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O desenvolvimento brasileiro e a crise da ALALC

COMENTÁRIOS

O desenvolvimento brasileiro e a crise da ALALC

José E Mindlin

Diretor da Metal Leve S A. Indústria e Comércio. São Paulo

1 Introdução

A estagnação da ALALC (Associação Latino-Americana de Livre Comércio), que se tem agravado nos últimos anos, preocupa o empresariado brasileiro mais do que se supõe. Especialmente as áreas mais dinâmicas da indústria nacional - seria um erro admitir que somente as empresas internacionais se interessam pela integração latino-americana - estão profundamente preocupadas com as implicações da crise da ALALC para todo o processo de desenvolvimento econômico, quer da região em seu conjunto, quer de cada um dos países participantes. Certas características da evolução recente das relações internacionais - que parecem indicar toda uma nova tendência a longo prazo da política mundial - tornam oportuno o exame dos problemas relacionados com o nosso tema do ponto de vista de um empresário que deseja a realização dos objetivos do Tratado de Montevidéu.

O enquadramento do problema dentro do contexto mundial em que ele deve ser visto leva-nos a duas constatações preliminares muito importantes. Primeiro, o estágio em que se encontra atualmente o Mercado Comum Europeu e as vicissitudes políticas que caracterizam a África e a Ásia dão à América Latina uma posição especial nas prioridades externas dos países altamente desenvolvidos e exportadores de capital. De outro lado, os movimentos de integração regional ou sub-regional - tenho em mente especialmente o Grupo Andino - na medida em que alcancem evito, também atrairão iniciativas de tora da Zona.

As implicações que dessas tendências decorrem para as empresas brasileiras são óbvias e devem ser vistas tendo-se em conta a nova etapa de descimento da economia brasileira. Elemento essencial nesta fase de crescimento acelerado, que tende a se consolidar, é a necessidade de as empresas programarem sua expansão tendo em vista não apenas o mercado interno, mas o mercado ampliado das áreas externas em processo de integração. Limitar o desenvolvimento das empresas nacionais ao crescimento do mercado interno implica em restringir os benefícios das economias de escala e da absorção de tecnologia moderna. Equivale, por outro lado, a abandonar os demais mercados da região, a longo prazo, as empresas internacionais, com as quais normalmente deveríamos competir, ou das quais deveríamos participar, sob a forma de empresas multinacionais. Nesse quadro, é importante salientar que as atuais incertezas cm face do desenvolvimento da ALALC constituem grave fator de insegurança na definição de projetos de expansão das empresas ou das áreas mais dinâmicas do setor privado da economia nacional: levar ou não em conta o mercado regional?

Ninguém ignora que a instabilidade política existente em muitos paises latino-americanos e algumas diferenças de sistemas políticos, têm contribuído para aumentar o pessimismo de muitos em face das perspectivas de evolução da ALALC e de todo o processo de integração latino-americana. Não participo desse pessimismo, pois creio que devemos levar em consideração o pragmatismo que está caracterizando atualmente as relações internacionais. Devemos reconhecer que diferenças de sistemas políticos não anulam a comunidade de interesses, nem as possibilidades de cooperação econômica entre paises, sempre que esta seja mutuamente vantajosa, sobretudo quando já associados num processo de integração, como é o caso dos países da ALALC.

Não menos inquietante é o fato de que a participação do empresariado nacional nas decisões referentes à realização dos objetivos da ALALC tem de certa forma evoluído negativamente nos últimos anos. Segundo informa, por exemplo, recente documento da Secretaria da ALALC, apresentado na 7ª Reunião da Comissão Consultiva de Assuntos Empresariais, os governos não negociaram, em lista nacional, em 1970 e 1971, praticamente nenhuma das sugestões de desgravação tarifária formuladas pelos empresários nas duas a três dezenas de reuniões setoriais que realizaram em cada ano. Somente em acordos de complementação - de que participam quase exclusivamente empresas internacionais - foram negociadas nos dois mencionados anos algumas rebaixas tarifárias: respectivamente 121 e 329.

