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Fatores que influenciam a formação da fase β-PbO2 em filmes eletrossintetizados galvanostaticamente sobre substrato de tecido de carbono

Factors governing the formation of THE β-PbO2 phase electroformed galvanostatically on the carbon cloth substrate

Resumo

PbO2 films were electroformed onto carbon cloth substrates (twill woven type) in acid conditions using the nitrate precursor by changing the electrodeposition current density, temperature and pH, in order to optimize the formation of the β-PbO2 phase. The crystal structure and morphology of the PbO2 films were investigated using X-ray diffraction (XRD) and scanning electronic microscopy (SEM) techniques. The optimum conditions obtained for formation of the β-PbO2 were presented and discussed.

lead dioxide; carbon cloth; electrodeposition conditions


lead dioxide; carbon cloth; electrodeposition conditions

ARTIGO

Fatores que influenciam a formação da fase β-PbO2 em filmes eletrossintetizados galvanostaticamente sobre substrato de tecido de carbono

Factors governing the formation of THE β -PbO2 phase electroformed galvanostatically on the carbon cloth substrate

Fabiano Ramos Costa; Leonardo Morais da Silva* * e-mail: lsilvamorais@hotmail.com

Departamento de Química, Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, Rod. MGT 367, km 583, 5000, 39100-000 Diamantina – MG, Brasil

ABSTRACT

PbO2 films were electroformed onto carbon cloth substrates (twill woven type) in acid conditions using the nitrate precursor by changing the electrodeposition current density, temperature and pH, in order to optimize the formation of the β-PbO2 phase. The crystal structure and morphology of the PbO2 films were investigated using X-ray diffraction (XRD) and scanning electronic microscopy (SEM) techniques. The optimum conditions obtained for formation of the β-PbO2 were presented and discussed.

Keywords: lead dioxide; carbon cloth; electrodeposition conditions.

INTRODUÇÃO

O dióxido de chumbo, PbO2, é classificado como semicondutor degenerado1-4 que não apresenta boas propriedades eletrocatalíticas para a reação de desprendimento de oxigênio (RDO). Isto se deve ao fato do PbO2 atuar como ânodo inerte para a RDO, ou seja, o íon Pb(IV) não participa de nenhum ciclo eletrocatalítico neste processo eletródico.4

Quando hidratado, o PbO2 é classificado como um condutor do tipo metálico (possuidor de elevada densidade eletrônica, 1020 a 1021 cm-3).4 Essa condutividade se deve à não estequiometria do óxido que envolve vacâncias de oxigênio5 ou à substituição de oxigênios superficiais por grupos hidroxilas como resultado da hidratação dos filmes,6 representada por PbO2-x(yH2O), onde 2-x é o grau de desvio da estequiometria ideal e yH2O representa a quantidade de água presente na estrutura do óxido.

Estudos realizados por Lappe7 revelaram a dependência entre a condutividade e o coeficiente estequiométrico do PbO2-x. Quando o coeficiente estequiométrico é menor que 1,3 o filme de dióxido de chumbo é praticamente isolante, mas para (2-x) > 1,3 a condutividade eletrônica aumenta significativamente, aproximando-se da condutividade do PbO2 quando (2-x) se torna maior que 1,5.

O PbO2 pode ser preparado por eletrodeposição anódica (Pb(II) → Pb(IV)) a partir de soluções contendo Pb2+ em duas formas cristalinas: α-PbO2, de estrutura ortorrômbica do tipo columbita e, β-PbO2, de estrutura tetragonal do tipo rutílica, sendo a principal diferença entre elas a disposição das unidades hexacoordenadas (PbO6) na formação do filme. Na forma α-PbO2, as celas unitárias vizinhas compartilham bordas não opostas, resultando na formação de cadeias na forma de zig-zag, enquanto na forma β-PbO2 as celas unitárias vizinhas compartilham bordas opostas e originam cadeias lineares octaédricas.8

Experimentalmente, a eletrodeposição do dióxido de chumbo efetuada em meio ácido origina preferencialmente a forma β-PbO2, enquanto que a forma α-PbO2 prevalece em soluções alcalinas, mas em ambas as condições a aparência macroscópica é praticamente idêntica (cinza escuro).

