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Psicanálise e medicina reprodutiva: possíveis colaborações e indesejáveis armadilhas

Psychoanalysis and reproductive medicine: possible collaborations and undesirable traps

Psychanalyse et médecine reproductive: possibles collaborations et indésirables pièges

Psicoanálisis y medicina reproductiva: posibles colaboraciones y indeseables trampas

Resumos

A partir de sua experiência como psicanalista colaboradora em dois Serviços de Reprodução, a autora discrimina no presente artigo três diferentes ordens de demanda feitas pelos médicos aos psicanalistas no que concerne a sua atuação nos tratamentos de infertilidade humana: 1) abordagem da causalidade inconsciente da infertilidade sem causas orgânicas detectadas; 2) auxílio na construção da parentalidade nos casos em que se faz necessário o recurso a doadores de sêmen, óvulos ou embriões ou ainda a úteros de substituição; 3) ajuda à equipe médica na tomada de decisões diante de situações complexas do ponto de vista bioético, ou seja, ante demandas que implicam a montagem de arranjos familiares que contradizem o que é aceito socialmente ou viável naturalmente. Cada uma dessas ordens de demanda comporta uma armadilha própria para o psicanalista. A abordagem dessas armadilhas constitui, junto com a explicitação das ordens de demanda referidas, o objetivo do artigo.

Psicanálise; Medicina; Infertilidade; Tecnologia reprodutiva


Based on her experience as a collaborator psychoanalyst in two Reproduction Services, the author in this paper distinguishes three different orders of demands from physicians to psychoanalysts in relation to their activities in the context of treatments of human infertility: 1) approach of the unconscious causation of infertilities without detected organic causes; 2) aid in the construction of parenthood in cases where it is necessary the use of donors of semen, eggs or embryos or even replacement wombs; 3) help to the medical staff in making decisions in face of complex situations from a bioethical point of view, i.e., concerning demands involving the assembly of family arrangements that contradict what is socially accepted or naturally feasible. Each of these orders of demands includes a trap for the psychoanalyst. The approach of these traps is, along with the explanation of demand orders referred above, the purpose of the article.

Psychoanalysis; Medicine; Infertility; Reproductive technology


A partir de son expérience comme psychanalyste collaborant dans deux Services de Reproduction, l’auteur discrimine dans le présent article trois différents ordres de demande faites par les médecins aux psychanalystes en ce qui concerne leur actuation dans le cadre des traitements d’infertilité humaine: 1) tenir compte de la causalité inconsciente des infertilités sans cause organique décelée; 2) favoriser la construction de la parentalité dans les cas où il y a participation de donneurs de sperme, d’ovule ou d’embryons ou encore de mères porteuses; 3) aider l’équipe médicale a prendre des décisions face à des situations complexes du point de vue bioéthique, c’est-à-dire, face à des demandes qui impliquent le montage d’arrangements familiaux qui contredisent ce qui est accepté socialement ou possible naturellement. Chacun de ces ordres de demande comporte un piège particulier pour le psychanalyste. L’examen de ces pièges constitue, avec l’explicitation des ordres de demande ci-dessus indiquées, l’objectif de l’article.

Psychanalyse; Médecine; Infertilité; Techniques de reproduction


A partir de su experiencia como psicoanalista colaboradora en dos Servicios de Reproducción, la autora discrimina en este artículo tres diferentes órdenes de demandas hechas por los médicos a los psicoanalistas con respecto a su desempeño en el contexto de los tratamientos de infertilidad humana: 1) enfoque de la causalidad inconsciente de la infertilidad sin causas orgánicas detectadas; 2) auxilio en la construcción de la parentalidad en los casos que se hace necesario el recurso de donantes de esperma, óvulos o embriones o el reemplazo del vientre; 3) ayuda al equipo médico en las decisiones delante de situaciones complejas de punto de vista bioético, es decir, delante de las demandas que involucran el montaje de arreglos familiares que contradicen lo que es socialmente aceptable o viable naturalmente. Cada uno de estos órdenes de demanda contiene una trampa propia para el psicoanalista. El enfoque de estas trampas compone, junto a la explicitación de los órdenes de demanda dichas anteriormente, el objetivo del artículo.

Psicoanálisis; Medicina; Infertilidad; Tecnologia reproductiva


Psicanálise e medicina reprodutiva: possíveis colaborações e indesejáveis armadilhas

Psychoanalysis and reproductive medicine: possible collaborations and undesirable traps

Psychanalyse et médecine reproductive : possibles collaborations et indésirables pièges

Psicoanálisis y medicina reproductiva: posibles colaboraciones y indeseables trampas

Simone Perelson

Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro-RJ, Brasil

RESUMO

A partir de sua experiência como psicanalista colaboradora em dois Serviços de Reprodução, a autora discrimina no presente artigo três diferentes ordens de demanda feitas pelos médicos aos psicanalistas no que concerne a sua atuação nos tratamentos de infertilidade humana: 1) abordagem da causalidade inconsciente da infertilidade sem causas orgânicas detectadas; 2) auxílio na construção da parentalidade nos casos em que se faz necessário o recurso a doadores de sêmen, óvulos ou embriões ou ainda a úteros de substituição; 3) ajuda à equipe médica na tomada de decisões diante de situações complexas do ponto de vista bioético, ou seja, ante demandas que implicam a montagem de arranjos familiares que contradizem o que é aceito socialmente ou viável naturalmente. Cada uma dessas ordens de demanda comporta uma armadilha própria para o psicanalista. A abordagem dessas armadilhas constitui, junto com a explicitação das ordens de demanda referidas, o objetivo do artigo.

Palavras-chave: Psicanálise. Medicina. Infertilidade. Tecnologia reprodutiva.

ABSTRACT

Based on her experience as a collaborator psychoanalyst in two Reproduction Services, the author in this paper distinguishes three different orders of demands from physicians to psychoanalysts in relation to their activities in the context of treatments of human infertility: 1) approach of the unconscious causation of infertilities without detected organic causes; 2) aid in the construction of parenthood in cases where it is necessary the use of donors of semen, eggs or embryos or even replacement wombs; 3) help to the medical staff in making decisions in face of complex situations from a bioethical point of view, i.e., concerning demands involving the assembly of family arrangements that contradict what is socially accepted or naturally feasible. Each of these orders of demands includes a trap for the psychoanalyst. The approach of these traps is, along with the explanation of demand orders referred above, the purpose of the article.

Keywords: Psychoanalysis. Medicine. Infertility. Reproductive technology.

RÉSUMÉ

A partir de son expérience comme psychanalyste collaborant dans deux Services de Reproduction, l’auteur discrimine dans le présent article trois différents ordres de demande faites par les médecins aux psychanalystes en ce qui concerne leur actuation dans le cadre des traitements d’infertilité humaine: 1) tenir compte de la causalité inconsciente des infertilités sans cause organique décelée; 2) favoriser la construction de la parentalité dans les cas où il y a participation de donneurs de sperme, d’ovule ou d’embryons ou encore de mères porteuses; 3) aider l’équipe médicale a prendre des décisions face à des situations complexes du point de vue bioéthique, c’est-à-dire, face à des demandes qui impliquent le montage d’arrangements familiaux qui contredisent ce qui est accepté socialement ou possible naturellement. Chacun de ces ordres de demande comporte un piège particulier pour le psychanalyste. L’examen de ces pièges constitue, avec l’explicitation des ordres de demande ci-dessus indiquées, l’objectif de l’article.

