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Debating organization: point-counterpoint in organization studies

RESENHAS BIBLIOGRÁFICAS

Maria Ceci Misoczky

(PPGA / Escola de Administração da UFRGS)

DEBATING ORGANIZATION: POINT-COUNTERPOINT IN ORGANIZATION STUDIES. Robert Westwood e Stewart Clegg. Blackwell Publishing (Oxford), 2003. 350 p. ISBN0631216928.

Se você é um estudioso das organizações ou, principalmente, se você é professor de uma disciplina de teoria das organizações, não deixe de ler este livro. Os editores - Robert Westwood e Stewart Clegg partem do reconhecimento de que o discurso dos estudos organizacionais é constituído por uma matriz de diversos textos, teorias, conceitos, práticas, arranjos e formas institucionais, o que lhe confere um caráter de fragmentação e heterogeneidade. Além disto, reconhecendo que os diversos discursos são dinamicamente interdependentes e adotando a política do debate, organizam o livro no formato de posição e contraposição. No entanto, se percebe logo a partir da introdução, que os autores persistem adotando a posição já expressa por Clegg, na texto assinado com Cynthia Hardy na edição do Handbook de Estudos Organizacionais (Clegg e Hardy, 2001), de defesa da conversão. Com isto já adianto que você não vai encontrar debates renhidos entre posições claramente contraditórias. Em vez disso você encontrará pequenas divergências entre posições muito próximas.

Na primeira parte do livro, que inclui os temas do campo ou disciplina dos estudos organizacionais, da ontologia, da epistemologia e da metodologia, o que se encontra é um debate que se organiza em torno do posisitivismo/objetivismo e do construtivismo/interpretativismo, ou seja, um debate de pelo menos duas décadas atrás. Se você está interessado em temas realmente contemporâneos e provocativos leia as edições dos últimos três anos de Organization, ou o Handbook of Qualitative Research (Denzin e Lincoln, 2000).

A segunda parte trata dos temas do ambiente, poder e instituições, globalização. O pano de fundo nos temas do ambiente e do poder é a teoria institucional, aparecendo de modo muito evidente a opção pelos pequenos dissensos. O tema do poder, sempre um problema ("alguns ousam chamá-lo poder" insinuavam Hardy e Clegg, 2001), continua sem a ousadia necessária. Nelson Phillips tangencia o tema ao propor que a análise crítica de discurso pode preencher as lacunas que se encontram no novo institucionalismo a esse respeito. Essa é uma discussão superficial dos problemas paradigmáticos que constituem o pano de fundo desse tema, como já abordei em outro texto (Misoczky, 2003). Outro exemplo da escolha pela polêmica superficial se encontra no tema da globalização, por um lado a defesa de suas qualidades distributivas, feita por Barbara Parker, e, por outro, uma revisão das suas mazelas, só que considerando, preponderantemente, sob seus efeitos excludentes do ponto de vista do consumo, feita por Marc Jones. Com tanto a dizer, com tanto já dito, sobre os efeitos que tornam supérfluas populações de países inteiros, essa com certeza não é a principal polêmica em torno da globalização.

Seguem-se, ainda, um parte sobre estrutura e cultura, e uma outra sobre identidade e relações - onde aparecem os temas do gênero e o da confiança. O livro se encerra com um texto de Stephen Linstead em defesa do silêncio, com uma posição que, ainda que remodelada pela sitação de autores pós-estruturalistas e pós-modernos, se aproxima muito da velha posição de Donaldson - que, aliás, constitui um dos melhores capítulos do livro. Pessoalmente, prefiro a posição clara e afirmativa, ainda que reacionária, como se encontra na defesa que Donalson realiza do positivismo, do que o texto pretensioso e progressista na aparência, mas igualmente conservador, de Linstead (2003).

A esta altura da leitura (caso você tenha persistido), uma pergunta deve estar se impondo: afinal, isto é uma resenha "muito" crítica para quem começourecomendando a leitura. É verdade! Preciso admitir que tenho esse traço de personalidade. Um dos personagens prediletos na minha memória de desenhos animados é, sem dúvida alguma, o grilo falante...

Vamos falar de algumas das qualidades do livro, que são muitas... A primeira delas é organizar o campo dos estudos organizacionais na atualidade. Para o meu gosto podem estar faltando as polêmicas mais picantes e provocativas, as que envolvem as margens do campo. No entanto, as polêmicas que se encontram no centro, em disputa por configurar a ciência normal, estão lá. Dado o estado da arte dos estudos organizacionais no Brasil, o livro traz grandes novidades, já que a maioria destes debates ainda são praticamente ausentes no nosso contexto. Basta ver os anais do ENANPAD ou, melhor ainda, o conteúdo do teste da ANPAD. (Lá vem o grilo de novo! Sshhh... grilo!)

Alguns capítulos são exemplarmente provocativos. Gosto muito do texto de Rolland Munro, em que ele desenvolve um complexo argumento sobre como a estratégia de expansão do capitalismo em tempos de globalização está realizando uma construção discursiva que torna o tema da organização estrutural irrelevante, e que leva os administradores a uma crise de identidade dentro de um miasma de incerteza. Outro capítulo precioso é o de Peter Case, em defesa da autenticidade na pesquisa organizacional. Texto delicioso de ler e discutir, ótimo para ser retomado de vez em quando para nos lembrar de que produzimos não apenas artigos, livros, relatórios de pesquisa, mas também autorizamos mundos com nossa produção acadêmica. Portanto, reflexividade, transparência e autenticidade são ótimos companheiros de viagem. Tem muito mais coisas interessantes, mas meu espaço está acabando...

Utilizei algumas partes do livro na minha disciplina de Análise Organizacional. Chamou a atenção de um dos nossos alunos de doutorado - Duarte de Souza Rosa Filho - como os autores que escrevem o texto da posição expressam, de diversas formas, o medo da desorganização, o medo da perda de controle sobre a produção teórica, sobre as organizações, sobre o mundo, sobre si mesmo (ainda que não explicitando-o). Ler o livro a partir deste olhar o torna ainda mais interessante, na medida em que expressa uma das maiores pretensões do positivismo e, como testemunho da criatividade e capacidade de desobediência dos seres humanos, um de seus maiores fracassos.

Para encerrar, é preciso dizer que o que foi dito acima só serve como provocação para que você se interesse pelo livro, faça suas próprias leituras situadas, se aproprie dele do seu jeito e, feito isso, esqueça o que está escrito aqui.

  • CLEGG, S. R.; HARDY, C. Conclusão: representações. In: CLEGG, S. R.; HARDY, C.; NORD, W
  • DENZIN, N. K.; LINCOLN, Y.S. Handbook of qualitative research: second edition. London: Sage, 2000.
  • HARDY, C.; CLEGG, S. Alguns ousam chamá-lo de poder. In: CLEGG, S. R.; HARDY, C.; NORD, W
  • MISOCZKY, M. C. Poder e institucionalismo: uma reflexão crítica sobre as possibilidades de interação pardigmática. In: VIEIRA, M. M. F.; CARVALHO, C. A. (Orgs.) Organizações, instituições e poder no Brasil. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2002. p. 141-176.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Mar 2009
  • Data do Fascículo
    Jun 2004
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