Acessibilidade / Reportar erro

INGRESSO DO AFETO: EXPOSIÇÃO INDEVIDA E GHOSTING EM JOVENS USUÁRIOS DE REDES SOCIAIS

TICKET TO AFFECTION: UNDUE EXPOSITION AND GHOSTING IN YOUNG SOCIAL NETWORK USERS

TIQUETE DEL AFECTO: EXPOSICIÓN INDEBIDA Y GHOSTING EN JÓVENES USUARIOS DE REDES SOCIALES

RESUMO

A circulação de nudes constitui um fenômeno atual pertencente ao campo amplo do sexting. Este artigo apresenta uma sessão de psicodrama junguiano no tema. O recrutamento foi realizado através de redes sociais utilizando metodologia bola de neve. Foram obtidos dois relatos de jovens de 26 anos. Com a finalidade de exploração dos relatos em maior profundidade, apenas um deles foi dramatizado. Dois fenômenos digitais foram identificados: exposição indevida e ghosting. Emergiram dinâmicas relacionais de teor afetivo-sexual nos nudes que puderam ser compreendidas como associadas ao erotismo na cultura digital. Foram realizadas amplificações mítico-simbólicas pelos mitos de Eros e Psiquê e Lilith. Recomenda-se a elaboração de novos estudos para maior abrangência na compreensão de situações relacionadas a essa prática.

PALAVRAS-CHAVE
Sexting; Juventude; Redes sociais; Psicodrama junguiano

ABSTRACT

The circulation of nudes is a phenomenon belonging to the broad field of sexting. This article presents a Jungian psychodrama session about the theme. Recruitment was done in social networks using the snowball method. Two reports were obtained from 26-year-olds. Aiming at exploring the reports with greater depth, only one of them was dramatized. Two digital phenomena were identified: undue exposure and ghosting. Relational dynamics of affective-sexual content emerged related to nudes that were understood as being associated with eroticism in digital culture. Mythical-symbolic amplifications were carried out through the myths of Eros and Psyche and Lilith. New studies are recommended for greater scope in the understanding of situations related to this practice.

KEYWORDS
Sexting; Youth; Social media; Jungian psychodrama

RESUMEN

La circulación de nudes es un fenómeno actual perteneciente al campo del sexting. Este artículo presenta una sesión de psicodrama junguiano sobre el tema. El reclutamiento se realizó a través de las redes sociales utilizando la metodología Bola de Nieve. Se obtuvieron dos informes de personas de 26 años. Para profundizar en los relatos, sólo se dramatizó uno de ellos. Se identificaron dos fenómenos digitales: exposición indebida y ghosting. Surgieron en los nudes dinámicas relacionales de contenido afectivo-sexual que podrían entenderse asociadas al erotismo en la cultura digital. Amplificaciones mítico-simbólicas fueron realizadas por los mitos de Eros y Psique y Lilith. Se recomienda la elaboración de nuevos estudios para mayor alcance en la comprensión de situaciones relacionadas con esta práctica.

PALABRAS CLAVE
Sexting; Juventud; Medios de comunicación sociales; Psicodrama jungiano

INTRODUÇÃO

Antes de abrir para o tema de que trata este artigo, cumpre esclarecer alguns pontos. O artigo foi escrito em duas fronteiras: interface do psicodrama com tecnologia, que se insere em um campo de estudos denominado ciberpsicologia, e interface do psicodrama com psicologia analítica, inserida em proposta contemporânea de psicodrama. Assim, se o artigo contribui para o campo de estudos interdisciplinares — em que figuram conhecimentos pertencentes à psicologia e outras disciplinas, i.e., sociologia, filosofia, ciência da computação —, também inova na metodologia empregada, que tem sua especificidade dentro do campo metodológico psicodramático e foi desenvolvida durante a realização da pesquisa.

A ciberpsicologia é uma disciplina que se encontra na fronteira da psicologia referente à relação do homem com tecnologia. Debruça-se, entre outros temas, com a realidade virtual, a inteligência artificial, os efeitos de videogames sobre o desenvolvimento. Uma linha de estudos dentro da ciberpsicologia constitui o uso de internet.

O interesse sobre o uso de internet cresceu quando a internet se popularizou como meio de comunicação na década de 1990, que foi possibilitada pela disponibilização de computadores pessoais no mercado de bens de consumo e de serviços voltados para comunicação e entretenimento. Se antes a infraestrutura da internet era mais utilizada para comunicação científica, novas possibilidades de comunicação à distância foram abertas ao mundo a partir da sua popularização. O desenvolvimento da world wide web (www) ajudou a internet a se diferenciar como meio de comunicação interativo e bidirecional. Quando outros meios que estavam disponíveis na época, i.e., rádio, TV, permitiam apenas enviar mensagens unidirecionais, a troca bidirecional de mensagens teve uma otimização de tempo e alcance por meio do e-mail, havendo ainda inovações em recursos de interação específicos, i.e., hipertextualidade, uso de vídeo e áudio e possibilidade de interação humana por meio de cliques e mensagens. Essa revolução deu origem ao paradoxo da hipercomunicação, que aponta que estamos mais conectados e ao mesmo tempo mais distantes uns de outros (Turkle, 2017Turkle, S. (2017). Alone together: Why we expect more from technology and less from each other. Hachette.).

Havia, quando a internet se popularizou na década de 1990, certo desconhecimento em torno de suas consequências no comportamento humano. O desconhecimento em torno das tecnologias tem impactado a percepção social sobre novidades adotadas por usuários de internet (Nicolaci-da-Costa, 2022Nicolaci-da-Costa, A. M. (2002). Quem disse que é proibido ter prazer online?: Identificando o positivo no quadro de mudanças atual. Psicologia: Ciência e Profissão, 22(2), 12-21. https://doi.org/10.1590/S1414-98932002000200003
https://doi.org/10.1590/S1414-9893200200...
). Usar um aplicativo de relacionamento, como Tinder, Happn e Grindr, na busca de parceiros amorosos pode ser visto de modo negativo por aqueles que nunca utilizaram tais aplicativos. Essa condição social cria diferenças entre aqueles que utilizam as tecnologias e aqueles que não as utilizam no desempenho de atividades cotidianas. Destacam-se dois termos criados para descrever essa diferença: natividade digital (Prensky, 2001Prensky, M. (2001). Digital natives, Digital immigrants Part 1. On the Horizon, 9(5), 1-6. https://doi.org/10.1108/10748120110424816
https://doi.org/10.1108/1074812011042481...
) e residência (White & Le Cornu, 2011White, D. S., & Le Cornu, A. (2011). Visitors and residents: A new typology for online engagement. First Monday, 16(9). https://doi.org/10.5210/fm.v16i9.3171
https://doi.org/10.5210/fm.v16i9.3171...
). São nativos digitais aqueles que nasceram em um mundo conectado à internet; são residentes aqueles que desempenham atividades na internet, i.e., tarefas de trabalho, contato com amigos e familiares, busca de parceiro amoroso ou sexual. Argumenta-se que o conceito de residência seja mais abrangente do que o de natividade digital, pois considera o fenômeno a partir de critérios de motivação e contexto e não apenas da data de nascimento (White & Le Cornu, 2011White, D. S., & Le Cornu, A. (2011). Visitors and residents: A new typology for online engagement. First Monday, 16(9). https://doi.org/10.5210/fm.v16i9.3171
https://doi.org/10.5210/fm.v16i9.3171...
). Essa diferença pode ser importante quando consideradas populações específicas que fazem uso mais frequente da internet para certas atividades, i.e., nômades digitais que trabalham exclusivamente pela internet, população LGBTQI+ que utiliza as redes sociais na busca de parceiro diante de dificuldades ocasionadas pela visibilidade de sua orientação sexual (Morelli et al., 2016Morelli, M., Bianchi, D., Baiocco, R., Pezzuti, L., & Chirumbolo, A. (2016). Sexting, psychological distress and dating violence among adolescents and young adults. Psicothema, 28(2), 137-142. https://doi.org/10.7334/psicothema2015.193
https://doi.org/10.7334/psicothema2015.1...
).

Produzindo impacto nas relações humanas e, portanto, sendo influenciado pelo seu contexto histórico-cultural, as práticas efetuadas na internet se transformam no tempo. Entende-se que o psicodrama pode contribuir na compreensão de aspectos humanos relacionados às práticas efetuadas na internet por meio de concepções encontradas nos escritos psicodramáticos, i.e., conserva cultural, dinâmica teletransferencial, contribuindo para uma compreensão de aspectos psicossociais identificados no uso de internet, o que se efetua neste artigo.

A prática de circulação de nudes na internet

A pesquisa TIC Domicílio 2020 apontou, a respeito do uso de internet no Brasil, que 81% da população brasileira com dez anos de idade ou mais têm acesso domiciliar à internet. Foram estimados em torno de 152 milhões de usuários no Brasil em 2020. O acesso pelo telefone celular lidera o ranking de dispositivos com 99% da população acessando a internet dessa forma e 58% apenas por esse dispositivo (com a exclusão de outros, i.e., computador, tablet). As atividades relacionadas com comunicação mais frequentes no Brasil são: troca de mensagens instantâneas (93%), conversas e chamadas de voz ou vídeo (80%) e uso de redes sociais (72%).

