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O DEVIR VAGABUNDO(A) COMO RESISTÊNCIA AO TRABALHO NO SISTEMA CAPITALISTA

EL DEVENIR VAGABUNDO COMO RESISTENCIA AL TRABAJO EN EL SISTEMA CAPITALISTA

BECOMING VAGABOND AS RESISTANCE TO WORK IN THE CAPITALIST SYSTEM

Resumo

O trabalho é considerado uma dimensão basilar da vida humana que viabiliza práticas sociais de transformação da natureza, acesso ao consumo e preservação da ordem institucional. Cada uma dessas dimensões deixa entrever uma prática iminente que é tão antiga quanto o trabalho: o vagabundear. O objetivo deste estudo consistiu em compreender como a palavra vagabundo(a) foi linguisticamente definida, tendo suas práticas codificadas pela moral e submetida a legislações. Adotando uma metodologia interdisciplinar e teórica, que teve como norteadora a Psicologia Social, constatou-se como resultado um antagonismo historicamente construído entre trabalhar e vagabundear. Encontramos na arte uma aliada para problematizar esse antagonismo, uma vez que nela o tema é abordado diretamente, podendo ser praticado no cotidiano sem desqualificações. A pesquisa conclui que a avaliação moral sobre o vagabundear tende a interditar formas plurais de existência ao mesmo tempo em que difunde majoritariamente a forma capitalista produtivista de estar no mundo.

Palavras-chave
Vagabundear; Trabalhar; Subjetividade; Capitalismo; Resistência

Resumen

El trabajo es una dimensión básica de la vida humana que posibilita prácticas sociales de transformación de la naturaleza, acceso al consumo y preservación del orden institucional. Estas dimensiones apuntan a una práctica inminente que es tan antigua como el trabajo: el merodeo. El objetivo de este estudio fue comprender cómo la palabra vagabundo fue definida lingüísticamente, con sus prácticas codificadas por la moral y sujetas a la legislación. Adoptando una metodología interdisciplinaria y teórica, con base en la Psicología Social, se verificó como resultado un antagonismo históricamente construido entre el trabajo y el deambular. Encontramos en el arte un aliado para problematizar este antagonismo, ya que en el arte el tema es abordado directamente, pudiendo ser practicado en la vida cotidiana sin descalificación. La investigación concluye que la valoración moral de la vagancia tiende a prohibir formas plurales de existencia al mismo tiempo que difunde mayoritariamente la forma capitalista productivista de estar el mundo.

Palabras-clave
Vagabundeo; Trabajar; Subjetividad; Capitalismo; Resistencia

Abstract

Work is considered a basic dimension of human life that enables social practices of nature transformation, access to consumption and preservation of the institutional order. Each of these dimensions hints at an imminent practice that is as old as work: loitering. The aim of this study was to understand how the word vagabond was linguistically defined, with its practices codified by morality and subjected to legislation. Adopting an interdisciplinary and theoretical methodology, which had Social Psychology, it was verified as a result a historically constructed antagonism between working and wandering. We find in art an ally to problematize this antagonism, since in the art the theme is addressed directly, and can be practiced in everyday life without disqualifications. The research concludes that the moral evaluation of vagrancy tends to prohibit plural forms of existence at the same time that it mostly spreads the productivist capitalist way of being in the world.

Keywords
Vagabonding; To work; Subjectivity; Capitalism; Resistance

Introdução

Trabalhar tem sido historicamente considerada uma das dimensões mais relevantes da vida humana. Caracterizado desde Karl Marx (1867/2017Marx, K. (1867/2017). O Capital: Livro I. Boitempo.) como “um processo entre o homem e a natureza; processo este em que o homem, por sua própria ação, medeia, regula e controla seu metabolismo com a natureza” (327), em torno de seus desdobramentos históricos e suas práticas fortaleceram-se diferentes dimensões do existir por meio do trabalho, como: o reconhecimento social de quem desempenha as funções laborais, a organização geral da vinculação institucional pela atividade formal e informal, a transformação da natureza e dos conhecimentos, a garantia da subsistência e também, em larga medida, a manutenção da ordem social de acordo com os interesses dominantes. Cada uma dessas dimensões deixa entrever outra prática iminente que é tão antiga quanto o trabalhar: o vagabundear.

Em uma abordagem histórica, chama a atenção o quanto trabalho e vagabundagem foram moralmente avaliados, promovendo uma trajetória que ligou o vagabundear à desqualificação moral e aos códigos jurídicos. Primeiramente, pela evolução linguística da palavra vagabundo(a), que, aos poucos, foi adquirindo uma desqualificação moral vinculada ao fato de não se ter um trabalho que possibilitasse o próprio sustento. Por outro lado, a atividade laboral expandiu sua valorização na Idade Média (entre os séculos V-XV d.C.) e, depois, com o apoio da religião cristã expressa por João Calvino e Martinho LuteroLutero, Martinho (2017). Martinho Lutero: uma coletânea de escritos. Vida Nova., fortaleceu ainda mais uma desqualificação de quem era avaliado(a) como vagabundo(a) (Le Goff, 2016Le Goff, Jacques (2016). A civilização do ocidente medieval. Vozes.). Nesse sentido, leis, decretos, alvarás e códigos foram elaborados a fim de desqualificar e excluir quem não se enquadrava no regime de trabalho instituído.

Paralelo a essa desqualificação de quem se mantinha distante do trabalho moralmente valorizado (seja na condição de empregado(a) formal assalariado(a), trabalhador(a) informal ou, mais recentemente, ligado(a) ao trabalho precarizado), delineou-se uma série de práticas socialmente legitimadas e valorizadas como, por exemplo, o consumo de mercadorias, serviços e informações, o acúmulo de bens e a exploração da natureza (Ramos, 2009Ramos, Alberto (2009). Uma introdução ao histórico da organização racional do trabalho. Conselho Federal de Administração.) como condicionantes da vida em sociedade. Assim, foi por meio da demarcação trabalhador(a)-produção que se estabeleceram instâncias valorativas bem definidas e estáveis no campo social. Uma delas foi o valor atribuído ao trabalho e, concomitantemente, a trabalhadores(as), como vinculação que servia de acesso a uma condição socialmente reconhecida por meio da qual a moral, de certa forma, mantém estruturas rígidas que intervêm sobre os modos de viver e se relacionar (Machado, 1999Machado, Roberto (1999). Nietzsche e a verdade. Paz e Terra.). Entretanto, por contraste, o próprio trabalho foi colocando em cena a existência da vagabundagem que permitiu acessar, no cotidiano, valores, percepções, sensibilidades e modos de subjetivação plurais.

