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O PODER (NEURO)PSIQUIÁTRICO: A PSICOPATOLOGIZAÇÃO DO COTIDIANO NA ERA DO CÉREBRO

EL PODER (NEURO)PSIQUIÁTRICO: LA PSICOPATOLOGIZACIÓN DE LA VIDA COTIDIANA EN LA ERA DEL CEREBRO

(NEURO)PSYCHIATRIC POWER: THE PSYCHOPATHOLOGIZATION OF EVERYDAY LIFE IN THE BRAIN ERA

Resumo

Esta pesquisa pretende demonstrar como, em decorrência das alianças entre a psiquiatria e neurociências, emerge uma realidade social em que o diagnóstico psiquiátrico é extremamente disseminado, abarcando um número cada vez maior de pessoas e de situações. Logo, questiona-se como a reformulação do poder psiquiátrico, embasada na explicação cerebralista dos transtornos mentais, auxilia a expansão dos processos de psicopatologização do cotidiano. A hipótese é que o próprio saber-poder médico-psiquiátrico vem contribuindo para sua amplificação, confirmando-se como umas das práticas mais sensíveis em termos biopolíticos na atualidade. Nesse sentido, aplicando-se a técnica de pesquisa da documentação indireta e o método dedutivo, foi realizada uma revisão bibliográfica de cunho crítico e interdisciplinar. Testada a hipótese principal, concluiu-se, ao final, que a patologização generalista do sofrimento psíquico corresponde a um novo reducionismo biológico, o qual cria um novo modelo de controle social, embasado, agora, na chamada neuropsiquiatria.

Palavras-chave
Neurociências; Subjetividade; Psiquiatria; Controle; DSM

Resumen

Esta investigación pretende demostrar cómo de las alianzas entre la psiquiatría y las neurociencias emerge una realidad social en la que el diagnóstico psiquiátrico está extremadamente difundido, abarcando un número creciente de personas y situaciones. Por tanto, cuestiona cómo la reformulación del poder psiquiátrico, a partir de la explicación cerebralista de los trastornos mentales, ayuda a la ampliación de los procesos cotidianos de psicopatologización. La hipótesis es que el propio saber-poder médico-psiquiátrico viene contribuyendo a su amplificación, confirmándose como una de las prácticas más sensibles hoy en día en términos biopolíticos. En este sentido, aplicando la técnica de investigación de la documentación indirecta y el método deductivo, se realizó una revisión bibliográfica crítica e interdisciplinaria. Una vez contrastada la hipótesis principal, concluye, finalmente, que la patologización generalista del sufrimiento psíquico corresponde a un nuevo reduccionismo biológico, que crea un nuevo modelo de control social, ahora basado en la denominada neuropsiquiatría.

Palabras clave
Neurociencias; Subjetividad; Psiquiatría; Control; DSM

Abstract

This research aims to demonstrate how a social reality emerges from the alliances between psychiatry and neurosciences in which psychiatric diagnosis is extremely disseminated, encompassing an ever-increasing number of people and situations. Therefore, it questions how the reformulation of psychiatric power, based on the cerebralist explanation of mental disorders, helps the expansion of everyday psychopathologization processes. The hypothesis is that medical-psychiatric knowledge-power itself has been contributing to its amplification, confirming itself as one of the most sensitive practices today in biopolitical terms. In this sense, applying the research technique of indirect documentation and the deductive method, a critical and interdisciplinary bibliographical review was carried out. Having tested the main hypothesis, it concludes, in the end, that the generalist pathologization of psychic suffering corresponds to a new biological reductionism, which creates a new model of social control, now based on the so-called neuropsychiatry.

Keywords
Neurosciences; Subjectivity; Psychiatry; Control; DSM

Introdução

O presente estudo pretende analisar a atual posição da psiquiatria no paradigma neurocientífico, demonstrando como a concretização de um novo saber fundamentado no substrato biológico e na elaboração de um novo manual diagnóstico “ateórico” foram cruciais para uma formação social na qual o sofrimento psíquico é cada vez mais disseminado. Esses fatores são de indispensável averiguação, uma vez que tal dinâmica demonstra algo relevante sobre a vivência contemporânea, sobretudo para a própria estruturação das subjetividades. Logo, é preciso atentar-se ao fato de que esse fenômeno possui implicações em diversas áreas do conhecimento, inclusive no âmbito dos estudos sobre controle social.

Nesse contexto, ao se aproximar o exame do aumento do diagnóstico psiquiátrico às complexas práticas de controle e normalização da vida, a pesquisa gira em torno, fundamentalmente, do seguinte questionamento: como a reformulação do poder psiquiátrico, baseado na explicação cerebralista dos transtornos mentais, auxilia na expansão do processo de psicopatologização do cotidiano?

Destarte, na busca de respostas para o referido questionamento, aplicou-se a técnica de pesquisa da documentação indireta e o método dedutivo, efetuando-se uma revisão bibliográfica de cunho crítico e interdisciplinar, a qual teve como base a teoria foucaultiana sobre controle social. Em suma, foram verificados três eixos essenciais de pesquisa, quais sejam: o papel das neurociências no contexto do estudo apresentado, a psiquiatria biológica e a concepção do DSM-V como um dispositivo de controle biopolítico. Ao final, o que se pôde concluir é que o modelo (neuro)psiquiátrico fortificou-se como uma das formas mais eficientes de modulação da vida e das subjetividades, maximizando, em grande medida, os processos de psicopatologização do cotidiano.

O papel das neurociências

Na contemporaneidade, pode-se perceber uma certa tendência em atrelar as dinâmicas psíquicas ao componente cerebral. Como referiu Nikolas Rose (1999Rose, Nikolas (1999). Governing the soul: The shaping of the private self (2ª ed.). Free Association Books., p. 18), se ao longo da primeira metade do século XX o prefixo psy foi anexado a muitos campos de investigação do comportamento humano, parecendo vincular expertise e autoridade a um corpo de conhecimento objetivo sobre os seres humanos, agora emerge uma crença materialista, em que o prefixo “neuro”, ligado a uma concepção cerebralista e material do psiquismo, passa a ser invocado da mesma forma.

Portanto, não será à toa que a Organização Mundial da Saúde (WHO) passou a considerar quadros neurobiológicos um dos maiores riscos à saúde pública. Ainda, embora falem em saúde mental, sucessivos diretores do Instituto Nacional de Saúde Mental dos EUA (NIMH), a maior organização científica do setor no mundo, têm insistido que os transtornos mentais devem ser entendidos e tratados como transtornos cerebrais (Vidal & Ortega, 2019Vidal, Fernando & Ortega, Francisco (2019). Somos nosso cérebro? Neurociência, subjetividade, cultura. N-1 Edições., p. 13).

