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Institucionalização como mecanismo de controle de marketing

Institutionalization as a marketing control mechanism

Resumos

Dentre as atividades administrativas, o controle é a mais negligenciada de todas. Contudo o controle torna-se peça fundamental na medida em que a área de marketing tem buscado mais e mais métricas para medir seu resultado. Ao analisar a atual perspectiva do controle de marketing, concluímos que esta seja contingencial. Devido a isto, alguns problemas foram identificados. Sugerimos outra perspectiva, perspectiva institucional, como mais adequada. Para a nossa análise assumimos como escopo a perspectiva dos encontros de serviço. Esta escolha é devida à nossa crença de que todos os negócios são, em essência, de serviços, bem como de que os encontros de serviço trazem para o ambiente interno aspectos do ambiente externo, uma vez que clientes e funcionários de contato são sujeitos do ambiente sociocultural. Com isto em vista, este ensaio teórico propositivo tem por objetivo o desenvolvimento de um processo de controle de marketing baseado nos significados da organização. Contudo reconhecemos que, sendo esta uma visão de longo prazo, interesses de curto prazo podem comprometê-la.

controle de marketing; institucionalização; serviços


Among management activities, control is the most neglected. However, monitoring becomes a key player as the area of marketing has continually sought out metrics to measure its results. Upon analyzing the current perspective of marketing control, we conclude that it is contingential. As a result, some problems were identified. We suggest that a different, institutional perspective may be more adequate. For our analysis, we assumed as scope the perspective of service encounters. This choice was due to our belief that all businesses are - in essence - service-oriented, and that service encounters bring aspects of the external environment to the internal environment, as customers and contact employees are from the socio-cultural environment. With this in mind, the aim of this theoretical essay is to develop a marketing control process based on the meanings of the organization. However, we recognize that - as this is a long-term view - short-term interests may compromise it.

marketing control; institutionalization; services


ARTIGOS

Institucionalização como mecanismo de controle de marketing

Institutionalization as a Marketing Control Mechanism

André Luiz Maranhão de Souza LeãoI,* * Endereço: André Luiz Maranhão de Souza Leão Av. José Ferreira Lins, 35/303, Imbiribeira, Recife/PE, 51170-320. E-mail: andre.leao@pq.cnpq.br ; Sérgio Carvalho Benício de MelloII

IDoutor em Administração pela UFPE. Professor Adjunto do PROPAD/UFPE, Recife/PE, Brasil

IIPh.D. em Marketing pela City University, Reino Unido. Professor Adjunto da PROPAD/UFPE, Recife/PE, Brasil

RESUMO

Dentre as atividades administrativas, o controle é a mais negligenciada de todas. Contudo o controle torna-se peça fundamental na medida em que a área de marketing tem buscado mais e mais métricas para medir seu resultado. Ao analisar a atual perspectiva do controle de marketing, concluímos que esta seja contingencial. Devido a isto, alguns problemas foram identificados. Sugerimos outra perspectiva, perspectiva institucional, como mais adequada. Para a nossa análise assumimos como escopo a perspectiva dos encontros de serviço. Esta escolha é devida à nossa crença de que todos os negócios são, em essência, de serviços, bem como de que os encontros de serviço trazem para o ambiente interno aspectos do ambiente externo, uma vez que clientes e funcionários de contato são sujeitos do ambiente sociocultural. Com isto em vista, este ensaio teórico propositivo tem por objetivo o desenvolvimento de um processo de controle de marketing baseado nos significados da organização. Contudo reconhecemos que, sendo esta uma visão de longo prazo, interesses de curto prazo podem comprometê-la.

Palavras-chave: controle de marketing; institucionalização; serviços.

ABSTRACT

Among management activities, control is the most neglected. However, monitoring becomes a key player as the area of marketing has continually sought out metrics to measure its results. Upon analyzing the current perspective of marketing control, we conclude that it is contingential. As a result, some problems were identified. We suggest that a different, institutional perspective may be more adequate. For our analysis, we assumed as scope the perspective of service encounters. This choice was due to our belief that all businesses are - in essence - service-oriented, and that service encounters bring aspects of the external environment to the internal environment, as customers and contact employees are from the socio-cultural environment. With this in mind, the aim of this theoretical essay is to develop a marketing control process based on the meanings of the organization. However, we recognize that - as this is a long-term view - short-term interests may compromise it.

Key words: marketing control; institutionalization; services.

INTRODUÇÃO

O controle, juntamente com a análise, planejamento e implantação, desde Fayol (1994), têm sido considerado como uma das atividades fundamentais na Administração. Apesar disto, em algumas áreas da atividade administrativa (e.g., marketing, recursos humanos), esta é uma atividade negligenciada em relação às outras, o que parece ocorrer não apenas em decorrência de uma possível falta de atenção da comunidade acadêmica, mas possivelmente pela dificuldade de se delinear adequadamente seu escopo, suas atividades e suas premissas.

Queremos aqui ater-nos à atividade mercadológica. Apesar de entendermos que o controle possa representar um potencial para as organizações estabelecerem mecanismos sobre os resultados de marketing, algo extremamente discutido e cobrado na área (vide a ênfase dada às métricas de marketing nos últimos anos(1 1 Não pretendemos aqui estabelecer uma relação de dependência, ou mesmo uma comparação conceitual, entre controle de marketing e métricas de marketing. Outrossim, destacar como a recente ênfase sobre essas últimas se torna uma pressão para uma maior valorização daquele. )), podemos perceber alguns problemas na forma como se trata do controle nesta disciplina.

De início, podemos apontar que o controle de marketing ocorre, fundamentalmente, no ambiente interno da organização. Esse, por sua vez, é assumido como orientado à constante possibilidade de adaptação, de acordo com as influências macroambientais (Hulbert, 1977). Tal abordagem é clara orientação contingencial de gestão. Acreditamos que esta perspectiva peque por duas razões: a primeira, por não considerar o ambiente externo, tão ou mais importante que o interno na atividade mercadológica, como passível de controle; a segunda, por não se ater, a nosso ver, em todos os aspectos necessários do próprio ambiente interno.