As práticas da vagabundagem, dessa forma, dão visibilidade a alguns dos impasses presentes nos discursos morais nas sociedades. Não mais presos aos territórios convencionais do trabalho, os agentes dessas ações lançam-se, por vezes, na busca de outros espaços a serem mapeados em uma composição política e de resistência (Jacques, 2012Jacques, Paola (2012). Elogio aos errantes. EDUFBA.) pela via da experimentação multifacetada das cidades. Ao tatearem caminhos ainda inexplorados, o processo de vagabundear alarga as margens das experiências e permite a exploração de outras temporalidades e conexões com o mundo. Por vezes tido como prática à margem da sociedade, o vagabundear abre brechas para que sujeitos(as) possam desvencilhar-se do imperativo do lucro e do consumo (Justo, 2015Justo, José (2015). Vidas errantes: Políticas de mobilidade e experiências de tempo-espaço (livro eletrônico). Eduel.).

É nessa direção que se inscreveu o presente estudo. O objetivo foi compreender como a palavra vagabundo(a) foi linguisticamente definida, tendo suas significações submetidas à avaliação moral e codificada nas legislações. Percorrendo uma trajetória interdisciplinar, áreas como Linguística, Sociologia, História, Filosofia, Artes e Psicologia foram acionadas em um projeto analítico que buscou compor um saber plural, perspectivo e heterogêneo sobre as possibilidades de conjugar o verbo vagabundear: na palavra, na lei, no trabalho, no ócio, na exploração intensiva da cidade e na composição de múltiplas outras experimentações subjetivas. Ao final desta argumentação, será possível concluir que as práticas do vagabundear, para além das desqualificações morais, podem ser multifacetadas e abrir brechas para apreciar a existência de modo plural.

Composições andarilhas sobre o método

Transformações são consideradas processos inerentes à vida humana. Por meio delas, práticas historicamente mais cristalizadas são reinventadas e colocadas em circulação. Mover-se, dessa forma, pode ser considerada uma prática não somente de deslocamento físico, mas também de produção de valores, crenças, sensibilidades e hábitos que, em sua transformação incessante, compõem e decompõem a vida em sociedade. Vagabundear, tema central desta pesquisa, foi aqui analisado como um modo de vida cambiante tanto espacialmente quanto nas maneiras plurais de viver que não se reduzem à esfera produtivista capitalista.

O ato de vagabundear acompanha, nesse sentido, um modo peculiar de colocar-se nas relações sociais e urbanas que, ao não se aliar exclusivamente às práticas prescritivas do trabalho capitalista, acionam modos de resistência precipitados em movimentos e devires (Jacques, 2012Jacques, Paola (2012). Elogio aos errantes. EDUFBA.). Em nosso tempo, entretanto, o que mais se vê são vidas engendradas no modelo econômico que podem ser caracterizadas como corpos dóceis (Foucault, 1987Foucault, Michel (1987). Vigiar e Punir. Vozes.), que aceitam seguir um modelo de vida pautado em uma via de mão única: a da produção advinda do trabalho capitalista. Vagabundear nesse panorama pode ser compreendido como um desvio. E, em função disso, sua prática é julgada pelas leis do Estado que adota o crivo moral, desqualificando-a como improdutiva, ameaçadora e perigosa, devendo ser, assim, amplamente combatida.

Para avançar na caracterização da vagabundagem, adotou-se metodologicamente a perspectiva qualitativa, que se dedica à compreensão de processos heterogêneos, singulares e expressivos dos agentes sociais, focalizando os significados presentes nas relações (Minayo, 2001Minayo, Maria (2001). Pesquisa social: Teoria, método e criatividade. Vozes.). A abordagem qualitativa busca compreender as variações subjetivas que os encontros provocam e seus desdobramentos nas histórias de vida. Ao discorrer sobre as características desse tipo de pesquisa, Sonia Mansano (2014Mansano, S. R. V. (2014). O método qualitativo nos estudos sociais aplicados: dimensões éticas e políticas.Revista Economia & Gestão, 14(34), 119-136.) comenta: “ela acompanha o movimento e a singularidade dos acontecimentos sociais com um método que está, também ele, em movimento. Daí a importância de manter-se atento à composição provisória dos problemas estudados e aos múltiplos efeitos subjetivos que são por eles produzidos” (p. 124). Com essa escolha metodológica, foram abordadas algumas nuances do vagabundear que dão visibilidade às sutilezas presentes nesse modo de viver.

A estratégia utilizada na realização desta pesquisa foi histórico-teórica, por se tratar de um tema cercado por enfrentamentos institucionais. A formação histórica é atravessada pelo movimento e pela transitoriedade. Para Pedro Demo (1995Demo, Pedro (1995). Metodologia científica em ciências sociais. Atlas.): “Toda formação histórica está sempre em transição, o que supõe visão intrinsecamente dinâmica da realidade social, no sentido da produtividade histórica” (p. 90). Percebe-se, nesse sentido, que a concepção histórica deixa evidentes formas plurais de vida que implicam conflitos sociais, afetivos e legais. Peter Burke (2012Burke, Peter (2012). História e teoria social (2a ed.). Editora Unesp.) acrescenta que as pesquisas históricas ocupam-se do “estudo das sociedades humanas, com ênfase na diferença entre elas e nas mudanças verificadas ao longo do tempo em cada uma” (p. 9). Nesse sentido, a perspectiva histórico-teórica busca conectar conhecimentos diversificados valendo-se de uma multiplicidade de práticas, saberes e enunciados que são colocados em circulação na história social.