Portanto, importante perceber que isso é consequência direta de um longo e abrangente processo. Entre o final do século XX e início do século XXI, surgiu um movimento que alguns autores chamam de “virada neurocientífica”, no sentido de apontar a emergência de uma série de pesquisas que objetivavam atribuir praticamente tudo a esta dimensão neurológica. Trabalhos como o de Benjamin Libet, ainda na década de 80, sobre a impossibilidade do livre arbítrio (Galicia, 2013Galicia, Molina René (2013). Neurociencia, neuroética, derecho y processo. In Michele Taruffo (Org.), Neurociencia y proceso judicial (pp. 43-82). Marcial Pons Ediciones Jurídicas y Sociales., p. 54), demonstravam muito bem como os entusiasmos frenológicos ganhavam cada vez mais espaço.

Principalmente a partir dos anos 90, a neurociência recebeu um upgrade tecnológico que fez toda a diferença na sua história. Com o surgimento das neurotecnologias da verdade, como o FMRI (do inglês functional magnetic resonance imaging), disseminou-se a ideia de que era possível ler a mente através do cérebro. O FMRI prometia desvendar quando o sujeito estava mentindo, analisando a variação dos fluxos sanguíneos em determinadas áreas do cérebro. A partir dessa variação e de suas reações específicas, identificar-se-ia o momento em que a pessoa falava ou não a verdade. Evidentemente, outras técnicas já tentaram fazer o mesmo, contudo, foram extremamente criticadas (como é o exemplo do polígrafo). Em tese, o FMRI seria uma aposta nova, muito mais confiável que os antigos detectores (Taruffo, 2013Taruffo, Michele (2013). Proceso y neurociencia. Aspectos generales. In Neurociencia y proceso judicial (pp. 15-24). Marcial Pons Ediciones Jurídicas y Sociales., pp. 15-24).

Todavia, para Michele Taruffo (2013Taruffo, Michele (2013). Proceso y neurociencia. Aspectos generales. In Neurociencia y proceso judicial (pp. 15-24). Marcial Pons Ediciones Jurídicas y Sociales.), existem dúvidas relevantes sobre a real eficácia desse método, já que não há certezas em relação à causalidade direta entre os fenômenos cerebrais identificados no FMRI e o fato de o sujeito mentir. Na verdade, as provas que tentam demonstrar a existência dessa conexão são questionáveis, uma vez que os estudos publicados são poucos e não são coerentes entre si. Além disso, existem dúvidas se os grupos que fizeram parte dos estudos poderiam representar a população em geral, pois, muitas vezes, estes eram guiados no momento de darem as respostas (Taruffo, 2013, pp. 15-24).

Não obstante, esses são apenas alguns dos exemplos que mostram a existência de um movimento de larga escala, que no final do século XX culminou na incorporação acadêmica de uma “ideologia da cerebralidade”. Nessa época, houve uma grande multiplicação dos projetos intelectuais e institucionais cujos nomes combinam o prefixo neuro às chamadas NeuroX: disciplinas que postulam que “a mente é o que o cérebro faz” (uma verdade geral e consolidada) e que objetivam descobrir os substratos neurobiológicos por meio da neuroimagem. Assim, os resultados das pesquisas NeuroX são obtidos a partir do FMRI e dos correlatos neurais dos processos e comportamentos estudados (Vidal & Ortega, 2019Vidal, Fernando & Ortega, Francisco (2019). Somos nosso cérebro? Neurociência, subjetividade, cultura. N-1 Edições., p. 84). O problema é que, na tentativa de transformar correlações em causas, as neurodisciplinas não conseguem explicar o significado real dos dados e o papel das estruturas identificadas. Por isso, existe grande debate sobre a eficácia metodológica do FMRI. Por exemplo, a neurocientista Susan Fitzpatrick (2012Fitzpatrick, Susan M. (2012). Neuro-Turm or Wrong Turn. In Melissa Littlefield & Jenell Johnson (Orgs.), The Neuroscientific Turn: Transdisciplinarity in the Age of the Brain (pp. 180-198). The University of Michigan Press. , pp. 180-182) entende que a neuroimagem funcional não é o meio adequado para identificar os correlatos neurais de tarefas cognitivas ou comportamentais. Ademais, para a autora, os problemas principais não são técnicos, eles são conceituais e independem do avanço tecnológico utilizado.

Conforme Fitzpatrick enfatiza, a interpretação das mudanças na atividade neural que revela a neuroimagem “não faz sentido sem uma teoria das operações cognitivas envolvidas na realização das tarefas experimentais, e um conjunto de tarefas bem concebido para testar a teoria” (2012Fitzpatrick, Susan M. (2012). Neuro-Turm or Wrong Turn. In Melissa Littlefield & Jenell Johnson (Orgs.), The Neuroscientific Turn: Transdisciplinarity in the Age of the Brain (pp. 180-198). The University of Michigan Press. , p. 188). Logo, o que se pode subtrair dessa afirmação de Fitzpatrick é que se trata, antes de tudo, de um problema metodológico. Como a neuroimagem vai identificar “correlatos neurais de tarefas cognitivas” se nem mesmo conceitua o que são estes termos/fatores? É por isso que a autora chama atenção para o fato de que é importante a elaboração de uma teoria para explicar o que são essas operações cognitivas envolvidas na realização das tarefas experimentais. Em outras palavras, não adianta deslocar correlação para causas se a própria conceituação dos elementos envolvidos não é realizada. Além disso, a tentativa de inferir a presença de processos mentais específicos a partir de ativações detectadas nas áreas cerebrais supostamente correspondentes também se mostra falha, já que produzir imagens do cérebro não quer dizer que serão fornecidas informações da mente. Ao mostrar as áreas de ativação e tentar correlacionar com alguns estados mentais, cai-se novamente no mesmo erro metodológico referido anteriormente.

Embora sejam diversas as falhas na metodologia mencionada, é ela que na maioria das vezes dá forças ao alastramento do prefixo neuro, principalmente dentro do saber psiquiátrico e das instituições que o mantém, o exercem e o produzem. É isso o que se pode observar no documento oficial emitido em 2007 pela American Psychological Association (APA, 2007American Psychological Association - APA. (2007). Functional magnetic resonance imaging: a new research tool. Author., p. 2) quando afirma que o FMRI “não é exatamente um leitor de mentes, mas chega perto”.

