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Ocorrência de flavonas, flavonóis e seus glicosídeos em espécies do gênero Solanum (Solanaceae)

Occurrence of flavones and flavonols aglycones and its glycosides in Solanum (Solanaceae)

Resumo

During the last decades several flavonoids of Solanum species have been isolated. This review describes the flavones, flavonols and their glycosides presently known as constituents of Solanum species.

Solanum; flavone; flavonol


Solanum; flavone; flavonol

REVISÃO

Ocorrência de flavonas, flavonóis e seus glicosídeos em espécies do gênero Solanum (Solanaceae)

Occurrence of flavones and flavonols aglycones and its glycosides in Solanum (Solanaceae)

Tania Maria Sarmento da SilvaI; Mário Geraldo de CarvalhoI, * * e-mail: mgeraldo@ufrrj.br ; Raimundo Braz-FilhoII; Maria de Fatima AgraIII

IDepartamento de Química, Instituto de Ciências Exatas, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Antiga Rodovia Rio-SP, km 47, 23851-900 Seropédica - RJ

IISetor de Química de Produtos Naturais, CCT, Universidade Estadual do Norte Fluminense, Av. Alberto Lamego, 2000, 28015-620 Campos - RJ

IIICentro de Ciências da Saúde, Laboratório de Tecnologia Farmacêutica, Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa - PB

ABSTRACT

During the last decades several flavonoids of Solanum species have been isolated. This review describes the flavones, flavonols and their glycosides presently known as constituents of Solanum species.

Keywords:Solanum; flavone; flavonol.

INTRODUÇÃO

O gênero Solanum L. é o maior e mais complexo gênero da família Solanaceae, com cerca de 1500 espécies e 5000 epítetos habitando sistemas ecológicos estabelecidos pelas regiões tropicais e subtropicais do mundo e tendo a América do Sul como centro de diversidade e distribuição1.

Além de alcalóides, os flavonóides constituem um dos grupos de substâncias mais freqüentes em espécies do gênero Solanum. O número de trabalhos de sistemática química sobre o gênero Solanum é relativamente reduzido, aparentemente devido às dificuldades de se trabalhar com um gênero com grande plasticidade morfológica2. Porém, dados químicos baseados nos padrões flavonoídicos contribuíram para uma compreensão sistemática dos táxons nos níveis mais baixos de classificação na família3. A literatura relata um perfil químico de Solanum com base na freqüência de flavonóides3-11. Os padrões de oxidação dos flavonóides têm muito a contribuir, ajudando a entender a sistemática dos táxons na família6, mas este grande potencial ainda não foi explorado. Entre os poucos estudos realizados com os flavonóides de Solanum, constam a análise de espécies selecionadas de batata4,7,8, 12 espécies da seção Androceras5, 11 espécies da seção Solanum10, 22 espécies da seção Basarthrum11, 3 espécies da seção Erithrotrichum, 1 espécie da seção Micracantum e 1 espécie da seção Lasiocarpa12.

O presente trabalho relata a presença de flavonas, flavonóis e seus O-heterosídeos encontrados em espécies do gênero Solanum, escolhidos por serem as classes de flavonóides mais comuns. As antocianinas e isoflavonas foram excluídas devido aos poucos dados disponíveis na literatura.

FLAVONÓIDES DE SOLANUM

As Tabelas 1 e 2 descrevem os flavonóides em ordem crescente de numeração e do número de grupos hidroxílicos/metoxilícos/açú cares no esqueleto básico 1 (primeira coluna, contendo também o nome trivial entre parênteses), as espécies de onde foram isolados (segunda coluna) e as referências bibliográficas originais das citações referentes às substâncias (terceira coluna). Algumas informações foram obtidas somente de resumos do Chemical Abstract ou do NAPRALERT (NAtural PRoduct ALERT).

Flavonas, Flavonóis e seus O-heterosídeos

Muitos flavonóis (3-oxiflavonas) glicosilados descritos como bioprodutos de espécies deste gênero são geralmente derivados do kanferol (3,5,7,4'-tetraidroxiflavona) e quercetina (3,5,7,3',4'-pentaidroxiflavona), o mesmo ocorrendo também com os derivados metilados e acilados. Substâncias derivadas da isoramnetina (3,5,7,4'-tetraidroxi-3'-metoxiflavona) e miricetina (3,5,7,3',4',5'-hexaidroxiflavona) são mais restritos. A glicose e a ramnose aparecem como os carboidratos mais freqüentes, podendo-se considerar a galactose, a arabinose e a xilose como de ocorrência relativamente rara. A única flavona glicosilada (Tabela 1) encontrada até o presente é derivada da luteolina (5,7,3',4'-tetraidroxiflavona). No gênero Solanum, particularmente, destaca-se a excepcional capacidade de suas espécies produzirem 3-O-glicosidioflavonóis e um número significativo de kanferol, quercetina e miricetina metilados como agliconas, muitos dos quais apresentam 8-hidroxilação/glicosilação3 .