A respeito do uso de internet para circulação de nudes e sexting no Brasil, o Projeto Caretas fez uma intervenção em larga escala em que houve coleta de dados sobre sexting em território nacional (UNICEF Brasil, 2019UNICEF Brasil. (2019). Projeto Caretas. https://www.unicef.org/brazil/projeto-caretas
https://www.unicef.org/brazil/projeto-ca...
). Participaram do projeto quase um milhão de jovens, dos quais 75% eram mulheres (13 a 25 anos). Destas, quase metade informou já ter praticado sexting ou falado sobre isso. Nesse sentido, pode-se imaginar o alcance do sexting entre jovens brasileiros, apesar de não terem sido encontradas pesquisas de larga escala para o seu mapeamento no Brasil. Realizou-se a partir do Projeto Caretas um estudo com participação de aproximadamente oito mil adolescentes mulheres de 13 a 18 anos, que consideraram o diálogo como principal ferramenta para prevenir eventuais problemas relacionados ao sexting nessa população (Fundo das Nações Unidas para a Infância, 2019Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF). (2019). Adolescentes e o risco de vazamento de imagens íntimas na internet. Brasil: UNICEF. https://www.unicef.org/brazil/media/1671/file/Adolescentes_e_o_risco_de_vazamento_de_imagens_intimas_na_internet.pdf
https://www.unicef.org/brazil/media/1671...
). Ressalta-se que sexting não é um termo muito bem definido na literatura (Barrense-Dias et al., 2017Barrense-Dias, Y., Berchtold, A., Surís, J.-C., & Akre, C. (2017). Sexting and the definition issue. The Journal of Adolescent Health, 61(5), 544-554. https://doi.org/10.1016/j.jadohealth.2017.05.009
https://doi.org/10.1016/j.jadohealth.201...
). Para fins deste estudo, considera-se sexting o comportamento de enviar, receber ou compartilhar com terceiros (de modo não consentido ou consentido pelo autor da mídia) mensagens de texto, imagens, vídeos, áudios dentro de uma conversa de teor sexual e/ou erótico. O envolvimento mais frequente no sexting também implica maior risco de ciberviolência (Kričkić & Babić Čike, 2017).

Faz parte do sexting o comportamento de circulação de nudes. Entre os fenômenos de abuso digital relacionados com essa circulação, destaca-se a exposição indevida. A exposição indevida acontece quando nudes são compartilhados sem o consentimento de seu(s) autor(es). Considerando as chances de compartilhamento não consentido, o principal fator de risco assinalado é pressão para enviar nudes (Wolak et al., 2018Wolak, J., Finkelhor, D., Walsh, W., & Treitman, L. (2018). Sextortion of minors: Characteristics and dynamics. The Journal of Adolescent Health, 62(1), 72-79. https://doi.org/10.1016/j.jadohealth.2017.08.014
https://doi.org/10.1016/j.jadohealth.201...
). A relação com a nudez no nude pode ser reconhecida tanto como libertadora quanto objetificante (Liong & Cheng, 2019Liong, M., & Cheng, G. H.-L. (2019). Objectifying or liberating? Investigation of the effects of sexting on body image. Journal of Sex Research, 56(3), 337–344. https://doi.org/10.1080/00224499.2018.1438576
https://doi.org/10.1080/00224499.2018.14...
). Essa dupla relação talvez sugira a possibilidade de que nos nudes seja estabelecida uma relação entre o emissor e o recipiente que aluda — de acordo com conceituação de Fonseca (2008Fonseca, J. (2008). Psicodrama da loucura: Correlações entre Buber e Moreno (7ª ed.). Ágora.; 2010Fonseca, J. (2010). Psicoterapia da relação: Elementos de psicodrama contemporâneo. Ágora.; 2018)Fonseca, J. (2018). Essência e personalidade: Elementos de psicologia relacional. Ágora. — tanto a uma relação Eu-Tu, em que existe mais consciência das necessidades e expectativas presentes nessa relação, quanto a uma relação Eu-Isso, em que existe propensão maior à utilização de nudes obtidos para fins outros que não sejam o estabelecimento de parceria sexual e/ou afetiva (i.e., autoestimulação, fetichismo, comentário social ou exposição indevida, entre outros). Essa relação não foi ainda estabelecida na literatura e constitui uma hipótese deste artigo.

Embora pouco estudado na literatura, cita-se ainda o ghosting, entendido como o término de um relacionamento sem explicação para o parceiro, cortando a comunicação abruptamente ou utilizando outras estratégias como deixá-lo sem resposta para mensagens eletrônicas ou mudando o número de telefone. Mesmo não relacionado diretamente aos nudes, o ghosting pode acontecer em decorrência ou concomitante ao fenômeno da exposição indevida. Suas consequências para a saúde mental ainda não são conhecidas. Em estudo preliminar sobre o fenômeno, não foram encontrados correlatos psicológicos (Navarro et al., 2020Navarro, R., Larrañaga, E., Yubero, S., & Víllora, B. (2020). Psychological correlates of ghosting and breadcrumbing experiences: A preliminary study among adults. International Journal of Environmental Research and Public Health, 17(3), E1116. https://doi.org/10.3390/ijerph17031116
https://doi.org/10.3390/ijerph17031116...
). Entretanto isso não significa que o ghosting não tenha impacto na saúde mental de usuários de redes sociais.

Outra vertente da reflexão proposta encontra-se em Han (2015)Han, B. (2015). Sociedade do cansaço. Vozes., que efetua uma análise do impacto da tecnologia na sociedade contemporânea. Refletindo sobre o efeito da constante demanda de atividade e atenção na sociedade contemporânea, o autor entende que a positividade — concepção criada por ele para denotar certas normas de conduta com constante necessidade de atenção e atividade para cumprimento de expectativas geradas socialmente que deixam o sujeito exausto — são transmitidas socialmente, por exemplo, pelas redes sociais. Assim, pode-se conferir status de imperatividade para certos comportamentos humanos considerados positivos, i.e., o feed das redes sociais que realça a necessidade ou a aparência de ser bem-sucedido ou de ter certo tipo de relacionamento amoroso, ou reconhecer no trabalho extenuante sinal de felicidade. Diversas condições emocionais que surgem diante desse contexto acabam trazendo sofrimento individual, com sintomas de depressão, estresse, ansiedade, cansaço, os quais, sob uma perspectiva da positividade, poderiam ser repensados em termos de dinâmicas psicossociais.

A interface simbólica do psicodrama na pesquisa em tecnologia

O psicodrama pode contribuir para compreender o uso da internet e seu potencial de aumentar ou impactar negativamente, ou positivamente, a ação humana. Moreno (1975)Moreno, J. L. (1975). Psicodrama. Cultrix. percebeu na relação homem-máquina a possibilidade de automatismo, conotada na noção de conserva cultural. Falando sobre a tecnologia de seus tempos, considera que existe uma possibilidade de a tecnologia efetuar um bloqueio do desenvolvimento da criatividade humana ao submeter o sujeito a repetições. Considerando o alcance da tecnologia no mundo atual — especialmente quando se considera um impacto da internet nas relações humanas —, talvez a tarefa do psicodramatista diante da tecnologia em nossos tempos seja de promover uma apropriação criativa de seu uso. Contraposta ao automatismo está a espontaneidade. Relações automatizadas são pouco espontâneas. Essa falta de espontaneidade afeta a possibilidade de soluções criativas para problemas relacionados ao uso de tecnologia. O resgate dessa espontaneidade-criatividade nas relações humanas e no uso de internet constitui talvez uma tarefa atual do psicodramatista.

Ampliando o construto de criatividade e sua elaboração afetiva no uso de internet, a possibilidade de interface metodológica entre psicodrama e psicologia analítica se mostra profícua. O embasamento para realizar o estudo proposto tece, portanto, essa interface (Cardoso Júnior & Wahba, 2021Cardoso Júnior, A. L. (2021). Palco, cena e corpo no psicodrama on-line. Revista Brasileira de Psicodrama, 29(1), 65–70. https://doi.org/10.15329/2318-0498.21746
https://doi.org/10.15329/2318-0498.21746...
), que, sob uma perspectiva teórica, aponta aproximações e distanciamentos (Ramalho, 2002Ramalho, C. M. (2002). Aproximações entre Jung e Moreno. Ágora.). Essa vinculação data ao menos da década de 1970, quando da primeira publicação da obra Psicodrama Junguiano de Gasseau e Gasca (1991)Gasseau, M., & Gasca, G. (1991). Lo psicodramma junghiano. Bollati Boringhieri.. Psicodramatistas que atuam em uma interface com a psicologia analítica podem ser encontrados em diversos lugares no mundo (Cardoso Júnior & Wahba, 2021Cardoso Júnior, A. L. (2021). Corpos líquidos: Circulação de nudes em jovens usuários de redes sociais e o psicodrama junguiano. [dissertação de mestrado, Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia: Psicologia Clínica da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo]. Repositório PUCSP. Disponível em: https://repositorio.pucsp.br/handle/handle/24927. Acesso em: 16 out. 2022.
https://repositorio.pucsp.br/handle/hand...
). Assim, não existe uma definição a priori do que se constitui como psicodrama junguiano, fora o reconhecimento da influência simultânea de um e de outro na proposta de trabalho. Tecer uma definição sobre o psicodrama junguiano é tarefa complexa, especialmente considerando que a identificação de certos psicodramas como pertencendo a um campo junguiano ensejaria uma exclusão de outros que têm potencialmente sua contribuição para essa modalidade contemporânea. Não se pode efetuar uma definição estrita de psicodrama junguiano considerando a multiplicidade de propostas existentes e ainda a serem criadas na interface entre o psicodrama e a psicologia analítica.