Nos estudos da reação de formação de ozônio (RFO) e da degradação eletroquímica de poluentes orgânicos, a forma β é a preferida por apresentar um maior sobrepotencial para o processo da RDO.9

Além das características citadas anteriormente, o baixo custo torna o PbO2 um excelente substituto a metais nobres, como a platina, em diversos processos eletroquímicos.4

Na oxidação eletroquímica de compostos orgânicos, dois fatores contribuem para a melhoria do processo: o material eletródico, uma vez que este influencia o mecanismo e, consequentemente, os produtos da reação10 e, a área ativa superficial.11 Nesse contexto, o uso de fibras de carbono e/ou de seus tecidos como substrato para o PbO2 tem merecido especial atenção devido às características bem peculiares desse material, tais como, elevada área superficial, resistência a alguns meios corrosivos e possibilidade de modificação de sua superfície.12

Soluções aquosas de nitrato de chumbo (II), Pb(NO3)2, acidificadas com ácido nítrico (HNO3) constituem grande parte dos sistemas eletrolíticos já investigados para formação dos filmes de PbO2.13 Nesse meio, o processo de eletrodeposição do dióxido de chumbo é independente da natureza do eletrodo (substrato) e ocorre em quatro etapas, sendo duas eletroquímicas e as demais químicas. O mecanismo de eletrodeposição mais provável para a formação do PbO2 é apresentado nas Equações 1 a 4:13

A primeira etapa, Equação 1, é eletroquímica e envolve a transferência do primeiro elétron e a formação de espécie contendo oxigênio do tipo OHads na superfície do eletrodo durante a eletrólise da água (reação paralela). Na segunda etapa, Equação 2, íons chumbo (II) interagem quimicamente com as espécies contendo oxigênio formadas na primeira etapa, formando o complexo superficial Pb(OH)2+. Na sequência, Equação 3, o complexo formado é oxidado, liberando o segundo elétron, formando outro complexo, do tipo Pb(OH)22+. Por fim, o complexo se decompõe quimicamente, Equação 4, resultando na formação do dióxido de chumbo13 que permanece aderido ao substrato.

Neste estudo, filmes de PbO2 foram eletrodepositados sobre tecido de carbono (TC) do tipo sarja e foi efetuada uma investigação sistemática da influência das condições de eletrodeposição sobre as propriedades morfológicas, cristalográficas e eletroquímicas.

PARTE EXPERIMENTAL

Soluções e reagentes utilizados

As soluções foram preparadas com reagentes de grau analítico e água ultrapura (sistema de purificação Gehaka, 18,18 MΩ cm).

Para a confecção dos eletrodos, utilizou-se a cola de silicone comercial da Tek Bond®.

O solvente isopropanol (Ecibra®) foi utilizado no pré-tratamento do TC, enquanto o sulfato de sódio, Na2SO4, (Nuclear®) foi utilizado no preparo do eletrólito empregado na obtenção dos perfis voltamétricos dos substratos de TC pré-tratados.

O eletrólito empregado na eletrodeposição dos filmes de dióxido de chumbo sobre os substratos de TC pré-tratados foi preparado com nitrato de chumbo, Pb(NO3)2, (Dinâmica®) e ácido nítrico, HNO3, (65%, Neon®).

Equipamentos e softwares

Todos os estudos eletroquímicos foram realizados empregando-se um potenciostato/galvanostato da Solartron® (modelo 1280C) interfaciado a um microcomputador Pentium® e gerenciado pelo software CorrWare for Windows® (versão 2.9b2).

As imagens dos eletrodos foram obtidas empregando-se um microscópio eletrônico de varredura com canhão de emissão por efeito de campo (Quanta 200).

Os estudos da difração de raios-X foram realizados utilizando-se um difratômetro da Shimadzu (modelo XRD6000) empregando-se radiação CuKα com comprimento de onda (λ) 0,154060 nm (a 40 kV e 30 mA) e velocidade de varredura de 2 º min-1, no intervalo 2θ de 20 a 70º. A análise estrutural das amostras foi efetuada por comparação dos difratogramas experimentais com as fichas cristalográficas do JCDPS (Joint Committee of Diffraction Standards), realizada através do software Crystallographica Search-Match® (versão 2,0).

O tratamento teórico dos dados experimentais foi realizado empregando-se o software OriginPro® (versão 8.0724).

Preparação dos substratos de TC

Utilizou-se como substrato para a confecção dos eletrodos de β-PbO2 um TC com trama do tipo sarja (CCS200, importando pela empresa Maxepoxi Industrial e Comercial Ltda., Brasil).