Mots-clés: Psychanalyse. Médecine. Infertilité. Techniques de reproduction.

RESUMEN

A partir de su experiencia como psicoanalista colaboradora en dos Servicios de Reproducción, la autora discrimina en este artículo tres diferentes órdenes de demandas hechas por los médicos a los psicoanalistas con respecto a su desempeño en el contexto de los tratamientos de infertilidad humana: 1) enfoque de la causalidad inconsciente de la infertilidad sin causas orgánicas detectadas; 2) auxilio en la construcción de la parentalidad en los casos que se hace necesario el recurso de donantes de esperma, óvulos o embriones o el reemplazo del vientre; 3) ayuda al equipo médico en las decisiones delante de situaciones complejas de punto de vista bioético, es decir, delante de las demandas que involucran el montaje de arreglos familiares que contradicen lo que es socialmente aceptable o viable naturalmente. Cada uno de estos órdenes de demanda contiene una trampa propia para el psicoanalista. El enfoque de estas trampas compone, junto a la explicitación de los órdenes de demanda dichas anteriormente, el objetivo del artículo.

Palabras-clave: Psicoanálisis. Medicina. Infertilidad. Tecnologia reproductiva.

Introdução

Nossos tempos apresentam uma mutação radical no que concerne à reprodução humana: hoje, uma criança pode vir ao mundo como fruto não mais de um encontro sexual, mas de um ato técnico. Ela pode ser o resultado de uma doação de sêmen, óvulos ou embriões e, portanto, ter como pai e/ou mãe não aquele(s) de quem ela é o herdeiro genético; pode provir de uma fertilização ocorrida numa proveta, e não mais na interioridade do corpo materno; pode ser gestada não na barriga de sua mãe, mas num “útero de substituição”; pode, enfim, originar-se do descongelamento de um embrião. Todas essas possibilidade são cada vez mais comuns nas clínicas particulares que se multiplicam nos vários países e que atendem às demandas cada vez maiores daqueles que não conseguem, por inúmeras razões, ter filhos por meio do que se convencionou chamar de “vias naturais”. Aqui no Brasil, os serviços públicos que oferecem essas técnicas ainda são extremamente escassos1 1 O Hospital Pérola Byington e o Hospital das Clínicas, ambos de São Paulo, o Hospital Regional da Asa Sul do Distrito Federal e o Instituto Materno Infantil de Pernambuco são as únicas instituições no Brasil que oferecem o tratamento completo sem custo para os pacientes. Os hospitais que oferecem parte do tratamento gratuito e cujos medicamentos são pagos pelo paciente são: Hospital Universitário de Ribeirão Preto, Hospital Universitário da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais, Hospital das Clínicas e Hospital Fêmina, ambos de Porto Alegre (Garcia, Bellamy, & de Russi, 2012). , mas tudo leva a crer que eles se multiplicarão rapidamente nas próximas décadas.

É comum aos dois tipos de serviço – particular e público – a presença do mesmo desamparo, não apenas dos pacientes, mas também dos médicos, para fazer face a essa mutação de consequências tão importantes quanto ainda timidamente abordadas. Enquanto o desamparo dos pacientes se revela principalmente diante das questões que giram em torno da sua condição ou de(a) seu(sua) parceiro(a) para ocupar um lugar de mãe ou pai quando há doação de gametas ou embriões, ou ainda do lugar que o(a) doador(a) de sêmen, óvulo, embrião ou útero terá na montagem da filiação, ou enfim no que se refere à dúvida quanto a contar ou não para o filho a forma como ele foi concebido ou gestado; o desamparo do médico se revela sobretudo no que se refere, em primeiro lugar, à definição do objetivo de sua clínica e à concepção de êxito do tratamento e, em segundo lugar, à discriminação das demandas a serem atendidas a partir da consideração dos riscos subjetivos que determinados processos podem implicar2 2 Como no Brasil não há nenhuma legislação que determine os critérios de elegibilidade para o tratamento – há apenas as normas do Conselho Federal de Medicina –, os médicos muitas vezes se veem desamparados diante de demandas de tratamento que implicam a constituição de arranjos familiares que contradizem o que é socialmente aceito ou naturalmente viável. Mais adiante, será apontado um exemplo de uma demanda dessa ordem. .

A descrição de duas situações que experienciei em ambas as clínicas – pública e privada – ilustra a presença dessas questões no meio médico. A primeira se deu durante uma reunião com a equipe que atende no Setor de Reprodução Humana do Instituto de Ginecologia da UFRJ, que inclui médicos, estudantes de medicina e psicólogos. Nela, a médica-chefe fez aos estudantes a seguinte pergunta: “o que nos propusemos a realizar aqui; qual é o objetivo desse setor?”. As respostas foram, e podem ser muitas: “contornar ou curar a infertilidade”, “ajudar mulheres ou casais a engravidarem”, “obter gravidezes”, ou, ainda, “ajudar homens, mulheres e/ou casais a terem filhos”. Detendo-se nessa última resposta, a médica lançou uma nova questão: “se o nosso objetivo pode ser assim definido – ajudar casais a terem filhos –, podemos, então, considerar que, quando uma gravidez não sobrevém ao tratamento médico, mas, por outro lado, o tratamento ajuda o casal a optar pela adoção de uma criança, podemos falar em êxito do tratamento?”. Observemos que, tendo escolhido a última resposta como a mais adequada à primeira questão colocada, e colocado a resposta afirmativa à segunda questão como uma consequência lógica de sua escolha, a médica não pôde senão julgar que a abertura de um casal para a possibilidade de adoção – que muitas vezes só surge após o tratamento evidenciar os impedimentos à obtenção de gravidez – aponta, sim, para o êxito do tratamento.

Ao tomar essa via, que, cabe observar, não é de modo algum a mais comum, a médica explicita a complexidade que implica a definição dos objetivos de um Serviço de Reprodução Humana e da concepção de êxito dos tratamentos que ali se realizam. Além disso, ela indica que um Serviço que se propõe “ajudar um casal a ter filhos”, ou, ainda, ajudar um homem a tornar-se pai e/ou uma mulher a tornar-se mãe, não pode restringir-se a tratar apenas da fisiologia da reprodução, mas requer, ao contrário, uma equipe multidisciplinar capaz de intervir sobre o processo de fabricação do filhote humano – o qual só surge como efeito de uma combinatória simbólica, resultante tanto da dimensão coletiva do sistema social de parentesco quanto da dimensão singular do desejo inconsciente –, sem deixar de considerar a complexidade psíquica e social que lhe é própria.

A segunda situação se deu durante uma conversa com a médica do Vida Centro de Fertilidade a propósito de uma moça, a mim encaminhada por ela para uma avaliação quanto aos riscos do acolhimento médico à sua demanda. A moça tinha cerca de vinte anos e a procurou acompanhada de sua mãe com a demanda de realizar uma inseminação artificial com doador anônimo. Justificava sua demanda afirmando desejar ter precisamente naquele momento um filho e com a sua concepção de que o projeto de filho e a relação conjugal não se articulam necessariamente. Após o único encontro que tive com a moça, e o embate com os inúmeros questionamentos que esse único encontro causou em mim, dei como retorno à médica a minha avaliação: tratava-se de uma demanda que, a meu ver, não deveria ser atendida, visto haver um risco na mesma, a saber, o de se fazer o instrumento da realização da fantasia incestuosa, no caso, da moça com a sua própria mãe ou da mãe com a sua própria filha. A médica, aliviada com meu retorno, disse, então: “pois é, foi a mesma impressão que tive, a de uma relação incestuosa; apenas não sabia se o incesto já havia ou não sido de fato realizado”. Ao que respondo: “acredito que o que elas lhe pediram foi justamente que o realizasse”. Cabe aqui destacar, da mesma forma que o fiz no que se refere à primeira situação, que a recusa por parte da médica em atender à demanda não ilustra o que mais comumente se encontra no universo da reprodução assistida, em que qualquer ordem de demanda encontrará sempre algum lugar para ser atendida.

