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É plágio: e daí?

EDITORIAL

Editores de QN

Da forma como foi pensado esse título, seria um tremendo plágio se não disséssemos que esta ideia foi idealizada pelo jornal O Globo, numa seção chamada "É ilegal. E daí?" que por sua vez parafraseava um prefeito da cidade do Rio de Janeiro. A proposta do Jornal era discutir as ilegalidades que ocorrem na cidade e que o poder público conhece, mas nada faz para corrigi-las. A mesma sensação se tem com a questão do plágio. Parece que nada vai acontecer àqueles que decidem copiar ideias e texto de trabalhos alheios sem a devida citação ou o crédito apropriado. O absurdo chega a tanto que já existem empresas especializadas, escondidas em endereços da Web, para a produção de apostilas, monografias, dissertações e teses de doutorado. Porém, os recentes fatos ocorridos - um professor brasileiro foi demitido, uma aluna teve seu doutorado cassado e a demissão do Ministro da Defesa da Alemanha - parecem estar mudando o rumo desta questão. Então, a frase do título poderia ser mudada para: é plágio e agora vai ter consequências!

Bem sabemos que as consequências dependem muito das decisões políticas das IES, que em sua maioria são corporativas e pouco fazem no sentido de tomarem posição quanto aos fatos graves de plágio de alunos e docentes. Elas deveriam ser as mais interessadas em desenvolver a conscientização de seus alunos e docentes quanto à questão do plágio através de cursos, cartilhas, ciclo de debates e em ampliar o escopo dos comitês de ética em pesquisa para esta questão. Aparentemente, as instituições imaginam que tais fatos não arranham a sua imagem, mas isso não é verdade, pois para o público passa a imagem negativa de que a instituição não cuida do material acadêmico que está sendo produzido nas suas dependências de ensino. Bem como as IES que não tratam adequadamente esta questão nas suas salas de aula, recentemente, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) aprovou recomendações para evitar o comércio ilegal de trabalhos acadêmicos e o plágio de monografias nas universidades brasileiras. Foram aprovadas duas medidas importantes: o envio de ofício a todas as IES brasileiras para que passem a utilizar softwares de busca de similaridades para identificar plágios em monografias, dissertações e teses e a adoção de políticas de conscientização dos estudantes acerca da propriedade intelectual e o plágio nas atividades acadêmicas.1 O ofício foi enviado e o seu teor está disponível na web;2 agora é acompanhar o seu desenvolvimento nas IES. Vamos acompanhar e verificar se essa é mais uma das ações tomadas que não resultam em nada.

É estranho quando o olhar vem de fora para chamar a atenção ao que deveria ser considerada missão das IES. Sabe-se muito bem que elas sabem ensinar aos alunos a ler e escrever criticamente, mas precisam enfatizar às suas comunidades que quando forem compor as ideias e resultados da pesquisa o façam de forma original. Deste modo, elas devem incentivar o pensar e o senso crítico e nisso devem estar inseridas a questão da ética e o plágio. O "copiar-colar" diminui a qualidade do ensino e aleija a capacidade crítica dos alunos e docentes.

A Química Nova já há algum tempo vem alertando a comunidade desta prática nefasta através de seus editoriais. Já houve caso de publicação integral de texto publicado anteriormente3,4 e, mais recentemente, uma apostila para concurso público foi comercializada na web contendo um trabalho copiado integralmente sem nenhuma menção à origem ou aos autores. As revistas não são imunes a este problema, pois da mesma forma que podem ter parte ou a integralidade dos seus textos e figuras plagiadas,5 também podem publicar artigos contendo plágio, mesmo utilizando o mecanismo de avaliação por pares. Esse mecanismo de avaliação é o mais empregado pelas revistas científicas, mas é feito por pessoas que conhecem as teorias, mas não o teor de todos os textos e figuras que estão publicados na literatura científica. O mais fácil para os assessores ad hoc é verificarem o autoplágio, onde os autores repetem inúmeras vezes as introduções dos trabalhos. Apenas para ressaltar, a Química Nova nunca publica uma figura ou imagem referenciada sem que o autor apresente a autorização da fonte para utilização no seu texto.

O objetivo deste editorial é mais uma vez alertar nossos colaboradores a evitarem a cópia de textos publicados, mesmo que de frase ou texto de sua própria autoria. Os professores e membros das bancas de avaliação são fundamentais, pois devem discutir abertamente com seus alunos esta questão e as consequências que poderão advir, como carreiras arruinadas e potencialidades interrompidas após terem sido frutos de investimento em bolsas e apoio à pesquisa.

Memorandos de reitorias para as comunidades acadêmicas terão pouca ou nenhuma efetividade nesta questão. Só a educação e conscientização poderão alcançar algum resultado.

  • 1
    www.oab.org.br/combateplagio, acessada em Março 2011.
    » link
  • 2
    http://dead.ifpe.edu.br/moodle/file.php/1/WebConferencia/Of._Circular_no_23_combate_ao_plagio.jpg, acessada em Março 2011.
    » link
  • 3. Torresi, S. I. C.; Pardini, V. L.; Ferreira, V. F.; Quim. Nova, 2009, 32, 1371.
  • 4. Torresi, S. I. C.; Pardini, V. L.; Ferreira, V. F.; Quim. Nova 2008 31, 197.
  • 5. Sociedade Brasileira de Química; Boletim Eletrônico 845, 2009.
  • É plágio. e daí?

    Susana I. Córdoba de Torresi; Vera L. Pardini; Vitor F. Ferreira
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      12 Abr 2011
    • Data do Fascículo
      2011
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