Naturalmente a concessão tarifária não é tudo para que se originem ou ampliem correntes de comércio. A eficácia das concessões depende também do grau de inexistência de obstáculos ou gravames não tarifários e de uma série de condições de mercado, assim como dos mecanismos do comércio exterior de cada país, mas nem por isso é menor a importância das concessões. Por outro lado, configura igualmente a crise da ALALC o fato de que, ao lado da estagnação das negociações tarifárias em lista nacional, também se verifica um escasso aproveitamento, por muitos dos paises participantes, das concessões vigentes.

Não é bem esse o caso do Brasil, cujo aumento das exportações para a ALALC - em números redondos, de 86,4 para quase 303 milhões de dólares entre 1960 e 1970 - apresenta crescente participação de manufaturas. Mas esse aumento, por sua vez, além das concessões tarifárias recebidas pelo Brasil, deve-se aos incentivos, à desburocratização dos trâmites e às condições especiais do mercado interno, que levam o empresário privado a descobrir ou investigar a demanda existente para seus produtos no mercado dos países vizinhos.

O quadro favorável da participação e da posição do Brasil na ALALC não nos deixa, por isso, plenamente satisfeitos com o que se tem realizado até agora, nem permite considerar perfeito (longe disso) o desenvolvimento da Associação desde 1961 até hoje. Ao contrário, sentimo-nos participantes das frustrações que têm sido causadas pela estagnação dos últimos anos, que se seguiu à euforia dos primeiros tempos. Também não considero satisfatória a solução encontrada na Conferência de Caracas, quando, entre outras medidas, se propôs a extensão do período de transição da ALALC até o fim de 1980. Bastaria essa decisão para configurar o reconhecimento oficial do não-cumprimento do Tratado, ou da impossibilidade de cumpri-lo nos prazos inicialmente previstos. Isso não deve levarnos, porém, a um pessimismo que impeça a busca de novas idéias e novas soluções.

Para investigar essas novas possibilidades, é útil um breve retrospecto, que talvez nos ajude a encontrar as causas reais da estagnação de que tanto se tem falado nos últimos anos. Antes de mais nada, é preciso lembrar que a ALALC foi concebida inicialmente como mecanismo para libertar o comércio entre o Brasil, Argentina, Uruguai e Chile das limitações dos acordos bilaterais e das moedas "convênio". Esse regime, além de estrangular o crescimento do comércio exterior, apresentava certas incompatibilidades com as normas do GATT. O instrumento imaginado pelos criadores da ALALC seria assim apenas um novo mecanismo de política comercial que, harmonizando-se com certas exigências do GATT, permitiria o estabelecimento de um certo grau de preferência no intercâmbio entre os quatro mencionados paises. A adesão à Associação de mais paises, com estruturas e condições diversas, e que entreviam na iniciativa um instrumento de novas e maiores possibilidades de aceleração de seu desenvolvimento econômico, por atuação de fatores externos, modificou bastante a estrutura e o funcionamento da ALALC. Não podemos deixar de reconhecer, num exame realista da experiência dos anos passados, que aos poucos se foram configurando e consolidando expectativas conflitantes, que acabaram por limitar as próprias possibilidades de negociações tarifárias. Eis como a Confederação Nacional da Indústria, em trabalho preparado para a 4ª Reunião da Comissão Consultiva de Assuntos Empresariais da ALALC (Assunção, abril de 1969, p. 28 e seg.), analisou esse problema:

"Criaram-se na ALALC duas correntes de pensamento bem definidas:

a) a dos países chamados 'maiores' (Argentina, Brasil e México), que guardam a idéia original do Tratado de Montevidéu como instrumento comercial com o objetivo imediato de estimular o intercâmbio entre as Partes Contratantes, sem prejuízo dos esforços nacionais de desenvolvimento autônomo;

b) a dos países chamados 'menores' (Bolívia, Equador e Paraguai) e 'medianos' (Chile, Colômbia, Peru, Venezuela e Uruguai) que entendem que a simples liberação de comércio, sem outras medidas correlatas visando ao desenvolvimento global da região, agravaria as disparidades econômicas em benefício dos países maiores."

