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“Sobre a sua buceta, responda…”: escolas e constituição de sujeitos em meio a jogos de poder1 1 Apoio: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes)

Resumo

O que pode uma pergunta sobre a sexualidade na escola? Quais os seus efeitos em uma professora, nos alunos e nas demais pessoas da comunidade escolar? Essas são algumas questões que norteiam este artigo interessado nas relações entre os saberes, sua constituição histórica na construção da sexualidade e as subjetividades. Não sendo esperadas em uma sala de aula, as perguntas sobre a genitália feminina extrapolaram este espaço, nos convidando a pensar os efeitos do dispositivo da sexualidade nos sujeitos e seus atravessamentos com as relações de saber-poder. Neste sentido, trabalhando com a perspectiva foucaultiana de análise, o conceito de acontecimento é o foco da problematização deste artigo.

Palavras-chave
oficina audiovisual; surdez; modos de endereçamento; inclusão; cinema e educação

Abstract

What is the power of a question about sexuality in school? What are its effects on a teacher, on students, and on other people in the school community? These are some questions that guide this article interested in the relationships between the knowledges, their historical constitution in the construction of the sexuality, and the subjectivities. Not expected in a classroom, questions about the female genitalia extrapolated this space, enticing the thought about the effects of the deployment of sexuality on the subjects and its crisscrossing with the knowledge-power relationships. In this sense, working with the Foucauldian perspective of analysis, the concept of event is the focus of this article’s problematization.

Keywords
video workshop; deafness; modes of address; inclusion; cinema and education

Introdução

Vamos tomar como provocador da escrita e das problematizações que se seguirão neste artigo um acontecimento ocorrido na sala de aula de uma turma do segundo ano do ensino médio de uma escola pública. O título do artigo já traz a questão originária do acontecimento: “Sobre a sua buceta, responda…” Acontecimento talvez seja o conceito foucaultiano que melhor expresse o ocorrido. Ao assumir o acontecimento discursivo como uma análise histórica da arqueologia, Michel Foucault (2002)Foucault, M. (2002). A ordem do discurso: aula inaugural no Collège de France, pronunciada em 2 de dezembro de 1970. São Paulo: Edições Loyola. nos provoca a pensar.

Por outro lado, se os acontecimentos discursivos devem ser tratados como séries homogêneas, mas descontínuas umas em relação às outras, que estatuto convém dar a esse descontínuo? Não se trata, bem entendido, nem da sucessão dos instantes do tempo, nem da pluralidade dos diversos sujeitos pensantes; trata-se de censuras que rompem o instante e dispersam o sujeito em uma pluralidade de posições e de funções possíveis. Tal descontinuidade golpeia e invalida as menores unidades tradicionalmente reconhecidas ou as mais facilmente contestadas: o instante e o sujeito (p. 58).

O filósofo não está se referindo a escolas, mas está pensando nos acontecimentos discursivos e suas relações com os modos de subjetivação, com as diferentes maneiras, momentos e espaços em que ocorrem os processos de constituição dos sujeitos. Neste sentido, a citação apresentada nos convida a pensar sobre as rupturas que dispersam os sujeitos e que expõem suas posições nas escolas. O acontecimento é uma novidade, uma ruptura que evidencia certa continuidade, ao mesmo tempo em que a continuidade só pode ser entendida em relação a ela, ruptura. Há um jogo entre continuidade e descontinuidade que organiza o acontecimento. Os acontecimentos, por esta definição, são possibilidades presentes cotidianamente nas salas de aula, visto que este espaço é o lugar da imprevisibilidade. Podemos afirmar ainda que o acontecido na sala de aula desta turma só se tornou um fato relevante e, portanto, objeto de análise neste artigo porque a professora sentiu sua força na constituição de si, como professora e como mulher. Mais do que isso, porque ela também dá um lugar ao que cabe aos alunos e às alunas, o sentido que fornece aos temas que eles e elas devem trazer para a escola, enfim, saberes que organizam os lugares atribuídos a alunos e alunas, professoras e professores e ao entendimento do que é escola.

