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Seqüência de estímulos durante o fortalecimento da resposta de bicar: efeitos sobre a aquisição de desempenhos em matching e oddity

Stimuli sequencing during pecking responses build up: effects upon matching and oddity acquisitions

Resumos

Este estudo investigou o efeito da seqüência de apresentação de estímulos durante o fortalecimento da resposta (pré-treino) de bicar em pombos, sobre a aquisição do matching de identidade (IMTS) e oddity-from-sample (OFS) com 3 cores como estímulos e 2 escolhas. O problema se remete à disparidade no desempenho inicial em OFS em relação aos níveis do acaso, reiteradamente relatado na literatura. Durante o pré-treino, apenas uma cor era apresentada em qualquer uma de 3 chaves de resposta. O sorteio da seqüência de estímulos nas tentativas foi realizado com a restrição de que a probabilidade de 2 estímulos iguais serem apresentados em tentativas consecutivas foi semelhante à probabilidade de 2 estímulos diferentes serem apresentados em tentativas consecutivas. Em seguida, os sujeitos foram submetidos ou ao treino IMTS ou ao OFS. Os resultados replicaram aqueles descritos na literatura, indicando que o controle realizado sobre a seqüência de tentativas no pré-treino não teve efeito sobre a aquisição do IMTS e OFS.

Discriminação condicional; matching-to-sample; oddity-from-sample


This study was aimed to investigate the question why oddity-from-sample acquisition in animals always start at above chance level. A question was raised concerning the role of stimuli sequences and a possible bias introduced in responding. Thus, this study analyzed the effects of stimuli sequencing during response build up in the pigeon (pre-training) upon the acquisition of identity matching (IMTS) and oddity-from-sample (OFS) with three color stimuli and two comparisons. During pre-training one color was presented at the time in any one of three response key. Color presentation was randomized but for the restriction that the probability of two like colors being presented consecutively was the same as the probability of two non-like colors being presented consecutively. This controlled for any sequencing bias effects upon responding. Following, subjects were submitted either to IMTS or to OFS training. Results replicated those of the literature, indicating that stimuli sequencing control during pre-training has no effect upon matching and oddity acquisition.

Conditional discrimination; matching-to-Sample; oddity-from-sample


Seqüência de estímulos durante o fortalecimento da resposta de bicar: efeitos sobre a aquisição de desempenhos em matching e oddity

Stimuli sequencing during pecking responses build up: effects upon matching and oddity acquisitions

Katia DamianiI; Maria de Lourdes Rodrigues da Fonseca PassosII; Maria Amelia MatosI, 1 1 Endereço para correspondência: Rua Engenheiro Bianor, 153, 05502-010, São Paulo, SP. Fone(s): (11) 38149817 / 38184444 (r: 213/214/215), Fax: (11)38149817 / 38184356 (USP). E-mail: maamatos@usp.br 2 Elaborado por José Iran Ataíde dos Santos na UFPA para experimentos com macacos e por ele adaptado para a utilização no presente experimento com pombos.

IUniversidade de São Paulo

IIUniversidade Federal do Rio de Janeiro

RESUMO

Este estudo investigou o efeito da seqüência de apresentação de estímulos durante o fortalecimento da resposta (pré-treino) de bicar em pombos, sobre a aquisição do matching de identidade (IMTS) e oddity-from-sample (OFS) com 3 cores como estímulos e 2 escolhas. O problema se remete à disparidade no desempenho inicial em OFS em relação aos níveis do acaso, reiteradamente relatado na literatura. Durante o pré-treino, apenas uma cor era apresentada em qualquer uma de 3 chaves de resposta. O sorteio da seqüência de estímulos nas tentativas foi realizado com a restrição de que a probabilidade de 2 estímulos iguais serem apresentados em tentativas consecutivas foi semelhante à probabilidade de 2 estímulos diferentes serem apresentados em tentativas consecutivas. Em seguida, os sujeitos foram submetidos ou ao treino IMTS ou ao OFS. Os resultados replicaram aqueles descritos na literatura, indicando que o controle realizado sobre a seqüência de tentativas no pré-treino não teve efeito sobre a aquisição do IMTS e OFS.

Palavras-chave: Discriminação condicional; matching-to-sample; oddity-from-sample.