Por isso, quando se fala em cerebralizar o psiquismo, muitos questionamentos vêm à tona. Um deles é pensar que tipo de seres são os humanos, afinal de contas. A questão pode parecer demasiado filosófica ou abstrata, mas, certamente, não é. Mesmo que haja grande avanço nos estudos sobre o cérebro, será que se pode, realmente, reduzir o funcionamento da mente às funções cerebrais? Ao longo das últimas décadas, pesquisadores como Libet,

Elwood Wright, Bertram Feinstein e Pearl Dennis (1979Libet, Benjamin, Wright, Elwood W., Feinstein, Bertram, & Pearl, Dennis K. (1979). Referência subjetiva do tempo para uma experiência sensorial consciente - um papel funcional para o sistema de projeção específico somatossensorial no homem. Cérebro, 102, 193-224, https://doi.org/10.1093/brain/102.1.193
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) e Libet (1982Libet, Benjamin (1982). Brain stimulation in the study of neuronal functions for conscious sensory experiences. Human Neurobiology, 4, 235-242. PMID: 6309708. ) passaram a afirmar que a resposta para esta pergunta é positiva, afirmando que o órgão deteria a chave para descobrir o que há de mais profundo no humano. Em que pese não haver dúvida que existe uma conexão entre cérebro e mente, porém, deve-se ficar atento à simplificação e reducionismo que, não raro, o assunto enseja.

Apesar das grandes ressalvas que podem ser feitas, a dimensão neurológica segue ganhando forças no imaginário científico e social. Evidentemente, isso ocorre não só pelo vasto apoio que recebe de instituições importantes como a APA ou o NIMH (National Institute of Mental Health), mas também porque a utilização do léxico “neuro” ou o uso da neuroimagem faz com que as pessoas tendam a acreditar mais nesse argumento em detrimento de outros.

Não seria um exagero, assim, afirmar que se produz um processo de remodelação que abrange até mesmo a esfera cultural. É notável o número de livros sobre o cérebro no âmbito acadêmico e para leitores leigos que estão no mercado, além do vasto número de informações que são divulgadas, afirmando que os assuntos humanos devem ser regidos à luz do conhecimento neurocientífico. Nesse sentido, o trabalho de Felipe Lisboa e Rafaela Zorzanelli (2014Lisboa, Felipe Stephan & Zorzanelli, Rafaela Teixeira (2014). Metáforas do cérebro: uma reflexão sobre as representações do cérebro humano na contemporaneidade. Physis, 24. https://doi.org/10.1590/S0103-73312014000200003
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) apresenta a importância do uso de metáforas do cérebro humano em materiais de divulgação científica. Como observam os autores, as metáforas aproximam o público leigo de certos sentidos atribuídos ao cérebro, facilitando a sua ascensão como o órgão da mente. Ou melhor, o órgão que representa a origem das funções mentais.

Ademais, uma série de neurotecnologias foram inventadas e se espalharam na sociedade de modo grandioso. Novas drogas (psicofármacos), dispositivos e técnicas fortificaram a incidência do cerebralismo, principalmente dentro da psiquiatria, abrindo portas para novas estratégias de intervenção e controle social (conceito aqui embasado, principalmente, na doutrina de Michel Foucault).

Destarte, é necessário ressaltar que, quando se fala em controle social, fala-se, essencialmente, dos mecanismos que se empenham em cuidar da construção de um sujeito que, em termos gerais, adequa-se à ordem estabelecida, por meio de processos disciplinadores e biopolíticos. Nesse sentido, conforme se observa na obra de Foucault, o saber médico-psiquiátrico possui papel fundamental, uma vez que estaria presente em ambos os processos, governando o corpo e a mente do sujeito, moldando-os conforme os padrões de normalidade aceitos (Foucault, 1988Foucault, Michel (1988). História da Sexualidade I: A Vontade de Saber. Graal., 1997Foucault, Michel (1997). A história da loucura na idade clássica (5ª ed.). Perspectiva., 2008Foucault, Michel (2008). Segurança, território, população. Martins Fontes., 2010Foucault, Michel (2010). Em defesa da sociedade (2ª ed.) Martins Fontes., 2012Foucault, Michel (2012). O poder psiquiátrico (2ª ed.). Martins Fontes.).

Por isso, nota-se que a psiquiatria era um nicho óbvio de aplicação das pesquisas neurocientíficas, especialmente por causa da crença, desde a década de 1950, de que o tratamento farmacológico seria eficaz porque agia diretamente na neurobiologia que sustentava o transtorno mental. O termo neuropsiquiatria já tinha sido usado na década de 1920, contudo, foi no início do século XXI que ele passou a ter um sentido específico: mostrava que o futuro da psiquiatria estava na integração de insights da genética e da neurobiologia à prática clínica (Rose & Abi-Rached, 2013Rose, Nikolas & Abi-Rached, Joelle (2013). Neuro: the new brain sciences and the management of the mind. Princeton University Press., p. 6).

Logo surgiu um olhar neuromolecular intrinsecamente ligado ao desenvolvimento da psicofarmacologia e ao crescente recurso a drogas para o tratamento de pessoas diagnosticadas com doença mental, dentro e fora dos muros do asilo. Muitas descobertas sobre mecanismos moleculares foram feitas no curso das tentativas de identificar o modo de ação das drogas, quase sempre usando modelos animais. Pesquisas utilizando tais modelos se concentraram nas propriedades moleculares de drogas que pareciam agir em estados mentais e comportamentais, levando quase que inescapavelmente à crença de que as anomalias deveriam ser compreendidas em termos de distúrbios específicos, interrupções ou defeitos em processos neuromoleculares. Uma vez que as drogas pareciam afetar os componentes neurotransmissores, isso levou tanto ao triunfo da visão química sobre a visão elétrica, que antes era dominante, quanto à crença de que os defeitos na neurotransmissão sustentam a maioria quando não todos os transtornos mentais (Rose & Abi-Rached, 2013Rose, Nikolas & Abi-Rached, Joelle (2013). Neuro: the new brain sciences and the management of the mind. Princeton University Press., p. 89).

Evidentemente, esse “imaginário psicofarmacológico” possibilitou o crescimento de novas transações entre laboratório, clínica, comércio, reforçando no cotidiano a força da visão neurocêntrica do ser humano. Conquanto ela não seja hegemônica nem monolítica, não se deve relegar o fato de que é poderosa e cada vez mais disseminada. Além disso, existe um problema ainda mais importante no âmago desse neurocentrismo: o fato de que, no seu âmago, não depende de conhecimento científico propriamente dito. Uma característica desse fenômeno é que não há uma hierarquia entre o científico e o senso comum, ou seja, as práticas e as formas de conhecimento acabam se retroalimentando (Vidal & Ortega, 2019Vidal, Fernando & Ortega, Francisco (2019). Somos nosso cérebro? Neurociência, subjetividade, cultura. N-1 Edições., p. 28).