As observações feitas sobre o assunto pelo mencionado estudo continuam válidas, não se modificando em conseqüência das resoluções da Conferência de Caracas;

"... os países 'menores' e 'medianos' mostram-se totalmente desinteressados no programa de liberação, por considerarem:

a) que a simples liberação do intercâmbio tenderia a beneficiar os países de maior desenvolvimento econômico relativo, que teriam efetivamente condições para o aproveitamento das preferências;

b) que, embora as possibilidades de aceleração do desenvolvimento dependam, em parte, de mercados ampliados, só poderiam aproveitar esses mercados através de uma adequada política de inversões em função de metas comuns de desenvolvimento que contemplassem a situação dos 'pequenos' e dos 'medianos'.

No caso de três países maiores, Argentina, Brasil e México, embora seja grande o interesse na liberação, mostram também resistências a posições liberais devido principalmente a que as concessões começam a atingir setores de produção comum, competitiva ou programada, e em face das diferenças de tratamento para terceiros países, seja quanto à assimetria das margens de preferência, seja quanto à falta de uniformidade no tratamento dos insumos e práticas de estímulo à exportação que desfiguram as condições de concorrência.

Atua como importante fator negativo, nas condições expostas, o mecanismo da liberação através de negociações produto por produto, vale dizer, reduções consentidas. Dependendo cada concessão de ato expresso dos países, preferem estes não negociar, posição mais cômoda, a se verem face a problemas internos de adaptação de sua economia a situações criadas pelas liberações.

Os fatos expostos acima evidenciam uma profunda mudança na concepção do Tratado de Montevidéu, que de simples instrumento de comércio vai se transformando em compromisso de integração e desenvolvimento econômico."

A conclusão que naturalmente decorre dessas observações também deve ser meditada e pode constituir ponto de partida para um amplo debate visando-se a reformulações de que depende o futuro da ALALC: "O conflito de concepções antes referido torna extremamente difícil a recolocação das negociações anuais como o principal mecanismo da formação da Zona, sem que antes se proceda a modificações substanciais de redefinição de objetivos da ALALC e reformulação de seus mecanismos, matéria de profundas implicações políticas."

Desse conflito de concepções, devido, como sabemos, a diferenças de condições estruturais e políticas internas de cada país, bem como a diferentes expectativas, originaram-se todos os componentes do que se denomina a crise da ALALC: a estagnação das negociações anuais; a reduzida aceitação, pelos governos, das recomendações das reuniões setoriais; a escassa ou quase nula participação dos países "médios" e "menores" nos projetos de acordos de complementação; o malogro da Lista Comum; a insuficiência de resultados práticos das reuniões e dos estudos sobre harmonização de políticas; o desinteresse dos governos por projetos de complementação industrial em setores básicos que, por requererem mercados ampliados ou maiores que os de qualquer dos países participantes individualmente considerado, seriam tecnicamente justificáveis.

Tudo isso configura o impasse em que se encontra a Associação, e para o qual não se descortinam soluções imediatas, pois as medidas propostas na Conferência de Caracas, entre as quais a dilatação do período de transição até 1980 e os programas de estudo, são na realidade protelatórias. O programa de trabalho contido na Resolução 206, do Comitê Executivo Permanente, não apresenta nada de propriamente novo. Seu objeto é a mesma problemática sobre a qual já se têm feito estudos cujo único destino foi o arquivo, ou que não pôde ser solucionada por falta, ora de entendimento, ora de decisão política por parte dos governos dos países da ALALC. Assim, o impasse persiste, com a diferença de que agora se nos oferece a perspectiva de uma pausa decenal para meditação.

Comecemos pois a meditar, se é de nosso interesse, como efetivamente me parece ser, salvar a ALALC.