A modelagem dos substratos de TC para a eletrodeposição e sua caracterização consistiu em delimitar as áreas geométricas quadradas (3,0 x 3,0 cm) das faces expostas (Ag) com cola de silicone utilizando-se um gabarito de papelão, na frente e no verso do TC. Uma área exposta superior do substrato de TC serviu para se fazer o contato elétrico com o circuito externo.

Após a secagem da cola de silicone (t ≈ 24 h), os substratos foram pré-tratados por imersão em isopropanol sob agitação magnética moderada por 30 min visando a retirada de substâncias adsorvidas na superfície, principalmente substâncias orgânicas oriundas da manipulação.14 Em seguida, os substratos foram devidamente enxaguados com água ultrapura e mantidos imersos em água ultrapura até o momento do uso.

Célula eletroquímica e eletrodos

A célula eletroquímica utilizada na caracterização do substrato de TC e na eletrossíntese dos filmes de β-PbO2 suportados no TC consistiu de uma célula convencional de vidro, de um único compartimento, com capacidade para 250 mL (Figura 1).


Os substratos de TC pré-tratados foram utilizados como eletrodos de trabalho (ET). Utilizou-se o eletrodo de referência (ER) de calomelano saturado (ECS) e uma camisa cilíndrica do TC CCS200 adequadamente fixada com cola de silicone no interior da célula de vidro foi empregada como contraeletrodo (CE), tendo uma extensão externa à célula para contato com o circuito elétrico (potenciostato/galvanostato), como mostrado na Figura 1. Essa configuração do CE na célula eletroquímica permite uma melhor distribuição das linhas de campo ao redor da área exposta do eletrodo de trabalho.

Em todos os estudos, as soluções eletrolíticas foram mantidas sob agitação magnética moderada.

Metodologia experimental

Perfis voltamétricos dos substratos de TC após pré-tratamento

Para comprovar a eficácia do pré-tratamento e verificar a ausência de substâncias aderidas à superfície dos substratos de TC que pudessem desenvolver correntes faradaicas não desejadas, voltamogramas cíclicos (15 ciclos) foram registrados para o substrato de TC pré-tratado, em solução aquosa 0,10 mol L-1 de Na2SO4, na faixa de -0,8 a 1,0 V vs. ECS, com velocidade de varredura do potencial (ν) de 50 mV s-1, à temperatura de 25 ºC.

Eletrodeposição dos filmes de PbO2 sobre o TC pré-tratado

Todas as eletrodeposições foram realizadas no tempo (telet) de 16,8 min, em solução aquosa 0,10 mol L-1 de Pb(NO3)2 acidificadas com HNO3, tendo as condições de densidade de corrente aparente (jap), temperatura da solução eletrolítica (T) e pH ajustadas em cada eletrodeposição, como apresentado na Tabela 1.

As soluções empregadas no processo de eletrodeposição foram mantidas sob agitação magnética moderada com temperatura controlada mediante uso de uma chapa de aquecimento.

Caracterização estrutural dos filmes de PbO2 suportados em TC com a técnica DRX

A caracterização cristalográfica dos filmes de PbO2 eletrossintetizados sobre substrato de TC foi conduzida visando a identificação das fases β-PbO2 e α-PbO2. Foram utilizados os PDF (Powder Diffraction File) de número 41-1492 e 45-1416.

Caracterização morfológica dos filmes de PbO2 suportados em TC

A caracterização morfológica dos filmes de PbO2 eletrodepositados sobre os substratos de TC foi realizada através da técnica de microscopia eletrônica de varredura (MEV) visando a análise da distribuição superficial do PbO2 sobre as fibras do TC (extensão do recobrimento das fibras).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Perfil voltamétrico do substrato de TC

A Figura 2 apresenta os perfis voltamétricos (jap vs. E) obtidos para o substrato de TC antes (Figura 2a) e após (Figura 2b) o pré-tratamento com isopropanol (representativo para todos os substratos), onde se nota que a limpeza da superfície das fibras do TC com isopropanol permitiu o aumento da molhabilidade do TC, caracterizada pelo aumento da densidade de corrente aparente no intervalo de potencial estudado.