A descrição dessas duas situações nos introduz na complexidade que implica a determinação dos objetivos de um Serviço de Reprodução Humana. Elas nos indicam ainda em que medida essa determinação tem amplas consequências para a definição, não menos complexa, de êxito nesse tipo de tratamento, assim como dos riscos que lhe são inerentes. Enfim, elas nos conduzem à necessidade de compreendermos de que forma médicos e psicanalistas podem colaborar mutuamente no âmbito dos tratamentos de reprodução, sem perder de vista as diferentes concepções de êxito e de riscos do tratamento próprias a cada um deles.

Se cada vez mais os médicos da reprodução recorrem ao psicanalista por se darem conta de que as concepções estritamente médicas de êxito do tratamento, assim como dos riscos que lhe são inerentes, não são suficientes no que concerne aos tratamentos de reprodução; se, diante disso, torna-se cada vez mais evidente que o psicanalista tem um papel a desempenhar dentro de uma equipe de tratamento de reprodução, a colaboração médico/psicanalista não poderá ser frutífera senão na medida em que o psicanalista for capaz de sustentar sua posição no que concerne à direção de seu trabalho, o que envolve, entre inúmeras questões, demarcar a diferença com relação ao tratamento médico no que concerne a sua concepção de êxito, a qual se refere sempre ao desejo, e não à demanda do paciente. Com efeito, se, para o médico, a impossibilidade de responder satisfatoriamente à demanda do paciente – isto é, engravidar ou ter um filho3 3 Não teorizarei aqui a respeito da diferença entre essas duas ordens de demanda. Não cabe, entretanto, ignorar sua existência. – é quase sempre identificada com fracasso do tratamento, para o psicanalista, a concepção de êxito do tratamento, quando ele aí tem seu lugar, não deve nunca estar subordinada à demanda do paciente, quer seja ela a obtenção de uma gravidez ou de uma maternidade/paternidade. Mais claramente falando, esta não deve ser nunca sua visada. Ela pode vir como um ganho secundário do tratamento, como um resultado da expressão do desejo inconsciente – este, sim, o norte da clínica psicanalítica.

Marie-Magdeleine Chatel, psicanalista que trabalhou durante vários anos com a clínica da infertilidade, nos ajuda aqui a compreender de que modo a expressão do desejo inconsciente, mais precisamente de sua arquitetura lógica, de seus arranjos e desarranjos significantes – expressão que pode se dar seja no âmbito de um tratamento analítico, seja fora dele –, pode ganhar corpo, seja sob a forma de uma infertilidade, seja de uma fertilidade em uma mulher.

Esclarecendo: segundo a autora, o que sua experiência clínica tanto nos Serviços de Interrupção Voluntária de Gravidez (onde lidou com as gravidezes advindas apesar de serem conscientemente indesejadas e apesar dos métodos contraceptivos serem amplamente disponibilizados) quanto nos Serviços de Reprodução Assistida (nos quais deparou com as dificuldades para obter a gravidez apesar do desejo conscientemente sustentado de sua vinda e da ampla disponibilização das avançadas técnicas de reprodução) lhe mostrou é que coincidências de datas, insistência de certas palavras, retorno de nomes, tinham muitas vezes o poder de precipitar a vinda ou a não vinda de uma gravidez, fosse ela conscientemente desejada ou não. Descobre ainda que, em grande parte das mulheres, o significante que tomava corpo na gravidez realizava uma conexão inconsciente com um “sentido de pai”.

A respeito dessa última descoberta, Chatel fornece um exemplo bastante interessante. Trata-se de uma paciente que lhe relata ter engravidado graças a um medicamento. Acontece que o nome desse medicamento continha justamente as letras que faziam a junção entre o nome de seu pai, o nome de seu avô e o sobrenome de seu namorado. Haveria aqui, portanto, uma conexão entre o nome do medicamento e sua fertilidade, sendo possível formularmos a hipótese de que, na gravidez da paciente, tomou corpo uma conexão inconsciente. O remédio, para além de suas inquestionáveis propriedades técnicas, mostrou-se eficaz também no plano do sentido. Feliz coincidência, que, além de permitir que uma gravidez ganhasse corpo, remetia a maternidade à paternidade, lembrando-nos de que, se o êxito do tratamento é na maior parte das vezes identificado à obtenção de gravidez, para o psicanalista, a articulação desta com a possibilidade de constituição da filiação não pode nunca ser colocada de lado4 4 As concepções de Marie-Magdeleine Chatel são mais extensamente desenvolvidas em Perelson (2007). . Evidentemente, nada impede que um Serviço de Reprodução restrinja seu objetivo à obtenção de gravidez, concebendo, da mesma forma, o êxito do tratamento em referência unicamente ao alcance desse objetivo. Entretanto, nossa experiência de trabalho com os médicos da reprodução nos mostrou que dificilmente eles permanecem alheios ao fato de que, para além da simples obtenção de gravidezes, seus conhecimentos e técnicas são empregados na fabricação de filhos, pais e mães. E é em grande medida por não ignorarem esse fato, sendo por ele afetados em sua experiência cotidiana, que com grande frequência os médicos da reprodução convocam psicanalistas, seja para integrar a equipe do Serviço, seja para com ela colaborar.

Talvez possamos afirmar que principalmente três diferentes ordens de demanda são dirigidas pelos médicos aos psicanalistas. Em primeiro lugar, o psicanalista é convocado a abordar o que os médicos supõem ser os aspectos psíquicos, ou ainda a causalidade inconsciente da infertilidade. Em segundo lugar, sua contribuição ao tratamento vem a ser também justificada na medida em que os pacientes podem precisar de um auxílio para constituir-se como pais, sobretudo em casos em que uma doação de sêmen, de óvulo ou de embrião, ou, ainda, o recurso ao empréstimo de útero, se fazem necessários ao processo de concepção ou gestação da criança. Enfim, o psicanalista muitas vezes se vê convocado a ajudar a equipe a tomar decisões diante de situações complexas do ponto de vista bioético, ou seja, ante demandas que lhe são dirigidas e que implicam a montagem de arranjos familiares que contradizem o que normalmente é aceito pela sociedade ou viável naturalmente. Cada uma dessas três ordens de demanda comporta armadilhas próprias, armadilhas que o psicanalista deve evitar. Buscarei aqui explicitar essas três demandas, assim como as armadilhas próprias a cada uma delas.