A interface do psicodrama com o simbólico foi explorada em estudos como o de Quilici (2009)Quilici, M. A. I. (2009). Dramatização espontânea e psicologia analítica de Jung: Consideração da sombra em um grupo de psico-sociodrama [dissertação de mestrado, Universidade de São Paulo]. https://doi.org/10.11606/D.47.2009.tde-11082009-080205
https://doi.org/10.11606/D.47.2009.tde-1...
, observando a dimensão da sombra em participantes do psicodrama público no Centro Cultural São Paulo; Shaffer (2019)Shaffer, S. D. (2019). The stage and the stone: Psychodrama, alchemy, and Jung [dissertação de mestrado, Pacifica Graduate Institute]. ProQuest LLC. Disponível em: https://www.proquest.com/openview/6acf3a93919ec967d435fdb7a790f5bb/1.pdf. Acesso em: 16 out. 2022.
https://www.proquest.com/openview/6acf3a...
, tecendo metáforas sobre dois símbolos considerados por ela como fundamentais para o desenvolvimento do psicodrama (palco e pedra); ou Benedito (2002)Benedito, V. L. D. I. (2002). Abordagem simbólica do conflito conjugal: O corpo em cena. Junguiana, 20, 87-94., observando, a partir de esculturas psicodramáticas criadas em psicoterapia de casal, aspectos mítico-simbólicos presentes nessa relação conjugal. A via de aproximação deste artigo pode ser mais bem compreendida na consideração dos aspectos simbólicos encontrados na experiência psicodramática (Cardoso Júnior & Wahba, 2021Cardoso Júnior, A. L. (2021). Palco, cena e corpo no psicodrama on-line. Revista Brasileira de Psicodrama, 29(1), 65–70. https://doi.org/10.15329/2318-0498.21746
https://doi.org/10.15329/2318-0498.21746...
). Menegazzo (1994)Menegazzo, C. M. (1994). Magia, mito e psicodrama. Ágora. considera que a dramatização possibilita a formação de uma consciência mítica em que acontece uma superação de dinâmicas coletivas que atribuem problemáticas coletivas a sujeitos específicos, i.e., dinâmica do bode expiatório. Ressalta como sendo papel do psicodramatista a transformação das dinâmicas excludentes em outras mais criativas através de um processo de simbolização efetuado coletivamente através do ritual dramático.

Outras aproximações conceituais são importantes de serem esclarecidas para compreensão deste artigo, por constituírem referências na análise dos dados obtidos na sessão psicodramática. São elas: (1) aproximação entre o conceito de personagem (Calvente, 2002Calvente, C. (2002). O personagem na psicoterapia. Ágora.) e amplificação mítico-simbólica (Campbell, 2014Campbell, J. (2014). O poder do mito (30a ed.). Palas Athena.; Cardoso Júnior & Wahba, 2019Wahba, L. L. (2019). Entre o universal e o particular: A subjetivação simbólica no método junguiano. Em I. Kublikowski, E. M. S. P. Kahhale, & R. M. Tosta (Orgs.), Pesquisas em psicologia clínica: Contexto e desafios. EDUC.) e (2) sistema teletransferencial.

A amplificação mítico-simbólica pode ser efetuada na observação das dinâmicas relacionais presentes na personagem, assim como nas histórias criadas. As personagens criadas pelos participantes durante a dramatização poderão revelar aspectos concernentes a experiências humanas universais que são reconhecidos nos mitos. Exemplifica-se na leitura efetuada por Benedito (2002)Benedito, V. L. D. I. (2002). Abordagem simbólica do conflito conjugal: O corpo em cena. Junguiana, 20, 87-94., quando descreve pelo mito de Eco e Narciso aspectos da dinâmica conjugal presentes em esculturas psicodramáticas criadas por um casal. Representando a dinâmica do casal pela leitura simbólica desse mito, Eco representa a constante necessidade sentida pela esposa de corresponder ao seu esposo e Narciso representa a falta de reciprocidade do esposo com sua esposa. De modo semelhante, outros mitos poderão auxiliar na compreensão de dinâmicas relacionais emergentes na experiência psicodramática. Considerando especificamente dinâmicas que estão presentes no uso de tecnologia, considera-se que fenômenos emergentes na cultura digital poderão ser compreendidos pelas metáforas de referências poéticas exploradas em mitologias. Mitologias podem ser, nesse caso, tanto aquelas antigas quanto outras contemporâneas, i.e., histórias, artes visuais, composições musicais. Fenômenos tecnológicos são simbolizados dramaticamente — saindo de uma dimensão concreta e ingressando em uma compreensão simbólica mais sintonizada com o contexto social no qual são efetuados. Uma possível abordagem a retomar é a noção de mito e ideologia em Menegazzo (1994)Menegazzo, C. M. (1994). Magia, mito e psicodrama. Ágora., que aponta para essa possibilidade de simbolização de dinâmicas relacionais mediadas pelos dispositivos tecnológicos. Observe-se que, em sessões mais prolongadas, esses mitos e símbolos podem fazer parte do compartilhamento, sendo comunicados entre os participantes ou para eles por meio de uma linguagem poética e, eventualmente, aprofundados no seu significado simbólico em processamentos das sessões.

Outra noção contemporânea relevante para este artigo é a de dinâmica entre papel e contrapapel (Moreno, 1975Moreno, J. L. (1975). Psicodrama. Cultrix.), que acontece em termos de sistema teletransferencial. A noção de sistema teletransferencial parte da concepção de tele (Moreno, 1975Moreno, J. L. (1975). Psicodrama. Cultrix.), que pode ser descrita como o ato de ver o outro pelos seus olhos e também ser visto pelo outro pelos meus olhos (Moreno, 1920/1992Moreno, J. L. (1992). As palavras do pai. Editorial Psy. (Obra original publicada em 1920)). Posteriormente, compreendeu-se a relação entre tele e transferência como passagens — o que deu evidência maior à dinâmica entre os dois —, formando a noção de sistema teletransferencial (Santos & Torres de Vasconcelos, 2021Santos, F., & Torres de Vasconcelos, T. (2021). Leitura conceitual sobre o fenômeno da transferência na cena psicodramática. Revista Brasileira de Psicodrama, 24(1), 7-15. https://doi.org/10.15329/2318-0498.20160002
https://doi.org/10.15329/2318-0498.20160...
). Considera-se que a dramatização da transferência pode ser importante na produção de insights que eventualmente favorecerão o estabelecimento de relações télicas nas situações dramatizadas (Kim, 2021Kim, L. M. V. (2021). Intervenção sociodramática breve operacionalizada (ISBO). Revista Brasileira de Psicodrama, 20(1), 93-114.). Note-se que a concepção de transferência psicodramática difere da psicologia analítica. Na psicologia analítica, pode-se compreender transferência como projeção de conteúdos inconscientes observada em relações humanas que se transpõem no campo terapêutico (Jacoby, 2011Jacoby, M. (2011). Encontro analítico: Transferência e relacionamento humano. Vozes.). Essa diferença entre concepções de transferência diferencia setting analítico de setting psicodramático; entretanto ambos podem ser aproximados na simbolização. Considerando-se que o símbolo intermedeia a comunicação entre cliente e analista, o analista, assim como o psicodramatista, embora percorrendo caminhos diferentes, auxilia a realizar passagens essencialmente simbólicas. No símbolo concentra-se uma carga afetivo-emocional presente na experiência subjetiva; sob essa perspectiva, o palco psicodramático age como um continente para a simbolização da experiência, que ocasiona transformação ao possibilitar uma reelaboração pelo sujeito de sua história (Palomo, 2017Palomo, V. (2017). Psicoterapia: Um ritual de reinvenção de si. Em E. C. Souza & M. H. M. B. Abrahão (Eds.), Tempos, narrativas e ficções: A invenção de si. EDIPUCRS.; Cardoso Júnior & Wahba, 2021Cardoso Júnior, A. L. (2021). Palco, cena e corpo no psicodrama on-line. Revista Brasileira de Psicodrama, 29(1), 65–70. https://doi.org/10.15329/2318-0498.21746
https://doi.org/10.15329/2318-0498.21746...
). Ainda, amplificações mítico-simbólicas poderão ser efetuadas a posteriori, a partir de personagens e cenas vivenciadas no palco psicodramático, por meio de metáforas baseadas em mitos presentes na cultura (Campbell, 2014Campbell, J. (2014). O poder do mito (30a ed.). Palas Athena.; Cardoso Júnior & Wahba, 2021Cardoso Júnior, A. L. (2021). Palco, cena e corpo no psicodrama on-line. Revista Brasileira de Psicodrama, 29(1), 65–70. https://doi.org/10.15329/2318-0498.21746
https://doi.org/10.15329/2318-0498.21746...
). No que toca os fenômenos tecnológicos, o símbolo pode ser um ponto de partida para a compreensão de práticas e fenômenos relacionados ao uso de internet, i.e., nudes, ghosting, exposição indevida, e o sistema teletransferencial adquire aplicação na análise de dinâmicas relacionais encontradas no uso de dispositivos tecnológicos, ao vincular as expectativas de seus usuários com a formação de relações humanas no uso de tais dispositivos.

OBJETIVOS

O presente artigo traz uma reflexão a partir de pesquisa realizada com psicodrama junguiano. A pesquisa partiu da problematização sobre qual seria a função de enviar, receber e compartilhar nudes na prática de circulação de nudes em jovens usuários de redes sociais de 18 até 26 anos. Após um levantamento inicial caracterizando a amostra, foram selecionados dois participantes para sessão online de psicodrama junguiano. O presente artigo refere-se aos objetivos específicos pertinentes à sessão psicodramática: identificar os sentidos atribuídos na prática de circulação de nudes, identificar problemas presentes nessa prática e como eles são vivenciados pelos participantes do grupo e, ainda, realizar amplificações mítico-simbólicas que possibilitem a compreensão das temáticas e dinâmicas emergentes.