Por isso, o que está em jogo não é a ciência nem fatos determináveis, mas uma ideia de ser humano, a “figura antropológica do sujeito cerebral - uma ‘ideologia’ no sentido subjetivo de um conjunto de ideias, crenças, valores, interesses e ideais” (Vidal & Ortega, 2019Vidal, Fernando & Ortega, Francisco (2019). Somos nosso cérebro? Neurociência, subjetividade, cultura. N-1 Edições., p. 28). Desse modo, é possível constatar que existe todo um processo de subjetivação que gira em torno dessa “ideologia do cérebro”, produzindo diferentes consequências, como a ênfase em (re)medicalização e o aumento do diagnóstico (neuro)psiquiátrico. Por mais que tais narrativas marquem a contemporaneidade, a importância do cérebro é algo que remonta ao início da Idade Moderna. Ela aparece mais diretamente relevante para muitas das questões que, nas tradições filosóficas, morais e políticas ocidentais, têm sido centrais para a definição da identidade pessoal. Conceber pessoalidade como cerebralidade, de acordo com Fernando Vidal e Francisco Ortega (2019, p. 41), foi possibilitado por sistemas de pensamento do início da modernidade que conceitualizam self e corpo de tal modo que o corpo, embora importante do ponto de vista experiencial, tornou-se ontologicamente secundário.

Por exemplo, para John Locke (1999Locke, John (1999). Ensaio acerca do entendimento humano. Nova Cultural.), a “pessoa” seria um ser autoconsciente, inteligente, que reflete e raciocina sobre si mesmo, sendo, ainda, capaz de se perceber no passado, de se reconhecer no presente e de se conceber no futuro. Desse modo, a pessoalidade poderia ser ligada a qualquer substância material. Entretanto, como memória e consciência eram associadas ao conteúdo da cabeça, o cérebro era o único órgão necessário para ser uma pessoa. Em suma, constata-se que, na verdade, o sujeito cerebral não é consequência de nenhum avanço neurocientífico, mas sim uma posição filosófica ou metafísica, uma figura antropológica característica do pensamento moderno, fato este que, na maioria das vezes, é ignorado. Mesmo que essa visão não se traduza automaticamente em consentimento público, isso não quer dizer que não traga consequências diretas para a vida de todos. Exemplo significativo, indispensável para nossos objetivos, é observável na atividade psiquiátrica, que passou por uma reformulação totalmente exposta aos estudos neurocientíficos. Com isso, o “poder psiquiátrico” (Foucault, 2012Foucault, Michel (2012). O poder psiquiátrico (2ª ed.). Martins Fontes.) agora também adotou o prefixo neuro, constituindo-se como uma das especialidades médicas mais disseminadas entre (sobre) a população.

A psiquiatria biológica

De acordo com Foucault (1997Foucault, Michel (1997). A história da loucura na idade clássica (5ª ed.). Perspectiva., p. 150), no século XIX, a doença, em geral, significava uma modificação da estrutura física, algo visível, como uma lesão ou uma fratura, por exemplo. Por isso, a dissecação do corpo acabou sendo permitida, e a anatomia era a base da ciência médica. Foi assim que surgiu a clínica: procurando entender a doença por meio do corpo morto.

Nesse contexto, a moderna psiquiatria também se formou com base nessas práticas. A doença mental deveria ser detectada a partir das mesmas premissas. Contudo, o ponto-chave era a observação do comportamento. De acordo com Franco Basaglia (1982Basaglia, Franco (1982). Psiquiatria Alternativa: contra o pessimismo da razão, o otimismo da prática (3ª ed.). Brasil Debates., pp. 51-54), assim como a medicina científica surgiu da verificação cadavérica, a psiquiatria ergueu-se também sobre uma mente sem vida, em uma espécie de análise da “anatomia mental”. Portanto, desde o seu surgimento, a psiquiatria já buscava as causas físicas dos distúrbios psíquicos. Para Thomas Szasz (1979Szasz, Thomas (1979). O mito da doença mental. Zahar., p. 33), o protótipo das patologias comportamentais que melhor representa o espírito da época foi a histeria de conversão e a luta de Charcot para tentar fazê-la uma desordem neurológica. Luta porque, apesar das tentativas, nunca ficou comprovada qualquer lesão neural que pudesse ser identificada como causa.

Na realidade, o corpo, a doença e a vida eram consideradas coisas de extremidades diferentes. A loucura não era uma doença, mas o extremo dos defeitos. Isso se comprova pelo fato de que os psiquiatras cuidavam de indivíduos considerados: grandes mentirosos, espíritos inquietos e tristes (Foucault, 1997Foucault, Michel (1997). A história da loucura na idade clássica (5ª ed.). Perspectiva., p. 151). Por isso, o tratamento moral era a base da terapêutica psiquiátrica (tanto em nível individual quanto institucional). Entretanto, tal realidade transformou-se. Por volta de 1960, a psiquiatria ainda bastante embasada no modelo psicanalítico, encontrava-se em uma grave crise que exigia reformulações. Com o advento da criminologia crítica, as instituições totais tornaram-se alvos de julgamento e de planos modificadores. Além das agências punitivas tradicionais (prisões, escolas e quartéis, por exemplo), no campo psiquiátrico, os manicômios e os efeitos iatrogênicos da clínica também passaram a ser objeto de repúdio, principalmente após as críticas de Erving Goffman (1974Goffman, Erving (1974). Manicômios, prisões e conventos. Perspectiva.), influenciando consideravelmente a criação do movimento político antipsiquiátrico e antimanicomial.

No Brasil, desde o pioneirismo terapêutico de Nise da Silveira, o movimento cresceu com relevância, iniciando uma grande reforma. Com a influência das ideias de Basaglia, Szasz e do pensamento crítico de Foucault, várias instituições manicomiais, já denunciadas pela violência e brutalidade que tratavam seus internos, foram fechadas. Entre os casos mais famosos está o Hospital Colônia de Barbacena, em Minas Gerais, maior manicômio do Brasil, o qual foi comparado por Basaglia aos campos de concentração nazistas (Arbex, 2013Arbex, Daniela (2013). Holocausto brasileiro: vida, genocídio e 60 mil mortes no maior hospício do Brasil. Geração Editorial., p. 13).

As controvérsias que envolviam a psiquiatria eram tantas que foram tema, inclusive, do cinema. O filme “Um estranho no ninho”, de 1975, conta a história de Randall McMurphy, um indivíduo sadio (não portador de qualquer doença) que, para fugir da prisão, se esconde em uma clínica psiquiátrica. No entanto, ao final, mesmo não possuindo qualquer problema psíquico originário, o personagem acaba sendo vítima do efeito institucional da psiquiatria. Certamente, trata-se de um belo exemplo a respeito dos efeitos opressivos, modificativos e disciplinadores referidos por Goffman (1974Goffman, Erving (1974). Manicômios, prisões e conventos. Perspectiva., p. 61) em sua crítica às instituições totais.