Para análise destas questões, nos atemos, neste ensaio, ao desempenho dos funcionários da linha de frente e dos clientes num encontro de serviços. No encontro de serviços, funcionários da linha de frente e clientes interagem para produzir, conjuntamente, a oferta de uma organização ao mercado. Neste contexto, ambos podem desenvolver seus próprios mecanismos de controle do encontro, deixando a organização à mercê desta situação (Rafaeli, 1989; Weatherly & Tansik, 1993a, 1993b).

Nossa proposta é de que, uma vez que os significados de uma organização estejam institucionalizados, estes venham a funcionar como mão invisível sobre o desempenho tanto dos funcionários da linha de frente quanto dos clientes num encontro de serviços. Para desenvolver tal proposta, nossa revisão teórica será realizada no sentido de apresentar proposições que, no final deste ensaio, se representarão num modelo propositivo de um processo de controle de marketing baseado nos significados da organização.

O CONTROLE NA ADMINISTRAÇÃO DE MARKETING: UMA PERSPECTIVA CONTINGENCIAL

Dentre as várias áreas do marketing, existe nítida preferência da academia pelo campo do comportamento do consumidor, seguido pelo composto de marketing (4Ps) e pelo marketing estratégico (posicionamento, segmentação etc.), o que pode ser evidenciado pelo volume de publicações sobre estes temas, bem como a sua ênfase nos manuais. Neste contexto, a análise, o planejamento e a implantação são atividades contempladas pelos trabalhos da área. Entretanto o controle não tem recebido a devida atenção (Jaworski, 1988; Jaworski, Stathakopoulos, & Krishnan, 1993). Nos manuais da disciplina (e.g., Churchill & Peter, 2000; Kotler & Keller, 2005), o controle aparece sempre em segundo plano, seja num capítulo final e quase sempre superficial, seja dentro dos outros capítulos, sendo apenas mencionado, de forma acessória, quando se trata de orçamentos, vendas, eficiência, lucratividade, planejamento, canais de distribuição, desenvolvimento de produtos, pesquisa de marketing, sistemas informatizados, entre outros. Nos periódicos e anais especializados, a situação não é muito diferente, sendo raros os artigos encontrados sobre o tema.

Esta é uma questão no mínimo curiosa, tendo em vista a criticidade do controle para qualquer atividade administrativa. Não acreditamos, contudo, que esta seja questão puramente decorrente de uma negligência dos pesquisadores e profissionais de marketing. Antes, talvez advenha de uma elaboração sobre o delineamento do controle de marketing que, conforme argumentaremos, nos parece por demais limitada.

O termo controle, na administração, está associado a um processo de atingimento de objetivos, em que o gerente se assegura de que os recursos são obtidos e utilizados efetiva e eficientemente no alcance dos objetivos de uma organização. Assim, propõe-se que, a partir do estabelecimento de objetivos e metas, seja possível mensurar, avaliar e reavaliar os processos de controle, executando ações corretivas, sempre na intenção do atingimento dos objetivos previamente definidos. Entre os elementos do controle, destacam-se os padrões pré-estabelecidos, a aquisição de informações, a comparação e a ação corretiva e o recomeço do ciclo de planejamento, podendo estes ser moderados pelo nível hierárquico pelo qual os controles são realizados, ou seja, estratégico, tático ou operacional (Maximiliano, 2002; Motta & Vasconcelos, 2002).

De forma geral, os autores de marketing (e.g., Hulbert, 1977) entendem que o controle tem como função medir resultados obtidos com a implantação de uma estratégia ou um planejamento qualquer, comparar estes resultados com aqueles previamente fixados, analisando as discrepâncias entre estes dois parâmetros, para que ações corretivas possam ser tomadas. Nessa visão, à medida que uma estratégia mercadológica é implantada, a organização precisa acompanhar os resultados obtidos e monitorar os acontecimentos nos ambientes interno e externo, na certeza de que o mercado irá mudar e, quando isto acontecer, a organização estará preparada para analisar e revisar a implantação, os programas e as estratégias ou até mesmo os objetivos de marketing. Esta visão pode ser demonstrada pela Figura 1.


Tradicionalmente, a literatura de marketing apresenta mecanismos de controle que podemos chamar de formais. Estes podem ser escritos e estão associados a mecanismos de administração que influenciam a probabilidade de atingimento dos objetivos. Estão associados às atividades de marketing propriamente ditas, como desenvolvimento de produtos, precificação, distribuição, resultados sobre comunicação e vendas etc. Entretanto Jaworski (1988) indicou que os controles formais são limitados em escopo e aplicação. Desta forma, propôs que também controles informais são necessários. Estes, contudo, não podem ser escritos. Tipicamente são mecanismos que influenciam o comportamento dos indivíduos ou grupos responsáveis pelas atividades de marketing, com o intuito último de que este controle impacte positivamente sobre seu desempenho. São divididos como autocontrole, em que o indivíduo ajusta seu próprio comportamento em curso com base nos objetivos a serem atingidos; controle social, que se refere às perspectivas e padrões das interações interpessoais dentro de subgrupos da organização; e, finalmente, o controle cultural, que pode ser entendido como os valores e padrões normativos da organização que guiam os comportamentos dos funcionários.

Apesar de representarem um avanço sobre as possibilidades de controle de marketing, os controles informais, assim como os formais, mantêm-se sobre o ambiente interno da organização. O macroambiente, nos dois casos, representa a possibilidade de se reconhecer oportunidades ou ameaças para as organizações e, portanto, devem ser acompanhados por constante monitoramento, sobretudo por meio do uso de pesquisa e de inteligência de marketing. Este monitoramento, por sua vez, serve como parâmetro para correções ou ajustes no microambiente, este sim passível de mensurações e avaliações de desempenho de metas estabelecidas, para se gerar ações corretivas quando necessário.