ABSTRACT

This study was aimed to investigate the question why oddity-from-sample acquisition in animals always start at above chance level. A question was raised concerning the role of stimuli sequences and a possible bias introduced in responding. Thus, this study analyzed the effects of stimuli sequencing during response build up in the pigeon (pre-training) upon the acquisition of identity matching (IMTS) and oddity-from-sample (OFS) with three color stimuli and two comparisons. During pre-training one color was presented at the time in any one of three response key. Color presentation was randomized but for the restriction that the probability of two like colors being presented consecutively was the same as the probability of two non-like colors being presented consecutively. This controlled for any sequencing bias effects upon responding. Following, subjects were submitted either to IMTS or to OFS training. Results replicated those of the literature, indicating that stimuli sequencing control during pre-training has no effect upon matching and oddity acquisition.

Keywords: Conditional discrimination; matching-to-Sample; oddity-from-sample.

Assim como as respostas operantes podem ser colocadas sob controle de estímulos formando as contingências de três termos, essas últimas também podem ser colocadas sob controle de um quarto elemento, o estímulo condicional. Cumming e Berryman (1961,1965) descreveram o estímulo condicional como aquele responsável por selecionar discriminações simples e, nesse sentido, o estudo de relações condicionais seria de grande importância para o entendimento de processos complexos de controle de estímulos.

O procedimento de treino de discriminações condicionais mais freqüentemente utilizado é denominado "escolha de acordo com o modelo" (matching-to-sample, ou MTS). No início de cada tentativa, um estímulo (denominado estímulo condicional) é apresentado. Após uma resposta de observação a esse estímulo, dois ou mais estímulos discriminativos são apresentados e a resposta a um deles (Ex.: S1) é reforçada, respostas aos outros estímulos discriminativos (Ex.: S2 e/ou S3) não são reforçadas. Na presença de um outro estímulo condicional, a resposta a ser reforçada deve ser emitida para outro estímulo discriminativo (Ex.: S2), e, neste caso, se for emitida para os demais discriminativos (Ex.: S1 e/ou S3) não será reforçada. Estas diferentes configurações e suas respectivas alterações nas contingências reforçadoras devem ser apresentadas repetidas vezes e de forma aleatória. Assim as funções dos estímulos discriminativos mudam a depender do estimulo condicional apresentado. Nesse sentido existe uma relação de condicionalidade entre os estímulos condicionais e os estímulos discriminativos. Nesse procedimento, o estímulo condicional é chamado "modelo" e os estímulos discriminativos são denominados "comparação" ou "escolha".

O procedimento de MTS pode ser classificado de acordo com as relações entre as propriedades formais dos estímulos utilizados. Quando um dos estímulos de escolha for idêntico ao modelo, o procedimento poderá ser denominado de duas maneiras: "escolha de acordo com o igual" (MTS de identidade, ou IMTS), se a resposta reforçada for a de escolher o estímulo idêntico ao modelo; ou "escolha de acordo com o diferente" (oddity-from-sample, ou OFS), se a resposta reforçada for a de escolher o estímulo diferente do modelo. Quando todos os estímulos utilizados, modelo e comparação, forem diferentes entre si, o procedimento é chamado "escolha de acordo com o arbitrário".