Para tal, recorrerei à contribuição teórica de alguns psicanalistas e antropólogos que têm se havido com o tema nos últimos anos e que me ajudaram em minha prática como psicanalista colaboradora de dois Serviços de Reprodução, um público e um privado – respectivamente, os já referidos Setor de Reprodução do Instituto de Ginecologia da UFRJ e o Vida Centro de Fertilidade. No primeiro, participei, durante cerca de três anos, das reuniões semanais da equipe multidisciplinar e atendi a mulheres ou casais que vinham para sua primeira consulta médica. Sempre lhes era ofertada a possibilidade de retornar. Algumas dessas mulheres ou desses casais o faziam; em alguns raros casos, um tratamento com alguma continuidade se estabelecia. A maioria, entretanto, das mulheres ou casais que se propunham a voltar acabava por sublinhar a dificuldade para manter uma continuidade devido à impossibilidade de se ausentar no trabalho ou mesmo de arcar com o custo da condução ao hospital. Entretanto, essa mesma dificuldade dos pacientes em tratamento de reprodução para manterem uma continuidade no tratamento com o psicanalista, que eu acreditava dever-se às dificuldades financeiras, foi também encontrada no Vida Centro de Fertilidade. Ali tive, ao longo de alguns anos, duas principais formas de atuação: 1) o atendimento a todos os pacientes cujo tratamento implicasse doação de gametas ou recurso a útero de substituição (aqui era incluída no tratamento médico a possibilidade de até três encontros comigo) e 2) o atendimento a todos os pacientes no momento de entrega do documento de consentimento informado, o que lhes permitia elaborar ou ao menos expor sua dificuldade de elaboração quanto às escolhas que esse documento lhes impõe fazer (por exemplo, se desejam ou não doar seus óvulos, se desejam ou não congelar seus embriões, qual destino desejam dar aos embriões congelados, etc.). Ali pude perceber claramente quanto a dificuldade em dar continuidade ao tratamento analítico – talvez fosse mais adequado falar em alguma ordem de acompanhamento, e não propriamente de tratamento – não estava referida a qualquer impedimento prático, mas antes subjetivo.

O aspecto psíquico da infertilidade: a armadilha da noção de infertilidade psicogênica

Os surpreendentes avanços dos saberes e técnicas científicos que operam sobre a reprodução viabilizaram, nos últimos anos, a transformação do processo reprodutivo num ciclo quase inteiramente observável e manipulável, as causas orgânicas da infertilidade podendo ser cada vez mais bem detectadas e, se não tratadas, ao menos contornadas. Com efeito, o processo reprodutivo se oferece cada vez mais à observação dos médicos, provocando, inclusive, inúmeras reações preocupadas com a falta de pudor com que os mistérios do início da vida se revelam hoje nas provetas dos laboratórios ao voyeurismo dos cientistas. Além disso, esse processo – que até há pouco tempo fortuitamente colocava-se ou não em marcha em decorrência de um encontro erótico – expõe-se a cada vez maiores possibilidades de controle científico, que fundamentam desde as mais esperançosas expectativas de liberação humana dos imperativos da natureza até as mais catastróficas fantasias de instrumentalização do homem pela tecnologia biomédica, assim como a da possível fabricação, por essa mesma tecnologia, de exércitos de escravos humanos.

Diante dessa escalada vertiginosa da tecnociência, aquelas infertilidades que inexplicavelmente resistem ao cada vez mais amplo controle e às mais precisas manipulações biomédicas – isto é, que não revelam causa orgânica alguma para o fracasso das tentativas de obtenção de gravidez – acabam sendo, por exclusão, explicadas como não podendo ter senão uma etiologia psíquica. É assim que, quanto mais vasto torna-se o campo de observação e manipulação da infertilidade, quanto mais as infertilidades tornam-se explicáveis e tratáveis fisiologicamente, maior é a certeza dos médicos de que aquilo que escapa a esse campo deve ser explicado e tratado, necessariamente, como tendo uma gênese psíquica inconsciente, ou seja, deve ser definido como uma infertilidade psicogênica.

Entretanto, como aponta a psicanalista Sylvie Faure-Pragier (1997), a noção de infertilidade psicogênica não é isenta de problemas. Em primeiro lugar, definindo à psicogênese por exclusão da organogênese, ela supõe uma concepção dualista em que corpo e alma seriam autônomos um em relação ao outro. Sustentando-se na eliminação de toda e qualquer causa orgânica, a definição da infertilidade psicogênica estaria referida a uma concepção do psiquismo como uma ausência de organicidade, ou, ainda, como uma lacuna ou “lixeira onde são jogadas as infertilidades ‘sem causa’” (p. 65). Mas a psicanalista se pergunta “por que a presença de uma anomalia do funcionamento endocrinológico ou da permeabilidade das trompas, que afirmam a organicidade, excluiria uma causalidade psíquica?” (p. 66) E, por outro lado, “através de que milagre o psíquico se manifestaria na ausência de concepção sem provocar nenhuma disfunção fisiológica?” (p. 66). Contrapondo-se ao dualismo corpo-alma, a autora sublinha que psicogênese e organogênese do sintoma da infertilidade não devem ser opostas, mas articuladas recursivamente, implicando uma influência recíproca e circular do corpo e do psiquismo, sem que o ponto de partida possa ser sempre situado precisamente.

A inoperância da concepção de infertilidade psicogênica se deve não apenas ao fato de ela estar referida ao dualismo corpo–alma, como também, observa ainda Faure-Pragier (1997), ao fato de essa concepção designar o que Isabelle Stengers (1987) chama de um “conceito nômade”, isto é, um conceito que é importado de uma ciência – no nosso caso, a medicina – para outra, aqui a psicanálise. Se, por um lado, o psíquico é apontado por exclusão do orgânico, por outro, concebe-se que ambos obedecem ao mesmo modo de ação e são sensíveis à mesma forma de tratamento. Assim, tal como um micróbio particular se encontra necessariamente na causa de uma doença específica, um bloqueio psíquico determinaria linearmente seu efeito: a infertilidade. E, tal como a eliminação do micróbio, causa da doença, permite a supressão da mesma, a supressão do bloqueio deveria permitir a eliminação da infertilidade.

Se, observa ainda a psicanalista, esse determinismo linear não deixa de se encontrar em alguns casos de infertilidade, sobretudo naqueles em que a causa é manifestamente um traumatismo psíquico claro e violento, como o nascimento de um filho morto ou com graves problemas5 5 Essa situação é ilustrada por Faure-Pragier por meio de um caso clínico em que uma infertilidade sobrevém após a morte de um filho. Que a mãe não possa lhe dar um substituto, observa a psicanalista, a desola e, ao mesmo tempo, a encanta. A prova de fidelidade ao filho morto aparece aqui como um sentido possível para a infertilidade. – aqui, a viabilização de um luto não realizado pode, de fato, muitas vezes permitir a superação da infertilidade6 6 Cabe observar, entretanto, como sublinha Faure-Pragier, que a realização do luto pode conduzir também ao abandono do desejo de gravidez, que muitas vezes, nesse caso, confunde-se com o desejo de substituir aquele que foi perdido. Notemos que aqui o êxito do tratamento analítico não se confunde com a obtenção da gravidez. –, na maior parte dos casos, é o mecanismo da recursividade que se encontra na complexa origem do sintoma. Cabe observar que o mecanismo da recursividade refere-se não apenas à recursividade entre fatores psíquicos e orgânicos, mas também entre fatores causais da infertilidade e métodos atuais de tratamento – os quais, se por um lado mostram-se cada vez mais eficazes no tratamento de lesões ou disfunções orgânicas, podem ter, por outro, como efeito a produção de um bloqueio psíquico7 7 Ver, a esse respeito, Perelson (2008). –, como, enfim entre passado e presente: a temporalidade própria à etiologia do sintoma sendo a do après coup, o processo interpretativo, antes de revelar, no presente, uma causalidade situada no passado, confere, no presente, a determinado acontecimento passado, um valor causal (curativo ou patogênico).