Trata-se de visão claramente orientada por uma perspectiva contingencial (ver Merchant, 1988; Ruekert, 1985). A teoria da contingência estrutural aponta uma estrutura organizacional que não deve ser única. Antes disso, para ser efetiva, a organização deve estar apta a adaptar sua estrutura às suas contingências ambientais. Desta forma, uma hierarquia centralizada parece mais adequada para tarefas de baixa incerteza, enquanto uma estrutura mais flexível parece mais adequada para tarefas de alta incerteza (Donaldson, 1999). Trata-se de síntese entre as escolas clássica e das relações humanas, já que possibilita um movimento contínuo entre os processos administrativos mecânicos da primeira e a valorização - se assim podemos dizer - do ser humano nas organizações. Exatamente nesta síntese vemos que tanto os controles formais quanto os informais fazem parte de uma mesma perspectiva.

Esta nos parece uma questão curiosa e, por que não dizer, até inquietante, já que na atividade de marketing o ambiente externo é tão ou mais importante que o interno. Apesar disto, a literatura existente, conforme foi discutido, contenta-se em aceitar que os fenômenos existentes no macroambiente de negócios se configuram como fatores incontroláveis.

No entanto questionamo-nos como, numa atividade como a da administração mercadológica, seja possível atingir todo o potencial de êxito, gerando-se controle apenas sobre o microambiente. Na apreciação do conceito de controle de marketing, portanto, estamos na situação de tão somente aprender com o ambiente externo, para que este processo se torne insumo de ajustes do ambiente interno. Perguntamo-nos, contudo, se grandes organizações, como Coca-Cola, McDonald's e tantas outras, atingiram seus atuais status mercadológicos apenas fazendo a lição corretamente - sobretudo se considerarmos a dinâmica dos mercados - ou se, de alguma maneira, elas desenvolveram mecanismos de controle do macroambiente, pelo menos em alguns de seus aspectos. No caso das marcas mencionadas, por exemplo, temos que foram transformadas em verdadeiras instituições estadunidenses, propiciando que os mercados não apenas respondam a seus estímulos, mas que se adaptem às suas diretrizes; afinal, não à toa o Big Mac com Coca se tornou a refeição padrão daquele país, alastrando-se para boa parte do mundo.

Por outro lado, questionamo-nos também até que ponto os fatores do ambiente interno são realmente passíveis de total controle, dentro dos moldes do que se apresenta como tal. Destacamos dois aspectos relevantes em relação a esta questão. O primeiro recai na ampla utilização de terceirizações pelas organizações, na busca de focarem-se nas suas competências essenciais. Nesses casos, parte das atividades internas passam a ser realizadas por terceiros, fora da porta da fábrica. Especificamente na atividade de marketing, esta parece ser uma prática amplamente utilizada, sobretudo no que diz respeito à comunicação, em que especialistas são contratados para as campanhas de publicidade, desenvolvimento de logomarcas, realização de eventos, assessoria de imprensa, entre outros. Consideramos que essas situações não sejam passíveis dos mesmos controles aplicados dentro da fábrica, sobretudo nas atividades mencionadas, em que a arte e a intuição se apresentam como base do desenvolvimento dessas tarefas (ver Souza, Leão, Lubi, & Vieitz, 2004).

Um segundo aspecto é que, mesmo dentro da fábrica, os controles de marketing são susceptíveis de falha. Os controles formais e informais se referem a processos e pessoal de marketing. Entretanto, numa perspectiva de serviços - que será mais bem explorada na próxima seção - o marketing deixa de ser de responsabilidade exclusiva de seu pessoal técnico, para ser compartilhado com o pessoal de linha de frente, ou seja, aqueles que atendem aos clientes, pois são estes que, afinal de contas, entregam a oferta de uma organização aos clientes. Ademais, ainda quando esses controles são levados aos funcionários de linha de frente, sustentamos que o fato do seu desempenho profissional depender da interação com os clientes dificulta que estes sejam totalmente levados a cabo. Por outro lado, é possível constatarmos que, na sua participação na produção do serviço, o cliente traz para o microambiente organizacional aspectos do ambiente externo, sobretudo aqueles socioculturais, porque, em sua vida cotidiana, é parte deste(2 2 A literatura de marketing considera os clientes, assim como fornecedores, distribuidores, concorrentes e outros stakeholders, como parte do microambiente organizacional, por serem forças participantes de como uma organização entrega valor ao mercado. Apesar disto, entendemos que os clientes ocupem um papel peculiar neste contexto, uma vez que não fazem parte do negócio e sim estejam procurando condições adequadas para a solução de seus próprios problemas. Com isto, apesar de aceitarmos que façam parte do microambiente organizacional, sugerimos que o background que trazem de suas vidas cotidianas represente mais as forças do (macro)ambiente sociocultural do qual fazem parte, do que das questões do microambiente organizacional. De fato, entendemos que também os funcionários - bem como prestadores de serviços, como mencionado em nossa argumentação, mas também funcionários de outras organizações (e.g., gestores, compradores, vendedores organizacionais), também tragam aspectos do ambiente sociocultural para o desempenho de suas atribuições, ainda que em nível menor, devido a estarem desempenhando uma atividade profissional. A escolha do encontro de serviços para a presente reflexão, como é apresentado adiante, se baseia nesta abordagem. ).

Portanto, assim como Jaworski (1988) criticou os controles formais pelo seu limitado escopo e aplicação, criticamos não somente a estes, mas a perspectiva atual sobre o controle de marketing, reafirmando que seja, toda ela, limitada em seu escopo e aplicação. Portanto, se a preocupação dos mecanismos de controle é gerar eficácia, entendemos que estes, como são apresentados pela literatura de marketing, não têm como realizar efetivamente o que se propõem. Isto porque, se é verdadeiro o nosso argumento, controla-se apenas uma fração de todo o processo de marketing, do microambiente apenas parte.

Com base nessas questões, chegamos a duas evidências relativas à deficiência da atual perspectiva de controle de marketing:

Evidência 1: O marketing deveria preocupar-se em estabelecer níveis de controle externo.

Evidência 2: O controle de marketing sobre o nível de ambiente interno que se encontra inteira ou parcialmente fora da fábrica poderia ser mais efetivo do que hoje se apresenta.