MÉTODO

A sessão online de psicodrama foi parte de pesquisa maior com uso de métodos mistos (Creswell & Clark, 2015Creswell, J. W., & Clark, V. L. P. (2015). Pesquisa de Métodos Mistos - 2.ed.: Série Métodos de Pesquisa. Penso.) que se encontra em processo de publicação como outro artigo. O recrutamento dos participantes para a sessão de psicodrama foi feito por meio dos e-mails deixados por eles após responderem a um questionário online cuja chamada foi realizada em redes sociais e através de indicações de endereços de e-mail efetuadas pelos participantes em metodologia denominada bola de neve. Neste artigo são apresentadas apenas informações referentes à sessão psicodramática que teve o objetivo de coletar informações qualitativas sobre a prática de circulação de nudes no uso de internet considerando jovens brasileiros de 18 a 26 anos.

Quanto ao desenho da pesquisa – no que tange a essa etapa qualitativa da sessão online de psicodrama – foi organizado um grupo online para coleta de histórias sobre nudes entre os participantes. Durante a sessão, uma dessas histórias foi escolhida com os participantes para ser dramatizada e aprofundada. Houve a participação de ego-auxiliar – designado como Amauri na descrição da sessão. A modalidade foi o psicodrama online (Cardoso Júnior, 2021Cardoso Júnior, A. L. (2021). Palco, cena e corpo no psicodrama on-line. Revista Brasileira de Psicodrama, 29(1), 65–70. https://doi.org/10.15329/2318-0498.21746
https://doi.org/10.15329/2318-0498.21746...
; Vidal & Castro, 2020Vidal, G. P., & Castro, A. (2020). O Psicodrama clínico online: Uma conexão possível. Revista Brasileira de Psicodrama, 28(1), 54–64.). A sessão teve duração de duas horas e foi gravada e posteriormente transcrita em texto. Depois da transcrição, a gravação original foi descartada. A transcrição completa da sessão de psicodrama pode ser encontrada como referência dos dados utilizados neste artigo em Cardoso Júnior (2021)Cardoso Júnior, A. L. (2021). Palco, cena e corpo no psicodrama on-line. Revista Brasileira de Psicodrama, 29(1), 65–70. https://doi.org/10.15329/2318-0498.21746
https://doi.org/10.15329/2318-0498.21746...
. Foram utilizadas técnicas básicas do psicodrama (Cruz et al., 2018Cruz, A., Sales, C. M. D., Alves, P., & Moita, G. (2018). The core techniques of Morenian psychodrama: A systematic review of literature. Frontiers in Psychology, 9, 1263. https://doi.org/10.3389/fpsyg.2018.01263
https://doi.org/10.3389/fpsyg.2018.01263...
; Moreno, 1975Moreno, J. L. (1975). Psicodrama. Cultrix.), i.e., congelamento, solilóquio, duplo, espelho, inversão de papel, buscando compreender a função simbólica do nude ao longo do desenvolvimento da história dramatizada. A partir da fundamentação teórica proposta, foi feita uma leitura da experiência da sessão de psicodrama nos seguintes aspectos: processo de simbolização, considerando a simbolização da função dos nudes durante a dramatização; dinâmicas teletransferenciais, considerando em particular dinâmicas de violência encontradas nos fenômenos relacionados com uso de tecnologia na história dramatizada, que foram exposição indevida e ghosting; e amplificações mítico-simbólicas (Campbell, 2014Campbell, J. (2014). O poder do mito (30a ed.). Palas Athena.; Cardoso Júnior & Wahba, 2021Cardoso Júnior, A. L., & Wahba, L. L. (2021). Um encontro entre psicodrama e psicologia analítica: Ritual e mitopoese. Revista Brasileira de Psicodrama, 29(3), 237–249. https://doi.org/10.15329/2318-0498.22161
https://doi.org/10.15329/2318-0498.22161...
; Wahba, 2019Wahba, L. L. (2019). Entre o universal e o particular: A subjetivação simbólica no método junguiano. Em I. Kublikowski, E. M. S. P. Kahhale, & R. M. Tosta (Orgs.), Pesquisas em psicologia clínica: Contexto e desafios. EDUC.), efetuadas a partir das personagens (Calvente, 2002Calvente, C. (2002). O personagem na psicoterapia. Ágora.) emergentes na dramatização e em que puderam ser efetuadas leituras sobre dinâmicas de Orlando relacionando-as ao mito de Lilith (Sicuteri, 1998Sicuteri, R. (1998). Lilith: A lua negra (6ª ed.). Paz e Terra.) e sobre a função dos nudes a partir do mito de Eros e Psiquê (Apuleio, 2009Apuleio. (2009). Eros e Psiquê (F. Gullar, Trad.). FTD Educação.), que são apresentadas na discussão.

Ressalta-se que a realização da sessão de psicodrama na modalidade online foi uma escolha metodológica influenciada pela situação de isolamento social durante a pandemia. Faz sentido a escolha da modalidade online na pesquisa de fenômenos relacionados ao uso de internet; entretanto o plano original era realizar o encontro presencialmente. Foi durante a elaboração da pesquisa que se impôs o isolamento social decorrente da pandemia de COVID-19 e se alterou o plano para que houvesse continuidade do projeto dentro da modalidade online. As técnicas foram assim adaptadas para esse contexto conforme reflexão dos psicodramatistas naquele momento (Cardoso Júnior, 2021Cardoso Júnior, A. L. (2021). Palco, cena e corpo no psicodrama on-line. Revista Brasileira de Psicodrama, 29(1), 65–70. https://doi.org/10.15329/2318-0498.21746
https://doi.org/10.15329/2318-0498.21746...
; Vidal & Castro, 2020Vidal, G. P., & Castro, A. (2020). O Psicodrama clínico online: Uma conexão possível. Revista Brasileira de Psicodrama, 28(1), 54–64.). Um ponto positivo da utilização da modalidade de psicodrama online neste estudo foi a possibilidade de uso de recursos tecnológicos, i.e., fundo eletrônico, objetos disponíveis no ambiente habitado para caracterização de personagem, delimitação do contexto dramático pela utilização dos recursos de câmera. A utilização dos recursos tecnológicos pelos participantes demonstra que a modalidade online pode promover o desenvolvimento da criatividade para os seus participantes mediante uso de recursos tecnológicos.

A sessão foi planejada com as seguintes etapas: (1) aquecimento inespecífico, quando os participantes foram convidados a se apresentar uns para os outros pelo jogo Batizado Mineiro — que consiste no participante dizer seu nome acompanhado de um gesto, ao que depois dessa apresentação ressoa o grupo repetindo o nome e o gesto que foram feitos; (2) aquecimento específico, quando os participantes foram convidados a fechar seus olhos e visualizar histórias pessoais com os nudes, deixando que uma dessas histórias surgisse como sua escolha pessoal de cena, a qual foi contada aos demais seguindo a orientação de partilharem apenas o que sentissem ser confortável dentro da situação de pesquisa; (3) dramatização, em que, ocorrendo eleição sociométrica com os participantes da cena a ser dramatizada, inseriu-se o nude como papel simbólico tendo em vista a exploração da sua função no desenvolvimento das cenas e de como os nudes afetam e são afetados enquanto estão em cena (Dedomenico, 2013Dedomenico, A. M. (2013). A funcionalidade do conceito de papel. Revista Brasileira de Psicodrama, 21(2), 81-92.); e (4) compartilhamento e processamento simbólico, no qual os participantes foram convidados a associar elementos simbólicos emergentes nessa experiência com imagens e situações do seu cotidiano depois de um compartilhamento livre sobre como foi para eles terem dramatizado as cenas escolhidas (Wahba, 2019Wahba, L. L. (2019). Entre o universal e o particular: A subjetivação simbólica no método junguiano. Em I. Kublikowski, E. M. S. P. Kahhale, & R. M. Tosta (Orgs.), Pesquisas em psicologia clínica: Contexto e desafios. EDUC.).

CONSIDERAÇÕES ÉTICAS

A pesquisa foi realizada de acordo com os requerimentos éticos em pesquisa envolvendo seres humanos preconizados pela Resolução CONEP 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde, pela Resolução CNS/MS 510/2016 e pelo Regimento dos Comitês de Ética em Pesquisa da PUC-SP. A parte online de recrutamento foi amparada nas Resoluções nº 466 e 510. A pesquisa encontra-se aprovada na Plataforma Brasil sob o n˚ CAAE 37145820.3.0000.5482.