Os procedimentos de IMTS e OFS foram extensamente aplicados em pombos (Berryman, Cumming, Cohen & Johnson, 1965; Cumming & Berryman, 1961, 1965; Farthing & Opuda, 1974; Holmes, 1979; Lyndersen, Perkins & Chairez, 1977; Strenght & Zentall, 1991; Wilson, Mackintosh & Boakes, 1985; Zentall & Hogan, 1974,1978). Cumming e Berryman (1965) compararam os desempenhos sob esses dois procedimentos, utilizando parâmetros de treino muito semelhantes. Foram empregados três estímulos modelo, as cores vermelho, verde e azul. A caixa experimental era equipada com três discos de respostas, alinhados horizontalmente. O estímulo modelo sempre aparecia no disco central e os de comparação eram apresentados nos discos laterais; o estímulo modelo permanecia durante as apresentações dos estímulos de comparação (condição simultânea). As respostas de escolha corretas, -bicar o estímulo de comparação idêntico (IMTS) ou diferente (OFS) do modelo,- tiveram como conseqüência 3s de acesso ao comedouro. As três cores eram apresentadas um igual número de vezes como modelo e cada uma delas aparecia como comparação com igual probabilidade no disco à esquerda e no à direita do modelo. Cumming e Berryman (1965) relataram que no início da aquisição do IMTS todos os sujeitos mantiveram porcentagens de respostas próximas daquelas esperadas ao acaso. O desempenho nas duas primeiras sessões foi caracterizado pelo forte controle por posição, isto é, os animais responderam apenas em um dos discos laterais, à direita ou à esquerda do modelo. Após a terceira ou quarta sessão ocorreu um rápido aumento da porcentagem de respostas corretas até que, por volta da oitava sessão, todos os animais já apresentavam índices maiores que 90% de acertos. Esse aumento da porcentagem de respostas corretas foi acompanhado pelo enfraquecimento do controle por posição. Na aquisição do OFS, o desempenho de quatro sujeitos se iniciou ao redor de 70% de acerto e não foi caracterizado pelo controle por posição; dois outros sujeitos iniciaram a aquisição do OFS ao redor de 50% e apenas no desempenho de um deles observou-se controle por posição comparável ao observado na aquisição sob IMTS. Os animais submetidos ao procedimento de OFS alcançaram índices próximos de 90% de respostas corretas por volta da 20ª sessão.

Resumindo, os resultados de Cumming e Berryman (1965) revelaram que: 1) a aquisição do IMTS se iniciou ao redor de 50% enquanto que a do OFS com valores médios próximos de 70%; 2) as aquisições do IMTS foram caracterizadas por forte controle inicial por posição; e 3) a velocidade de aquisição foi maior para os animais submetidos ao procedimento IMTS do que aqueles submetidos ao OFS. Os autores que têm estudado o desempenho sob estes procedimentos têm se dividido sobre as razões dessas diferenças, mas todos concordam em que o problema maior, e provavelmente focal, dessas diferenças está na questão do desempenho inicial: 50% versus 70% de acertos.

No presente estudo aventou-se uma explicação das altas porcentagens iniciais de respostas corretas sob o procedimento OFS; esta explicação se baseia nas características do procedimento comumente empregado nas sessões de pré-treino da resposta de bicar. O pré-treino tem como objetivo instalar e fortalecer a resposta de bicar os discos de resposta, iluminados com as cores que serão utilizadas no treino; este treino necessariamente antecede o treino de discriminação condicional. Analisando os procedimentos de pré-treino padrão (Cumming & Berryman, 1961,1965) verifica-se que, a cada tentativa do procedimento de pré-treino, um dos três discos de respostas, e todos eles em uma seqüência aleatória, era iluminado com uma de três cores: azul, verde e vermelho. Os animais recebiam cerca de 10 reforços em cada um dos discos e todas as cores foram apresentadas um igual número de vezes em todos os discos. As seqüências de cores e das suas posições foram sorteadas aleatoriamente, e isso tem conseqüências importantes, conforme pode-se ver na Tabela 1.

Observa-se na Tabela 1, que a probabilidade de uma mesma cor ter aparecido em duas tentativas consecutivas era 0,33 e a probabilidade de uma cor ter sido seguida de uma cor diferente era 0,66. Uma conseqüência dessas diferentes probabilidades é que os animais podem ter recebido reforços com maior freqüência por bicar um disco iluminado com uma cor diferente daquela do disco iluminado anteriormente, do que ao bicar um disco com uma cor idêntica à do disco anteriormente iluminado. Desta forma, a seqüência de tentativas do pré-treino poderia ter reforçado mais o bicar consecutivo em discos com estímulos diferentes do que em discos com estímulos iguais, o que, por sua vez, facilitaria o desempenho inicial no OFS. Por outro lado, o reforçamento adventício da resposta de bicar seqüencialmente estímulos diferentes na sessão de pré-treino deveria produzir desempenhos abaixo de 50% de corretas no início do IMTS. Os resultados de Cumming e Berryman (1961,1965) não confirmaram esta última previsão, pois todos os animais apresentaram cerca de 50% de respostas corretas nas primeiras sessões de treino em IMTS. Entretanto, os autores também relataram que os desempenhos desses animais estiveram sob controle perfeito ou quase perfeito de posição, isto é, os animais escolheram preferencialmente uma das chaves laterais, direita ou esquerda. Como o reforçamento esteve associado a cada chave lateral 50% das tentativas, esse padrão de respostas resultou em 50% de corretas. É possível, portanto, que o forte controle por posição estabelecido no início do IMTS tenha obscurecido qualquer efeito de probabilidades diferenciais de reforço para o igual e para o diferente.