Entendemos que um controle de marketing mais efetivo seja necessário. A grande questão se torna esta: como gerar um nível de controle mais efetivo nos aspectos que apontamos. Nossa proposta é de que isto seja possível de se realizar de forma indireta, por meio da institucionalização dos significados da organização. Entendemos que tal abordagem poderia contribuir em aspectos variados, tais como aqueles que usamos aqui de exemplos. Para a elaboração de tal proposta tomamos como base uma destas possibilidades: a situação de prestação de serviços. Esta escolha se justifica pelo fato de o encontro de serviços deparar, no microambiente, indivíduos - seja o cliente, seja o funcionário de linha de frente, que não é um técnico de marketing - que podem trazer para este a força, supostamente incontrolável, do ambiente externo, em pelo menos um de seus níveis: o sociocultural. Por esta razão, atemo-nos ao encontro de serviços face a face, apesar de reconhecer a crescente importância das interações mediadas por tecnologia, o que pode ser objeto de reflexões posteriores, assim como outros aspectos (e.g., a terceirização de profissionais de comunicação, conforme mencionado anteriormente).

UMA PERSPECTIVA SOBRE OS ENCONTROS DE SERVIÇO

Nossa preocupação em torno dos serviços advém do fato de que não vemos o serviço como setor, mas como atividade presente em qualquer ação mercadológica. Isto porque não apenas as organizações, cujas ofertas ao mercado são serviços, estarão lidando com estes. Mesmo as organizações, cuja oferta central seja um bem físico, demandarão serviços para a entrega deste. Desta forma, concluímos que todos os negócios são, em última instância, negócios de serviços (Gronröos, 1997). Essa entrega de serviços ocorre nos chamados encontros de serviço, que representam o período de tempo durante o qual o consumidor interage diretamente com as organizações (Shostack, 1985).

Neste sentido, como já foi ressaltado por inúmeros autores (entre eles, Bitner, Booms, & Tetreault, 1990; Bitner, Faranda, Hubbert, & Zeithaml, 1997; Farrell, Souchon, & Durden, 2001; Grove, Fisk, & Bitner, 1997; Lovelock, 1983) a entrega do serviço tem enorme potencial para ser heterogênea, pois depende, em grande parte, do comportamento dos funcionários, do comportamento do próprio cliente que recebe o serviço e das ações dos demais clientes que porventura estejam presentes no momento em que o serviço esteja sendo entregue. Além disto, em maior ou menor grau, os serviços possuem componentes difíceis de serem avaliados, devido à sua intangibilidade, complexidade ou natureza técnica.

Portanto o bom desempenho dos funcionários para a qualidade da experiência do cliente com o serviço é crítico. Funcionários que não são capazes de executar adequadamente suas atividades nitidamente reduzem o valor que entregam para o cliente. Por outro lado, no entanto, o cliente não apenas consome um serviço, mas também tem participação importante durante sua produção e entrega devido ao fato de que os encontros de serviço constituem interações. A qualidade dos resultados de um encontro de serviços é, portanto, dependente das ações coordenadas de todos os participantes (Solomon, Surprenant, Czepiel, & Gutman, 1985; Surprenant & Solomon, 1987). Se quiserem criar valor em conjunto, cada parte envolvida em um encontro precisa ter em mente as ações que deve efetivar e saber como e quando elas poderão ser executadas (Bateson & Hoffman, 2001; Gummesson, 2000).

Nesse sentido, é necessário refletir a respeito do que poderia exercer influência na participação do cliente em um encontro de serviços. Primeiramente, podemos destacar o tamanho do papel do cliente. Esse tamanho do papel seria a proporção do serviço que é produzido pelo próprio cliente (Bowen, 1986). Assim, quanto maior o tamanho do papel, maior a participação do cliente, pois passa a ser necessário que ele forneça uma quantidade maior de insumos para que o serviço possa ser entregue, fato que ocorre em um restaurante self-service, por exemplo. Outro fator que podemos destacar diz respeito à habilidade do cliente para participar da entrega do serviço. Essa habilidade dependeria da posse dos recursos necessários (conhecimento, experiência, energia, esforço, dinheiro, tempo etc.) para desempenhar o tamanho ideal do seu papel. Desse modo, sem conhecimento mínimo de informática, o cliente não possui a habilidade necessária para poder realizar a encomenda de um livro pela Internet. Finalmente, podemos considerar a disposição do cliente para participar da entrega do serviço. Em linhas gerais, essa disposição representa o grau de interesse do cliente em obter os benefícios do serviço (Dabholkar, 1996).

Além de variar em extensão, a participação de um cliente durante encontro de serviços também pode ser encarada como ocorrendo sob diversas formas. Assumindo a perspectiva da organização, Bitner et al. (1997) identificaram três tipos de papéis (não mutuamente exclusivos) que os clientes podem desempenhar na entrega do serviço. O primeiro desses papéis é o de recurso produtivo. Nele, o cliente contribui com insumos, atuando como funcionário parcial, cujo desempenho impacta na produtividade da organização, tanto por meio da quantidade e da qualidade desses imputes, quanto pela qualidade dos resultados gerados. Por conta disso, muitos sistemas de entrega de serviços são planejados para evitar ao máximo as incertezas que a participação do cliente pode trazer ao processo produtivo, reduzindo justamente o grau necessário de sua participação, como acontece no caso dos serviços que são entregues por meio de máquinas automáticas. De modo contrário, outros sistemas de entrega são desenhados para que os clientes possam maximizar suas contribuições ao processo de criação dos serviços, como acontece nos self-services. Outro papel que o cliente pode desempenhar é o de contribuinte para a qualidade, satisfação e valor. Nesse papel o cliente contribui para a sua própria satisfação, para a qualidade e para o valor do serviço recebido ao experienciar o processo de entrega. Para que isso ocorra, além da exigência de um desempenho correto das atividades que estão sob responsabilidade do cliente, é preciso que haja certa flexibilidade no serviço para que ele possa adaptar-se a algumas das necessidades dos clientes. Por fim, o cliente pode desempenhar o papel de competidor. Como o cliente tem tanto a opção de buscar alguém que forneça os serviços que necessita como a de ele mesmo produzi-los (no todo ou em parte), os clientes de certa forma podem competir com as organizações que lhes poderiam prestar o serviço.