A remoção de substâncias orgânicas isolantes, oriundas do processo de fabricação e manipulação, adsorvidas nas superfícies das fibras do TC, disponibiliza um maior número de sítios ativos superficiais necessários ao processo da eletrodeposição do filme de dióxido de chumbo.

O perfil voltamétrico apresentado na Figura 2 é diferente daquele obtido por Irikura11 utilizando TC de código PWB-3/Stackpole – USA e tratamento térmico a 450 ºC por 1 h, seguido de tratamento químico com solução 50% (V/V) de H2SO4 por mais 1 h. Nessa condição, a jap obtida foi um pouco maior que a apresentada na Figura 2. Entretanto, como foi verificado em nosso laboratório, não há necessidade de pré-tratamentos do TC através de processos oxidativos severos, bastando apenas uma limpeza da superfície com solventes orgânicos para possibilitar a formação de filmes de dióxido de chumbo aderentes e homogeneamente distribuídos sobre a superfície das fibras de carbono.

Fatores que afetam a constituição das fases cristalinas dos filmes de PbO2 suportados em TC pré-tratados

Influência do pH

Difratogramas obtidos para os filmes de PbO2 eletrodepositados sobre os substratos de TC pré-tratados em diferentes valores do pH (1,0; 2,0; 3,0 e 4,0) são mostrados na Figura 3. Foram mantidos constantes os seguintes parâmetros: densidade de corrente (40 mA cm-2); temperatura (50 ºC); tempo de eletrodeposição (~16,8 min) e concentração inicial do Pb(NO3)2 (0,10 mol L-1).


A análise da Figura 3 evidencia a influência do pH sobre a composição das fases do filme de dióxido de chumbo. Observa-se que os filmes depositados em vários valores do pH são policristalinos e compostos por uma mistura das duas fases cristalográficas (α- e β-PbO2), sendo a fase β predominante nos valores mais baixos de pH, com uma orientação preferencial ao longo do plano cristalográfico β (110). O aumento do pH aumenta consideravelmente a quantidade relativa da fase α, sendo que no pH 4,0 essa fase é a mais característica do filme formado. A fase α orienta-se preferencialmente ao longo do plano cristalográfico α (111).

Com o aumento do pH o pico β (110), característico da fase β-PbO2, diminui, enquanto que o pico α (111), característico da fase α-PbO2, aumenta.

Análises cristalográficas de filmes de PbO2 eletrodepositados potenciostaticamente sobre substrato de Cu, relatadas por Mahalingam et al.,15 apresentaram resultados contrários. Segundo esses autores, com o aumento do pH da solução, os filmes exibiram predominância da fase β-PbO2, com a fase α-PbO2 desaparecendo em valores de pH acima de 5,0.

Entretanto, outros autores16,17 chegaram a conclusões semelhantes às encontradas no presente estudo, ou seja, a diminuição do pH favorecendo a predominância da fase β-PbO2 nos filmes eletrodepositados. Segundo Carr e Hampson,16 a forma β é mais estável em meios ácidos já que nesse ambiente a forma α modifica espontaneamente sua estrutura para a forma β-PbO2.

Verificou-se que o pH é o fator que mais afeta a constituição cristalográfica dos filmes de PbO2 sobre o TC pré-tratado.

Influência da temperatura

A Figura 4 apresenta os difratogramas obtidos para os filmes de PbO2 eletrodepositados sobre os substratos de TC pré-tratados nas temperaturas de 24, 40, 50 e 70 ºC. Foram mantidos constantes os seguintes parâmetros: densidade de corrente aparente (40 mA cm-2), pH (1,0), tempo de eletrodeposição (~16,8 min) e concentração inicial do Pb(NO3)2 (0,10 mol L-1).


Conforme já discutido, todos os filmes eletrodepositados em diferentes temperaturas apresentaram uma mistura policristalina das duas fases do dióxido de chumbo. É possível notar, observando a Figura 4, que o aumento da temperatura da solução eletrolítica favorece a formação da fase β-PbO2. No entanto, para temperaturas muito elevadas o processo de formação do filme fica prejudicado pela grande energia térmica, fazendo com que diversas fibras de carbono fiquem descobertas.