A hipótese explicativa que se baseia na seqüência de tentativas de pré-treino, levantada acima, também permite argumentar o porquê, em alguns estudos (Strenght & Zentall, 1991; Urcuioli & Honig, 1980; Zentall & Hogan, 1974,1978), a média das porcentagens de respostas corretas, no início da aquisição do OFS, ficou ao redor de 50%. Nestes estudos, os animais eram treinados a bicar em discos iluminados com apenas duas cores. Assim, nestas condições, a probabilidade de uma mesma cor aparecer em duas tentativas consecutivas, na sessão de pré-treino, é igual à probabilidade de uma cor ser seguida por uma cor diferente, como pode ser visto na Tabela 2.

Segundo a hipótese aventada no presente trabalho, o controle da seqüência de tentativas de pré-treino deveria produzir desempenhos próximos de 50% no início da aquisição de ambos os procedimentos, IMTS e OFS. Para testá-la foi conduzida uma replicação sistemática do delineamento de Cumming e Berryman (1965) no qual pombos foram submetidos ao treino de IMTS ou de OFS simultâneos, com duas escolhas, com as cores: azul, verde e vermelho. No presente estudo, na sessão de pré-treino foram utilizados cinco estímulos: azul, verde, vermelho, amarelo e laranja. O amarelo e o laranja foram utilizados porque tiveram uma outra função em fases experimentais subseqüentes aos treinos de IMTS e OFS (fases essas que não são pertinentes ao presente problema experimental e que, portanto, não serão apresentadas neste artigo), assim estas duas cores não foram apresentadas durante a fase de teste da hipótese deste trabalho, a saber durante a fase de aquisição dos desempenhos sob os procedimentos IMTS e OFS. Mais importante é saber que, coerentemente com a hipótese levantada no presente estudo, durante o planejamento do sorteio das tentativas do procedimento de pré-treino, é necessário controlar a diferença observada na distribuição de reforçamentos para diferentes seqüências de cores. Em outras palavras, a probabilidade de qualquer disco de respostas ser iluminado por uma mesma cor duas vezes consecutivas deverá ser igual à probabilidade de apresentação de um disco iluminado com cores diferentes em tentativas sucessivas.

Método

Participantes

Foram utilizados 6 pombos adultos, Columbia livia, experimentalmente ingênuos. Os animais foram mantidos em gaiolas individuais com água à vontade e privados de comida a 85% (± 15g) de seu peso ad libitum. A comida, assim como o reforçador utilizado, era uma mistura dos seguintes grãos: ervilha, cevada, sorgo, arroz com casca, lentilha, linhaça, semente de girassol, aveia sem casca e milho.

Materiais

Foram utilizadas três caixas Lehig Valley, uma delas com dois discos e as outras duas com três discos de respostas, alinhados horizontalmente numa das paredes. Nessa mesma parede, abaixo dos discos, estava acoplado um comedouro. Através de projetores de estímulos acoplados por traz dos discos de respostas, cada um desses discos poderia ser independentemente iluminado com uma de cinco cores: azul, verde, vermelho, amarelo e laranja. As cores eram produzidas por lâmpadas brancas de 4W cujo facho passava através de Wratten Filters da Kodak. No teto da caixa havia uma lâmpada de 12W.

A caixa com dois discos de respostas foi controlada por meio de um circuito eletromecânico; as caixas com três discos foram controladas on-line pelo software TRELCX2 1 Endereço para correspondência: Rua Engenheiro Bianor, 153, 05502-010, São Paulo, SP. Fone(s): (11) 38149817 / 38184444 (r: 213/214/215), Fax: (11)38149817 / 38184356 (USP). E-mail: maamatos@usp.br 2 Elaborado por José Iran Ataíde dos Santos na UFPA para experimentos com macacos e por ele adaptado para a utilização no presente experimento com pombos. instalado em um computador IBM-386.