Desta forma, assumindo o escopo definido, podemos gerar uma proposição geral alternativa, que identificamos como necessária à atual perspectiva de controle de marketing. Esta, por sua vez - bem como as proposições específicas vindouras - se divide em duas, por representar as partes envolvidas (i.e., clientes e funcionários de linha de frente), já que, tratando-se de uma interação, a proposição só se torna válida, se ambas as partes a confirmarem:

Proposição geral A: Tendo em vista que de seu desempenho nos encontros de serviços depende a própria entrega da oferta da empresa ao cliente, a organização deve desenvolver mecanismos de controle sobre sua participação nestes encontros.

Proposição geral B: Tendo em vista que de seu desempenho nos encontros de serviços depende a oferta da empresa aos seus clientes, a organização deve desenvolver mecanismos de controle, além dos atuais, sobre a participação dos funcionários de linha de frente nestes encontros.

A Metáfora Teatral nos Encontros de Serviço

Partindo do pressuposto de que o comportamento humano é um drama e que os serviços são essencialmente desempenhos, pois não podem ser manipulados ou estocados, mas apenas experienciados, Grove, Fisk e Bitner (1983) e, mais tarde, Grove, Fisk e Bitner (1992), propuseram uma metáfora teatral para os encontros de serviços, com base na sociologia dramatúrgica de Erving Goffman, na tentativa de traçar um paralelo entre os vários elementos envolvidos em um encontro de serviços e os elementos que estão presentes na experiência de uma peça de teatro. Dessa forma, consideram-se os funcionários como os atores, pois sua presença e ações definem o serviço; os clientes como a audiência, pois é para eles que o serviço é destinado; o ambiente físico no qual o serviço ocorre como o cenário; e, finalmente, o desempenho do serviço, ou seja, o conjunto entrelaçado de interações entre todos os outros elementos que irão moldar a experiência do cliente com o serviço, como a representação. Entretanto, considerando a co-produção dos serviços, preferimos entender que funcionários e clientes se revezem enquanto audiência e atores, o que tornará, em última instância, todos atores, ainda que pertencentes (nos termos do próprio Goffman, 2001), a diferentes equipes.

Uma abordagem como esta reconhece as pessoas como atores sociais que aprendem a se comportar de acordo com a posição que ocupam em determinada estrutura social em dado momento. Os papéis têm origem nas normas morais presentes em uma cultura e existem antes da interação de ocupantes particulares de posições ocorrer. Os papéis de cliente e de funcionário, portanto, são anteriores aos indivíduos que os ocupam; daí podermos afirmar que um indivíduo assume o papel de funcionário quando adentra em seu ambiente de trabalho, e um outro, o de cliente, quando busca uma organização para realizar seu consumo. Desse modo, os papéis também podem ser encarados como resíduos da experiência de ocupantes anteriores dessas posições modelados lentamente, ao longo do tempo, à medida que gerações sucessivas de ocupantes se adaptam aos requerimentos dos meios em que vivem, pois as pessoas estão sempre sob pressão externa ou interna para se conformar com as expectativas que os outros têm delas. Em geral, essas expectativas são fundamentadas em valores que tendem a ser compartilhados pela sociedade na qual o indivíduo está inserto; daí a pressão para que ele desempenhe bem seus papéis.

Portanto, quando interagem em um encontro de serviço, funcionário e cliente têm papéis com conteúdos e roteiros distintos a desempenhar, o que faz com que cada um deles tenha a tendência natural de ver o transcorrer do encontro sob a perspectiva da posição que ocupa nessa interação. No entanto o modo como os clientes e funcionários vêem os encontros de serviço pode ser mais congruente, quando as duas partes compartilham as expectativas de papéis uma da outra e os roteiros do serviço são bem definidos (Bitner et al., 1997, Solomon et al., 1985).

Tendo em vista os últimos argumentos, concluímos que os papéis tanto de clientes quanto de funcionários de linha de frente sejam forjados, antes que pelos seus ocupantes, pela própria estrutura social em que se inserem, no que tais ocupantes terão desempenhos baseados em sua apreensão da posição, função e relevância de seus papéis na estrutura social, bem como em relação aos outros papéis com os quais estejam interagindo.

Desta forma, podemos elaborar nossa primeira proposição específica que, juntamente com outras a serem apresentadas no decorrer do texto, se comporão para propor uma solução para as proposições gerais:

Proposição específica 1A: Clientes irão desempenhar seu papel baseados em sua apreensão da posição, função e relevância deste papel na estrutura social, bem como em relação ao papel de funcionário de linha de frente, com o qual irão interagir.

Proposição específica 1B: Funcionários de linha de frente irão desempenhar seu papel baseados em sua apreensão da posição, função e relevância deste papel na estrutura social, bem como em relação ao papel de cliente, com o qual irão interagir.

A Busca do Controle nos Encontros de Serviço

A importância de ter papéis bem definidos ocorre porque os funcionários estão sujeitos à ambigüidade de papel e a demandas conflitantes, vindas dos clientes e da organização (Bateson, 2000). A ambigüidade de papel ocorre quando o funcionário não possui as informações necessárias para o desempenho efetivo de seu papel (Singh, 1993) e, além disso, quando ele não detém, disponíveis, os recursos exigidos para desempenhar seu cargo do modo apropriado (Kahn, Wolfe, Quinn, Snoek, & Rosenthal, 1964). Por sua vez, as demandas conflitantes podem gerar conflito de papéis, que seria a ocorrência simultânea de duas ou mais expectativas de papéis tal que a concordância com uma tornaria mais difícil a concordância com a outra (Katz & Kahn, 1987). Tendo isso em vista, Rafaeli (1989) afirma que o conflito de papéis nos encontros de serviço inevitavelmente causa impacto no comportamento dos funcionários e nas atitudes e intenções dos clientes.