Conta ela que ao chegar em sala, no primeiro dia letivo depois de retornar de uma licença e de se ausentar da escola para se dedicar ao mestrado, defendido nas discussões de gênero e sexualidade, encontra o seguinte escrito no quadro branco:

Sobre a sua buceta, responda:

  1. Quantos fios de cabelo têm na sua buceta?

  2. Sua buceta é apertada? Se sim, justifique.

  3. Com quantos anos você deu a buceta?

  4. Qual o tamanho dos lábios da sua buceta?

  5. Você tem um pinguelão?

  6. Você tem uma bucetinha ou bucetona?

  7. Você chupa o ovo sem babar?

  8. Você engole o cacete inteiro?

Numa análise rápida, podemos dizer que se trata de uma série de questões e interesses sobre a genitália feminina, popularmente chamada de “buceta”. No entanto, elas dizem mais do que do interesse por esta parte do corpo feminino, se desdobrando numa vontade de saber que dá lugar à sexualidade daquela para quem estão direcionadas as perguntas. Perguntas que esperavam pela professora. Que estabelecem novas relações entre saber, escolas, alunas e alunos, professoras e professores. Que, paradoxalmente, fazem pensar o lugar da professora e da mulher que, nas relações de gênero, também dizem do lugar do homem. Paradoxalmente porque, ao mesmo tempo em que ela assume para si as perguntas, reforçando o seu lugar de professora, ela também se desloca dele, reforçando o lugar da mulher independentemente de ser professora. Diante deste encontro da professora com a turma, com meninas e meninos e com as questões, ela nos relata:

Confesso que fiquei meio embaraçada, mas não demonstrei. Havia um misto de euforia, tensão e curiosidade. Alunos e alunas de outras classes entravam na sala para ler os escritos. Algumas meninas ficavam me perguntando se eu havia lido o que estava escrito e eu respondia que sim, mas precisávamos fazer uma discussão sobre as notas da I unidade, já que eles e elas não tiveram aula de Português e Literatura. Enquanto eu explicava como seriam feitas as avaliações, procurei manter a turma calma e solicitei de uma aluna que copiasse tudo o que estava escrito ali, pois seria feita uma atividade também para nota. Ninguém se manifestou como autor do texto, e um grupo disse que já estava tudo lá quando entraram na sala. Não houve o primeiro horário porque a colega que daria aula havia faltado. Percebi também que as meninas que reivindicavam um posicionamento meu gostariam que o autor das sentenças fosse descoberto e punido. Durante o intervalo, expus o conteúdo na sala de professores relatando a minha atitude, e algumas colegas ficavam deduzindo quem poderia ser o autor, este apenas descoberto dois dias depois: um rapaz gay.

Existe uma história da sexualidade que organiza esta ação entre as alunas e os alunos e a professora. Os efeitos do que estava escrito, os efeitos desta novidade em sala de aula, desta ruptura e, portanto, deste acontecimento, dizem, ao mesmo tempo, de uma regularidade histórica que conduziu a sexualidade para dentro das casas, retirando-a dos espaços públicos, e de uma ruptura radical, que só pode ser entendida assim porque “sabemos” que não é esperado este tipo de escrito na sala de aula. Além disso, o que este acontecimento nos informa é que está em jogo a constituição dos sujeitos em meio a relações de poder entre alunas e alunos e a professora, entre saberes e ação sobre si e sobre as outras e os outros. É esse sentido ou efeito que queremos tomar como foco deste artigo, ou seja, partimos de duas questões investigativas norteadoras: que jogos de saber-poder estão circulando nas escolas e constituindo sujeitos? Que efeitos um acontecimento em sala de aula entrelaçado pelas questões da sexualidade pode provocar na professora regente, nas alunas e nos alunos e na comunidade escolar como um todo?