Procedimentos

Os animais foram submetidos a uma sessão de automodelagem utilizando o procedimento descrito por Brown e Jenkins (1965) na caixa com dois discos de respostas. Nessa sessão, o disco da direita encontrava-se ativado e era iluminado com uma luz branca, enquanto o disco da esquerda permanecia desativado. Após dez respostas de bicar o disco da direita, deu-se início a um esquema de CRF que permaneceu em vigor até serem liberados 60 reforços, quando então a sessão era encerrada.

A sessão seguinte, bem como as demais, foi realizada nas caixas com três discos de respostas. A segunda sessão consistiu de 30 reforços em CRF, 10 em cada disco iluminado. A cada tentativa, apenas um dos três discos era iluminado com uma de cinco cores: amarelo, verde, azul, laranja e vermelho. O sorteio das tentativas era aleatorizado, com algumas restrições, a saber a) cada uma das cores foi apresentada um igual número de vezes em cada disco; b) o mesmo disco não era iluminado por mais de três tentativas consecutivas; c) a mesma cor não aparecia por mais de duas tentativas consecutivas. Ao final do sorteio, a probabilidade da mesma cor ser apresentada em duas tentativas consecutivas era de 0,48, e a probabilidade de duas cores diferentes serem apresentadas em tentativas consecutivas era de 0,52. Para exemplificar o cálculo dessas probabilidades, considere-se as seqüências ABCCFFEDEDAB e AABCCDDBEEFF. No primeiro caso, a probabilidade de duas letras iguais aparecerem consecutivamente é 2/11 ou 0,18 (CC; FF) e a probabilidade de duas letras diferentes aparecerem é 9/11 ou 0,81 (AB; BC; CF; FE; ED; DE; ED; DA; AB). Por outro lado, na segunda seqüência, a probabilidade de duas letras iguais aparecerem consecutivamente é 5/11 ou 0,45 (AA; CC; DD; EE; FF) e a probabilidade de duas letras diferentes é 6/11 ou 0,55 (AB; BC; CD; DB; BE; EF).

Na terceira sessão foi dado início ao treino das discriminações condicionais de primeira ordem. Os sujeitos S01 e S02 foram submetidos a um treino de IMTS simultâneo e os sujeitos S03, S04, S05 e S06 foram submetidos a um treino de OFS simultâneo, todos com dois estímulos de escolha. As sessões eram compostas de 144 tentativas. A cada tentativa, o modelo era apresentado no disco central e a resposta de bicá-lo (resposta de observação) iluminava os dois discos laterais com os estímulos de escolha. Os estímulos utilizados nestes dois treinos foram as cores azul, verde e vermelho, as quais, combinadas duas a duas, resultaram em seis possíveis tentativas representadas na Tabela 3. Durante o treino de IMTS as respostas de bicar o estímulo de comparação idêntico ao modelo eram reforçadas e, durante o treino de OFS as respostas de bicar o estímulo diferente do modelo eram reforçadas. As respostas de escolha corretas tinham como conseqüência 3s de acesso ao comedouro e as respostas incorretas produziam 3s de blackout. O intervalo entre tentativa era de 25s, transcorridos com as luzes da caixa e dos discos de respostas desligadas.

A seqüência de 144 tentativas foi sorteada dentro de 12 blocos, cada um com 12 tentativas (as seis tentativas da Tabela 3 apresentadas duas vezes cada uma), balanceando-se a distribuição dos estímulos de comparação nos dois discos laterais. No sorteio, o mesmo estímulo modelo não era apresentado mais de três vezes consecutivas, e o reforço não poderia ser liberado no mesmo disco por mais de duas tentativas consecutivas. Foram programadas 24 sessões segundo esses critérios. Após a 25ª sessão, a privação do sujeito S05 foi aumentada para 75% de seu peso ad libitum, pois foi observado que o animal não completava as 144 tentativas da sessão. Após essa manipulação, o sujeito S05 passou a completar, na maioria das sessões subseqüentes, o total de tentativas previsto.

Quando os animais completavam em uma dada sessão as 144 tentativas e, simultaneamente, apresentavam 95% de respostas corretas, o treino era interrompido e o experimento encerrado.