Assumindo-se então, em maior ou menor grau, a natureza conflitante das atividades desempenhadas pelos funcionários de contato no encontro de serviço, a busca pelo controle das interações com os clientes poderia tornar-se um meio pelo qual eles reduziriam o conflito e, conseqüentemente, o estresse do papel. Esse controle pode ser encarado sob as mais diversas formas. Primeiramente, devese distinguir entre controle real e controle percebido. Existem situações em que os participantes de um encontro de serviço pensam deter o controle da situação quando, de fato, estão à mercê de eventos externos e do comportamento das outras partes envolvidas. Assim, dificilmente qualquer um dos participantes deterá o controle completo da interação. Contudo, como o comportamento será moldado de acordo com o que o indivíduo percebe, o controle percebido parece ser tão importante quanto o controle real, ou até mais. De modo geral, o controle percebido pode ser enquadrado como controle comportamental, quando as pessoas tentam controlar os estímulos, modificando seu próprio comportamento; como controle cognitivo, quando as pessoas tentam obter informações e analisar elementos em seu ambiente para aprender a controlá-los; e como controle decisório, quando as pessoas modificam objetivos para obter controle (Averill, 1973). Acontece que no processo de percepção de controle por parte de um indivíduo alguns vieses podem ocorrer (Pittman & Pittman, 1980). Freqüentemente as pessoas atribuem a si próprias a responsabilidade por sucessos e rejeitam a responsabilidade por falhas. Além disso, algumas pessoas superestimam a habilidade que possuem em causar um resultado que é determinado pela probabilidade e acreditam que seus comportamentos são determinados predominantemente por fatores situacionais, enquanto o comportamento dos outros é determinado por variáveis estáticas e disposicionais, como traços de personalidade, por exemplo.

Segundo vários estudiosos (e.g., Rafaeli, 1989; Weatherly & Tansik, 1993a, 1993b), ao desempenharem seus papéis de contato, os funcionários comumente tendem a utilizar estratégias para gerenciar suas interações com os clientes, a fim de administrar a relação conflitante entre satisfazer os desejos da organização e os dos clientes. Em vista disso, Bateson (2000) afirma que o controle no encontro de serviço pode ser compreendido como luta de três extremidades, nomeadamente o cliente, o funcionário e a organização, na qual cada uma busca o controle. O cliente buscaria o controle, tentando demonstrar sua preferência, capacidade e domínio sobre a organização, seja consumindo ou ajudando a produzir o serviço, com o intuito de obter o melhor resultado para si. Já o controle da organização proveria suas operações e políticas, através da criação do ambiente do serviço. O funcionário, por sua vez, objetivaria o controle, para evitar demandas conflitantes e, assim, manter sua saúde mental e física. Como nem a organização, nem o funcionário nem o cliente têm o controle completo do encontro de serviço, todos os momentos da prestação do serviço podem ser vistos como concessão mútua (Bateson & Hoffmann, 2001).

Este aspecto nos leva a elaborar uma segunda proposição específica:

Proposição específica 2A: Clientes buscam o controle nos encontros de serviço com o intuito de obter o melhor resultado para si.

Proposição específica 2B: Funcionários de linha de frente buscam o controle nos encontros de serviço com o intuito de evitar demandas conflitantes e, assim, manter sua saúde mental e física.

Em nossa segunda proposição específica não consideramos a busca de controle pela organização por este representar o próprio objetivo deste trabalho. Esta é uma questão que assume, portanto, neste trabalho, um status superior em relação àquelas apontadas em tal proposição.

Entendemos que a não possibilidade da organização, do funcionário ou do cliente deter o controle total da situação do encontro de serviços possa ser analisada sob dois aspectos: num primeiro, tendo em vista que se trata de interação social, a dependência mútua é extremamente benéfica para o relacionamento entre as partes envolvidas, o que é, em última instância, benéfico para a organização; por outro lado, do ponto de vista administrativo, não há como não reconhecer o risco, para a organização, deste compartilhamento de controle, pois o seu próprio estaria comprometido. Isto, portanto, parece desenhar-se como paradoxo. O controle compartilhado é, ao mesmo tempo, inevitável, potencialmente benéfico, mas também arriscado para a organização.

A conclusão a que chegamos para a solução deste paradoxo é a seguinte: para que a organização possa ter controle real sobre o encontro de serviço, faz-se necessário que tanto clientes quanto funcionários de linha de frente tenham o controle percebido sobre ele, desde que os aspectos deste controle percebido estejam de acordo com os interesses da organização. Desta forma, chegamos à nossa terceira proposição específica:

Proposição específica 3A: A percepção dos clientes de que têm o controle nos encontros de serviço pode ser benéfico para o controle real da organização sobre estes encontros, desde que o controle percebido dos clientes esteja de acordo com os interesses da organização.

Proposição específica 3B: A percepção dos funcionários de linha de frente de que têm o controle nos encontros de serviço pode ser benéfico para o controle real da organização sobre estes encontros, desde que o controle percebido dos funcionários de linha de frente esteja de acordo com os interesses da organização.

A grande questão se torna esta: como esta proposição se faz possível. Acreditamos que a perspectiva institucional possa apresentar uma saída para isto.

O CONTROLE POR MEIO DOS SIGNIFICADOS DA ORGANIZAÇÃO: UMA PERSPECTIVA INSTITUCIONAL

A perspectiva institucional sustenta que a realidade organizacional é socialmente construída e institucionalmente sustentada, de cunho fundamentalmente subjetivista (Fachin & Mendonça, 2003). Tal perspectiva foi introduzida nos estudos organizacionais por Selznick, em 1957. Hoje considerado como o velho institucionalismo, a institucionalização aqui é tida como o processo pelo qual uma organização desenvolve uma estrutura de caráter distinto, em que as expressões racionais técnicas são substituídas pelas expressões que carregam valores compartilhados no ambiente (Fachin & Mendonça, 2003; Vieira & Misoczky, 2000).