Em sua dimensão teórica, a pesquisa buscou aproximar áreas do conhecimento capazes de analisar, por diferentes perspectivas, os efeitos plurais do tema estudado e suas repercussões na sociedade. Desse modo, autores ligados à Linguística (Houaiss, 2009Houaiss, Antonio (2009). Dicionário Houaiss da língua portuguesa eletrônico 3.0. Editora Objetiva LTDA.; Moniz, 2001Moniz, Fábio (2001). Dicionário de latim-português (2a ed.). Porto Editora.; Nascentes, 1966Nascentes, Antenor (1966). Dicionário etimológico reduzido. Tomo.; Viaro, 2014Viaro, Mario (2014). Manual de etimologia do português. Globo.), Sociologia (Carvalho, 2019Carvalho, José (2019). Os bestializados: O Rio de Janeiro e a República que não foi (4a ed.). Companhia das Letras.; Crary, 2014Crary, Jonathan (2014). 24/7 - Capitalismo tardio e os fins do sono. (J. Toledo, trad.). Cosac Naify.; Lafargue, 2003Lafargue, Paul (2003). O direito a preguiça (O. L. Correa, trad.). Claridade.), História (Harari, 2011Harari, Yuval (2011). Sapiens: Uma breve história da humanidade. Harper.), Filosofia (Deleuze, 1962/2018Deleuze, Gilles (1962/2018). Nietzsche e a filosofia. N-1 Edições.; Foucault, 1987/1995Foucault, Michel (1987). Vigiar e Punir. Vozes.; Machado, 1999Machado, Roberto (1999). Nietzsche e a verdade. Paz e Terra.), Artes (Buarque, 1970Buarque, Chico (1970). Samba e amor (Álbum 78 rpm). CBD/Philips.,1978Buarque, Chico (1978). Ópera do malandro. Círculo do Livro.; Pessoa, 2015Pessoa, Fernando (2015). Obra Completa de Fernando Pessoa [livro eletrônico].; Bretch, 2004Bretch, Berlot (2004). A ópera dos três vinténs. Paz e terra.; Assis, 1960Assis, Machado (1994). Memórias póstumas de Brás Cubas. Nova Aguilar.), Psicologia (Justo, 2015Justo, José (2015). Vidas errantes: Políticas de mobilidade e experiências de tempo-espaço (livro eletrônico). Eduel.; Mansano, 2009Mansano, S. R. V. (2009). Sorria, você está sendo controlado: Resistência e poder na sociedade de controle. Summus.), bem como documentos referentes a códigos penais (1830Código penal 1830 (1830). http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lim/lim-16-12-1830.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/lei...
e 1890Código Penal 1890 (1890). http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1851-1899/d847.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/dec...
), alvarás (1760Alvará de 1760 (1760). Cria o Lugar de Intendente Geral de Polícia da Corte de Reino e estabelece suas responsabilidades. Coleção da Legislação Portuguesa 1750 a 1762, Lisboa. http://purl.pt/17387/4/1754614_PDF/1754614_PDF_24-C-R0150/1754614_0000_1-b_t24-C-R0150.pdf
http://purl.pt/17387/4/1754614_PDF/17546...
) e decretos de lei (1941Decreto de Lei número 3688/1941 (1941). https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=FD88F6020FE7C49CA474315FF00ACD35.node1?codteor=290126&filename=LegislacaoCitada+-PL+4977/2005
https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb...
) foram, no decorrer do estudo, acionados para dar visibilidade ao problema em pauta.

Ao aproximar áreas distintas de saber, traçamos um campo problemático que percorreu as nuances do vagabundear como uma dimensão possível da existência.

A interdisciplinaridade, assim, foi adotada como norteadora para integrar um panorama composto por diferentes saberes que se dedicam ao estudo da vagabundagem, afastando-se de um modelo hegemônico capitalista naturalizado pela via do produtivismo laboral. Jayme Paviani (2008Paviani, Jayme (2008). Interdisciplinaridade: Conceitos e distinções (2a ed.). Educs., pp. 14-15), ao discutir essa abordagem de estudo, considera: “a interdisciplinaridade, reconhecido o fenômeno, impõe-se, de um lado, como uma necessidade epistemológica e, de outro lado, como uma necessidade política de organização do conhecimento, de institucionalização da ciência”. Desse modo, recorrer a distintos saberes configurou-se como uma estratégia para multifacetar as análises e minimizar os riscos de endurecê-la.

Vagabundagem: como uma denominação marca as existências

Analisaremos, primeiramente, como as derivações, sinônimos e acepções linguísticas da palavra vagabundo(a) foram variando seus significados ao longo do tempo. No léxico da língua portuguesa, a palavra vagabundo(a) possui alguns traços históricos em sua composição, sendo esses de origem latina e derivados da palavra vagativus. A formação lexical vagabundo(a) possui a raiz vag-, que significa errante; que se move de um lugar ao outro; espontâneo; que não se submete às limitações do ritmo (Nascentes, 1966Nascentes, Antenor (1966). Dicionário etimológico reduzido. Tomo.).

Manuais de etimologia e dicionários latim-português como, por exemplo, os de Antonio Houaiss (2009Houaiss, Antonio (2009). Dicionário Houaiss da língua portuguesa eletrônico 3.0. Editora Objetiva LTDA.) e Nascente (1966Nascentes, Antenor (1966). Dicionário etimológico reduzido. Tomo.), trazem o significado da palavra vagabundo(a) ligado à palavra errante. Tomando a formação etimológica de errante, tem-se que essa também é de origem latina, composta pela raiz errare- que, segundo Nascentes (1966Nascentes, Antenor (1966). Dicionário etimológico reduzido. Tomo., p. 278), significa: “vaguear; aquele que não acerta o caminho”.

Mario Viaro (2014Viaro, Mario (2014). Manual de etimologia do português. Globo.) assinala que a noção de errante como sinônimo da palavra vagabundo guarda relação com a mudança processada ao longo da sua formação lexical. Com isso, as palavras errar, vadiar, vagabundear e vagar são todas designações que descrevem o movimento. Analisando o modo de vida das pessoas qualificadas como vagabundas no plano linguístico e nas legislações, nota-se que elas ocupam lugares distintos por estarem em trânsito, não se limitando à demarcação de territórios ou adotando um modo de vida sedentário e supostamente seguro. Nesse sentido, a noção de vagabundo(a) é associada a quem não estabelece residência em local específico (Jacques, 2012Jacques, Paola (2012). Elogio aos errantes. EDUFBA.).

Pode-se dizer que a trajetória no movimento da vagabundagem não está relacionada a um ponto de chegada ou a um ponto de partida. Conforme Paola Jacques (2012Jacques, Paola (2012). Elogio aos errantes. EDUFBA., p. 276) afirma: “a questão dos errantes está nos percursos, o errante faz dos percursos o seu território”. Observa-se, assim, que o(a) errante faz do movimento um contínuo fluxo de experiências à medida que se move. Essa maneira de transitar, não planejada ou passível de controle imediato, conecta-se à experiência do mover-se que delineia um modo específico de vida: itinerante e crítico à estabilidade. Isso se desdobra em uma experiência nômade, já que seus agentes tendem a não fixar residência, priorizando a mudança, a experimentação e os riscos. Jacques (2012Jacques, Paola (2012). Elogio aos errantes. EDUFBA.) pontua que o vagar, por não adotar um modelo para se conectar aos lugares, impede o estabelecimento de uma identidade ao mesmo tempo valorizada e aprisionada no trabalho moralmente legitimado. Assim, o(a) vagante deixa entrever uma fluidez dificilmente categorizada por agentes legisladores, deixando exposta a dificuldade de prescrever sua existência em uma narrativa condizente com a ordem social que tem no trabalho seu maior valor.