Ademais, outros acontecimentos contribuíram para o embaraço dos psiquiatras perante a sociedade naquela época. Especialmente, o status de doença que era dado à homossexualidade no DSM (Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders), em sua segunda edição. Organizações de direitos dos homossexuais pressionaram e em 1973 ela foi retirada do manual (Burstow, 2015Burstow, Bonnie (2015). Psychiatry and the business of madness: an ethical and epistemological accounting. Palgrave Macmillan., p. 80). Esse fato deixava explícito que os diagnósticos psiquiátricos mantinham uma forte relação com a construção social das figuras “desviantes”. Outro evento importante foi o famoso estudo de Rosenhan, publicado em 1973 na revista Science, com o sugestivo título de “Being sane in insane places”. No experimento, indivíduos passaram-se por doentes, enganando a equipe do hospital e obtendo diagnósticos de “esquizofrenia” e outros transtornos mentais (Burstow, 2015, p. 75). Por isso, para autores como Szasz (1979Szasz, Thomas (1979). O mito da doença mental. Zahar.), a doença mental era um mito, um rótulo que apenas servia para justificar o controle social que era exercido pela psiquiatria desde seus primórdios.

Enfim, com as fortes restrições financeiras que foram impostas (os fundos de pesquisa do NIMH, por exemplo, decresceram 5% ao ano de 65 a 72), o advento dos medicamentos psicotrópicos mostrava que, realmente, a união da psiquiatria com a psicanálise precisaria acabar (Amaral, 2004Amaral, Adriano de Aguiar (2004). A psiquiatria no divã: entre as ciências da vida e a medicalização da sociedade. Nova Fronteira., p. 36). Após a descoberta do clorpromazina - antipsicótico utilizado no tratamento da esquizofrenia, na produção de antidepressivos tricíclicos e ansiolíticos -, emergia uma necessidade prática de critérios diagnósticos bem definidos. Entretanto, o modelo psicossocial não permitia a delimitação de categorias específicas.

Os medicamentos criaram a necessidade de uma psiquiatria baseada, sobretudo, em dados empíricos e experimentais adequados à metodologia de pesquisa das ciências biológicas. Sendo assim, de acordo com Adriano Amaral (2004Amaral, Adriano de Aguiar (2004). A psiquiatria no divã: entre as ciências da vida e a medicalização da sociedade. Nova Fronteira., p. 36), as disciplinas reagrupadas pela psicofarmacologia internacionalizaram-se e, para atingir o mercado principal - o americano -, a produção de medicamentos tinha de ser analisada e aprovada pelo órgão regulatório: a Food and Drug Administration (FDA), com suas estritas regras de controle sobre a comercialização dos fármacos. A solução encontrada para suprir todas essas controvérsias foi a formulação de um terceiro manual diagnóstico. Na busca por uma reformulação, os critérios de Feighner - que delimitavam 14 síndromes psiquiátricas descritas por critérios explícitos - e o RDC (Research Diagnostic Criteria) foram peças fundamentais. Robert Spitzer, um dos colaboradores do RDC, foi nomeado pela APA para chefiar uma força-tarefa encarregada de elaborar o novo DSM. O comitê visava a elaborar um manual com embasamento empírico, que aumentasse a confiabilidade do diagnóstico pelo uso de critérios objetivos. Assumindo que o saber psiquiátrico não conhecia as causas de muitos dos transtornos mentais, o comitê determinou que seria adotada uma perspectiva ateórica e descritiva. A classificação deveria, então, basear-se em fenômenos puramente fenomenológicos e facilmente observáveis na clínica, adotando-se os parâmetros da “medicina baseada em evidências”.

Assim, em 1980, o DSM foi publicado e, poucos anos depois, já era possível notar as diferenças, já que o manual se internacionalizou rapidamente, sendo traduzido para mais de 20 idiomas. O Congresso americano, que desacreditava o NIMH no começo dos anos 70, passou a aumentar os recursos financeiros destinados à pesquisa. (Amaral, 2004Amaral, Adriano de Aguiar (2004). A psiquiatria no divã: entre as ciências da vida e a medicalização da sociedade. Nova Fronteira.).

O que Christian Dunker (2015Dunker, Christian (2015). Mal-estar, sofrimento e sintoma: uma psicopatologia do Brasil entre muros. Boitempo., p. 150) elucida, precisamente, é que havia, sim, uma pretensão etiológica não evidente nesse giro “Kraepliniano” do DSM: a etiologia cerebral, genética e química, além da clara separação entre o diagnóstico psiquiátrico (descritivo e disciplinar) e o diagnóstico psicanalítico (liberal e sincrético). Em larga medida, o DSM-III é um marco importante dentro da história da psiquiatria, que se consolida definitivamente como especialidade médica, diferenciando-se de saberes como a psicologia e a psicanálise. A psiquiatria biológica nasce, assim, abolindo qualquer interioridade e profundidade. Ela passa a atuar na superfície descritiva e “ateórica”, deixando de lado a etiologia dos transtornos mentais. Dessa forma, a abordagem biologicista da psiquiatria entende a existência real da doença mental através do seu substrato mental, conectando-se tanto ao discurso neurocientífico quanto à disseminação de um self cerebral como validação do seu saber.

Logo, é importante ressaltar que a biologização da mente no cérebro não significou uma recusa dos aspectos não biológicos, mas sim uma tradução desses fenômenos em medidas e padrões cerebrais. Fenômenos que eram estudados com medidas comportamentais passaram a ser investigados com medidas anatômicas e funcionais do cérebro, tornando-se condições biomédicas (Zorzanelli, & Ortega, 2011Zorzanelli, Rafaela & Ortega, Francisco (2011). Cultura somática, neurociências e subjetividade contemporânea. Psicologia & Sociedade, 23(nspe.), 30-36. https://doi.org/10.1590/S0102-71822011000400005
https://doi.org/10.1590/S0102-7182201100...
).

Desse modo, a psiquiatria finalmente conseguiu fazer da psicopatologia um problema biológico-cerebral, transformando-se na área da medicina cujo vocabulário mais se difundiu na sociedade nos últimos anos. Palavras como “serotonina”, “diagnóstico”, “ansiedade” e “depressão” passaram a fazer parte do cotidiano, e o universo psiquiátrico expandiu-se para fora dos muros dos asilos e consultórios, atingindo quase toda a sociedade. Hoje, ela abrange um campo de atuação muito mais vasto em comparação aos séculos anteriores.