RESULTADOS

Relato de sessão

Os nomes Rebeca e Orlando foram escolhidos pelos dois participantes aqui retratados como nomes fictícios, e a sessão teve a participação de um ego-auxiliar, Amauri. No aquecimento inespecífico foi realizada uma apresentação dos participantes por meio do jogo Batizado Mineiro. Terminando o jogo, o grupo estava tranquilo e os participantes mais à vontade entre si. Efetuou-se no aquecimento específico a técnica da fantasia dirigida (Fonseca, 2010Fonseca, J. (2010). Psicoterapia da relação: Elementos de psicodrama contemporâneo. Ágora.) pela consigna “Feche seus olhos e pense em situações em que você troca nudes”, seguida de “A partir das situações evocadas e vivenciadas, conte uma história para o grupo”. Depois que todos abriram os olhos, contaram as histórias que foram visualizadas. A história de Orlando, advogado, 26 anos, atualmente solteiro, foi a história escolhida pelos participantes para ser dramatizada:

Arrependimento

A situação que eu lembrei foi a mais recente que aconteceu na minha vida nessa questão de mandar nudes, porque, devido a ela, acabou gerando uma complicação muito maior no meu relacionamento, que acabou. Em agosto do ano passado, eu conversei com uma garota e eu acabei terminando com a minha namorada. Ficamos um mês terminados, sem contato nenhum. Fui mandar mensagem pra essa garota, que eu havia saído algumas vezes, mas nunca chegamos nos finalmentes. Acabei mandando mensagem pra ela, conversamos normal e, de repente, num ponto dessa conversa, nós acabamos entrando nessa parte mais sexual. Então vários sentimentos que foram acontecendo, de todas as vezes que a gente saiu e se falou, acabaram aflorando com esse princípio de conversa; mudança de tópico. Então ela começou a me mandar fotos dela e eu também comecei a mandar fotos minhas. Só que, quando isso aconteceu, eu não gostei, porque eu ainda nutria muito sentimento pela minha ex-namorada e eu não achei aquilo certo. Então, fui, tentei, chamei ela pra conversar seriamente, né, fui, expliquei toda a situação, falei que estava recentemente solteiro, mas que ainda gostava muito da minha ex-namorada e que eu queria conversar com ela pra ver se nós ainda teríamos a possibilidade de uma outra chance. Essa outra garota ficou extremamente brava, achando que eu a havia usado para alguma coisa e nunca mais nos falamos. Voltei com a minha ex-namorada, ficamos super bem. E, em dezembro, acabou nosso namoro, no Natal, acabou. E por diversas questões, principalmente por parte dela, que não vêm ao caso no momento, e eu aproveitei esse término pra tirar um tempo pra mim e sentar comigo mesmo pra organizar minha vida e tentar começar meu 2021 bem. Então eu fui, fiz uma autorreflexão comigo mesmo e decidi que muitos pontos da minha vida precisavam mudar, que eu não enxergava, que eu precisava realmente mudar e eu decidi colocar isso em prática. E minha primeira atitude foi pedir desculpas pra qualquer pessoa que um dia eu prejudiquei, que um dia eu já fiz mal. Mandei mensagens pra algumas dessas pessoas, pedindo desculpas sinceras, explicando tudo que aconteceu, falando que eu estava em um processo para começar meu 2021 diferente, pra ser uma pessoa melhor. A maioria aceitou tranquilamente, numa boa, até ficaram felizes, e muitos acabaram me pedindo desculpas, porque foi uma via de mão dupla, não fui só eu que prejudiquei, mas também fui prejudicado em alguns pontos, e resolvi mandar mensagem pra essa menina que eu conversei enquanto eu estava solteiro, durante esse mês que eu havia terminado com a minha namorada. Mandei mensagem pra ela, expliquei toda a situação, pedi desculpas: “Fulana, estou pedindo desculpas por tudo que aconteceu, naquele tempo eu não agi certo, é isso, não chamei pra sair, não chamei pra fazer nada, somente mensagem pedindo desculpas”. Aí, eu não sei o que se passou pela cabeça dela que ela não acreditou, eu realmente sendo sincero em pedir desculpas, e ela foi mandar toda a conversa que tivemos pra minha ex-namorada. Minha ex-namorada viu tudo aquilo, principalmente as fotos que nós trocamos — não sei se ela mostrou fotos dela também, acredito que só tenha mostrado a minha parte — minha ex-namorada, nós já estávamos terminados, isso aconteceu no dia 2 de janeiro, que eu tive a conversa com essa garota, e a partir desse momento a minha ex-namorada colocou na cabeça dela que eu a traí com essa menina. Mesmo estando solteiros na época, ela acha que eu a traí com essa menina. Depois disso, eu parei pra pensar, depois de algumas semanas eu parei pra pensar o quanto, se você for realmente mandar nudes pra uma pessoa, o quanto você precisa ter certeza da pessoa pra quem você vai mandar. É bom, é gostoso, é legal, atiça, dá vontade, mas você tem ali, você está dando pra outra pessoa, como eu posso dizer... uma arma que ela pode um dia atirar contra você. Você está armando a outra pessoa pra um dia ela te ferir. Então... a partir desse momento eu peguei trauma. Não consigo mais fazer ou receber.

(Cardoso Jr., 2021Cardoso Júnior, A. L. (2021). Palco, cena e corpo no psicodrama on-line. Revista Brasileira de Psicodrama, 29(1), 65–70. https://doi.org/10.15329/2318-0498.21746
https://doi.org/10.15329/2318-0498.21746...
, p. 131-132)

A cena escolhida para ser dramatizada foi a de Orlando. Foram personagens: João, Vitória, Orlando, a ex e o nude. As personagens foram dramatizadas pelos atores: ego-auxiliar Amauri (João, Orlando e o nude), Rebeca (Vitória, a ex e o nude) e Orlando (Orlando e Vitória).

A dramatização foi iniciada no ponto em que Orlando estava na casa do amigo João. Os dois estavam no videogame quando Orlando resolve conversar através do seu smartphone com Vitória. Conversa com ela na tentativa de pedir desculpas sobre o ocorrido entre eles quando fazia alguns meses que eles tinham trocado mensagens no WhatsApp, quando ocorreu também uma troca de nudes, e depois havia deixado o contato com ela. Nessa conversa entre Orlando e Vitória, aparece em cena Amauri (ego-auxiliar) no papel do nude. Comenta, iluminando-se parcialmente: “eu sempre funciono”. Voltando para a conversa entre Orlando e Vitória, Orlando pediu desculpas para Vitória pelo que aconteceu entre eles em agosto. Vitória em cena faz menção de enviar nude seu agora para Orlando. Orlando recusa. A cena foi congelada pelo diretor e os atores foram entrevistados. Nessa entrevista, Orlando conta que a possibilidade de receber os nudes de Vitória deixa ele querendo mais fortemente não receber mais nudes, ao passo que Vitória, por sua vez, comenta que o envio de nudes acontece de acordo com o contexto da conversa — referindo-se à conversa que eles haviam tido quando da troca de nudes com teor erótico. Finalmente o nude expressa que se sente usado, mas acredita que chamará atenção de Orlando. Descongela-se a cena. Orlando e Vitória continuam conversando, mas não conseguem entrar em acordo. Orlando pede desculpas a ela e Vitória efetua pressão nele para que continuem se falando. Orlando esclarece que não quer ficar em contato com ela, somente quer pedir desculpas. Vitória sugere que vai bloquear e excluir o seu contato. Novamente congela-se a cena. Orlando comenta estar muito bem interpretando o seu próprio papel, apesar de Vitória, na situação real, não ter recebido bem as suas desculpas. O diretor propõe que Orlando entre no papel de Vitória como ator. Como a atriz Rebeca parecia estar pouco aquecida para fazer uma inversão de papel e entrar no papel de Orlando, Amauri desempenhou o papel de Orlando e Rebeca desempenhou o papel de nude.

Descongela-se a cena. Vitória revela ter afeto por Orlando e diz ter se sentido usada quando Orlando entrou em contato com ela apenas quando se encontrava mal com sua namorada. Orlando pede desculpas para Vitória. Vitória resolve que é melhor para ela não continuar como sua amiga. Congelando a cena, o diretor pede que Rebeca entre na cena como nude. Rebeca entra em cena com uma imagem do universo em fundo eletrônico e instiga Orlando a enviar o nude para Vitória. Orlando, entretanto, recusa. Revela nesse momento que havia enviado nudes para Vitória na situação anterior somente porque se sentia sozinho. Vitória procura a ex de Orlando nas redes sociais e envia para ela o print da conversa em que Orlando lhe enviou nudes. Rebeca — agora mais aquecida em cena — entra no papel da ex de Orlando que recebe o print da conversa entre ambos. A ex confronta Orlando sobre esse print, sugerindo que ele está mentindo. O diretor congela a cena e pede aos atores para falarem alto como estão se sentindo em cena com seus papéis. Rebeca conta como ex de Orlando que não confia mais nele, Orlando conta que sente hipocrisia em sua ex, pois lembra que ela pressionava para que ele mudasse durante o seu relacionamento e sente agora na dramatização que ela também precisava ter mudado com ele — talvez expressando desconforto com o fato de que durante o relacionamento a namorada via no WhatsApp de Orlando as conversas que ele tinha com suas amigas. Finalmente, Amauri, desempenhando o nude, expressa: “Eu sou o ingresso do afeto que eu quero receber”.

O diretor convida o protagonista a dar o fim que ele deseja para sua história. Orlando esclarece para sua ex que ele não tem por Vitória o sentimento que tem por ela e que é com a ex que ele quer ficar. Sua ex responde a Orlando que entende, mas que não consegue confiar nele naquele momento. Orlando responde a sua ex que também entende sua posição e que ele não se orgulha da conversa com Vitória. Amauri, no papel do nude, pergunta para Orlando se ele não quer mais recebê-lo — o nude — e Orlando responde que o nude foi consequência de algo que Orlando não gostou e que não quer mais o nude em sua vida. Antes de saírem de cena, os atores disseram, a pedido do diretor, uma frase sobre as personagens que haviam desempenhado. Rebeca, no papel de ex, diz: “Eu vou me vingar”. Orlando, no papel de Orlando, diz: “Me desculpa”. E Amauri, no papel de nude, diz: “Sou muito mal compreendido”.

Seguiu-se a etapa de compartilhamento. O protagonista comentou que compreendeu melhor as reações de sua ex, recebendo o print da conversa de WhatsApp com os nudes do seu namorado, e de sua amiga Vitória, sugerindo mediante tal leitura que ela se poderia ter se frustrado com a falta de continuidade na relação entre eles. Orlando não entende, entretanto, que isso justifique a atitude de compartilhar com sua ex a conversa que ele e Vitória tiveram. Durante a etapa adicional de processamento simbólico, efetuada depois do compartilhamento, personificou-se o nude como símbolo de erotismo em que estão presentes instinto sexual e afetividade. Orlando atribuiu para o nude a imagem daquilo que foi vivenciado por ele em janeiro, quando permaneceu chorando no quarto. Convidados a darem para o nude outro nome, Rebeca escolheu besteira e Orlando escolheu idiotice. Orlando enfim entende que não precisa do nude para conhecer alguém e que não gostaria de passar de novo por essa situação na vida. Sente que pode deixar as coisas fluírem naturalmente.