Por outro lado, o novo institucionalismo tem inicio com o trabalho de Meyer e Rowan (1977), que definem institucionalização como o processo pelo qual os processos sociais, as obrigações ou as realidades chegam a tomar um status de regras no pensamento e nas ações sociais. É notória aqui a forte influência da sociologia de Peter Berger e Thomas Luckmann, de quem os autores importam a noção própria de instituição. Nesta versão, a premissa básica é a de que a organização importa crenças e valores de seu ambiente como forma de obter a legitimação por parte deste. Tal pressuposto foi o que levou esta abordagem a assumir fortemente a noção de isomorfismo, ou seja, os mecanismos pelos quais ocorrem a convergência das organizações a uma tendência por meio da imitação; DiMaggio e Powell (1991) classificam três informativos: coercitivo, que se deve a influências políticas e ao problema de legitimidade; mimético, que resulta das respostas padrões à incerteza; e, finalmente, normativo, associado à profissionalização.

Em relação à questão do controle, foco do nosso presente interesse, Selznick, sob forte influência de Barnard, considera a questão do controle em sua abordagem. Entretanto ele aborda tal tema sob a ótica da legitimidade do líder, concedida pelos liderados (Fachin & Mendonça, 2003). Para a elaboração que pretendemos propor, acreditamos ser mais adequada a recuperação da noção de controle presente na gênese do conceito de instituição dos novos institucionalistas.

Berger e Luckmann (2002) iniciam a discussão das origens da institucionalização, apresentando que toda atividade humana está sujeita ao hábito. Qualquer ação freqüentemente repetida torna-se moldada em padrão, que pode, em seguida, ser reproduzido com economia de esforço e que é apreendido pelo executante como tal. No que se refere aos significados atribuídos pelo homem à sua atividade, o hábito torna desnecessário que cada situação seja definida de novo, etapa por etapa. Estes processos de formação de hábitos precedem toda institucionalização. Por sua vez, esta ocorre sempre que há uma tipificação recíproca de ações habituais por tipos de atores. Dito de maneira diferente, qualquer uma dessas tipificações é uma instituição. As tipificações das ações habituais que constituem as instituições são sempre partilhadas. São acessíveis a todos os membros do grupo social particular em questão e a própria instituição tipifica os atores individuais assim como as ações individuais.

As instituições, também, pelo simples fato de existirem, controlam a conduta humana, estabelecendo padrões previamente definidos de conduta, que a canalizam em uma direção por oposição às muitas outras direções que seriam teoricamente possíveis. O controle social primário é dado pela existência de uma instituição enquanto tal. Dizer que um segmento da atividade humana foi institucionalizado já é dizer que este segmento da atividade humana foi submetido ao controle social. Novos mecanismos de controle só são exigidos se os processos de institucionalização não forem completamente bem sucedidos.

É neste aspecto que sugerimos que o processo de controle de marketing possa ocorrer de maneira mais efetiva, se fizer uso de outro tipo de controle: o institucional. Entendemos que isto possa ocorrer de forma indireta, através da institucionalização dos significados de uma organização - em que, para o contexto ora apresentado, podemos incluir, além da missão, dos valores e das crenças organizacionais e de seus processos, normas e procedimentos, os programas de marketing, como noções sobre os produtos e serviços, preços etc.

Entendemos que, uma vez que os significados de uma organização estejam institucionalizados, estes influenciarão decisivamente o desempenho de clientes e de funcionários de linha de frente num encontro de serviços. Seus scripts tenderão a estarem ajustados a tais significados, bem como as adaptações necessárias a estes. Isto levaria a uma situação em que, mesmo na iminência da busca de controle das partes durante a interação, este estaria submetido à mão invisível do controle institucional e, portanto, sob um controle real das organizações.

Esta discussão nos levar a conceber nossa quarta proposição específica:

Proposição específica 4A: Clientes desempenharão seu papel de acordo com os interesses da organização, se os significados desta estiverem institucionalizados.

Proposição específica 4B: Funcionários de linha de frente desempenharão seu papel de acordo com os interesses da organização, se os significados desta estiverem institucionalizados.

Meyer e Rowan (1977) apontam que os produtos, serviços, técnicas, políticas e programas institucionalizados funcionam como mitos poderosos e muitas organizações os adaptam cerimonialmente. Entretanto, Berger e Luckmann (2002) apontam que isto exige alguma forma de processo educacional. Os significados institucionais devem ser impressos poderosa e inesquecivelmente na consciência do indivíduo. O caráter de fórmula dos significados institucionais assegura sua possibilidade de memorização. Têm-se, no nível dos significados sedimentados, os mesmos processos de rotinização e trivialização da institucionalização.

Neste sentido, toda a transmissão exige alguma espécie de aparelho social, em que alguns tipos são designados como transmissores e outros como receptores do conhecimento tradicional. Assim, vemos que a forma como os significados de uma organização devam ser transmitidos para clientes e funcionários de linha de frente possa ocorrer pela comunicação, tanto externa quanto interna. Entendemos que, à medida que os significados organizacionais sejam transmitidos para e assimilados pela sociedade (i.e., macroambiente) e pelo microambiente organizacional, possam inserir-se na cultura destas, influenciando as expectativas, tanto de clientes (via sociedade) quanto dos funcionários de linha de frente (tanto por meio do microambiente organizacional quanto por meio da sociedade, pois que estes estão num âmbito mais amplo, ali inseridos) em relação às organizações e à forma como estes se vêem em relação àquelas.

Desta forma, podemos indicar que meios de comunicação de massa (TV, rádio, jornais etc.) possam ser utilizados para transmitir os significados da organização para a sociedade como um todo, influenciando tanto clientes quanto funcionários de linha de frente, enquanto, por outro lado, meios de comunicação dirigida e interpessoal (Mala direta, ponto de venda, telemarketing, e-mail etc.) e de comunicação interna (treinamento, feedback pessoal, cartazes, murais etc.) possam ser utilizados para atingi-los, em separado, de forma mais específica.