Assim, Robert Spitzer e John Feighner (idealizadores desse novo formato) conseguiram implementar uma profunda reforma metodológica, que num curto espaço de tempo modificou a clínica radicalmente. Acompanhada do discurso neurológico, a clínica psiquiátrica passou a se centralizar no desenvolvimento de medicamentos que prometem ser capazes de curar a esquizofrenia e melhorar a performance do sujeito no trabalho, seu papel social e a própria autonomia do desejo. Não tardaram a surgir cada vez mais trabalhos que se mostraram preocupados com os efeitos (problemas) da psiquiatria biológica e da medicalização excessiva que parece acompanhá-la (Vidal & Ortega, 2019Vidal, Fernando & Ortega, Francisco (2019). Somos nosso cérebro? Neurociência, subjetividade, cultura. N-1 Edições.). Principalmente após a publicação dos outros dois manuais diagnósticos que vieram na sequência, o reducionismo, a medicalização e a expansão de uma verdadeira psicopatologização do cotidiano cresceram ainda mais, colocando, novamente, o saber psiquiátrico sob alvo de críticas severas.

Embora o processo de reformulação tenha sido grande, os problemas não acabaram. Observa-se que, na verdade, ao migrar para fora dos muros dos asilos com um manual diagnóstico cada vez mais abrangente, questionou-se, novamente, a validade das categorias agora abertas, gerais e, por vezes, arbitrárias do DSM. Sua quinta edição, publicada em 2013, chamou a atenção pelo aumento exorbitante de novas categorias. Enquanto no DSM-IV (1994) havia previsão de 297 transtornos, no DSM-V o total foi de 450. Esse fato, por óbvio, fez com que muitos passassem a questionar o conteúdo dos diagnósticos adicionados (cf. Safatle, 2013Safatle, Vladimir (2013). O Poder do Psiquiatra. Revista Cult, 184, 22-23.). Logo, o DSM-V vem desencadeando uma série de artigos e livros que questionam o “caráter normativo de suas classificações, fundadas num movimento vertiginoso de psiquiatrização da vida cotidiana e numa psicopatologização do mal-estar subjetivo” (Iannini & Teixeira, 2013Iannini, Gilson & Teixeira, Antonio (2013). O futuro de uma classificação. Revista Cult, 184, 24-27., p. 25).

DSM-V: Um dispositivo de controle biopolítico

Desde os ensinamentos de Foucault, ficou claro que a psiquiatria é um dos saberes-poderes que auxiliam no disciplinamento dos corpos e no governo das almas. Quando ela cataloga uma nova patologia, surge uma nova regra (padrão) a ser seguida. Com isso, inaugura-se uma relação substancial de poder com aqueles que são classificados como desviantes e que recebem o estigma por não seguirem o que determina a norma, ou melhor, os processos de normação produzidos (Foucault, 2008, pp. 73-116).

No mesmo sentido, o diagnóstico sempre desempenhou um papel importante, porém, nos últimos séculos esse papel foi “reconfigurado e se tornou mais central à medida que a medicina - como a sociedade ocidental em geral - se tornou cada vez mais técnica, especializada e burocratizada” (Rosenberg, 2002Rosenberg, Charles (2002). The tyranny of diagnosis: specific entities and individual experience. The Milbank quarterly, 80. https://doi.org/10.1111/1468-0009.t01-1-00003
https://doi.org/10.1111/1468-0009.t01-1-...
, p. 237).

Por isso, quando se fala na expansão do diagnóstico (neuro)psiquiátrico, existem fatores importantes em termos de muitas vezes ignorados, tornando o DSM, principalmente em sua atual edição, um elemento crucial de investigação. Desde logo, o que se observa é que a abrangência das classificações trazidas pelo DSM, respaldada na explicação cerebralista do sofrimento psíquico, reforça um processo de psicopatologização da vida cotidiana, constatado desde o início do manual quando apela ao seguinte conceito: “Um transtorno mental é uma síndrome caracterizada por perturbação clinicamente significativa na cognição, na regulação emocional ou no comportamento de um indivíduo que reflete uma disfunção nos processos psicológicos, biológicos ou de desenvolvimentos subjacentes ao funcionamento mental (APA, 2014American Psychiatric Association - APA. (2014). Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais: DSM-5 (5ª ed.). Artmed., p. 20).

Para além de qualquer sensação superficial, o que se percebe ao analisar o conceito é sua demasiada imprecisão. Essa psiquiatria que se pretende neurocientífica, ao trazer várias categorias vagas, abstém-se de maiores referências, produzindo incógnitas e dificultando a compreensão. Com efeito, o que se tem é uma mistificação do sofrimento sob camadas de abstração. Entretanto, tal abstração não se retém por ali. As próprias categorias diagnósticas ao longo do manual demonstram total imprecisão. Observe-se, por exemplo, o critério 6 do Transtorno de Personalidade Narcisista:

Esperam ser servidos e ficam atônitos ou furiosos quando isso não acontece. Por exemplo, podem supor que não precisam aguardar em filas e que suas prioridades são tão importantes que os outros farão uma deferência a eles, irritando-se depois quando estes não os auxiliam “em seu trabalho tão importante”. (APA, 2014American Psychiatric Association - APA. (2014). Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais: DSM-5 (5ª ed.). Artmed., p. 670)

O que este quadro, sobremaneira, diz sobre o sofrimento psíquico? De fato, nada. Trata-se de um manual que se vangloria pela clareza de seus critérios específicos e objetivos. Todavia, causa espanto que esses sejam os distúrbios da psiquiatria que se diz biológica, embasada nas neurociências. O que esses padrões revelam, na prática, é exatamente o contrário do que a área prometia. Em detrimento da falta de especificidade e do quadro clínico demasiadamente amplo, os diagnósticos poderiam ser aplicados a praticamente qualquer pessoa. Então, questiona-se: qual a ligação deste tipo de critério com o funcionamento dos neurotransmissores? Ou melhor, qual a relação com a suposta origem biológica dos distúrbios mentais? Certamente, ninguém sabe precisamente quais são as respostas a essas perguntas, nem mesmo os “neuropsiquiatras” que, na verdade, mais parecem acometidos pela “doença de Bacamarte” (Assis, 1994Assis, Machado de (1994). O alienista. FTD. (Original publicado em 1882)).

Por isso, são muitas as reflexões que pairam sobre o DSM-V. Evidentemente, alguns problemas já eram verificados antes mesmo de sua publicação, pois retratam questões que envolvem a própria tentativa da psiquiatria em se tornar uma área respeitada dentro da medicina. Contudo, com a multiplicação das hipóteses diagnósticas, as controvérsias que já existiam aumentaram e ainda se agravaram pelo fato de que o transtorno mental, sob o olhar psiquiátrico, foi banalizado. Como refere Vladimir Safatle (2013Safatle, Vladimir (2013). O Poder do Psiquiatra. Revista Cult, 184, 22-23., p. 23), o mínimo que se pode dizer sobre tais quadros é que eles dizem muito mais a respeito dos padrões disciplinares e morais que a sociedade tenta elevar à condição de normalidade médica do que a distúrbios mentais de raiz supostamente biológica.