Resultados e Discussão

Na Figura 1 estão apresentadas as porcentagens de respostas corretas, a cada sessão, para os sujeitos S01 e S02 submetidos ao treino de IMTS. Pode-se observar que o sujeito S01 acertou 36% das tentativas da 1a sessão e manteve porcentagens de respostas corretas ao redor de 50% nas 10 sessões seguintes. A partir da 12ª sessão, a porcentagem de respostas corretas aumentou até atingir níveis entre 80% e 90% nas 16 últimas sessões. O sujeito S02 iniciou a aquisição do IMTS apresentando 40% de respostas corretas. Entre a segunda e a sexta sessões, esse índice oscilou entre 35% e 55% de respostas corretas; a partir da sétima sessão, as porcentagens de corretas aumentaram até atingir níveis entre 80% e 95% nas oito últimas sessões.


As porcentagens de respostas corretas abaixo de 50%, na primeira sessão dos sujeitos S01 e do S02, indicam que os animais escolheram preferencialmente o estímulo diferente do modelo no início do IMTS. Contudo, posteriormente, por cinco ou seis sessões, o desempenho destes sujeitos oscilou ao redor de 50%. Esses resultados diferem apenas ligeiramente daqueles de Cumming e Berryman (1965) que observaram desempenhos próximos de 50% já nas primeiras sessões do treino de IMTS.

Na Figura 2 estão apresentadas as porcentagens de respostas corretas dos sujeitos S03, S04, S05 e S06 submetidos ao treino de OFS. Os sujeitos apresentaram índices de acertos na primeira sessão que ficaram entre 60% e 80% de respostas corretas. Na primeira e segunda sessões, o sujeito S03 apresentou, respectivamente, 79% e 72% de respostas corretas; o sujeito S04 apresentou 69% e 75%; o sujeito S05 apresentou 64% e 65%; e o sujeito S06 apresentou 59% e 69%. Estes índices cresceram, gradualmente, e com grandes oscilações, ao longo das demais sessões, terminando com níveis entre 90% e 98% de acerto para os diferentes sujeitos.


Caso a igualação entre a probabilidade de dois estímulos iguais e a probabilidade de dois estímulos diferentes aparecerem em duas tentativas consecutivas durante a sessão de pré-treino tivesse o efeito esperado, os desempenhos noIMTS e no OFS deveriam ambos ficar ao redor de 50% de acertos nas primeiras sessões, isto é, ao redor do acaso. As porcentagens de respostas corretas apresentadas pelos sujeitos S01 e S02, treinados no IMTS, ficaram próximas deste valor, contudo as apresentadas pelos sujeitos S03, S04, S05 e S06, treinados no procedimento de OFS, se iniciaram entre 10% e 39% acima daqueles esperados ao acaso. Esses resultados, portanto indicam que a seqüência de tentativas da sessão de pré-treino, variável manipulada neste estudo, não é a variável determinante dos altos índices de respostas corretas observados nas primeiras sessões de treino em OFS.

Para verificar a generalidade destes resultados foram feitas comparações entre os índices médios de acertos, sessão a sessão, para os sujeitos submetidos ao IMTS e para aqueles submetidos ao procedimento de OFS. Adicionalmente foram feitas também análises de possíveis preferências por cor e/ou posição.

Na Figura 3 estão apresentadas as porcentagens médias de respostas corretas para os dois sujeitos submetidos ao treino de IMTS e as porcentagens médias de respostas corretas para os quatro sujeitos submetidos ao treino de OFS, sessão a sessão, nas primeiras 20 sessões destes treinos. Pode-se observar que, até a 16a sessão, as porcentagens de respostas corretas no treino de OFS estiveram sempre acima daquelas obtidas com o treino de IMTS; a partir da 16ª sessão os índices de acerto se igualaram. Estes resultados indicam não só níveis de acertos iniciais maiores para os sujeitos submetidos ao treino de OFS, mas também manutenção destes níveis ao longo de um grande número de sessões, com apenas um ligeiro crescimento. Em contraposição, os sujeitos submetidos ao treino de IMTS, e que haviam iniciado seus treinos apresentando porcentagens de corretas consideravelmente mais baixas que os sujeitos submetidos ao OFS, apresentaram uma rápida elevação de seus níveis de acerto. Estes resultados indicam portanto, maior velocidade de aquisição das relações condicionais, por parte dos sujeitos submetidos ao treino de IMTS. Cumming e Berryman (1965), ao realizarem uma análise semelhante, também observaram que a velocidade média de aquisição do desempenho em IMTS fora maior do que aquela para a aquisição do desempenho em OFS.