Quais os desdobramentos dessa dificuldade? Viaro (2014Viaro, Mario (2014). Manual de etimologia do português. Globo.) mostra que o vagar incomoda à medida que não permite sua ampla caracterização e fácil controle, pois “está vazio” (p. 90) em relação aos valores morais vigentes. Trata-se, porém, de um vazio de forma (modelo), e não de conteúdo. Ao resistir a uma caracterização evidente, moralista e identitária, a vagabundagem não pode ter suas práticas e valores prescritos e avaliados com facilidade, abrindo uma dificuldade para quem porventura pretenda categorizar e legislar sobre tal experiência.

À medida que o vagabundo(a) nega-se a ocupar espaços fixos e codificados, coloca em evidência os limites do sedentarismo. José Justo (2015Justo, José (2015). Vidas errantes: Políticas de mobilidade e experiências de tempo-espaço (livro eletrônico). Eduel.) considera que o sedentarismo opta pela territorialização como estratégia para garantir a subsistência de si e dos pares. A partir disso, o sedentarismo e o nomadismo se opõem expressando modos de vida diferentes que colocam em cena alguns enfrentamentos como: estabilidade x instabilidade; locomoção x fixação; territorialização x experimentação livre.

Outro ponto a ser considerado na caracterização linguística do vagabundear é que o sedentarismo, inicialmente vinculado ao plantio e à colheita, foi uma maneira crucial para possibilitar a organização social urbana e rural (Harari, 2015Harari, Yuval (2011). Sapiens: Uma breve história da humanidade. Harper.). A atividade de cultivo e o comércio dos alimentos, possíveis apenas graças ao excedente de produção e sua estocagem, serviram como catalisadores para a passagem do humano nômade, coletor e caçador, para o humano produtor, trabalhador e sedentário (Harari, 2015Harari, Yuval (2011). Sapiens: Uma breve história da humanidade. Harper.).

É nesse contexto que o trabalho ganhou marcas morais como um organizador do processo de fixação e sedentarização na história da humanidade. Para isso, Jacques Le Goff (2016Le Goff, Jacques (2016). A civilização do ocidente medieval. Vozes.) comenta que as cidades medievais protagonizaram o nascimento das noções capitalistas de trabalho como valor crucial para seu estabelecimento, bem como para a marginalização de quem não se adequava a esse modelo, contando, para isso, com a intervenção de ampla rede institucional. Em suas palavras: “Levada por seu novo ideal de trabalho, a cristandade expulsa os ociosos, que consintam ou não. Lança nas estradas aquela multidão de enfermos, de doentes, de desempregados que vão se juntar ao grande bando dos vagabundos” (Le Goff, 2016Le Goff, Jacques (2016). A civilização do ocidente medieval. Vozes., p. 277.

O trabalho torna-se, historicamente, um valor social norteador da garantia não somente da residência fixa, mas do acesso a comodidades sociais atreladas à segurança, ao conforto, ao respeito público e à adesão aos valores conservadores vigentes. Decorrente disso cresceu a necessidade de manter uma vigilância, bem como um distanciamento daqueles(as) que eram considerados(as) ociosos(as) e vagabundos(as), ou seja, que resistiam às práticas instituídas do trabalho hegemônico.

Em uma acepção mais contemporânea da palavra vagabundo(a), tal como a descrita por Houaiss (2009Houaiss, Antonio (2009). Dicionário Houaiss da língua portuguesa eletrônico 3.0. Editora Objetiva LTDA.), há um desdobramento de seus sentidos, sendo descrita mais recentemente como madraço(a), larápio(a) e ocioso(a). Vê-se marcadamente aqui uma abordagem moral. Esta última implica um processo radicalizado nas relações humanas que, capitaneadas por forças antagônicas, no caso trabalho e vagabundagem, estabelecem o que é bom e o que é mau. Considerando que a moral é composta por valores que são histórica e socialmente produzidos, seus efeitos são conhecidos pelas práticas de convivência adotadas em cada sociedade. Assim, nota-se uma característica marcante em relação a valores morais: eles são constructos sociais que, apesar de terem uma duração longínqua e serem lentos nos processos de transformação, dando uma aparência de eternidade e estabilidade, demandam investimentos sociais maciços para se firmar na pretensa permanência (Foucault, 1987Foucault, Michel (1987). Vigiar e Punir. Vozes.). Desse modo, quem os questiona são avaliados(as) como ameaça a ser combatida, pois estão conectados(as) e aliados(as) às transformações geradas em cada tempo histórico.

Vimos que tanto linguística quanto moralmente a prática da vagabundagem foi uma dessas tendências questionadoras, ganhando contornos cada vez mais visíveis de resistência em uma sociedade que hipervalorizou o trabalho produtivo, esteja ele formalizado ou não, na organização capitalista. Tal visibilidade também pode ser constatada nos documentos oficiais, em formas de decretos e leis, que abordam a vagabundagem no Brasil, conforme apresentaremos na sequência.

Leis e decretos que descrevem vagabundos(as) no Brasil

O livro quinto das ordenações denominadas Ordenações Filipinas foi um dos primeiros registros históricos que tipifica os(as) vagabundos(as) no Brasil. Esse livro consistia em um compilado de códigos, posturas e regimentos que buscava normatizar, descrever e organizar a vida nas metrópoles e na colônia. Descreve o referido livro, no título 68 (1870Ordenações Filipinas Livro V (1870). https://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/562747
https://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/i...
, p. 1216): “Mandamos, que qualquer homem que não viver com o senhor, ou com o amo, nem tiver officio ... seja preso e açoutado publicamente”. Esse trecho relata precisamente aqueles(as) que, por não possuírem uma vinculação direta com o trabalho, eram condenados(as) a alguma punição. Desse modo, encontramos novamente, agora pela via da lei, uma relação direta entre trabalho e moral: para viver em sociedade era necessário comprometer-se com o trabalho, sendo esse um valor indispensável para o bom andamento da vida urbana.