DISCUSSÃO

Há três aspectos a se destacar na discussão proposta:

  • Nudes e erotismo na cultura digital;

  • Os fenômenos da exposição indevida, ghosting e dinâmicas de violência na circulação de nudes;

  • Amplificações mítico-simbólicas realizadas a posteriori pelo terapeuta a partir das situações e personagens que foram colocadas em cena, nas quais são explorados os mitos Eros e Psiquê (Apuleio, 2009Apuleio. (2009). Eros e Psiquê (F. Gullar, Trad.). FTD Educação.) e Lilith (Sicuteri, 1998Sicuteri, R. (1998). Lilith: A lua negra (6ª ed.). Paz e Terra.).

Função do nude: Erotismo e busca de afeto

A respeito do uso de nudes como busca de erotismo e de afeto, desempenhar o papel do nude dentro da cena apontou que ele surge como um elemento que, ao mesmo tempo em que simboliza o erotismo, abre a possibilidade de desenvolvimento da afetividade, ou seja, tem a função de ser tanto um elemento de exploração erótica, quanto de formação e manutenção de vínculos afetivos ou de rompimento destes vínculos. Essa duplicidade de funções torna-se evidente na frase: “Eu sou o ingresso do seu afeto”. Outra função possível de ser apreendida pela cena dramatizada é de que o nude constitui um elemento importante para a formação vincular nos relacionamentos. Um relacionamento pode ter início com o envio de nudes cuja manutenção é feita pelo contato via internet com o parceiro para o qual se enviou e/ou do qual recebeu nudes. Entretanto, se analisarmos a psicodinâmica de Orlando, enviar nudes para ele talvez tenha sido uma resposta para a solidão afetiva que sentia com a falta da sua namorada — com quem gostaria de voltar —, parecendo que ele poderia se envolver em uma interação casual com a amiga com certa facilidade e posteriormente deixar esse envolvimento de lado. Importante ressaltar que haveria outras funções não exploradas na história do protagonista para os nudes. Finalmente, é possível antever a síntese dos dois aspectos — sexual e afetivo — na frase “Eu sou o ingresso do afeto que eu quero receber”, dita a partir de duas perspectivas, i.e., do nude (“Eu sou o ingresso do afeto”) e Orlando (“do afeto que eu quero receber”). Parece que o ator Amauri se colocou no lugar de Orlando e expressou o papel do nude aos olhos de Orlando na história dramatizada.

O processo de simbolização do nude foi realizado mediante as sucessivas revelações de sentidos obtidas pelos atores durante o desempenho desse papel na dramatização. No início, o nude surgiu na penumbra, simbolizando a existência de aspectos mais conscientes e outros mais inconscientes ou desconhecidos, que estão nele sintetizados. Conforme a dramatização prosseguiu, mudou-se a visão inicial de que o nude teria uma função apenas erótica e surgiu a função de vinculação afetiva nos relacionamentos pela internet. Depreende-se que o erotismo tenha um papel de provocar interesse para a relação afetiva, sem que se coloque o corpo meramente como objeto sexual; adquire, portanto, conotação de um estímulo prazeroso que permite a descoberta do outro. O aspecto afetivo simbolizado no nude é assim entendido como um “ingresso para o afeto”, ou seja, a expectativa de que, pelo nude, se forme uma relação sexual e também afetiva, ainda que casual, que permita um escape da sensação de solidão. Conforme dificuldades afetivas do protagonista são ensejadas pelo distanciamento da ex-namorada (especialmente considerando o tempo de separação entre eles), especialmente no seu sentimento de solidão, a troca de nudes acaba não tendo o resultado esperado de diminuir a solidão, mas mantém a dificuldade nesse relacionamento.

Dinâmicas de violência nos nudes

Dois fenômenos de violência relacionados ao uso de internet são identificados na dramatização: exposição indevida e ghosting. Ambas foram identificadas como causadoras de sofrimento. O arrependimento relatado pelo protagonista surge como desdobramento de uma experiência negativa de violação da sua intimidade mediante quebra de um acordo de confiança — o que ocorreu a Vitória ao compartilhar a sua conversa com a ex-namorada de modo não consentido. O clima emocional da sessão foi permeado pelo medo das possíveis consequências negativas da exposição indevida. Adentrando na história do protagonista, percebe-se através do papel do nude desempenhando pelo ego-auxiliar Amauri que a motivação de Orlando para envio de nudes decorreu da sensação de solidão afetiva. Diante das dificuldades no seu relacionamento amoroso, Orlando vê no nude uma possibilidade de estabelecimento de conexão afetivo-sexual com sua amiga Vitória, sem que houvesse necessariamente um compromisso envolvido. Já para Vitória, imagina-se que o nude pode ter adquirido sentido diferente: um pretexto para aproximação afetiva com Orlando, o que estaria presente quando Rebeca desempenha o papel de Vitória e vincula a oferta de afeto ao recebimento de seus nudes por Orlando. Posteriormente, quando Orlando conversa sobre a interrupção do contato entre eles, evocou-se nessa personagem em cena uma sensação negativa a partir do envio do seu nude. Entende-se que a questão seja concernente não apenas à história afetiva entre os dois, mas também à sensação que uma não continuidade do contato afetivo pode gerar depois do envio de nudes entre conhecidos, ou seja, a própria dinâmica de envio e recebimento de nudes tem um impacto nessa relação. Talvez essa sensação esteja acompanhada de esvaziamento diante do envio de imagem erótica que não resultou em uma conexão afetiva.

Haveria, assim, nesse caso de exposição indevida, expectativa de que, por meio do nude, uma possibilidade de conexão afetiva com outra pessoa se concretize e, no momento que essa formação de vínculo não adquire continuidade, as expectativas depositadas no ato de envio de nudes são frustradas. Esse esvaziamento do vínculo afetivo remete ao estabelecimento de uma relação “Eu-Isso” (Fonseca, 2008Kričkić, D., Šincek, D., & Čike, A. B. (2017). Sexting, cyber-violence and sexually risk behaviour among college students. Kriminologija & Socijalna Integracija, 25(2), 15-28. https://doi.org/10.31299/ksi.25.2.2
https://doi.org/10.31299/ksi.25.2.2...
; 2010Fonseca, J. (2010). Psicoterapia da relação: Elementos de psicodrama contemporâneo. Ágora.; 2018Fonseca, J. (2018). Essência e personalidade: Elementos de psicologia relacional. Ágora.), que pode ser reconhecida também na temática da objetificação em torno da nudez no sexting, como explicitada por Liong e Cheng (2019)Liong, M., & Cheng, G. H.-L. (2019). Objectifying or liberating? Investigation of the effects of sexting on body image. Journal of Sex Research, 56(3), 337–344. https://doi.org/10.1080/00224499.2018.1438576
https://doi.org/10.1080/00224499.2018.14...
. Se Orlando buscava alívio para a solidão imediata, do outro lado Vitória buscava possivelmente formar vínculo mais profundo, no que se compreende que o nude para Orlando teria função simbólica de lidar com a solidão afetiva, ao passo que, para Vitória, teria função simbólica de ingresso ou entrada em relação afetivo-sexual. Essa relação aparece quando os participantes citam no papel do nude a liquidez desse tipo de imagem nas relações contemporâneas, i.e., “vou passear de chat”, “sou mal compreendido”.

Existe certa pressão neste processo de vinculação afetivo-sexual pela troca de nudes no que concerne ao bloqueio e exclusão do contato do outro caso ele não receba o nude. Embora não tenha acontecido na história real de Orlando, esse movimento aparece em cena quando Rebeca, no papel de Vitória, ameaça bloquear e excluir o contato de Orlando caso ele não recebesse seus nudes. Esse fenômeno — que pode ser denominado ghosting — parece ter para a personagem Vitória função de controle sobre Orlando. Alude ainda ao controle exercido pela ex-namorada — que efetivamente bloqueou e excluiu o contato de Orlando ao descobrir a troca de nudes entre ele e Vitória. O ghosting demarcaria assim um exercício de poder nos relacionamentos digitais. Foi verificada no relato possibilidade de dano emocional no ghosting — em contraposição ao estudo de Navarro et al. (2020)Navarro, R., Larrañaga, E., Yubero, S., & Víllora, B. (2020). Psychological correlates of ghosting and breadcrumbing experiences: A preliminary study among adults. International Journal of Environmental Research and Public Health, 17(3), E1116. https://doi.org/10.3390/ijerph17031116
https://doi.org/10.3390/ijerph17031116...
, diferença de resultado que talvez possa ser atribuída ao fato de que o vínculo entre Orlando e sua ex-namorada fosse significativo para ele e o efeito da perda desse vínculo tenha maior impacto que de outros vínculos. Pode-se considerar que seu papel de namorado exercia para ele função importante no seu desenvolvimento. Constata-se pela cena que se segue de isolamento e sofrimento pessoal que a perda repentina de vínculo significativo pode ensejar complicações que poderão desdobrar-se em outros estados emocionais negativos, i.e., depressão, ansiedade. A dimensão de dano emocional do ghosting constitui-se importante aspecto a ser mais explorado em futuras pesquisas sobre esse fenômeno.