2. A insuficiência dos mecanismos atuais

Muitos observadores e estudiosos dos problemas da ALALC têm afirmado que as negociações de desgravação tarifária seletiva ou por produto constituem obstáculo ao cumprimento do Tratado de Montevidéu. A objeção, aliás, já havia sido feita até mesmo por críticos do próprio projeto de que nasceu o Tratado de Montevidéu. A alternativa que naturalmente surge é a de substituir o sistema por uma desgravação linear programada, com listas de exceção e/ou com cláusulas de salvaguarda. Estariam, porém, os governos dos países-membros da ALALC preparados para promover esta alteração, que implica em importante decisão política? Quanto ao Brasil, creio que nos círculos industriais é bastante generalizada a opinião favorável à desgravação programada. Naturalmente, seria difícil afirmar se essa corrente de opinião tem suficiente representatividade, ou grau de consenso necessário para fundamentar uma decisão de governo no mais alto nível político. Por outro lado, a desgravação linear, com negociação de lista de exceções, poderia acabar por transformar-se em outra negociação produto por produto (das exceções), voltando-se ao impasse anterior. É uma dificuldade previsível, para a qual confesso que não tenho solução, a não ser a do apelo à racionalidade, ou da severa restrição do número de exceções. Mas estou convencido de que esse é o caminho a seguir, com maiores probabilidades de sucesso do que o sistema atual.

Também se tem mencionado a possibilidade de desgravação programada por capítulos NABALALC, escolhendo-se os setores de maior importância estratégica para a aceleração de todo o processo de desenvolvimento dos países da Zona.

Não vou prolongar aqui o exame das deficiências do sistema atual de desgravação seletiva. Elas são conhecidas de todos os que têm acompanhado a vida da Associação. Não podemos deixar, porém, de mencionar brevemente outro instrumento que, ao lado das listas nacionais, constitui atualmente importante mecanismo de liberação de comércio. Trata-se dos Acordos de Complementação Setorial. Tem-se afirmado que, em face da estagnação das negociações anuais para listas nacionais, tenderia a aumentar a utilização dos Acordos de Complementação por iniciativa dos setores industriais mais interessados na liberação do comércio. Não acredito que essa hipótese justifique muito otimismo, pois que o instrumento é limitado pelas dificuldades gerais características da negociação seletiva, mas mesmo assim devemos empenhar-nos por utilizá-lo ao máximo. Aliás, também se faz aos Acordos de Complementação uma objeção de outra natureza, que me parece oportuno mencionar, com o simples propósito de sugerir estudos e debates.

Em primeiro lugar, afirma-se que os Acordos de Complementação interessam somente às empresas internacionais que operam em dois ou mais países, o que parece de certo modo confirmado pela experiência, pois os projetos existentes, e os acordos em vigor, de fato dizem respeito a setores industriais em que predominam empresas internacionais. Em segundo lugar, tais acordos são impropriamente chamados de complementação, pois no seu aspecto formal constituem simples instrumentos de rebaixas tarifárias. É aqui que surge, porém, a objeção mais séria: à margem da simples negociação tarifária consubstanciada no acordo, as empresas deles participantes estabeleceriam diretrizes ou entendimentos visando à especialização, em determinados produtos, de suas fábricas em cada país, em busca de maior grau de racionalização. O objetivo das empresas é legítimo e salutar, de um ponto de vista estritamente econômico. Isso implica, porém, em transferir para fora dos países da ALALC o poder de decisão sobre o desenvolvimento de setores industriais que podem ter importância estratégica, quer para o crescimento econômico dos países interessados, quer para a sua própria segurança nacional.

As conclusões que se podem tirar desse fato são óbvias: se a complementação propriamente dita, a que se refere o art. 16 do Tratado de Montevidéu, deve ser o objetivo dos acordos setoriais, seria necessária uma reforma que permitisse explicitar em seu texto os programas de desenvolvimento setorial que em cada caso constituam objetivo das empresas deles participantes, para que os governos pudessem examinar a compatibilidade desses programas com sua política econômica nacional.