Com o passar do tempo, decretos e leis engendraram aparatos legais para combater a vadiagem, supostamente ocasionada pela falta do trabalho. Para isso, em junho de 1760, tem-se o Alvará que cria a organização de polícia do Império e do reino. Nesse Alvará ficava estabelecido o combate de quem atentasse contra a moral e os bons costumes relacionados ao trabalho como, por exemplo, o sexto artigo que diz: “Cada ministro terá um livro de registro, em que declara todos os moradores do seu bairro, com exata declaração de officio, modo de viver, ... para fazer um perfeito conhecimento dos ociosos e libertinos” (1760Alvará de 1760 (1760). Cria o Lugar de Intendente Geral de Polícia da Corte de Reino e estabelece suas responsabilidades. Coleção da Legislação Portuguesa 1750 a 1762, Lisboa. http://purl.pt/17387/4/1754614_PDF/1754614_PDF_24-C-R0150/1754614_0000_1-b_t24-C-R0150.pdf
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, p. 3). Nota-se aqui que as pessoas que estivessem fora do regime do trabalho eram fichadas no livro da lei sendo considerados(as), então, como vadios(as) e libertinos(as).

A institucionalização da polícia como combatente dos crimes foi reforçada pela elaboração de documentos oficiais que reuniram um conjunto de leis para definir as penas a serem aplicadas às pessoas avaliadas como contraventores(as) do Estado. Nesse sentido, considera Myrian Santos (2004Santos, Myrian (2004). A prisão dos ébrios, capoeiras e vagabundos no início da Era republicana. Topoi, 8, 138-169.) que em 1830 inicia-se a história do Direito Penal brasileiro com a criação do primeiro Código Penal. Tratava-se, para a autora, de uma inovação que introduziu a sanção por meio do trabalho como variação da pena imposta ao detento. Com isso, comenta a autora, castigar não era somente privar de liberdade quem se voltasse contra a ordem, mas explorar e desgastar suas forças vitais com o trabalho.

Já o artigo 59 do código penal de 1830 definia a vadiagem como “entregar-se alguém habitualmente à ociosidade, sendo válido para o trabalho, sem ter renda que lhe assegure meios bastantes de subsistência, ou prover a própria subsistência mediante ocupação ilícita: Pena - prisão simples, de quinze dias a três meses” (Lei de 16 de dezembro de 1830Código penal 1830 (1830). http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lim/lim-16-12-1830.htm
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). É possível, a partir dessa passagem, dizer que as práticas de vagabundagem naquela época estavam ligadas à dificuldade de sustento, à preguiça e à inaptidão para o trabalho. Sendo assim, o ócio, a preguiça e a errância, a partir desse momento legal, foram vinculados também à noção de periculosidade.

Por não se enquadrarem nos ditames de vida social conservadora, a vadiagem e a mendicância, como signos do rompimento moral, foram consideradas nocivas ao convívio social. Uma das ações para combatê-las foi a retirada, pelo Estado, do direito de transitar livremente (Santos, 2016Santos, Adriana (2016). Vagabundos e criminosos: O trabalho como mecanismo de poder e índice de criminalização no discurso jurídico-penal de reinserção social dos apenados (Tese de Doutorado em Tecnologia, Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Curitiba/PR).). Por se manterem fora do regime laboral, os(as) errantes não podiam usufruir da liberdade de ir e vir, diferente daqueles(as) que possuíam riqueza ou trabalho. Para tanto, havia uma distinção aparente entre quem estava vinculado ao trabalho ou à riqueza, sendo esses livres para transitar, enquanto quem não possuía trabalho tinha o trânsito limitado e vigiado. Nesse código, a elite podia usufruir o seu tempo tal como quisesse. Já pessoas pobres deveriam utilizar o seu tempo preferencialmente para servir por meio do labor.

A valorização social do trabalho continuou protagonizando um papel importante nas leis brasileiras. É o que se pode constatar na elaboração do segundo Código Penal brasileiro, de 1890, que também criminalizou os cultos africanos religiosos e a prática da capoeira, oferecendo indícios, desde esse momento da história brasileira, de rudimentos do preconceito e da exclusão raciais (Schwarcz & Starling, 2015Schwarcz, L. M. & Starling, H. M. (2015). Brasil: uma biografia. Companhia das Letras.). O Código de 1890 possuía um viés mais repreensivo em relação ao primeiro de 1830. Assim, os crimes ligados à vadiagem e à capoeiragem eram mais coibidos pela polícia. Como um efeito do primeiro Código Penal, no qual a noção de vagabundagem era atrelada à periculosidade, incorporava-se, nesse momento, uma noção estigmatizada desse novo grupo, valendo-se da rejeição disseminada de costumes culturais e localizados.

Nesse momento, o corpo do(a) vagabundo(a) passava a ter uma especificação além daquela ligada ao trabalho: ganhava contornos específicos de cor, raça e religião, além da posição socioeconômica. Como exemplo, utilizamos o capítulo 13 localizado no artigo 402 do código de 1890, que aborda mais especificamente a junção entre vadios(as) e capoeiras, associando à desordem, ficando proibido: “Fazer nas ruas e praças públicas exercícios de agilidade e destreza corporal conhecidos pela denominação capoeiragem” (Decreto-Lei n° 847, 1890Código Penal 1890 (1890). http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1851-1899/d847.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/dec...
, p. 57).

Outro documento importante para o debate do tema é o chamado Código de Posturas, de 1893 (Santos, 2004Santos, Myrian (2004). A prisão dos ébrios, capoeiras e vagabundos no início da Era republicana. Topoi, 8, 138-169.), que consistia em um compilado de normativas sobre as maneiras como a população deveria se comportar moralmente para não ser enviada às casas correcionais. O Código de Posturas foi utilizado como uma ferramenta do governo para manter a estabilidade social através de fatores que reafirmavam a moral. Vagabundos(as), a partir desse momento, eram obrigados(as) pela lei a se conectarem a um trabalho legitimado pelo Estado. José Carvalho (2019Carvalho, José (2019). Os bestializados: O Rio de Janeiro e a República que não foi (4a ed.). Companhia das Letras., p. 26) explica que os ideais modernistas europeus eram “as quebras de valores antigos... acelerado no campo da moral e dos bons costumes”, o que se configurou em uma forma mais violenta de combater a vadiagem. Cortiços e conjuntos habitacionais foram removidos da paisagem das cidades para dar lugar a avenidas e novos edifícios (Carvalho, 2019Carvalho, José (2019). Os bestializados: O Rio de Janeiro e a República que não foi (4a ed.). Companhia das Letras.).