A primeira armadilha da qual o psicanalista deve buscar escapar é, portanto, aquela de, importando da medicina seus conceitos, tomar as infertilidades inexplicáveis do ponto de vista fisiológico necessariamente como infertilidades psicogênicas, armadilha que, em sua vertente mais caricatural, poderia levá-lo a interpretar o sintoma de infertilidade como a expressão direta de um desejo inconsciente de não engravidar, ou ainda de não ter o filho que a demanda consciente afirma querer. Seguindo a lógica médica, o desejo inconsciente de não engravidar atuaria como um agente patógeno que bloquearia a fertilidade, devendo as suas próprias causas ser eliminadas para que a fertilidade pudesse ser liberada.

Cabe observar que essa armadilha, da qual muitas vezes médicos, psicanalistas e pacientes se fazem presas – armadilha resultante da hegemonia da lógica que opõe controle tecnocientífico a desejo inconsciente –, é responsável pela produção de uma alta dose de culpabilidade em algumas pacientes, culpabilidade esta que virá somar-se à já frequente presença da culpabilidade experimentada por toda mulher que se vê impossibilitada de gerar um filho.

A impossibilidade da maternidade: a armadilha do complexo de Édipo

Em sua experiência clínica, Faure-Pragier (1997) depara com grande frequência com um laço entre a infertilidade feminina e uma fixação na relação pré-edipiana da menina com a mãe. Devo observar que o mesmo se deu em minha experiência, tanto na clínica privada quanto na pública, em que tive inúmeras oportunidades de escutar, assim como Faure-Pragier, as incessantes evocações, no discurso de grande parte das mulheres inférteis, de um laço de dependência com uma mãe descrita como independente, poderosa, dominadora, fálica. Nessas pacientes, a relação com a mãe, que rapidamente passa a ocupar o primeiro plano no trabalho analítico, as coloca numa relação de extrema dependência, ou ainda de uma submissão frequentemente devastadora.

Na inversa proporção do lugar concedido ao laço excessivamente estreito com a mãe, para quem se volta de modo quase exclusivo todo o investimento libidinal ambivalente da mulher, o laço com o pai, assim como com a figura masculina em geral, não parece ter aqui praticamente lugar algum. A redução desse lugar àquele de mero doador anônimo de esperma nos casos de produção independente é, em algumas situações, a esse respeito exemplar.

Parece, então, como nota Faure-Pragier (1997), que nesses casos, enquanto o laço pré-genital com a mãe manteve seu lugar originário, a mudança de objeto da mãe para o pai, que marca a entrada do Édipo no caso da menina, teria falhado, de modo que “ela não pôde ‘entrar no Édipo como em um porto’” (p. 121). Disso decorre que, antes de o filho desejado situar-se no lugar de substituto do “desejo de possuir o pênis que a mãe lhe recusou e que agora espera obter de seu pai” (Freud, 1933/1976, p. 157), objeto referido por Freud como relacionando-se ao “objetivo do mais intenso desejo feminino” (p. 158), lugar que o filho vem ocupar nos casos em que o Édipo se daria a contento, aqui, ao contrário, onde “o Édipo não marcou praticamente essa evolução” (Faure-Pragier, 1997, p. 121), onde as mulheres “sofrem da insuficiência do papel paterno e masculino” (p. 126) e, com isso, da insuficiência do interdito que viria separá-las da mãe, o filho desejado “pode representar então a tentativa de romper o laço excessivamente fusional e ambivalente com a mãe” (p. 126). O filho passa a ser esperado como “objeto transformacional” que, transformando-a em mãe, a tornaria diferente, a livraria da imagem dominadora de sua própria mãe. Por outro lado, a ameaça de identificação à mãe que a perspectiva de gravidez coloca em cena e o temor de exercer sobre a criança concebida as mesmas pulsões devastadoras de que se vê vítima, assim como de sofrer, por parte do filho, o mesmo ódio que dirige à mãe, podem se traduzir na infertilidade.

Diante dessa situação, observa Faure-Pragier (1997), ela acaba por se prestar a “fazer de tudo” para ter um filho, tornando a infertilidade a causa de sua “depressão de inferioridade latente”, quando esta é muitas vezes, na realidade, a sua consequência. A esse respeito, a cumplicidade médica em sua obstinação para engravidar não pode senão contribuir para a manutenção do recalque incidido sobre a ambivalência que motiva seu desejo por filho.

Como observa a psicanalista, essas pacientes, cujo sintoma, muito mais do que moldado pelo conflito e pelo interdito edipianos, refere-se à falha de sua instauração e à dificuldade de distanciarem-se da mãe para dirigirem-se ao pai, revelam justamente aquilo que Freud, a partir de 1925, passa a sublinhar em suas considerações a respeito da feminilidade e do Édipo. Com efeito, a exploração que começará a empreender em 1925 sobre as consequências psíquicas da distinção anatômica entre os sexos levará Freud a sustentar que a fase pré-edipiana tem nas mulheres uma importância muito maior do que a que pode ter nos homens (Freud, 1931/1976, p. 265), o complexo de Édipo não sendo para elas senão uma formação secundária (Freud, 1925/1976, p. 318), apenas uma entre as três vias possíveis na qual os investimentos pré-edipianos podem desembocar e que, portanto, o que ele havia definido como o complexo de Édipo “se aplica de modo absolutamente estrito apenas à criança do sexo masculino” (Freud, 1933/1976, p. 263), o que o leva a afirmar dever “retratar-[se] da tese segundo a qual o complexo de Édipo é o núcleo das neuroses” (p. 260). Sabemos que essa dissimetria que Freud indica no que concerne à submissão do menino e da menina ao complexo edipiano será explicitada por Lacan (1972-73/1982) em sua definição das mulheres como sendo, ao contrário dos homens, não totalmente circunscritas pela lógica fálica ou ainda como não sendo totalmente sujeitadas à castração simbólica.

Ao sublinhar a frequência com que o discurso sustentado durante o tratamento analítico por grande parte das mulheres inférteis é revelador de uma fixação na relação pré-edipiana e uma “ausência de Édipo organizador” (Faure-Pragier, 1997, p. 127) e ao aproximar o que é revelado nesses discursos à estrutura feminina enunciada por Freud a partir de 1925, essa autora nos ajuda a apontar mais algumas armadilhas que o psicanalista deve evitar quando for convocado a tratar de mulheres diagnosticadas pela medicina como inférteis e que a ela se dirigem para ter o filho tão desejado. Em primeiro lugar, Faure-Pragier nos mostra, nem sempre o filho é desejado como substituto ou equivalente simbólico do falo que lhe falta. Da mesma forma, o filho que a infertilidade impede de vir não é necessariamente o filho edipiano. Estamos aqui no contexto de uma outra lógica, não inteiramente marcada ou ainda insuficientemente marcada pelo Édipo. Se permanecermos presos ao primeiro modelo freudiano, em que o complexo de Édipo é universalmente reconhecido como o núcleo das neuroses, corremos o risco de nos desviarmos aqui do que é essencial, a saber, os investimentos libidinais pré-edipianos. Em segundo lugar, não cabe aqui demonizarmos as novas tecnologias reprodutivas, imputando-lhe a responsabilidade pelo desaparecimento do pai no processo de procriação e sustentando serem elas as fabricantes de filhos privados da figura do terceiro que garante sua diferenciação. Como mostra Faure-Pragier (1997), a falha da inscrição da função paterna já se revela no discurso de grande parte das mulheres inférteis e, como observa Freud, ao questionar a consistência do complexo de Édipo no caso da menina, essa falha talvez seja em si mesma a marca da feminilidade, possivelmente definível em termos da incompletude de sua submissão à lógica edipiana.