Note-se que as consequências negativas da exposição indevida e ghosting não conduzem o protagonista necessariamente a refletir sobre sua posição em relação à amiga e à ex-namorada durante a troca de nudes com Vitória. Orlando simplesmente revela a intenção de cessar de enviar nudes, uma solução aparente, como se o centro da problemática fosse meramente querer ou não os enviar e não as consequências da prática dentro do contexto em que ela foi efetuada. Cogita apenas — ainda que com propriedade — que uma troca de nudes se embasa em acordos de confiança que podem ser rompidos, sem maior apropriação da sua experiência relacional diante das dificuldades que compõem essa tessitura, a qual envolveu o protagonista, a ex-namorada e a amiga. Revela-se nesses episódios corriqueiros o impacto da automatização promovida pela tecnologia no comportamento humano, dificultando o desenvolvimento de relações amorosas que não releguem a espontaneidade à superficialidade ou ao espontaneísmo, perdendo seu potencial criativo. Essa observação confirmaria a presença de automações como conservas culturais mencionadas por Moreno (1975)Moreno, J. L. (1975). Psicodrama. Cultrix. no uso da internet, compreendido analiticamente também como defesa. Entretanto, colocando em cena a sua história, Orlando pôde perceber melhor suas necessidades afetivas. Outras sessões seriam necessárias para que ele pudesse aprofundar as relações que surgiram durante a dramatização e pudesse trazer à tona a espontaneidade e a criatividade. Essa talvez seja uma importante contribuição do psicodramatista aos automatismos relacionados com o uso de tecnologia e especialmente à circulação de nudes: desenvolver uma reflexão sobre as relações humanas de modo a estimular relações mais plenas e significativas mediadas pela internet.

A função erótica dos nudes e o mito de Eros e Psiquê

A fim de ilustrar uma das possíveis amplificações simbólicas a partir da temática e das dinâmicas na dramatização, é trazido o mito de Eros e Psiquê (Apuleio, 2009Apuleio. (2009). Eros e Psiquê (F. Gullar, Trad.). FTD Educação.). Dois momentos são importantes nesse mito a fim de elucidar a leitura simbólica: a revelação de Eros pela candeia de Psiquê e o sofrimento de Psiquê. Eros se revela o deus do amor quando a cera da vela queima seu peito. Psicologicamente, alude-se à idealização presente nos relacionamentos. Enquanto Eros e Psiquê estão imersos em noites de prazer erótico e Psiquê não vislumbrou seu amante, a experiência se repete de noite. Representando uma inconsciência (López-Pedraza, 2010López-Pedraza, R. (2010). Sobre Eros e Psiquê. Vozes.), a manutenção de uma relação de prazer puramente erótico entre Eros e Psiquê sugere que existem duas saídas simbólicas para essa experiência: o desenvolvimento do afeto mediante o erotismo vinculado a uma consciência da alteridade (relação Eu-Tu) ou uma eterna repetição da experiência erótica em que o outro figura apenas como objeto erótico (relação Eu-Isso).

Esse conto elucidaria o comportamento de busca de parceiros em redes sociais quando a persistência na idealização do outro compromete a formação de conexão afetiva e vínculo amoroso. Um circuito de autogratificação mantido pela constante idealização pode inclusive levar a um automatismo expresso na busca incessante de parceiros em redes sociais e aplicativos — que se transforma em uma conserva cultural, promovendo dificuldades nas interações sociais com parceiros românticos. Esse automatismo aponta para dificuldades em vivenciar relações criativas que seriam possíveis após desidealização e elaboração da necessidade de autogratificação pelo sujeito. Outro ponto de reflexão refere-se à exclusão de sentimentos indesejados da experiência amorosa. Evitar a dor da experiência amorosa — como sentida por Psiquê ao se apaixonar por Eros e ser expulsa do seu castelo — traz uma facilidade que interfere no processo de vinculação. Han (2015)Han, B. (2015). Sociedade do cansaço. Vozes. transpõe essa dificuldade comumente atribuída ao âmbito pessoal para o âmbito social pela noção de positividade. A positividade pode ser definida como necessidade constante de atenção e engajamento com o imperativo de certos discursos sociais, i.e., necessidade de relacionamentos constantemente saudáveis, necessidade de gratificação constante por meio de uma vida considerada ideal. A autogratificação nesse caso seria expressão da dinâmica social da positividade, que carrega em si uma exclusão de experiências presentes em relacionamentos amorosos que são evitadas como indesejadas na necessidade constante de autogratificação. Contrapondo-se a esse movimento, apresenta-se como alternativa para uma melhor convivência a aceitação de sentimentos que, embora inerentes à experiência amorosa, são muitas vezes excluídos dela.

Orlando e o mito de Lilith na cultura digital

O sofrimento de Orlando pode ser ainda lido pela vertente apoiada no mito de Lilith (Sicuteri, 1998Sicuteri, R. (1998). Lilith: A lua negra (6ª ed.). Paz e Terra.). Haveria uma cisão simbólica entre os aspectos masculino e feminino — em que o feminino representado por Eva tem seu aporte na possibilidade de relação afetiva e aquele representado por Lilith tem seu aporte no instinto sexual — que pode ser observada quando Orlando vê em sua ex-namorada a possibilidade de relação afetiva, mas não na relação com sua amiga Vitória — aparentemente reduzindo a sua troca de nudes a uma expectativa de encontro sexual, que, entretanto, acabou não concretizada. Esse movimento pode ter sido percebido por Vitória como objetificação — ensejando uma percepção negativa sobre o comportamento de Orlando no sentido que haveria procurado Vitória apenas com o intuito de obter sexo, mas não estaria aberto para desenvolver com ela o afeto, possibilidade reservada por ele apenas a sua ex-namorada. Essa dinâmica pode ter ensejado emoções negativas em Vitória, i.e., sensação de ter sido desvalorizada, frustração em uma expectativa de obtenção de afeto.

Quando o nude acabou exposto sem o consentimento de Orlando para sua namorada, depois que haviam retomado o relacionamento, Orlando sofreu a perda ocasionada pelo rompimento. O impacto doloroso com o novo término de relacionamento levou a sentimento de culpa, o qual, associado ao envio de nudes, dificultou a integração do feminino cindido. Considerando a psicodinâmica do protagonista, essa exclusão do feminino de sua consciência se personifica para ele na figura de Lilith vingativa. Diante da culpa sentida pela experiência negativa, isola-se na sua dor, na tentativa de excluir de sua consciência a sensualidade que, para ele, supostamente provocou seu sofrimento. Posteriormente, de modo defensivo e, talvez, na tentativa de superação do abalo na autoimagem, considerou o nude como mera idiotice. Importante ressaltar que os fenômenos de exposição indevida e do ghosting aconteceram para Orlando em sequência; não se pode separar claramente o peso para ele de cada fenômeno dentro de sua experiência dolorosa. Talvez, para ele, ambas as mulheres tivessem se vingado, cada uma ao seu modo, causando danos emocionais tanto decorrentes do compartilhamento não consentido efetuado pela amiga (exposição indevida), quanto do fim do relacionamento e bloqueio da comunicação pela ex-namorada (ghosting). A observação aponta novamente para a necessidade de pesquisar melhor o fenômeno do ghosting no que tange ao dano emocional dessa prática, especialmente no contexto de relações de maior duração.

CONCLUSÃO

O trabalho na sessão psicodramática pôde revelar o impacto emocional de uma experiência de exposição indevida na circulação de nudes, evidenciando também a importância de considerar dinâmicas psicossociais na compreensão da temática da exposição indevida e do ghosting. Observa-se que a exposição indevida dificulta a transformação de relações sociais de gênero. O atendimento dos envolvidos em um episódio de exposição indevida há de buscar um reconhecimento de aspectos subjetivos presentes nessa prática efetuada pela internet e de como ela afeta todos os envolvidos. O psicodrama fornece recursos para o diálogo com as personagens internas, tanto de vítimas como de perpetradores, com possibilidade de troca de papéis, ampliando a visão do acontecido e seus significados. Oferece ainda possibilidade de reconhecer o impacto de atribuições sociais de gênero e de suas dinâmicas, alertando para a importância da prevenção da exposição indevida, que é derivada de estereótipos de gênero e de outras manifestações relacionadas ao uso de internet, e de uma reflexão sobre o ghosting, que têm possíveis efeitos emocionais negativos. O processo psicodramático pode contribuir para o desenvolvimento de estratégias de proteção na troca de nudes, tanto na apropriação de recursos técnicos como uso de timer, quanto de aspectos subjetivos, como adquirir percepção mais definida sobre como se efetua a escolha de parceiros nessa prática. Essas estratégias seriam auxiliares à prevenção do dano emocional resultante de abusos. É importante que novas pesquisas sobre exposição indevida e ghosting sejam realizadas para a compreensão dos fenômenos e seu impacto na saúde mental.

A pesquisa teve a limitação de não ter podido buscar estratégias de enfrentamento para essa situação, apesar de revelar as problemáticas da exposição indevida e do ghosting. Considera-se necessário que novas pesquisas sejam realizadas com o intuito de elaboração de estratégias de proteção contra a exposição indevida e de enfrentamento quando ela ocorre. Em termos de prevenção, parece promissora uma exploração de diálogos e debates sobre a influência de aspectos relacionados ao gênero nos nudes. Igualmente, outros temas, como o autocentramento e necessidade de gratificação nas redes sociais, bem como de questões ligadas especificamente ao uso de internet e dispositivos tecnológicos, como uso de timers no envio de fotos ou a proteção e a vulnerabilidade ensejadas pela sensação de anonimato nas interações sociais pela internet precisam ser abordadas. Outra limitação é o número de participantes. A baixa quantidade de participantes na pesquisa poderia sinalizar que, em decorrência do receio de exposição, encontros individuais talvez ofereçam conforto maior para falar sobre um assunto que socialmente desperta sensibilidade e necessidade de resguardo.