Esses aspectos nos levam a apresentar nossa quinta e última proposição específica:

Proposição específica 5A: A assimilação dos significados da organização pelos clientes deve ocorrer por meio da transmissão destes em meios de comunicação de massa e de comunicações dirigida e interpessoal.

Proposição específica 5B: A assimilação dos significados da organização pelos funcionários de linha de frente deve ocorrer por meio da transmissão destes em meios de comunicação de massa e de comunicação interna.

Com base em nossas proposições, apresentamos nossa proposta de um processo de controle de marketing baseado nos significados da organização (Figura 2). Por meio dele, propomos que os significados da organização sejam transmitidos, por via dos meios de comunicação discutidos, para o macroambiente como um todo, bem como, especificamente, para clientes e funcionários de linha de frente, num procedimento dirigido para a institucionalização destes significados (proposições específicas 5A e 5B). Uma vez institucionalizados, tais significados agiriam sobre os atores em questão, influenciando seus desempenhos (proposições específicas 4A e 4B). Tais desempenhos pareceriam de controle dos clientes e dos funcionários de linha de frente, satisfazendo, assim, suas demandas específicas (proposições específicas 2A e 2B). Contudo estariam atendendo aos interesses da organização, possibilitando a esta o controle real dos encontros de serviços (proposições específicas 3A e 3B), já que o desempenho dos atores em questão estariam submetidos à estrutura social e aos seus papéis mutuamente (proposições específicas 1A e 1B), ambas já influenciadas pelos significados institucionalizados da organização.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nossa argumentação baseia-se na premissa de que uma dada organização, cujos significados venham a enraizarem-se na cultura de uma dada sociedade e de seu microambiente organizacional torna-se, para estas, uma instituição. Com isto, esta organização estaria apta a desenvolver o que ora chamamos de controle institucional numa situação de encontro de serviços, uma vez que seus significados estariam compartilhados por funcionários de linha de frente e clientes.

Apesar do tipo de controle que aqui identificamos ser baseado num longo e difícil caminho, considerando-se que o tempo de um processo de institucionalização equivale a pelo menos uma geração, acreditamos que este seja crítico no delineamento do escopo e das aplicações dos controles de marketing. Percebemos que, no entanto, esta seja uma possibilidade só passível de estabelecer em longo prazo, o que certamente impactaria em altos investimentos realizados durante o processo de institucionalização, o que parece ir de encontro aos atuais mecanismos de controle de marketing, comumente focados em metas de curto prazo.

Vale aqui uma ressalva. Reconhecemos que o que ora argumentamos possa ser utilizado como forma de se reificar(3 3 i.e., levar à alienação, tirando-os de suas condições de sujeitos, convertendo-os em objetos do processo. ) funcionários e clientes. Entretanto entendemos que esta seja uma questão anterior. Parece-nos que qualquer mecanismo de controle sobre seres humanos que não faça uso da força possa incorrer nesta possibilidade. Além disto, outra questão anterior refere-se à própria atividade mercadológica que, muitas vezes, procede por meio da reificação das massas. Acreditamos, portanto, que esta seja uma questão que deva ser discutida em termos éticos e que certamente não encontrará neste momento e nessas páginas seu fórum mais adequado. Contudo acreditamos que os significados organizacionais possam ser institucionalizados, mas também que a prática dos funcionários e dos clientes, incentivada pela organização, possa ser reflexiva (nos termos de Schön, 1983), o que seria, no nosso entendimento, não apenas possível, como extremamente adequado, em como lidar com o paradoxo que apresentamos, em que se faz necessário tanto o controle sobre os indivíduos como a autonomia destes no encontro de serviços.

Finalmente, o corte aqui proposto em relação aos encontros de serviços, como antecipado, foi por uma opção analítica. Acreditamos que o controle institucional seja adequado também para outros aspectos do macroambiente - dentre os quais a obtenção de benefícios externos, como a própria teoria institucional já prevê - bem como níveis do microambiente fora da fábrica, como em relação a fornecedores, distribuidores, prestadores de serviços etc.

Essas são questões que consideramos fundamentais para futuras reflexões e debates.

NOTAS

Artigo recebido em 18.10.2007

Aprovado em 16.03.2009

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  • 1
    Não pretendemos aqui estabelecer uma relação de dependência, ou mesmo uma comparação conceitual, entre controle de marketing e métricas de marketing. Outrossim, destacar como a recente ênfase sobre essas últimas se torna uma pressão para uma maior valorização daquele.
  • 2
    A literatura de marketing considera os clientes, assim como fornecedores, distribuidores, concorrentes e outros
    stakeholders, como parte do microambiente organizacional, por serem forças participantes de como uma organização entrega valor ao mercado. Apesar disto, entendemos que os clientes ocupem um papel peculiar neste contexto, uma vez que não fazem parte do negócio e sim estejam procurando condições adequadas para a solução de seus próprios problemas. Com isto, apesar de aceitarmos que façam parte do microambiente organizacional, sugerimos que o
    background que trazem de suas vidas cotidianas represente mais as forças do (macro)ambiente sociocultural do qual fazem parte, do que das questões do microambiente organizacional. De fato, entendemos que também os funcionários - bem como prestadores de serviços, como mencionado em nossa argumentação, mas também funcionários de outras organizações (e.g., gestores, compradores, vendedores organizacionais), também tragam aspectos do ambiente sociocultural para o desempenho de suas atribuições, ainda que em nível menor, devido a estarem desempenhando uma atividade profissional. A escolha do encontro de serviços para a presente reflexão, como é apresentado adiante, se baseia nesta abordagem.
  • 3
    i.e., levar à alienação, tirando-os de suas condições de sujeitos, convertendo-os em objetos do processo.
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    Endereço: André Luiz Maranhão de Souza Leão Av. José Ferreira Lins, 35/303, Imbiribeira, Recife/PE, 51170-320. E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      26 Mar 2010
    • Data do Fascículo
      Abr 2010

    Histórico

    • Recebido
      18 Out 2007
    • Aceito
      16 Mar 2009
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