Nas Figuras 4 e 5 estão apresentados dados que permitem identificar possíveis preferências por cor e/ou posição. Foi calculado um índice de preferência de acordo com a proposta de Goldman e Shapiro (1979). Para exemplificar, tome-se a análise da preferência por cor durante o treino de IMTS ou OFS. Cada uma das três cores apareceu 96 vezes em um total de 144 tentativas (48 tentativas como S+ e 48 como S-). Se um sujeito não apresentasse preferência por cor, cada uma das três cores deveria ter sido escolhida 48 vezes. Inicialmente, foi calculado, sessão a sessão, o desvio da frequência esperada de escolhas ao acaso para cada cor, isto é, quantas vezes a escolha de um estímulo foi maior ou menor que 48. Os módulos dos valores dos desvios foram somados entre si, o resultado foi dividido por 96 (total de vezes que cada estímulo apareceu) e multiplicado por 100. O índice assim calculado é uma medida da preferência geral de todos os estímulos e seu valor pode variar entre 0 (ausência de preferência) até 100% (preferência total). Embora, teoricamente, qualquer valor acima de 0% indique preferência, na presente análise somente foram consideradas como preferências expressivas, aquelas assinaladas por valores acima de 50%.



Na Figura 4 estão apresentados os índices de preferências em relação a uma cor ou posição, apresentados pelos sujeitos S01 e S02 durante o treino no procedimento de IMTS. A preferência por posição do S01 foi pouco expressiva na primeira sessão, entretanto, entre a segunda e a 10a sessão ela permaneceu em níveis acima de 80%. Em seguida, caiu bruscamente, mantendo-se entre 2% e 45% até o final do treino. A preferência por cor apresentada por este sujeito, esteve por volta de 62% na primeira sessão, caindo bruscamente para 20% na segunda sessão, e permanecendo abaixo de 40% até a nona sessão. Após uma brusca elevação na nona e 10ª sessões, seus índices de preferência por cor oscilaram bastante, permanecendo, contudo, abaixo de 35% até o final do treino em IMTS.

O sujeito S02 não apresentou controle por posição expressivo nas primeiras sete sessões, embora fosse observada uma tendência de aumento nos índices de preferência por posição, aumento esse que atingiu seu valor máximo (62%) na oitava sessão. Esta preferência caiu bruscamente logo em seguida, permanecendo abaixo de 40% até o final deste treino. A preferência por cor com este sujeito, já na primeira sessão foi de 60% e continuou crescendo, atingindo e mantendo o valor de 98%, na quarta e quinta sessões. A partir de então, essa preferência cai gradativamente, e após a nona sessão ela fica em níveis inferiores a 50%.

No caso do sujeito S01, a preferência por posição atingiu valores comparáveis aos obtidos por Cumming e Berryman (1965), entre a segunda e a 10a sessão. No caso do S02, por outro lado, a clara preferência por cor estabelecida nas sete primeiras sessões não foi observada nos resultados daqueles autores. Embora, no presente estudo, o controle da seqüência de tentativas do pré-treino tenha sido acrescentado ao procedimento de Cumming e Berryman (1961,1965), é difícil avaliar a contribuição dessa variável aos dados de preferência, pois poucos estudos da literatura apresentaram dados de preferência; e nenhum estudo dedicou-se à investigação sistemática das condições necessárias ao estabelecimento de preferência por cor e posição no IMTS.

Carter e Werner (1978) sugeriram que a probabilidade do estabelecimento de preferência ou por cor ou por posição é função do número de estímulos e de posições utilizados. Assim, quando três cores são combinadas duas a duas, como estímulos de comparação, a probabilidade do estabelecimento de preferência por posição seria maior, pois a dimensão de posição seria mais estável que a de cor. Isto é, as posições, direita ou esquerda, seriam as mesmas em todas as tentativas e em 50% das vezes o estímulo correto estaria na posição direita e em 50%, na posição esquerda. Por outro lado, a cada tentativa, apenas duas das três cores possíveis seriam apresentadas, gerando três combinações diferentes de cores e, conseqüentemente cada cor teria uma probabilidade de apenas 33% de ser o estímulo correto.