As figuras do(a) vagabundo(a), por serem enquadradas em leis que versavam a relação com o trabalho, são alvos de posições morais ligadas a uma norma instituída sobre a vinculação laboral (formal ou informal) como único modo de vida aceitável. Mansano (2009Mansano, S. R. V. (2009). Sorria, você está sendo controlado: Resistência e poder na sociedade de controle. Summus.) comenta que a formulação de leis que simplesmente identificam, julgam e punem modos de vida que rompem com a visão moral e neutralizada do trabalho idealizado favorece a prática continuada, obediente e docilizada do capitalismo. Isso acaba sendo associado ao perigo e ao risco, pois, ao não se coadunarem ao trabalho legalmente aceito, são vigiados(as) e punidos(as) pelo livro da lei.

As expressões do devir vagabundo(a) nas artes

Práticas que afirmam modos de vida alternativos àqueles disseminados pelo capitalismo vigente e moralizado, majoritariamente ligados ao trabalho e à produtividade, são cada vez mais necessárias em um cotidiano marcado pela aceleração. Há aí a intervenção, experimentação e audácia de personagens que perfilam diariamente pelas cidades contemporâneas, desarticulando as sinuosidades da aceleração, da exploração monetária dos espaços e da naturalização de valores econômicos. São práticas que rompem limites e colocam em circulação novas possibilidades de viver. Romper, nesse caso, significa desvelar, ensaiar e provar novas articulações sociais. Após percorrer a etimologia e as leis delineadoras da vagabundagem, cabe agora explorar algumas práticas, que tomam contornos de resistência a essa desqualificação sistemática. Encontramos na arte esse caminho, uma vez que nesse campo é possível afirmar a vida e seu leque multifacetado de possibilidades. Para Machado (2012Machado, Roberto (2012). Deleuze, Arte e Filosofia (2ª ed., livro eletr.). Zahar., p. 13), “o verdadeiro objeto da arte é criar agregados sensíveis”, afirmando práticas sociais que estimulem outras formas de ver, sentir e se posicionar no mundo.

A arte aqui mencionada insinua e deixa entrever estratégias de resistência por penetrar nos modos de vida e realçar a criação e a experimentação do pensamento, dos afetos e dos encontros. Com isso, ela atua em prol da afirmação da vida pluralizada na cotidianidade das relações, compondo, dessa forma, existências potentes e ativas. Sobre isso, Deleuze (1962/2018Deleuze, Gilles (1962/2018). Nietzsche e a filosofia. N-1 Edições.) comenta:

A arte é sempre julgada do ponto de vista do espectador e de um espectador cada vez menos artista ... . Mas por que, precisamente desse novo ponto de vista, a arte aparece como estimulante da vontade de potência? Por que a vontade de potência tem necessidade de um excitante, ela que não precisa de motivo, de finalidade e nem de representação? É porque ela só pode colocar-se como afirmativa na relação com forças ativas, com uma vida ativa. (p. 132)

Em diferentes segmentos da arte, encontramos o vagabundear como verbo no infinitivo evocando maneiras plurais de devir-vagabundo. A canção “linha 743” de Raul Seixas (1984Seixas, Raul (1984). Metrô Linha 74 (Álbum). Som Livre.) serve como indício dessa variedade de conjugação do verbo vagabundear ao enunciar: “quem pensa, pensa melhor parado”, evocando a relevância da pausa para saborear o existir. Ao dizer: “Faça o que tu queres pois é tudo da lei” (Seixas, 1974Seixas, Raul (1974). Sociedade Alternativa (Álbum). Universal Music.), ele produz uma espécie de efeito perturbador nos valores sociais, tendo em vista que o autor enuncia uma “sociedade alternativa” em que se afirma a multiplicidade da vida: “se eu quero, e você quer/ tomar banho de chapéu/ ou esperar Papai Noel/ ou discutir Carlos Gardel/ então vá! Viva a sociedade alternativa”. Uma sociedade alternativa expressa, nessa canção, a possibilidade de rebelar-se, ser diferente ou apenas acessar o mundo para além dos valores capitalistas.

A arte aqui evocada segue dando seus contornos para delinear a vagabundagem. Ela fala, pinta, canta e recita a vagabundagem, dando tons de resistência e abrindo caminhos para desvencilhar a vida daquilo que já está tão naturalizado como regra social. É o que diz Fernando Pessoa (2015Pessoa, Fernando (2015). Obra Completa de Fernando Pessoa [livro eletrônico].) em um poema de Alberto Caeiro, seu heterônimo:

Não tenho pressa. Pressa de quê? Não têm pressa o sol e a lua: estão certos. Ter pressa é crer que a gente passa adiante das pernas, Ou que, dando um pulo, salta por cima da sombra. Não; não sei ter pressa. Se estendo o braço, chego exatamente aonde o meu braço chega Nem um centímetro mais longe. Toco só onde toco, não aonde penso. Só me posso sentar aonde estou. E isto faz rir como todas as verdades absolutamente verdadeiras, Mas o que faz rir a valer é que nós pensamos sempre noutra coisa, E somos vadios do nosso corpo. (Pessoa, 2015Pessoa, Fernando (2015). Obra Completa de Fernando Pessoa [livro eletrônico]., p. 747)

Fernando Pessoa suscita a desterritorialização de uma temporalidade previamente marcada e de um modelo mais fixado na produtividade que são aceitos e amplamente praticados em sociedade. Ao abandonar um território efetua-se a transmutação da forma anteriormente delimitada e faz escapar, romper e mesmo fugir de uma estrutura. Pode-se, portanto, dizer que a arte, rejeitando a mera imitação e identificação, permite tatear outros possíveis. Isso pode ser sentido também no romance “Grande Sertão: Veredas” de João Guimarães Rosa (1986/2019Rosa, José G. (2019). O grande sertão: Veredas. Companhias das Letras.), em que o autor coloca em relevo a aprendizagem da provisoriedade da vida por meio do sertão. A obra se passa no sertão brasileiro. No entanto, o mesmo autor diz que “o sertão é do tamanho do mundo” (p. 63), estendendo suas impressões para um palco amplo de acontecimentos sociais. Dedica-se, dessa maneira, a contar a história do jagunço Riobaldo, que se apaixona por Diadorim (outro jagunço) e como esse processo modifica as relações de ambos, entre si e com o sertão. Primeiramente, Riobaldo assinala: “Conseguiu de muito homem e mulher chorar sangue, por este simples universozinho nosso aqui” (p. 20). Na sequência, o personagem afirma seu amor por Diadorim: “Aquele lugar, o ar. Primeiro, fiquei sabendo que gostava de Diadorim - de amor mesmo amor, mal encoberto em amizade” (p. 234). Cabe dizer que os devires não correspondem a uma conotação binária de causa e efeito, pois não se aliam mecanicamente a uma função delimitada de mundo na qual há uma condição predeterminada entre raça, sexo, gênero, ocupação social e contexto socioambiental. Trata-se de vagar entre modos de vida.