Futuras pesquisas podem observar dinâmicas de ghosting observadas em relações de maior duração e naquelas de menor duração, diferenças de idade, identidade de gênero e orientação sexual, parcerias sexuais, maior número de sessões.

AGRADECIMENTOS

Não aplicável.

  • DECLARAÇÃO DE DISPONIBILIDADE DE DADOS

    Dados serão fornecidos mediante solicitação..
  • FINANCIAMENTO

    Não aplicável.

REFERÊNCIAS

  • Apuleio. (2009). Eros e Psiquê (F. Gullar, Trad.). FTD Educação.
  • Barrense-Dias, Y., Berchtold, A., Surís, J.-C., & Akre, C. (2017). Sexting and the definition issue. The Journal of Adolescent Health, 61(5), 544-554. https://doi.org/10.1016/j.jadohealth.2017.05.009
    » https://doi.org/10.1016/j.jadohealth.2017.05.009
  • Beach, C. (2013). Junguian psychodrama. Em C. E. Stephenson (Org.), Jung and Moreno: Essays on the theatre of human nature. Routledge.
  • Benedito, V. L. D. I. (2002). Abordagem simbólica do conflito conjugal: O corpo em cena. Junguiana, 20, 87-94.
  • Calvente, C. (2002). O personagem na psicoterapia Ágora.
  • Campbell, J. (2014). O poder do mito (30a ed.). Palas Athena.
  • Cardoso Júnior, A. L. (2021). Palco, cena e corpo no psicodrama on-line. Revista Brasileira de Psicodrama, 29(1), 65–70. https://doi.org/10.15329/2318-0498.21746
    » https://doi.org/10.15329/2318-0498.21746
  • Cardoso Júnior, A. L. (2021). Corpos líquidos: Circulação de nudes em jovens usuários de redes sociais e o psicodrama junguiano. [dissertação de mestrado, Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia: Psicologia Clínica da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo]. Repositório PUCSP. Disponível em: https://repositorio.pucsp.br/handle/handle/24927 Acesso em: 16 out. 2022.
    » https://repositorio.pucsp.br/handle/handle/24927
  • Cardoso Júnior, A. L., & Wahba, L. L. (2021). Um encontro entre psicodrama e psicologia analítica: Ritual e mitopoese. Revista Brasileira de Psicodrama, 29(3), 237–249. https://doi.org/10.15329/2318-0498.22161
    » https://doi.org/10.15329/2318-0498.22161
  • Creswell, J. W., & Clark, V. L. P. (2015). Pesquisa de Métodos Mistos - 2.ed: Série Métodos de Pesquisa. Penso.
  • Cruz, A., Sales, C. M. D., Alves, P., & Moita, G. (2018). The core techniques of Morenian psychodrama: A systematic review of literature. Frontiers in Psychology, 9, 1263. https://doi.org/10.3389/fpsyg.2018.01263
    » https://doi.org/10.3389/fpsyg.2018.01263
  • Dedomenico, A. M. (2013). A funcionalidade do conceito de papel. Revista Brasileira de Psicodrama, 21(2), 81-92.
  • Fonseca, J. (2008). Psicodrama da loucura: Correlações entre Buber e Moreno (7ª ed.). Ágora.
  • Fonseca, J. (2010). Psicoterapia da relação: Elementos de psicodrama contemporâneo. Ágora.
  • Fonseca, J. (2018). Essência e personalidade: Elementos de psicologia relacional. Ágora.
  • Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF). (2019). Adolescentes e o risco de vazamento de imagens íntimas na internet Brasil: UNICEF. https://www.unicef.org/brazil/media/1671/file/Adolescentes_e_o_risco_de_vazamento_de_imagens_intimas_na_internet.pdf
    » https://www.unicef.org/brazil/media/1671/file/Adolescentes_e_o_risco_de_vazamento_de_imagens_intimas_na_internet.pdf
  • Gasseau, M., & Gasca, G. (1991). Lo psicodramma junghiano Bollati Boringhieri.
  • Han, B. (2015). Sociedade do cansaço Vozes.
  • Jacoby, M. (2011). Encontro analítico: Transferência e relacionamento humano. Vozes.
  • Kričkić, D., Šincek, D., & Čike, A. B. (2017). Sexting, cyber-violence and sexually risk behaviour among college students. Kriminologija & Socijalna Integracija, 25(2), 15-28. https://doi.org/10.31299/ksi.25.2.2
    » https://doi.org/10.31299/ksi.25.2.2
  • Liong, M., & Cheng, G. H.-L. (2019). Objectifying or liberating? Investigation of the effects of sexting on body image. Journal of Sex Research, 56(3), 337–344. https://doi.org/10.1080/00224499.2018.1438576
    » https://doi.org/10.1080/00224499.2018.1438576
  • López-Pedraza, R. (2010). Sobre Eros e Psiquê Vozes.
  • Kim, L. M. V. (2021). Intervenção sociodramática breve operacionalizada (ISBO). Revista Brasileira de Psicodrama, 20(1), 93-114.
  • Menegazzo, C. M. (1994). Magia, mito e psicodrama Ágora.
  • Morelli, M., Bianchi, D., Baiocco, R., Pezzuti, L., & Chirumbolo, A. (2016). Sexting, psychological distress and dating violence among adolescents and young adults. Psicothema, 28(2), 137-142. https://doi.org/10.7334/psicothema2015.193
    » https://doi.org/10.7334/psicothema2015.193
  • Moreno, J. L. (1975). Psicodrama Cultrix.
  • Moreno, J. L. (1992). As palavras do pai Editorial Psy. (Obra original publicada em 1920)
  • Navarro, R., Larrañaga, E., Yubero, S., & Víllora, B. (2020). Psychological correlates of ghosting and breadcrumbing experiences: A preliminary study among adults. International Journal of Environmental Research and Public Health, 17(3), E1116. https://doi.org/10.3390/ijerph17031116
    » https://doi.org/10.3390/ijerph17031116
  • Nicolaci-da-Costa, A. M. (2002). Quem disse que é proibido ter prazer online?: Identificando o positivo no quadro de mudanças atual. Psicologia: Ciência e Profissão, 22(2), 12-21. https://doi.org/10.1590/S1414-98932002000200003
    » https://doi.org/10.1590/S1414-98932002000200003
  • Palomo, V. (2017). Psicoterapia: Um ritual de reinvenção de si. Em E. C. Souza & M. H. M. B. Abrahão (Eds.), Tempos, narrativas e ficções: A invenção de si. EDIPUCRS.
  • Prensky, M. (2001). Digital natives, Digital immigrants Part 1. On the Horizon, 9(5), 1-6. https://doi.org/10.1108/10748120110424816
    » https://doi.org/10.1108/10748120110424816
  • Quilici, M. A. I. (2009). Dramatização espontânea e psicologia analítica de Jung: Consideração da sombra em um grupo de psico-sociodrama [dissertação de mestrado, Universidade de São Paulo]. https://doi.org/10.11606/D.47.2009.tde-11082009-080205
    » https://doi.org/10.11606/D.47.2009.tde-11082009-080205
  • Ramalho, C. M. (2002). Aproximações entre Jung e Moreno Ágora.
  • Santos, F., & Torres de Vasconcelos, T. (2021). Leitura conceitual sobre o fenômeno da transferência na cena psicodramática. Revista Brasileira de Psicodrama, 24(1), 7-15. https://doi.org/10.15329/2318-0498.20160002
    » https://doi.org/10.15329/2318-0498.20160002
  • Shaffer, S. D. (2019). The stage and the stone: Psychodrama, alchemy, and Jung [dissertação de mestrado, Pacifica Graduate Institute]. ProQuest LLC. Disponível em: https://www.proquest.com/openview/6acf3a93919ec967d435fdb7a790f5bb/1.pdf Acesso em: 16 out. 2022.
    » https://www.proquest.com/openview/6acf3a93919ec967d435fdb7a790f5bb/1.pdf
  • Sicuteri, R. (1998). Lilith: A lua negra (6ª ed.). Paz e Terra.
  • Turkle, S. (2017). Alone together: Why we expect more from technology and less from each other. Hachette.
  • UNICEF Brasil. (2019). Projeto Caretas https://www.unicef.org/brazil/projeto-caretas
    » https://www.unicef.org/brazil/projeto-caretas
  • Vidal, G. P., & Castro, A. (2020). O Psicodrama clínico online: Uma conexão possível. Revista Brasileira de Psicodrama, 28(1), 54–64.
  • Wahba, L. L. (2019). Entre o universal e o particular: A subjetivação simbólica no método junguiano. Em I. Kublikowski, E. M. S. P. Kahhale, & R. M. Tosta (Orgs.), Pesquisas em psicologia clínica: Contexto e desafios. EDUC.
  • White, D. S., & Le Cornu, A. (2011). Visitors and residents: A new typology for online engagement. First Monday, 16(9). https://doi.org/10.5210/fm.v16i9.3171
    » https://doi.org/10.5210/fm.v16i9.3171
  • Wolak, J., Finkelhor, D., Walsh, W., & Treitman, L. (2018). Sextortion of minors: Characteristics and dynamics. The Journal of Adolescent Health, 62(1), 72-79. https://doi.org/10.1016/j.jadohealth.2017.08.014
    » https://doi.org/10.1016/j.jadohealth.2017.08.014

Editado por

Editora de Seção: Margarida Belchior

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Dez 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    18 Abr 2022
  • Aceito
    04 Out 2022
Federação Brasileira de Psicodrama Rua Barão de Itapetininga, 37 conj. 402 , cep: 01042-001 - São Paulo - SP / Brasil, tel: +55 (11) 3673 3674 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: rbp@febrap.org.br