Cabe, entretanto, não deixarmos de buscar compreender, caso a caso, como podem se articular, por um lado, o desejo da mulher de ter um filho que lhe permita separar-se da mãe, sem que, para isso, o pai se coloque necessariamente como objeto de investimento edipiano; por outro lado, o desejo, inverso, de não engravidar, pelo temor de identificação com a mãe e, por fim, a oferta médica de viabilizar, de inúmeras formas possíveis – entre as quais incluem-se a doação de sêmen, o recurso ao empréstimo de útero e o congelamento de embriões – a vinda de um filho.

Faure-Pragier (1997), assim como várias outras psicanalistas que empreendem uma reflexão sobre a clínica da infertilidade, sublinha a importância do reinvestimento do pai no discurso das pacientes como fator liberador da fertilidade. Será, entretanto, este o único caminho? Em que medida não se continua aqui a apostar, contrariamente àquilo para o que apontam o discurso dessas mulheres e as reformulações freudianas a partir de 1925, numa relação necessária entre fertilidade e desejo do filho edipiano? Que outras vias de direção de trabalho podem ser apontadas por esses discursos e essas elaborações? Eis algumas questões que, mesmo que não tenha ainda ferramentas suficientes para responder a contento, não deixo de julgar fundamental que sejam colocadas.

A posição do psicanalista diante das novas tecnologias reprodutivas: a armadilha de se fazer o garante da Ordem Simbólica

A eventual posição que resiste a escutar o discurso sobre o desejo de filho sem referi-lo ao desejo edipiano pode ser relacionada a uma outra posição, a saber, aquela que procura defender uma suposta ordem simbólica que rege as filiações, seja buscando defendê-la dos efeitos catastróficos das novas tecnologias reprodutivas sobre os “filhos da ciência”, seja sustentando que a solidez dessa ordem é de tal magnitude, que ela tem o poder de permanecer impassível a seus efeitos. Eis aqui as duas armadilhas que precisamos evitar. Enquanto a psicanalista Monette Vacquin (1994) parece situar-se na primeira posição, a antropóloga Françoise Heritier (1996), cujas análises sobre a filiação e as novas tecnologias reprodutivas têm grande influência sobre as reflexões psicanalíticas a esse respeito, ocupa, a nosso ver, de forma exemplar, essa última posição. Como observa a autora,

fez-se muito alusão nestes últimos anos à necessidade de mudanças fundamentais no domínio da filiação, à necessária invenção de novos modos de filiação que integrariam os diferentes tipos de reprodução medicamente assistida, quando eles recorrem a uma terceira pessoa situada fora do casal demandante. (p. 255).

Entretanto, sustenta Heritier (1996), por mais que se queira inovar, não teríamos como fazê-lo, pois inevitavelmente caímos em uma ou outra das únicas formas possíveis de filiação que as diversas sociedades, tradicionais ou modernas, sempre construíram artificialmente a partir do mesmo dado biológico incontornável que é a reprodução bissexuada. Com efeito, a seu ver, três dados biológicos de base se encontram no fundamento da combinatória própria a todos os sistemas de parentesco, independentemente das diferenças que eles possam revelar entre si, e que são: 1) o reconhecimento do caráter sexuado dos indivíduos que procriam, ou seja, do fato de que há apenas dois sexos e de que seu encontro é necessário à reprodução; 2) o reconhecimento do fato de que a reprodução produz uma sucessão de gerações cuja ordem natural não pode ser invertida; e 3) o reconhecimento de que vários indivíduos podem ter os mesmos pais, constituindo, assim, uma fratria e que a ordem de sucessão dos nascimentos no seio de uma mesma geração faz que se reconheça no seio das fratrias os irmãos mais velhos e os mais novos. Esses três dados biológicos – que exprimiriam a diferença no seio das relações masculino/feminino, pai/filho, mais velho/mais novo – constituem, portanto, para Heritier (1996), o “resíduo incontornável” ao qual o pensamento de todos os homens foi confrontado e que manipulou e continua manipulando sempre e em qualquer lugar o trabalho simbólico do parentesco.

Se, continua a sustentar a antropóloga, a filiação é sempre uma construção simbólica, portanto, uma escolha da sociedade – se não existem, até os nossos dias, sociedades humanas fundamentadas unicamente na consideração do engendramento biológico, nem tampouco que lhe tenham reconhecido o mesmo alcance da filiação socialmente reconhecida –, a margem de liberdade dessa escolha, visto esbarrar sempre no mesmo “resíduo incontornável”, é reduzida. E se para ela não há hoje margem alguma de invenção de novas filiações, é porque continuamos a esbarrar nesse mesmo resíduo. Em primeiro lugar, sustenta Heritier (1996), mesmo que, na atualidade, a reprodução tenha sido separada do sexo, mesmo que a aproximação física dos sexos opostos tenha se tornado dispensável à reprodução, a reprodução não deixou de ser sexuada. Em segundo lugar, mesmo que a possibilidade do congelamento de sêmen (e hoje também de óvulos e embriões) permita um grande intervalo de tempo entre o congelamento e a inseminação ou fertilização, intervalo que pode cobrir várias gerações, o pai vem sempre na frente do filho. Em terceiro lugar, mesmo que uma terceira ou uma quarta pessoa seja convocada a participar do engendramento de uma criança – doando óvulos, sêmen ou embriões, ou, ainda, emprestando seu útero –, a filiação não deixará de ser, como sempre o foi, artificial e arbitrariamente atribuída pela sociedade àqueles que ela legitimamente, segundo os arranjos simbólicos que a fundamentam, reconhece como Pater e Mater da criança. O que se evidencia aqui, observa a autora, é a separação, de modo algum nova e praticada em todas as sociedades, entre a filiação, fundada no laço social, e o engendramento, referido ao laço biológico. Portanto, “trata-se menos de modificar a nossa concepção da filiação do que de aceitar o fato, há muito tempo inscrito em nosso direito, que filiação e engendramento não são dois conceitos inextricavelmente ligados um ao outro” (Heritier, 1996, p. 280). Enfim, conclui a autora: fora das utopias da clonagem, onde desaparece o caráter bissexuado necessário da reprodução, não temos como conceber uma fórmula radicalmente diferente das fórmulas de filiação já existentes (p. 256).