A presença de grande número de fibras de carbono descobertas após a eletrodeposição conduzida a 70 ºC fez com que houvesse um alargamento da base do pico β (110) (2θ ≈ 25,4 º), devido ao fato do carbono ser caracterizado por uma banda de difração em torno do ângulo de 25,94 º (Figura 4, 70 ºC).18 Além disso, em altas temperaturas há uma perda acelerada de solvente por vaporização com grande produção de bolhas que se acumulam na superfície do eletrodo e dificultam a formação do filme, por isso, mesmo que a 70 ºC a fase β-PbO2 seja bem mais característica que a 50 ºC, essa última temperatura mostra ser, do ponto de vista prático, melhor para se obter o filme de β-PbO2.

Com o aumento da temperatura da solução eletrolítica, o transporte de massa aumenta e, consequentemente, a fase metaestável α-PbO2 recristaliza na fase mais estável β-PbO2.19

Como observado na Figura 4, com o aumento da temperatura, a intensidade de todos os picos das fases α e β-PbO2 diminuem, excetuando-se o pico β (110), característico da fase β-PbO2, que indica uma orientação preferencial dessa fase com a elevação da temperatura.

Influência da densidade de corrente

A influência da densidade de corrente sobre a composição das fases cristalográficas dos filmes de PbO2 suportados em TC pré-tratados está mostrada na Figura 5. Foram mantidos constantes os seguintes parâmetros: temperatura (50 ºC), pH (1,0), tempo de eletrodeposição (~16,8 min) e concentração inicial do Pb(NO3)2 (0,10 mol L-1).


Conforme verificado na Figura 5, a densidade de corrente aparente é outro fator que afeta a composição das fases dos filmes de dióxido de chumbo sobre o TC pré-tratado. Apesar de todos os filmes apresentarem uma mistura das duas fases cristalográficas, a fase β-PbO2 é predominante em todos os filmes formados. Entretanto, o aumento da densidade de corrente diminui a presença da fase α-PbO2, como se observa pela diminuição do pico α (111) na Figura 5.

É importante salientar que em baixos valores de densidade de corrente aparente algumas fibras de carbono ficaram descobertas, apresentando aspecto semelhante ao verificado na eletrodeposição ocorrida a 70 ºC.

Conforme já discutido, verifica-se que a orientação cristalográfica preferencial da fase β-PbO2 ocorre ao longo do plano cristalográfico β (110) e, minoritariamente, ao longo do plano β (211).

Influência do pH, da temperatura e da densidade de corrente aparente sobre a intensidade relativa dos principais picos cristalográficos das fases α- e β-PbO2

Como se observa nos difratogramas das Figuras 3, 4 e 5, a fase β-PbO2 orienta-se preferencialmente no plano (110) e, minoritariamente no plano (211), enquanto a fase α-PbO2 orienta-se preferencialmente no plano (111). A relação entre a intensidade relativa desses picos cristalográficos e as condições de eletrodeposição (pH, T e jap) é apresentada na Figura 6.


Da análise da Figura 6 é possível constatar que: a diminuição do pH provoca um aumento da intensidade relativa dos picos β (110) e β (211), sendo que no pH < 2 a orientação cristalográfica β (110) passa ser a principal; com a diminuição do pH, a intensidade relativa do pico α (111) também diminui, mas em valores de pH > 3 essa orientação cristalográfica passa ser a principal; das três condições de eletrodeposição estudadas, o pH é a única capaz de favorecer a formação de uma fase em detrimento da outra, enquanto que nas demais condições (T e jap), a fase β-PbO2 é sempre a principal; a partir de 40 ºC, o aumento da temperatura não afeta a intensidade relativa do pico β (110), que em T > 40 ºC é o principal pico cristalográfico, enquanto que a 24 ºC o pico β (211) é o principal; não se observa uma tendência quanto à mudança da intensidade relativa do pico β (211) em relação à temperatura; o aumento da temperatura diminui a proporção de fase α-PbO2, entretanto, a 70 ºC, a proporção dessa fase sobe para cerca de 25%, assim, visando a formação preferencial da fase β-PbO2 nos filmes eletrodepositados sobre o TC é importante que a temperatura da solução eletrolítica seja menor que 70 ºC; a densidade de corrente aparente não afeta a intensidade relativa do pico β (110), que é o principal pico cristalográfico na faixa de jap estudada (10 a 40 mA cm-2) e, a proporção da fase α-PbO2 diminui com o aumento da densidade de corrente aparente.

