juntas, essas modificações facilitarão o caminho para que as mudanças atitudinais ocorram eventualmente via desenvolvimento gerencial.

4. CONCLUSÕES

Alguns dos problemas característicos das diversas funções de AP, descritos neste artigo, serão novidade apenas para uns poucos profissionais da área. O trabalho, entretanto, não teve intenção meramente descritiva. Como indicado no começo, o seu propósito principal foi demonstrar que os problemas de AP têm sido (e continuam sendo) objeto do interesse científico, expresso em pesquisas e teorias de comportamento organizacional. Além de confirmar a existência dos problemas, essas pesquisas e teorias apresentam a vantagem (além da simples intuição profissional) de poder caracterizá-los, especificando suas causas e sugerindo soluções.

Assim, embora numa etapa embrionária, as teorias do comportamento organizacional não deveriam deixar de influir sobre as "práticas" de AP. A compreensão teórica das diferenças e semelhanças apresentadas pelas motivações dos diversos grupos na organização, por exemplo, é fundamental para implantar simultaneamente "práticas" tão diversas como um teste de seleção de aplicação geral ou um sistema salarial baseado no cálculo de "pacotes" de benefícios salariais por grupo.

Finalmente, apenas conhecer as deficiências apresentadas pelas práticas estabelecidas não é suficiente; precisase refletir sobre a sua causa e natureza, a fim de poder mudá-las. O fato das teorias não serem apresentadas em termos de "receitas de bolo" não deveria então desencorajar o profissional de AP. Muito pelo contrário, o sucesso dele estaria ligado à sua capacidade para extrair dessas teorias as idéias que lhe permitam desenvolver-se de maneira criativa dentro de sua própria empresa.

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Heneman Jr., H.G. & Seltzer, Goerge. Manpower planning and forecasting in the firm: an exploratory probe. In: Burack, E.H. & Walker, J.W. Manpower planning and programming. Boston, USA, Allyn & Bacon, 1973.

2. Kingstrom, J. Manpower planning and forecasting. The Conference Center Series, 1971.

3. Leavitt, HJ. Unhuman organizations. Harvard Business Review, v. 40, n. 4, July/Aug. 1962.

4. Haire, Mason. Use of tests in employe selection. In: Pigors, P.; Myers, CA. & Malm, F.T. eds. Management of human resources. McGraw-Hill, 1969.

5. Meyer, Herbert H.; Kay, E. & French Jr., J.R.P. Split roles in performance appraisal. Harvard Business Review, Jan./Feb. 1965.

6. Opsahl, R.L. & Dunnette, M.D. The role of financial compensation in industrial motivation. Psychological Bulletin, n. 66, p. 94-118, 1966.

7. Herzberg, Frederick. Work and the nature of then. Cleveland, USA, World Publishing, 1966.

  • 2. Kingstrom, J. Manpower planning and forecasting. The Conference Center Series, 1971.
  • 3. Leavitt, HJ. Unhuman organizations. Harvard Business Review, v. 40, n. 4, July/Aug. 1962.
  • 5. Meyer, Herbert H.; Kay, E. & French Jr., J.R.P. Split roles in performance appraisal. Harvard Business Review, Jan./Feb. 1965.
  • 6. Opsahl, R.L. & Dunnette, M.D. The role of financial compensation in industrial motivation. Psychological Bulletin, n. 66, p. 94-118, 1966.
  • 7. Herzberg, Frederick. Work and the nature of then. Cleveland, USA, World Publishing, 1966.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Ago 2013
  • Data do Fascículo
    Ago 1976
Fundação Getulio Vargas, Escola de Administração de Empresas de S.Paulo Av 9 de Julho, 2029, 01313-902 S. Paulo - SP Brasil, Tel.: (55 11) 3799-7999, Fax: (55 11) 3799-7871 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: rae@fgv.br