Com efeito, segundo Heritier (1996), não apenas continuamos a esbarrar com o mesmo “resíduo incontornável” com o qual esbarraram as mais diversas sociedades, como também as aparentemente novas soluções técnicas que hoje a ciência nos permite montar para contornar o problema da infertilidade encontram seus equivalentes em soluções não técnicas, mas ancoradas na estrutura social e no imaginário coletivo, que sociedades tradicionais colocaram em prática para driblar os mesmos problemas. Um exemplo de equivalência com a inseminação artificial com doador é apontado na sociedade Samo, onde um homem estéril é reconhecido como o pai (Pater) de todos os filhos que suas esposas legítimas tiverem com outros homens, os quais são reconhecidos pela coletividade como genitores, mas não pais das crianças. Outro exemplo equivalente à inseminação artificial, bastante interessante e que nos fornece um rico material para reflexão, encontra-se na sociedade Nuer, na qual uma mulher estéril é transformada simbolicamente pela coletividade em homem e levada a se casar com outra mulher, de quem ela se tornará o marido. Essa relação conjugal, cabe observar, não inclui relações homossexuais. A esposa terá filhos provenientes de um encontro sexual com um homem, e esses filhos serão reconhecidos e se reconhecerão como filhos do casal legítimo constituído pelas duas mulheres, transformadas em mãe (Mater) e pai (Pater) da criança. A prática, bastante comum em diversas sociedades tradicionais, segundo a qual um homem pode procriar em nome do irmão morto é, por sua vez, apresentada como um equivalente da inseminação post mortem. Quanto à doação de óvulos ou embriões, entretanto, Françoise Heritier (1996) mostra-se mais cautelosa para apontar um equivalente. A esse respeito, observa: “não podemos, evidentemente, encontrar instituições sociais que equivaleriam literalmente ao dom de ovócitos ou de embriões” (p. 268). As soluções que incluem o dom de crianças lhe parecem, entretanto, poder ser aproximadas dessa primeira forma de dom. De qualquer forma, esta última dificuldade não a impede de concluir que “todas as fórmulas que pensamos serem novas são possíveis socialmente e foram experimentadas em sociedades particulares” (p. 272), tendo sempre em comum o fato de, em qualquer caso, ser a união legítima que cria a filiação da criança, cujas montagens são sustentadas sem ambiguidade pela lei do grupo e inscritas firmemente na estrutura social, não podendo ser atingidas por simples decisões individuais. “Essas sociedades não têm dois códigos com efeitos contraditórios” (p. 273), afirma Heritier.

O paradoxo dos novos métodos de reprodução não se encontra, portanto, ao ver da autora, nos abalos que causam aos nossos sistemas de filiação, mas, sim, no fato de eles permitirem que hoje se reivindique a preeminência do genético – como nos casos em que uma mulher, não podendo gestar, recorre a um útero de substituição, fundando sua maternidade no laço genético –; enquanto, em outros casos, recusa-se esse laço genético justamente para afirmar a maternidade da mãe que porta em seu ventre uma criança concebida por ovodoação; como também, em casos nos quais a criança não é nem concebida com o óvulo da mãe nem gestada em seu ventre e a maternidade vem a ser fundada única e inteiramente no laço afetivo. A mesma ambiguidade, excluindo-se evidentemente, pelo menos por enquanto, a possibilidade da gravidez, pode ser apontada no que concerne à paternidade. O que é problemático, portanto, para a autora não são os avanços da ciência no campo da reprodução, mas o encontro deles com o primado, este, sim, novo, da noção de indivíduo, primado que lança nossas civilizações em uma zona fronteiriça onde “cada um recorre a seu bel-prazer, em função de seus interesses, seja ao biológico, seja ao social” (p. 275). Ou seja, “o que é problemática é a possibilidade oferecida aos diferentes indivíduos de se referir segundo a conveniência e o desejo do momento seja à filiação social seja à verdade biológica para reivindicar ou recusar uma criança” (p. 273).

A conclusão, portanto, de Françoise Heritier (1996) é bastante clara: os arranjos parentais que as novas tecnologias reprodutivas colocam em cena não nos convocam a inventar novas formas de filiação; elas não abalam de modo algum a ordem simbólica, fundamentada na diferença entre os sexos e as gerações, que sempre e em qualquer lugar regeu, a partir dos mesmos dados biológicos de base, as combinatórias do parentesco. O que precisamos não é olhar para a frente, para o que está por vir, mas para trás, de modo a não esquecer que a filiação, mesmo que sempre limitada aos dados biológicos, nunca, em sociedade alguma, das mais tradicionais às mais civilizadas, é sempre “um efeito da arte” (p. 285). Mais precisamente, sustenta a autora, não é possível associarmos essa concepção da filiação, que nunca deixou de nos marcar, com aquela que os avanços científicos parecem hoje nos oferecer: a filiação puramente biológica. Não é possível transitarmos, segundo as conveniências individuais, entre dois critérios diferentes de filiação, os quais, cabe observar, muitas vezes são simultaneamente convocados por um casal para fundar seus laços parentais com a criança, como nos casos em que o sêmen do marido é inseminado em uma mulher que emprestará seu útero para que o casal tenha seu filho. Aqui, enquanto a filiação paterna poderá sustentar-se inteiramente no laço genético, a filiação materna será inequivocadamente social.

Cabe agora questionarmos em que medida, enquanto psicanalista, podemos concordar inteiramente ou não com a posição de Heritier (1996), seja no que concerne à sua concepção segundo a qual as novas tecnologias reprodutivas não trazem abalo algum à ordem simbólica que sempre regeu, dentro do contexto das limitadas combinatórias tornadas possíveis pelos mesmos dados de base, as nossas sociedades, seja no que se refere à critica por ela feita à novidade contemporânea, a saber, o recurso a duas formas distintas de filiação – biológica e social –, recurso este que ignora o fato de que toda e qualquer filiação não pode ser senão simbólica.

Em primeiro lugar, sustenta Heritier (1996), mesmo tendo o encontro sexual dos corpos se tornado hoje prescindível à reprodução, esta não deixa de supor, visto não ter deixado de ser sexuada, o encontro entre os dois sexos. Portanto, observa a antropóloga, a esse respeito, nada mudou. Mas cabe perguntar, para a psicanálise, esse não tão sutil deslocamento – dos pais para os gametas – se dá sem que se operem consequências? Quais podem ser os efeitos do desaparecimento do encontro sexual dos pais (mesmo que se mantendo aquele de seus gametas, ou ainda de gametas não necessariamente seus) enquanto ato originário da criança? É possível continuarmos pensando da mesma forma a cena originária, concedendo-lhe o mesmo valor estruturante a que a ela é concedida quando não há mais necessariamente ato sexual originário? Seria possível pensarmos que novos elementos de base passariam a se combinar na constituição dessa cena? Ou ela simplesmente deixaria de encontrar as condições de possibilidade de sua construção?

Segundo a concepção um tanto quanto catastrófica de Monette Vacquin (1994), ao expor o encontro dos gametas aos nossos olhos, ao abolir a distância metafórica que manteria na reserva do imaginário os fantasmas da origem da vida, a FIV nos impediria de fantasmar o irrepresentável, o próprio lugar da origem de um indivíduo, o próprio lugar da origem do pensamento. Assim, conclui a psicanalista, “que o homem desloque o lugar de sua origem do não controle e da alteridade para situá-lo sob o signo do controle, não seria na sua capacidade de se reproduzir que ele tocaria, mas na sua capacidade de pensar” (Faure-Pragier, 1997, p. 220). Criticando a autora, Faure-Pragier (1997) sustenta que o saber, e podemos acrescentar também o fazer científico sobre a reprodução se transforma, a seu ver, numa verdadeira transgressão de um mistério cuja insondabilidade seria necessária à qualidade da elaboração psíquica e garante das capacidades de simbolização da criança. Entretanto, sustenta ela, o mistério, mesmo não se encontrando mais no coito fecundante, permanece: “ele recua à incompreensível atração de um espermatozoide particular pelo óvulo” (pp. 215-216), e o grande número de fracassos, incompreensíveis para a ciência, seria a esse respeito exemplar.