Assim, é possível afirmar que a caracterização estrutural dos filmes de dióxido de chumbo eletrodepositados sobre o TC pré-tratado pode ser realizada pela observação das intensidades relativas dos picos β (110) e α (111) e que a formação preferencial da fase β-PbO2 nesses filmes é conseguida pela aplicação de altas densidades de corrente, temperaturas entre 50 e 70 ºC e pH < 2, em soluções eletrolíticas 0,1 mol L-1 de Pb(NO3)2.

TAMANHO MÉDIO DOS CRISTALITOS

O tamanho médio dos cristalitos foi estimado mediante aplicação da Equação de Scherrer:20

onde thkl é o tamanho médio do cristalito na orientação hkl; K é uma constante de proporcionalidade que depende da forma das partículas (assumindo-se como sendo esféricas, tem-se K = 0,9);20λ é o comprimento de onda "monocromático" da radiação emitida pelo alvo de cobre e que atinge a amostra (0,154060 nm); B(2θ) é a largura à meia-altura do pico (em rad) e θB é o ângulo de incidência que permite o fenômeno da difração (ângulo de Bragg).

Para a obtenção dos valores de B(2θ) e θB foi aplicada a metodologia proposta por Abdullah e Khairurrijal21 em relação ao pico β(211). O pico β(110) não foi escolhido para se fazer o cálculo do tamanho médio dos cristalitos devido ao alargamento da base apresentado nos difratogramas obtidos a 10 mA cm-2 e também a 70 ºC que poderiam prejudicar os resultados. O tamanho médio dos cristalitos (t211) calculado está apresentado na Tabela 2.

Como se nota pela análise da Tabela 2, a alteração das condições de eletrodeposição dos filmes de dióxido de chumbo mostra apresentar uma tendência em relação ao tamanho dos cristalitos, cuja diminuição do diâmetro médio ocorre com o aumento do pH, a diminuição da temperatura e o aumento da densidade de corrente aparente. Entretanto, são observados comportamentos atípicos no tamanho médio dos cristalitos na jap de 40 mA cm-2 e no pH 4, onde se esperava um valor menor que 13 nm. O mesmo se observa na temperatura de 70 ºC, onde se esperava um tamanho médio maior que 22 nm.

Nas condições ótimas de eletrodeposição (pH = 1; T = 50 ºC e jap = 40 mA cm-2), obteve-se t211 ≈ 22 nm. Esse valor é bastante coerente com os tamanhos médios de cristalitos (20-30 nm) obtidos por Sirés et al.22 na eletrodeposição de β-PbO2 sobre compósito de carbono/polivinil-éster utilizando 1,0 mol L-1 de Pb(CH3SO3)2 e 0,2 mol L-1 de CH3SO3H, com aplicação de jap = 20 mA cm-2, a 60 ºC por 60 min.

Análise morfológica dos filmes de PbO2

A Figura 7 mostra imagens dos filmes de PbO2 obtidas por microscopia eletrônica de varredura (MEV). A análise destes dados revela que o processo de eletrodeposição do PbO2, quando realizado em condições adequadas, pode resultar numa boa cobertura superficial das fibras do TC sobre toda a sua extensão longitudinal. Portanto, estes dados revelam que é possível a obtenção de microfios de PbO2 tendo o tecido de carbono como substrato.


CONCLUSÃO

Filmes de dióxido de chumbo eletrodepositados galvanostaticamente sobre TC em soluções eletrolíticas aquosas de Pb(NO3)2, sob agitação magnética moderada, num mesmo intervalo de tempo de eletrodeposição são constituídos de uma mistura das duas formas cristalinas desse óxido (α- e β-PbO2). A constituição dos filmes é dependente do pH da solução eletrolítica, da temperatura e da densidade de corrente aparente. O aumento da temperatura e da densidade de corrente aparente e a diminuição do pH possibilitam a formação de filmes com elevada proporção da fase β-PbO2, com distribuição superficial uniforme, elevada cristalinidade e de boa aderência.

AGRADECIMENTOS

L. M. da Silva agradece ao CNPq pela bolsa PQ (Processo 311265/09) e à FAPEMIG pelo auxílio financeiro (CEX-APQ-705/09). F. R. Costa agradece à CAPES pela bolsa de Mestrado.

Recebido em 5/8/11

Aceito em 21/11/11

Publicado na web em 31/1/12

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  • *
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      02 Jul 2012
    • Data do Fascículo
      2012
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