Outra objeção tem sido feita por representantes de países "médios" e "pequenos": é que somente os países maiores e mais industrializados têm utilizado esse mecanismo de desgravação tarifária.

3. O aproveitamento das concessões

Como é sabido, tem-se estimado em cerca de 1/3 apenas do total negociado o número de concessões efetivamente aproveitadas ou utilizadas pelos países da ALALC. Esse fato, por sua vez, tem sido motivo de queixas, por parte de alguns países, de que somente os "grandes" estariam beneficiando-se das preferências tarifárias negociadas na ALALC. O fato parece ilustrar outro tipo de problema: o grau em que a simples rebaixa tarifária poderia dar lugar à formação de correntes de comércio. Ora, seria supérfluo repetir que a preferência tarifária é apenas uma condição fiscal, que pode gerar comércio se também ocorrerem outras condições necessárias. Entre estas, cabe lembrar: a existência de produção exportável, isto é, competitiva; o conhecimento dos mercados importadores; a estrutura do comércio exterior de cada país; a existência de incentivos fiscais e apoio creditício nos países exportadores; o grau de dinamismo do setor empresarial privado de cada país etc. Não seria demasiado lembrar aqui que o comércio exportador de nossos países tradicionalmente tem operado - e para isso foi organizado - com poucos produtos primários e com poucos mercados internacionais. A entrada em novos mercados regionais, com produtos substitutivos de importação tradicionalmente extrazonal, não só exige novos tipos de organização, mas também novos métodos e nova mentalidade. Um exame mais aprofundado do problema nos levaria, porém, além dos limites propostos para este trabalho.

4. O acordo sub-regional andino

Felizmente, as dificuldades da ALALC não têm sido obstáculo ao florescimento de outras iniciativas, quer dentro da própria Associação, quer à margem dela, estimuladas pelo clima de cooperação regional que ela consolidou. Entre elas destacam-se o Projeto da Lagoa Mirim, que interessa ao Brasil e ao Uruguai; o Acordo para o Desenvolvimento Comum da Bacia do Prata; o Acordo Sub-Regional Andino; entendimentos entre setores específicos para uma política comum de exportação de produtos tradicionais para terceiros países.

O Pacto Sub-Regional Andino, já em vias de implantação, apesar de muitos percalços, merece algumas observações. O Acordo de Cartagena entre os cinco países andinos1 1 A recente adesão da Venezuela deverá apresentar fator positivo de sucesso. foi, como é sabido, um resultado das perspectivas insatisfatórias oferecidas aos mesmos países pelo desenvolvimento da ALALC. Pode-se até afirmar que ele nasceu de alguns ressentimentos causados pelo fato de que, ao cabo de alguns anos, a ALALC afinal não se revelou o instrumento de aceleração do desenvolvimento que esses países esperavam. Não obstante essa origem, vejo na Sub-Região um passo altamente construtivo e benéfico, não apenas para os países que a constituem, na medida em que a sua implantação se realize com êxito, mas para toda a ALALC. Minha opinião é de que a própria Associação e os governos dos países individualmente considerados não devem poupar esforços para colaborar, por todos os meios ao seu alcance, para o êxito do Acordo Sub-Regional Andino. Não esqueçamos que a integração dos cinco países,2 2 Atualmente seis. mediante processos de desgravação tarifária mais audaciosos e mais racionais que os da própria ALALC, criará um mercado de dimensões consideráveis. A simples perspectiva de sua formação, com as primeiras rebaixas tarifárias negociadas, já está dando lugar a uma revisão de projetos de grandes empresas internacionais para adequá-los às dimensões do novo mercado e novos

programas de investimentos estão sendo considerados, principalmente por empresas extrazonais, inclusive do Japão. Não poderíamos nós, que somos associados à Sub-Região, através da ALALC, mostrar-nos menos otimistas e menos cooperativos com o grande projeto das nações andinas, cujo desenvolvimento acelerado, agora previsível, atenuará os desequilíbrios que têm sido uma das causas dos impasses da ALALC.