Estabelecido este foco de análise, é importante deixar claro nossa perspectiva teórico-metodológica, ou seja, que arcabouço teórico vamos acionar para olhar e problematizar este acontecimento. Problematizar é, para nós, uma forma de fazer pesquisa, uma perspectiva foucaultiana de ação diante do mundo e dos modos de subjetivação dos sujeitos. Para Michel Foucault (2006, p. 223)Foucault, M. (2006). Ética, sexualidade, política (2a ed). Rio de Janeiro: Forense Universitária., “aquele que questiona nada mais faz do que usar um direito que lhe é dado: não ter certeza, perceber uma contradição, ter necessidade de uma informação suplementar, defender diferentes postulados, apontar um erro de raciocínio”. Problematizar tem a ver com a história do pensamento, tem a ver com a relação entre moral, a busca da verdade pelo sujeito e a relação com o outro. O pensamento nos permite tomar distância das maneiras de fazer ou reagir, dar um passo atrás para transformar em problema algo que não nos chama mais atenção. Essa ação de distanciamento nos convida a transformar o pensamento, a ação e a realidade em objeto do pensamento e de questionamento: por que pensamos o que pensamos? Nossas formas de pensar e agir têm uma história, dizem de uma história do pensamento.

Acontecimento, relações de poder e sujeitos

Estamos partindo do princípio de que o questionário construído pelos estudantes intitulado “Sobre a sua buceta, responda…” é uma novidade. Entendimento confirmado pela reação e fala da professora. Há um certo susto neste encontro e a professora nos diz de um embaraço: “confesso que fiquei meio embaraçada, mas não demonstrei. As meninas ficavam me perguntando se eu havia lido o que estava escrito e eu respondia que sim, mas precisávamos fazer uma discussão sobre as notas da I unidade, já que eles e elas não tiveram aula de Português e Literatura”. Ao mesmo tempo, ela busca não se deixar afetar ou demonstrar afetação para as alunas e alunos, tentando retomar a regularidade que marca a sala de aula.

A escola que temos hoje é herdeira daquela fundada na Modernidade, que diz de um projeto mais amplo de construção de uma sociedade disciplinar (Foucault, 1987Foucault, M. (1987). Vigiar e punir: nascimento da prisão. Petrópolis: Editora Vozes.). Manter a regularidade é um exercício deste projeto. Um projeto de disciplinarização dos corpos e dos sujeitos, que nos constitui como professoras e professores, alunas e alunos. No entanto, a resistência e os escapes são sempre possibilidades para romper a pretensão de regularidade. Um rompimento que pode causar temor, mas também pode ser potencialidade no desafio de pensar as diversas possibilidades de reflexão sobre a sexualidade da mulher, como no caso em análise. As questões escritas no quadro nos convidam a pensar como foi construído nelas e neles, e na sociedade de forma geral, um lugar legítimo da sexualidade burguesa, que se desdobra no questionamento dos currículos nas suas articulações com as relações de gênero.

Os jogos de “provocação”, incitação a responder as questões, o temor em respondê-las, a necessidade de se posicionar enquanto professora, enfim, o que se desenvolve a partir das perguntas reforça o que Foucault (1988)Foucault, M. (1988). História da sexualidade 1: a vontade de saber. Rio de Janeiro: Edições Graal. se dedica a problematizar na História da Sexualidade I, ou seja, como somos sujeitos construídos em meio a estratégias discursivas do dispositivo de sexualidade. Mas dizer isso não é suficiente. A questão parece ser: como lidamos com o dispositivo da sexualidade quando estamos nas escolas? No caso da professora, há uma preocupação em não demonstrar que a ação dos estudantes a afetou, a tirou do lugar. Talvez porque a intimidade é algo que aprendemos como pessoal, de âmbito privado, que não deve ser revelado e que pode ser usado a partir de um entendimento de “agressão” ou, em outras circunstâncias, como forma de gozação. Falar, perguntar da sexualidade das pessoas é algo que devemos evitar, pelo menos em público, sobretudo em se tratando de uma relação entre alunas e alunos e professora no interior da escola.

Como já mencionado por Foucault, a sexualidade foi encerrada para o quarto do casal, onde ganha legitimidade; o restante é reduzido ao silêncio e, como dito pelo filósofo, “ao que sobra só resta encobrir-se; o decoro das atitudes esconde os corpos, a decência das palavras limpa os discursos” (Foucault, 1988Foucault, M. (1988). História da sexualidade 1: a vontade de saber. Rio de Janeiro: Edições Graal., p. 10). A intimidade é de ordem particular, envolve um sentido de segredo, devendo ser mantido em sigilo e só revelado em situações que envolvam confiança. A sexualidade também foi constituída nesta lógica, uma vez que ela é o lugar em que estão nossos sentidos, desejos e emoções mais íntimas.