Em outras palavras, como afirma Charles Rosenberg (2002Rosenberg, Charles (2002). The tyranny of diagnosis: specific entities and individual experience. The Milbank quarterly, 80. https://doi.org/10.1111/1468-0009.t01-1-00003
https://doi.org/10.1111/1468-0009.t01-1-...
), o diagnóstico constitui um ponto de articulação indispensável entre o geral e o particular. Trata-se de um ritual que liga médico e paciente, o emocional e o cognitivo e, por isso, legitima a autoridade de todo o sistema médico, fornecendo significados culturalmente acordados para a experiência individual.

Desta forma é que o DSM acabou por se tornar um espaço privilegiado da estratégia “biopolítica” (Foucault, 2008Foucault, Michel (2008). Segurança, território, população. Martins Fontes.). Com ele, a psiquiatria amplifica seu poder e se aplica a toda a população a fim de controlar a vida. O pensamento medicalizado permite, assim, que se prescreva à sociedade uma distinção entre o normal e o patológico, impondo um sistema de normação dos comportamentos, das existências, dos trabalhos e dos afetos. Não se pode esquecer que “uma classificação diagnóstica jamais é politicamente neutra, pois sempre veicula - necessária e implicitamente - uma visão do homem e da sociedade” (Pereira, 2013Pereira, Mario Eduardo Costa (2013). O DSM e a crise da psiquiatria. Revista Cult, 184, 38-45., p. 44), em especial quando pensamos nos modos de vida produzidos num contexto em que a concorrência é norma de conduta e a figura do “empresário de si” é que configura as subjetividades (cf. Dardot & Laval, 2016Dardot, Pierre & Laval, Christian (2016). A nova razão do mundo: ensaio sobre a sociedade neoliberal. Boitempo.).

Assim, o DSM age como instrumento essencial no controle social. Se antes os hospitais e manicômios pretendiam ser vetores de recolhimento dos doentes mentais, hoje, tais práticas dão-se por meio da rotulação e da consequente prescrição farmacológica. Aliás, de acordo com Safatle (2013Safatle, Vladimir (2013). O Poder do Psiquiatra. Revista Cult, 184, 22-23., p. 22), interessante mencionar que já é sabido que 70% dos experts que trabalharam na construção do DSM-V tinham alguma ligação com a indústria farmacêutica. Frente a esse espectro, a própria validade do transtorno mental é colocada em xeque desde as bases impostas biologicamente ao saber psiquiátrico.

Há muito Szasz (1976Szasz, Thomas (1976). A Fabricação da Loucura. Zahar.) já apontava criticamente para o fato de que a doença mental em si, tal como diagnosticada, de fato, nunca existiu. Em seu paralelo, assim como as feiticeiras, o doente mental é apenas mais um bode expiatório da sociedade. Para o autor, há uma enorme semelhança entre a crença medieval na feitiçaria e a contemporânea na insanidade mental, sendo que ambas se baseiam em explicações falsas que servem, na verdade, para encobrir certos problemas morais relacionados a interesses de grupos determinados. No caso da bruxaria, o poder do clero; para a doença mental, o interesse de grupos médicos.

Desse modo, o papel do possuidor de uma “desordem psíquica” é análogo ao da bruxa. Se no século XV, os homens acreditavam que algumas pessoas eram feiticeiras e que alguns atos eram devidos à feitiçaria, a partir do século XX eles passaram a acreditar que algumas pessoas são insanas e que alguns atos são devidos à doença mental. Os conceitos têm o mesmo status lógico e empírico: são imprecisos, excessivamente abrangentes e podem ser livremente adaptáveis a quaisquer usos que deles queiram fazer o sacerdote ou o médico (ou o diagnosticador leigo) (Szasz, 1976Szasz, Thomas (1976). A Fabricação da Loucura. Zahar., p. 19). Como se não bastassem as semelhanças, a própria atuação do médico, desde a inquisição, tem ligação direta com a classificação da bruxaria. Conforme dispõe claramente o Malleus Maleficarum (Kraemer, & SprengerKraemer, Heinrich & Sprenger, James (2015). O martelo das feiticeiras. BestBolso., 2015, p. 200), os médicos eram recomendados como especialistas em diagnósticos. Eles eram testemunhas importantes nos julgamentos das feiticeiras. Em suma, naquela época, os médicos eram peças importantes para distinguir entre os males causados por bruxaria e os males de causa “natural”.

Por isso, a atividade classificatória e estigmatizante que foi utilizada pela inquisição, com o auxílio do Malleus, a seu modo, hoje é perpetuada pela psiquiatria, com a ajuda do DSM. Ambos os instrumentos diferenciam os “divergentes”, aqueles na qual a conduta difere da ordem e da moral socialmente aceitas, divergência hoje em dia rotulada de transtorno. Se a conduta pessoal não está de acordo com as regras de saúde mental, psiquiatricamente definidas, o indivíduo raramente poderá deixar de receber algum dos 450 diagnósticos estabelecidos pelo DSM-V.

Enfim, a rigor, a doença mental desde sua matriz psiquiátrica hegemônica, simplesmente não existe - o que em nada reduz os estados de sofrimento psíquicos realmente existentes. Mesmo Georges Canguilhem (2002Canguilhem, Georges (2002). O normal e o patológico (5ª ed.). Forense Universitária. , p. 46) já havia feito fortemente a crítica da concepção científica de doença dominante (quantitativa e objetivista), que desconsidera o meio. Para ele, existe uma relatividade individual da saúde, que rechaça a definição absoluta do normal. Assim, a diferença é a essência da individualidade e o problema patológico do humano não se limita à biologia. Por isso, a anomalia e a mutação não são patológicas em si mesmas. Ou seja, não existiria fato que seja normal ou patológico em si. Na realidade, eles exprimem outras normas de vida possíveis. A partir dessa ideia, a normalidade viria diretamente de sua normatividade.

Logo, é um equívoco falar objetiva e biologicamente em doenças mentais ou qualquer outro termo utilizado para designar a mesma coisa, pois “elas não são nem doenças no sentido de um processo mórbido natural, que se infiltra no cérebro dos indivíduos, seguindo um curso inexorável e previsível, nem mentais, no sentido de uma deformação da personalidade”. Mesmo que a psiquiatria biológica ainda insista em tentar comprovar o substrato neurológico dos transtornos, ainda hoje “não há nenhuma testagem, nenhum método de neuroimagem, nenhuma forma de comprovar por meio de exames biológicos a presença ou a ausência de um transtorno mental” (Dunker, 2015Dunker, Christian (2015). Mal-estar, sofrimento e sintoma: uma psicopatologia do Brasil entre muros. Boitempo., pp. 27-32).