Cabe, entretanto, nos perguntarmos se essa discussão das autoras em torno da necessidade de preservação do mistério inaugural da vida não nos afasta do que é fundamental, a saber, a desfamiliarização dessa origem, que deixa os íntimos aposentos dos pais, para se expor publicamente nas provetas dos laboratórios. O que talvez precisamos questionar são alguns pressupostos da psicanálise que levam até mesmo psicanalistas que trabalham diretamente com as questões das novas tecnologias reprodutivas, como Geneviève Delaisi de Parseval (2008), a afirmar categoricamente que, “se os pais não têm vida sexual, a criança poderá ter dificuldades em construir a sua identidade sexuada, [visto que] uma criança tem necessidade de saber que, uma vez fechada a porta do quarto de seus pais, algo se passa ali, do qual ela está excluída” (p. 296). Será, de fato, possível continuar a acreditarmos nessa suposta verdade inquestionável, quando a origem da criança não tem mais necessariamente nada a ver com o que se passa nesse quarto? Esse deslocamento, do quarto para o laboratório, não estaria desmontando a costura que Foucault revelou ter sido operada por Freud entre os dispositivos da sexualidade e da aliança? São essas algumas das questões que, a nosso ver, o deslocamento do encontro sexual fecundo entre um homem e uma mulher para o encontro fértil dos gametas no lugar do ato inaugural da vida deve levar o psicanalista a se colocar.

Além do caráter sexuado, mantêm-se também, ao ver de Françoise Heritier (1996), os dois outros dados biológicos da reprodução que constituem o “resíduo incontornável” sobre o qual se fundam as operações simbólicas de filiação. Mesmo a possibilidade de congelamento de sêmen, óvulos e embriões não torna possível a inversão da sucessão de gerações que a reprodução produz, nem tampouco elimina a organização da fratria nos termos da sucessão dos nascimentos. Aqui, entretanto, cabe questionarmos se os casos já amplamente divulgados de mulheres que foram inseminadas com o material genético de suas filhas, dando à luz crianças que eram ao mesmo tempo netas e filhas da mesma mulher, assim como de gêmeos originados da mesma concepção, mas cujos nascimentos foram separados por um grande intervalo temporal, não têm o poder de embaralhar o referencial da diferença entre as gerações e da ordem regulatória das fratrias.

Detenhamo-nos agora na sustentação pela autora do fato que nada há de novo no recurso feito pela ciência a pessoas outras que os pais sociais – os doadores de sêmen, óvulos ou embriões, assim como as doadoras temporárias de útero – para engendrar uma criança, visto que, nesses casos, o que se opera em nada se distingue daquilo em que sempre se fundou a filiação, a saber, a separação entre genitores e pais. É, entretanto, possível, concordarmos inteiramente com a antropóloga a esse respeito? O arranjo simbólico sobre o qual Freud sustentou o complexo de Édipo, e Lacan, a noção de Nome-do-Pai – a saber, a evidência da maternidade e a incerteza da paternidade –, não diferenciava justamente a função materna, ancorada na evidência biológica, da função paterna, esta, sim, eminentemente simbólica? Como inúmeros autores já sublinharam, não é apenas com os avanços da ciência no campo da reprodução que essa certeza no lugar da mãe desaparece definitivamente?

Além disso, não nos parece desprezível, se levarmos em consideração as técnicas modernas de reprodução, o fato observado pelo antropólogo Maurice Godelier (2004) de que “o que é novo é que é preciso três corpos no lugar de dois para fazer uma criança” (p. 575). Ou, ainda, que

O processo clássico, milenar, da maternidade, que faz com que se encadeiem no corpo de uma mulher fecundação, gravidez, parto e primeiros cuidados à criança, é suscetível de ser fragmentado e composto em momentos a partir de agora dissociados e realizados em dois corpos distintos de mulheres. (p. 570)

Portanto, o novo são a multiplicação dos corpos e a fragmentação do processo reprodutivo. Seríamos mais precisos ainda indicando que não apenas os corpos se multiplicam como também se fragmentam. Portanto, trata-se mais precisamente de uma multiplicação de corpos fragmentados ou ainda de fragmentos de corpos. Como observa Le Breton (2007), “o corpo é hoje menos um destino do que um reservatório de elementos destacáveis e manipuláveis a serem trabalhados” (p. 83), fato que se revela na indústria do design corporal – body building, cirurgias plásticas e de transgenitalização, implantes de memória, etc. –, nas experiências artísticas contemporâneas, e, enfim, no processo reprodutivo. Seguindo o belo texto de Jorge Coli (2003), podemos notar que o desmembramento da divina unidade do corpo, sua desmontagem em partes autônomas e a criação de novas unidades a partir da aglutinação dessas partes, processos que se desenvolvem paralelamente no campo das artes e das ciências a partir do século XVIII, conhecem nas mais recentes tecnologias reprodutivas seu mais estranho ápice.

Recebido em: 23/10/2012

Aceito em: 12/6/2013

Simone Perelson, psicanalista e professora adjunta do Programa de Pós-Graduação em Teoria Psicanalítica e da Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Membro do Espaço Brasileiro de Estudos Psicanalíticos. Endereço eletrônico: simoneperelson@oi.com.br

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  • Vacquin, M. (1994). Frankenstein ou les délires de la raison Paris: Éditions Juliard.
  • 1
    O Hospital Pérola Byington e o Hospital das Clínicas, ambos de São Paulo, o Hospital Regional da Asa Sul do Distrito Federal e o Instituto Materno Infantil de Pernambuco são as únicas instituições no Brasil que oferecem o tratamento completo sem custo para os pacientes. Os hospitais que oferecem parte do tratamento gratuito e cujos medicamentos são pagos pelo paciente são: Hospital Universitário de Ribeirão Preto, Hospital Universitário da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais, Hospital das Clínicas e Hospital Fêmina, ambos de Porto Alegre (Garcia, Bellamy, & de Russi, 2012).
  • 2
    Como no Brasil não há nenhuma legislação que determine os critérios de elegibilidade para o tratamento – há apenas as normas do Conselho Federal de Medicina –, os médicos muitas vezes se veem desamparados diante de demandas de tratamento que implicam a constituição de arranjos familiares que contradizem o que é socialmente aceito ou naturalmente viável. Mais adiante, será apontado um exemplo de uma demanda dessa ordem.
  • 3
    Não teorizarei aqui a respeito da diferença entre essas duas ordens de demanda. Não cabe, entretanto, ignorar sua existência.
  • 4
    As concepções de Marie-Magdeleine Chatel são mais extensamente desenvolvidas em Perelson (2007).
  • 5
    Essa situação é ilustrada por Faure-Pragier por meio de um caso clínico em que uma infertilidade sobrevém após a morte de um filho. Que a mãe não possa lhe dar um substituto, observa a psicanalista, a desola e, ao mesmo tempo, a encanta. A prova de fidelidade ao filho morto aparece aqui como um sentido possível para a infertilidade.
  • 6
    Cabe observar, entretanto, como sublinha Faure-Pragier, que a realização do luto pode conduzir também ao abandono do desejo de gravidez, que muitas vezes, nesse caso, confunde-se com o desejo de substituir aquele que foi perdido. Notemos que aqui o êxito do tratamento analítico não se confunde com a obtenção da gravidez.
  • 7
    Ver, a esse respeito, Perelson (2008).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      28 Ago 2013
    • Data do Fascículo
      Ago 2013

    Histórico

    • Recebido
      23 Out 2012
    • Aceito
      13 Jun 2013
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