A aproximação que fazemos aqui entre vagabundagem e devires aparece também na obra de Machado de Assis (1881/1994Assis, Machado (1994). Memórias póstumas de Brás Cubas. Nova Aguilar.) “Memórias Póstumas de Brás Cubas”. Machado constrói um personagem vacilante, que decide contar sua história após a sua morte e que nada de significativo conseguiu realizar enquanto vivia: “não alcancei a celebridade do emplastro, não fui ministro, não fui califa, não conheci o casamento. Verdade é que, ao lado dessas faltas, coube-me a boa fortuna de não comprar o pão com o suor do meu rosto” (p. 145). O narrador, por não estar mais nos planos terrenos, não pode mais ser julgado pela moral que define o trabalho como condição para inserção social. Nesse sentido, Machado convoca o(a) leitor(a), valendo-se da imagem de Brás Cubas, a se despir de suas amarras valorativas e seus ecos fixos, para acompanhar a vida de um anti-herói. Nesse caso, o(a) leitor(a) não é convidado a imitar um vagabundo, não quer se tornar um vagabundo, não quer se assemelhar a Brás Cubas. Contudo, tem-se a chance de entrar em contato com um devir-vagabundo(a) atualizado na pele de Brás Cubas, cuja prática não pede licença e não avilta os olhos, somente coloca em jogo conexões plurais de vida que se desterritorializam do trabalho e buscam outras vizinhanças intensivas. Sobre a literatura, Gilles Deleuze e Felix Guattari (1995Deleuze, Gilles & Guattari, Felix (1995/2000). Mil platôs: Capitalismo e esquizofrenia Ed. 34.) comentam que “o livro assegura a desterritorialização do mundo, mas o mundo opera uma reterritorialização do livro, que se desterritorializa por sua vez em si mesmo no mundo” (p. 19). Assim, Machado não oferece Brás Cubas como mero personagem de identificação, mas abre a possibilidade de contatar a irreprimível presença do devir-vagabundo(a) na cotidianidade. Ainda que essa aproximação seja possível apenas com a morte.

Em outro campo artístico, a canção “Samba e Amor”, de Chico Buarque (1970Buarque, Chico (1970). Samba e amor (Álbum 78 rpm). CBD/Philips.), aproxima o verbo vagabundear das questões do tempo. Na composição, o autor canta: “Eu faço samba e amor até mais tarde/ E tenho muito sono de manhã/ Escuto a correria da cidade, que arde/ E apressa o dia de amanhã”. Ao fazer samba e amor até mais tarde e ter sono de manhã, o compositor abre um contragolpe aos ritmos e rotinas da vida urbana organizada e moralizada. Vagabundeia ao reconhecer a correria da cidade sem dobrar-se a ela. Com isso, abre a possibilidade de contemplar o amanhecer em uma espécie de desaceleração vital. As obrigações impostas pela vida de trabalho (Crary, 2014Crary, Jonathan (2014). 24/7 - Capitalismo tardio e os fins do sono. (J. Toledo, trad.). Cosac Naify.) buzinam no descanso, coíbem a preguiça e acionam os ociosos para ação, deixando entrever que “o trânsito contorna a nossa cama, reclama/ Do nosso eterno espreguiçar” (Buarque, 1970Buarque, Chico (1970). Samba e amor (Álbum 78 rpm). CBD/Philips.).

Vagabundear, desse modo, abre para artifícios por meio dos quais se possa fugir, mesmo que momentaneamente, das obrigações cronometradas das sociedades contemporâneas. Assim, seja sentado no banco de uma praça, seja andando pelas ruas sem destino traçado, devir-vagabundo(a) torce os valores fixos. Seu acento está na possibilidade da parada, da calma, da preguiça, da contemplação e dos afetos experimentados de forma lenta. Esses artifícios aparecem também na obra de João do Rio (2008Rio, João do (2008). A alma encantadora das ruas. Companhia das Letras.) “A alma encantadora das ruas”. No livro, composto por cinco partes, o autor procura rastrear os movimentos urbanos através da figura do flâneur em um Rio de Janeiro do século XX. Ao caminhar, Rio (2008Rio, João do (2008). A alma encantadora das ruas. Companhia das Letras., p. 10) comenta: “A rua é o aplauso dos medíocres, dos infelizes, dos miseráveis da arte.” E assim prossegue:

Para compreender a psicologia da rua não basta gozar-lhe as delícias como se goza o calor do sol e o lirismo do luar. É preciso ter espírito vagabundo, cheio de curiosidades malsãs e os nervos com um perpétuo desejo incompreensível, é preciso ser aquele que chamamos flâneur e praticar o mais interessante dos esportes - a arte de flanar. (p. 13)

Nessa exploração urbana, pergunta-se: “Que significa flanar? Flanar é ser vagabundo e refletir, é ser basbaque e comentar, ter o vírus da observação ligado ao da vadiagem” (p. 13). Logo em seguida, assinala sobre o flâneur: “É vagabundagem? Talvez. Flanar é a distinção de perambular com inteligência. Nada como o inútil para ser artístico. Daí o desocupado flâneur ter sempre na mente dez mil coisas necessárias, imprescindíveis, que podem ficar eternamente adiadas” (p. 14). Ao descrever o flâneur, o autor esmiúça como o verbo vagabundear se faz presente nas cenas cotidianas. Caminhar pelas ruas como exercício de contemplação descaracteriza a aceleração para criar uma intersecção com o devir-vagabundo(a). As partículas do vagabundear pululam no corpo do contemplante, aproximando-se, dessa forma, do amplo leque de possíveis aberto pelo devir-vagabundo(a). Nesse sentido, ao flanar assumem-se os riscos de fazer da sua vida uma obra de arte a céu aberto, uma vez que se acolhe o(a) ambulante, itinerante e nômade, buscando se pasmar com que o mundo vai lhe apresentando, sem garantias, metas ou segurança. Sobre a vida como obra de arte, Michel Foucault (1995Foucault, Michel (1995). Sobre a genealogia da ética: uma revisão do trabalho. In Paul Rabinow & Hubert Dreyfus (Eds.), Uma trajetória filosófica: para além do estruturalismo e da hermenêutica (pp. 253- 278). Forense Universitária.) diz:

O que me surpreende é o fato de que, em nossa sociedade, a arte tenha se transformado em algo relacionado apenas a objetos e não a indivíduos ou à vida; que a arte seja algo especializado ou feito por especialistas que são artistas. Entretanto, não poderia a vida de todos se transformar numa obra de arte? Por que deveria uma lâmpada ou uma casa ser um objeto de arte, e não a nossa vida? (p. 261)

Devir-vagabundo(a) aproxima-se da arte para configurar linhas de errância que fazem flutuar modos de vida e potencializar outras práticas de si no sistema majoritário da produtividade acelerada. A arte formal profissionalizada, feita por profissionais da área, é assim deslocada para o âmbito da vida cotidiana na qual: “Vou mostrando como sou/ E vou sendo como posso/ Jogando meu corpo no mundo/ Andando por todos os cantos/ E pela lei natural dos encontros/ Eu deixo e recebo um tanto/ E passo aos olhos nus/ Ou vestidos de lunetas” (Novos Baianos, 1972Novos Baianos (1972). Acabou Chorare (Álbum). Som Livre.). O devir-vagabundo(a), por situar-se no plano das intensidades, reserva seu tempo para ações simples como, a qualquer momento do dia, “sentir preguiça no corpo e, numa esteira de vime, beber uma água de coco” (Toquinho & Vinicius, 1970Toquinho & Vinicius de Moraes. (1970). Tarde em Itapuã (Álbum). Som Livre.). Cabe resgatar, nessa perspectiva intensiva, as considerações de Paul Lafargue (2003Lafargue, Paul (2003). O direito a preguiça (O. L. Correa, trad.). Claridade.) sobre o direito à preguiça, nas quais ele questiona:

Na nossa sociedade quem são as classes que amam o trabalho pelo trabalho? Os camponeses proprietários, os pequeno-burgueses, uns curvados sobre as suas terras, os outros retidos pelo hábito nas suas lojas, mexem-se como toupeira na sua galeria subterrânea e nunca se endireitam para olhar com vagar para a natureza. (p. 10)

Outra pista da afirmação de uma vida artística expressa no vagabundear pode ser encontrada na peça “Ópera do Malandro”, do compositor Chico Buarque (1978Buarque, Chico (1978). Ópera do malandro. Círculo do Livro.). Teresinha, personagem da peça, faz uma referência curiosa ao escritor Bertolt Brecht: “Me disseram que esse Brecht rouba tudo dos outros e faz coisas maravilhosas” (Buarque, 1978Buarque, Chico (1978). Ópera do malandro. Círculo do Livro., p. 81). Essa fala de Teresinha pode ser interpretada como menção à “Ópera dos Três Vinténs” de Brecht (1928), inspirada na “Ópera do Mendigo” de John Gay (1724Gay, John (2007). A ópera do mendigo. Vozes.). Da mesma forma, Chico adapta a peça ao contexto brasileiro, transformando a obra de Brecht na “Ópera do Malandro”, como se roubasse a história desse autor para traçar os contornos do(a) malandro(a), figura tipicamente brasileira. Identifica-se que a tentativa de Buarque (1978Buarque, Chico (1978). Ópera do malandro. Círculo do Livro.) é apontar que as malandragens perpassam os(as) personagens da peça, deixando sinais de que a malandragem se pluraliza no cotidiano. Nesse sentido, a esperteza, a flexibilidade e o vagabundear vestem, na forma de malandro(a), um modo de viver já difundido como possível.

Os fragmentos artísticos aqui mencionados deixam entrever um desafio colocado no contemporâneo: em identificar os valores majoritários ligados ao trabalho, ao consumo, à aceleração e às formas de controle e, dentro desse contexto, criar estratégias de acesso às potências e às intensidades que, pela via das sensações, possam extrapolar o universo laboral vigente e seus correlatos morais. Isso, em alguma medida, distancia-se também do denominado ócio criativo (De Masi, 2012De Masi, Domenico (2012). O ócio criativo. Sextante.), que funciona como fomentador de uma criatividade servil à aceleração produtiva.

Considerações finais

Ao tomar em análise o vagabundear, desde o sentido linguístico, passando pelo registro da sua trajetória histórica nas leis brasileiras e acionando as obras artísticas para sua compreensão, este estudo pretendeu dar visibilidade aos movimentos de mudança e ruptura precipitados pelos(as) vagabundos(as), mostrando sua multiplicidade social e subjetiva. Valendo da arte e sua multiplicidade vital, foi possível resgatar personagens históricos que ganharam concretude em malandros(as), preguiçosos(as) e capoeiras, acompanhando as valorações morais que recaem sobre suas vidas e sua insistência em resistir.

Além disso, foi possível mostrar que a noção de vagabundagem foi, historicamente, associada à noção de trabalho. Era preciso desqualificar, marcar linguisticamente e submeter à punição da lei quem não aderisse aos valores laborais e os praticassem em seu cotidiano. Até nossos dias, essa relação antagônica entre vagabundagem e trabalho continua em vigor, gerando impasses e práticas morais de exclusão social.

Ocorre que uma abordagem crítica do tema implica considerar, em primeiro lugar, que a reserva de mão de obra, utilizada como estratégia para manter a exclusão social dos(as) trabalhadores(as) desempregados(as), precisa ser amplamente questionada. Trata-se de uma sociedade organizada pela exclusão, que se utiliza das taxas de desemprego para justificar baixos salários, condições precárias de trabalho e usa a moral como objeto de chantagem para docilizar os que estão empregados. Além disso, ao adotar uma formulação linguística que define a vadiagem por uma via pejorativa, coloca toda a população em combate contra essa prática na esfera microssocial das relações familiares, laborais e pessoais.

Ressalta-se, por fim, que a tensa relação entre vagabundagem e trabalho, apesar de sua longa história no Brasil, carece de análise sobre as reais possibilidades de superar essa dicotomia e tornar tanto o trabalho quanto a vagabundagem acessíveis a todos(as) sem as amarras servis de uma existência moralmente formatada. Nesse contexto, caberia, no mínimo, assumir os limites capitalistas de inclusão social e fazer um esforço institucional para reconhecer (e absorver) aquele(a) que não consegue acessar a prática laboral como um efeito da política econômica excludente adotada em nosso país. Caberia também reconhecer na vagabundagem uma abertura para experimentação de outras conexões com a cidade e a vida: um devir vagabundo(a). Estaremos à altura desse desafio?

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  • Financiamento

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    Não se aplica

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Maio 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    16 Mar 2022
  • Revisado
    08 Nov 2022
  • Aceito
    25 Nov 2022
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