Dessa maneira, a inflação contemporânea dos transtornos mentais deve ser vista, além de tudo, como uma estratégia para ampliar a categoria de pessoas que podem ser legitimamente colocadas sob o aparato de controle da psiquiatria e da “farmacocracia” (Szasz, 2001Szasz, Thomas (2001). Pharmacracy: medicine and politics in America. Praeger.). É o que ocorre, principalmente, no caso da depressão. A “nova razão do mundo” neoliberal enfrenta isso como um problema individual (Dardot & Laval, 2016Dardot, Pierre & Laval, Christian (2016). A nova razão do mundo: ensaio sobre a sociedade neoliberal. Boitempo., pp. 361-367), uma desordem nos neurotransmissores. Contudo, a “nomeação normativa de um sintoma é terrivelmente redutiva em relação ao domínio de experiência que ela comprime e generaliza” (Dunker, 2015Dunker, Christian (2015). Mal-estar, sofrimento e sintoma: uma psicopatologia do Brasil entre muros. Boitempo., p. 26). Nesse sentido, o que deve ficar claro é que uma patologia mental, definitivamente, não descreve uma espécie natural, como no caso de uma doença como o câncer. O que ela faz é criar padrões nos quais os sujeitos se veem ou não inseridos. De fato, o que o DSM-V faz, majoritariamente, é aumentar o espectro de atuação da psiquiatria, pois dificilmente alguém que passa por conflitos psíquicos e períodos de incerteza entraria em um consultório psiquiátrico sem um diagnóstico e uma receita médica.

Por isso, o DSM age diretamente como um instrumento a serviço da biopolítica: uma forma de manifestação de poder que tem como objetivo principal o gerenciamento e administração da vida humana. Trata-se, em outras palavras, de um mecanismo de controle que não incidirá apenas sobre corpos individuais, mas sobre populações, estabelecendo censuras entre grupos considerados “diferentes” e atendendo a um interesse político determinado (Foucault, 1988Foucault, Michel (1988). História da Sexualidade I: A Vontade de Saber. Graal., 2010Foucault, Michel (2010). Em defesa da sociedade (2ª ed.) Martins Fontes.). Nesse sentido, o DSM funciona como uma espécie de medicina social que se aplica à população com o propósito de governar a vida.

Depois de realizar uma análise mais profunda sobre essa questão, notou-se que se está diante de uma ação importantíssima da chamada neuropsiquiatria, uma vez que ela não está curando doenças, mas aplicando um tratamento moral à população. Conforme refere Dunker (2015Dunker, Christian (2015). Mal-estar, sofrimento e sintoma: uma psicopatologia do Brasil entre muros. Boitempo.), o ponto nevrálgico é que, na desmontagem do antigo modelo asilar, correcional e punitivo dos manicômios, instalou-se um outro modelo clínico, que, ao que parece, não deseja dar voz à discordância trazida pelo relato do sofrimento. Ao certo, poderia afirmar-se que esse modelo busca disseminá-lo, junto ao consumo das pílulas que prometem trazer a felicidade.

Evidentemente, não é fácil rejeitar ideologias bem entrincheiradas - como o foi a crença às bruxas e como é hoje a crença na doença mental. Como o movimento da antipsiquiatria já demonstrou, as categorias envolvidas, quais sejam, “saúde”, “doença”, “mental” e “patológico” não são meros conceitos de um discurso científico, mas definições carregadas de potência política. Afinal, é pela definição das patologias que uma sociedade organiza seus modos de intervenção nas populações, nos corpos e nos afetos. Assim, na era neurológica, a psiquiatria reformulou sua atividade de controle, dominando a vida e suas nuances de maneira silenciosa, mas cada vez mais profundamente.

Conclusão

Como se observou no desenvolvimento desta investigação, o mecanismo de governo psiquiátrico se reconfigurou com o advento das neurociências, inaugurando uma era “cerebralista” dentro das relações de poder que envolvem a psiquiatria e os modos de articulação normativa, representados pelo normal e pelo patológico. Com isso, emerge um processo de psicopatologização do cotidiano, o qual é constantemente motivado pelo modo de gestão do saber-poder (neuro)psiquiátrico.

Não obstante as transformações tecnocientíficas demarcadas pelos esforços das neurociências, ainda não existe nenhum exame ou imagem por ressonância magnética que comprove qualquer causa orgânica para as supostas doenças mentais. Ou seja, quando o DSM cataloga uma síndrome, não está descrevendo uma doença que tem como causa um elemento “orgânico”. Ele está patologizando o cotidiano e aplicando um tratamento moral à população.

Embora não se negue que o sofrimento obviamente exista, o importante é perceber que há formas diferentes de entendê-lo e de governá-lo numa sociedade. Nesse contexto, não seria exagero afirmar que os “distúrbios” (formas de ser) catalogados pelo DSM e “tratados” (geridos) pela psiquiatria comportam uma aplicação, por sua própria natureza, de questionável legitimidade e de raiz reducionista. Aliás, o próprio ato de individualização (cerebralização) já supõe um ato de gestão da (neuro)psiquiatria, pautado, essencialmente, em políticas afeitas a um cotidiano investido pela matriz neoliberal.

A medicalização de problemas psicológicos decorrentes de conflitos sociais corresponde, assim, a um novo reducionismo biológico, realizado diariamente por profissionais ligados à promoção do saber psiquiátrico, representantes da indústria farmacêutica e intérpretes das neurociências (Zaffaroni, 2020Zaffaroni, Eugenio Raúl & Santos, Ílison Dias Dos (2020). A nova crítica criminológica: Criminologia em tempos de totalitarismo financeiro. Tirant., p. 135). Se as experiências cotidianas são fontes de sofrimentos, contudo, caberia, antes de tudo, indagar a quem serve tais condições reduzidas a meros problemas de disfunções cerebrais.

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  • Financiamento

    A autora Camila De Oliveira Angel obteve bolsa parcial CAPES durante a realização do mestrado e confecção deste artigo.
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  • Aprovação, ética e consentimento

    Não se aplica.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Set 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    06 Abr 2022
  • Revisado
    14 Dez 2022
  • Aceito
    22 Dez 2022
Associação Brasileira de Psicologia Social Programa de Pós-graduação em Psicologia, Universidade Federal de Pernambuco, Centro de Filosofia e Ciências Humanas (CFCH), Av. da Arquitetura S/N - 7º Andar - Cidade Universitária, Recife - PE - CEP: 50740-550 - Belo Horizonte - MG - Brazil
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