Por outro lado, quando duas cores são utilizadas no treino ambas - preferência por posição e preferência por cor - têm igual probabilidade de ocorrer, pois as duas posições e as duas cores seriam as mesmas em todas as tentativas. Carter e Werner (1978) apresentaram dados do treino em IMTS com duas cores em que alguns sujeitos apresentaram preferência por cor e outros por posição, e que, portanto, confirmaram a hipótese desses autores.

Entretanto, os resultados do presente estudo não confirmam a hipótese de Carter e Werner (1978), pois, no treino de IMTS com duas escolhas e três estímulos, a probabilidade de estabelecimento de preferência por posição (S01) foi igual a da preferência por cor (S02).

Na Figura 5, pode-se observar os índices de preferência por posição e por cor apresentados pelo sujeitos S03, S04, S05 e S06, submetidos ao treino de OFS. Pode-se observar que nenhuma das duas preferências foi expressiva nos desempenhos dos sujeitos S03 e S06. No desempenho do S04 ambas as preferências, por posição e por cor, apresentaram dois picos; a por posição atingiu 82% e 65% na segunda e oitava sessões, e a por cor atingiu 55% e 65% na terceira e 11ª sessões. Quanto ao S05, suas preferências ficaram em geral abaixo de 50%, exceto por dois picos de preferência por posição, ao redor de 60%, na primeira e 12ª sessões. De forma geral, para todos os sujeitos foram observadas ocorrências isoladas, e com valores baixos, de preferências quer por cor quer por posição durante o treino de OFS. Estes dados replicaram os dados obtidos por Cumming e Berryman (1965).

Conclusão

Os resultados do presente estudo revelaram que possíveis viéses no controle da seqüência de tentativas, durante a sessão de pré-treino, não podem ser considerados responsáveis pelos altos índices de acertos no início da aquisição do OFS. Neste estudo, foi feito o controle de tais viéses, e ainda assim observou-se que, enquanto os desempenhos, nas primeiras sessões de treino, em IMTS ficaram entre 40% e 50% de respostas corretas, aqueles em OFS ficaram entre 60% e 80%, repetindo os dados de estudos onde esse controle não foi feito (Cumming & Berryman, 1965).

Carter e Werner (1978) sugeriram que as diferenças nos desempenhos observados nas sessões de IMTS e de OFS seriam produto do procedimento de extinção associada à resposta de observação ao modelo. No início da aquisição, como a apresentação dos estímulos de comparação ainda não teria se estabelecido como reforço condicionado, se poderia argumentar, de fato, que as respostas de observação ao modelo estariam sob extinção. Como resultado desse procedimento, extinção, a probabilidade de escolher um estímulo idêntico ao modelo, dentre os de comparação, seria menor do que aquela de escolher um estímulo diferente. Como resultado desse processo, as porcentagens de respostas corretas no início da aquisição do desempenho em IMTS ficariam abaixo de 50%, e as em OFS ficariam acima desse valor. Os resultados do presente estudo são consistentes com a hipótese desses autores (Carter & Werner, 1978).

Recebido: 07/12/2001

1ª Revisão: 04/02/2002

2ª Revisão: 09/04/2002

Aceite Final: 12/04/2002

Sobre os autores

Katia Damiani é Doutora pela Universidade de São Paulo.

Maria de Lourdes Rodrigues da Fonseca Passos é Doutora pela Universidade de São Paulo. É professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Maria Amelia Matos é Doutora pela Columbia University of New York. É Professora da Universidade de São Paulo.

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    Endereço para correspondência: Rua Engenheiro Bianor, 153, 05502-010, São Paulo, SP. Fone(s): (11) 38149817 / 38184444 (r: 213/214/215), Fax: (11)38149817 / 38184356 (USP).
    E-mail:
    2
    Elaborado por José Iran Ataíde dos Santos na UFPA para experimentos com macacos e por ele adaptado para a utilização no presente experimento com pombos.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      18 Jul 2003
    • Data do Fascículo
      2002

    Histórico

    • Aceito
      12 Abr 2002
    • Revisado
      09 Abr 2002
    • Recebido
      07 Dez 2001
    Curso de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul Rua Ramiro Barcelos, 2600 - sala 110, 90035-003 Porto Alegre RS - Brazil, Tel.: +55 51 3308-5691 - Porto Alegre - RS - Brazil
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