5. Possibilidades de ação empresarial

No quadro que acabo de esboçar, sabemos que não são muito amplas nem fáceis as possibilidades de ação empresarial, com o objetivo de dinamizar a ALALC e maximizar os benefícios que de seu funcionamento podem decorrer para a economia dos nossos países. Contudo, algumas possibilidades de iniciativa existem e devemos utilizá-las da maneira mais eficiente possível.

Colocaria em primeiro plano a promoção de esforços conjuntos para convencer os governos da oportunidade, necessidade, e mesmo urgência, de se estudar a idéia da desgravação linear programada, pelo menos por capítulos NABALALC, escolhidos com o critério de preferir aqueles cujo desenvolvimento possa ter maior efeito multiplicador sobre os investimentos. Só assim poderemos começar a dar à economia de nossos países, ou aos setores industriais mais dinâmicos, dimensões regionais, de modo que possamos todos beneficiar-nos da absorção da mais moderna tecnologia existente em cada campo. Não seria preciso lembrar que cada um dos mercados nacionais em si é demasiado limitado para justificar a absorção da tecnologia mais avançada existente no mundo atual. Aos próprios empresários e às suas entidades de classe cabe, de outro lado, promover a idéia também na esfera privada e vencer as resistências que nela ainda existam contra a desgravação programada.

No que diz respeito à harmonização de políticas, sobretudo a de investimentos de capitais extrazonais, um requisito prévio para a desgravação programada, já se tem registrado considerável progresso nos meios empresariais. Vem ganhando aceitação a idéia de adotar-se uma política de seleção de investimentos, com definição dos setores em que devem ser preferidos ou desejados, de modo a assegurar-se proteção adequada aos capitais ou às empresas nacionais dos países latinoamericanos, e igualmente de se evitarem ônus cambiais perfeitamente dispensáveis. Também é importante a busca de instrumentos que uniformizem tanto as exigências formuladas, como as vantagens concedidas por cada um dos países em relação aos investimentos estrangeiros, para que sejam evitados excessos de umas ou outras.

Tudo isso envolve, por sua vez, uma revisão mais profunda do Tratado de Montevidéu, que também deve constituir objetivo da ação empresarial junto aos seus respectivos governos.

6. O balanço positivo

Não gostaria que a preocupação de fazer uma análise realista dos problemas atuais da ALALC deixasse uma impressão de pessimismo. Ao contrário, acho que o balanço final é bastante satisfatório. Apesar de tudo, a ALALC representa um conjunto de instrumentos e de condições positivas, que não teríamos sem ela. A simples experiência que adquirimos nestes 10 anos, no tratamento de problemas de interesse comum, é um ativo de grande valor. Técnicos dos governos e do setor privado aprenderam a trabalhar juntos; empresários conheceram-se e estabeleceram intercâmbios antes inexistentes; muitos problemas comuns foram resolvidos e concluíram-se entendimentos sobre trânsito de pessoas e transporte terrestre; funciona satisfatoriamente um acordo entre bancos centrais; o comércio cresceu; há alguns importantes exemplos de associação de capitais para investimentos conjuntos. Para se avaliar o significado de tudo o que foi feito, devemos ter em conta que antes da ALALC nossos países eram compartimentos estanques, com contatos muito escassos. Se ainda estamos longe de uma integração total ou de um mercado comum, mesmo assim já foi conseguido um progresso considerável sob numerosos aspectos, inclusive o do conhecimento realista de dificuldades que desafiam maior cooperação. Já temos um bom ponto de partida, que antes não existia, e que fortalece a nossa consciência de que temos um futuro comum a conquistar. Um futuro certamente mais rico em realizações, em progresso, em entendimento e bem-estar do que se continuássemos no isolamento de antes.

  • 1
    A recente adesão da Venezuela deverá apresentar fator positivo de sucesso.
  • 2
    Atualmente seis.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      13 Maio 2015
    • Data do Fascículo
      Jun 1973
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