A ocorrência de um padrão particular de substituição é freqüentemente usada como um indicador de avanço filogenético13,14. Steinharter3 propôs um "esquema evolutivo" hipotético, para alguns grupos infragenéricos de Solanum, apoiado na complexidade biossintética dos flavonóis bioproduzidos. No esquema proposto, a presença do flavonol com substituição 3-O- e 3,7-O-glicosídio, foi usada para definir os grupos basais, que são considerados menos evoluídos, encontrados nas espécies de Solanum dos subgêneros Solanum e Potatoe, que se caracterizam morfologicamente pelos tricomas simples, ausência de acúleos e anteras elípticas. Por outro lado, a presença da metoxila em 3, 4', e 7 e hidroxila/metoxila em C-8 foi empregada para definir os estados de caracteres avançados, encontrados em espécies de Solanum das seções Anisantherum15, Androceras5-7,9 e Erythrotrichum12,16, pertencentes ao subgênero Leptostemonum.

Flavonas e Flavonóis

Os flavonóis livres ocorrem em um número menor de espécies. Derivados da gossipetina (3,5,7,8,3',4'-hexaidroxiflavona)16 e a herbacetina (3,5,7,8,4'-pentaidroxiflavona)12 foram relatados somente uma vez cada um. Relativamente poucos derivados das flavonas apigenina (5,7,4'-triidroxiflavona), luteolina (5,7,3',4'-tetraidroxiflavona) e crisoeriol (5,7,4'-triidroxi-3'-metoxiflavona) encontram-se descritos na literatura (Tabela 2).

Nas espécies da família Solanaceae a posição 5 dos flavonóides está ocupada por um grupo hidroxila17. No gênero Solanum, particularmente, destaca-se a excepcional capacidade de suas espécies produzirem 3-O-glicosidioflavonóis e um número significativo de kanferol, quercetina e miricetina metilados como agliconas, muitos dos quais apresentam 8-hidroxilação/glicosilação3 .

O acúmulo de flavonóides não glicosilados está relacionado com a existência de estruturas secretoras, como também à formação de outros tipos de produtos naturais lipofilícos10. Assim, os flavonóides provenientes dos exsudatos das plantas têm sido encontrados em grupos taxonômicos distintos, em diferentes níveis hierárquicos, família, gênero e táxons infragenéricos. Na família Solanaceae a presença de flavonóides livres foi encontrada em partes aéreas de espécies pertencentes aos gêneros Nicotiana18,19, Browallia, Chamaesaracha, Petunia, Salpiglossis19, Lycopersicum e Solanum20. A presença de flavonóides em Solanum paludosum16 e em outras espécies das seções Erythrotrichum, Micracantha, Acanthophora e Crinitum, do subgênero Leptostemonum12, foi evidenciada em tricomas estrelados-glandulares.

CONCLUSÕES

Uma análise dos resultados obtidos nos diversos trabalhos já publicados, incluindo aqueles realizados pelos autores, evidencia uma acentuada correlação entre a classificação tradicional, com base na morfologia, e a hipótese quimiotaxonômica proposta por Steinharter. Em ambos, as espécies de Solanum dos subgêneros Solanum e Potatoe ocupam uma posição basal e compartilham caracteres morfológicos como a presença de tricomas simples, ausência de acúleos e anteras elípticas, e também características químicas, como o flavonol com substituição 3-O- e 3,7-O-glicosídio. Por outro lado, a posição mais avançada é compartilhada pelas espécies de Solanum do subgênero Leptostemonum, com a metoxila em 3, 4', e 7 e hidroxila/metoxila em C-8, cuja morfologia caracteriza-se pela presença de tricomas estrelados, acúleos e anteras atenuadas para o ápice.

Além disso, os resultados evidenciaram uma correlação entre grau de complexidade dos flavonóides e o tipo tricoma existente na planta. As espécies com tricomas simples só apresentaram os tipos de flavonóides com estruturas mais simples, como por exemplo S. sarrachoides e S. angustifolium. Nas espécies de tricomas estrelados e estrelados-glandulares (S. paludosum, S. crinitum e S. jabrense), característico do subgênero Leptostemonum considerados mais complexos, também foram encontrados os tipos de flavonóides com características mais derivadas.

6. Harborne, J. B.; Swain, T. Em Ref. 2, p. 257.

Recebido em 11/3/02

Aceito em 23/1/03

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      04 Ago 2003
    • Data do Fascículo
      Ago 2003

    Histórico

    • Aceito
      23 Jan 2003
    • Recebido
      11 Mar 2002
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