O que as alunas e os alunos colocam em jogo nas questões é essa relação do segredo com a confissão e com a revelação, que é parte do dispositivo da sexualidade. A confissão dos desejos secretos e íntimos é uma das técnicas desenvolvidas no Ocidente para produzir a “verdade” dos sujeitos (Foucault, 1988Foucault, M. (1988). História da sexualidade 1: a vontade de saber. Rio de Janeiro: Edições Graal.). “Dentre seus emblemas, nossa sociedade carrega o do sexo que fala. Do sexo que pode ser surpreendido e interrogado e que, contraído e volúvel ao mesmo tempo, responde ininterruptamente” (Foucault, 1988Foucault, M. (1988). História da sexualidade 1: a vontade de saber. Rio de Janeiro: Edições Graal., p. 75). Estamos todos envolvidos nessa necessidade de produzir e dizer a verdade sobre nós e sobre os outros, num jogo em que saber-poder-prazer “se mistura ao involuntário, e o consentimento à inquisição” (Foucault, 1988Foucault, M. (1988). História da sexualidade 1: a vontade de saber. Rio de Janeiro: Edições Graal., p. 75). Para discutir essa relação entre segredo, verdade, sexualidade, confissão e revelação, Foucault nos provoca:

“Vivemos todos, há muitos anos, no reino do príncipe Mangoggul: presa de uma imensa curiosidade pelo sexo, obstinados em questioná-lo, insaciáveis a ouvi-lo e ouvir falar nele, prontos a inventar todos os anéis mágicos que possam forçar sua discrição”

(Foucault, 1988Foucault, M. (1988). História da sexualidade 1: a vontade de saber. Rio de Janeiro: Edições Graal., p. 75).

Curiosidade transformada no questionário “Sobre a sua buceta”, que se manteve nas expressões faciais, na insistência em saber se a professora tinha lido as questões, forçando, ao mesmo tempo, a revelação e a busca pela discrição. Um processo que constitui as alunas e os alunos e que elas e eles fazem funcionar como o dispositivo de sexualidade. A mulher é incitada a falar sobre sua “buceta”, e essa incitação é, de certa forma, a vontade de fazer falar – as mulheres e suas vaginas –, visto que as questões colocadas na sala também incitam as outras alunas presentes. Podemos pensar que as mulheres e suas vaginas são controladas pela vontade de verdade e prazer sexual do soberano, que também constrói o lugar dos homens. O segredo como organização de uma curiosidade é um dos aspectos das relações de gênero, tomando os corpos e desejos como portadores da verdade-segredo. Não podemos afirmar que a curiosidade é exclusiva dos meninos sobre os corpos das meninas, mas podemos pensar qual atualização a sala de aula exige dos corpos que devem falar.

Nesses anos em que temos nos debruçado em discutir a relação da escola com as questões de gênero e sexualidade, volta e meia ouvimos de outras e outros docentes sobre o medo e a insegurança em assumir essas questões no espaço escolar com receio de que, ao tomá-las como foco em suas aulas, elas e eles tenham sua sexualidade (e com ela seus desejos e prazeres) exposta ou questionada pelas/pelos estudantes. Sobretudo com professoras mulheres, perguntas como se a professora se masturba, faz sexo oral e anal, usa camisinha, gosta de homem ou de mulher, aparecem, muitas vezes, de maneira imprevista, colocando muitas das professoras no que consideram como “saia justa”.

Voltando ao acontecimento trazido neste texto, a professora tenta retomar a regularidade da aula, apesar da insistência da aluna em perguntar se tinha lido, quase exigindo um posicionamento. A opção pela regularidade da aula se dá pela retomada da disciplina de Português, acionando o que caberia à sala de aula como espaço de um currículo oficial determinado pela professora e não pelas alunas e alunos. O conteúdo do currículo oficial passa a ser um lugar de conforto, de segurança e de fuga diante da instabilidade e do “embaraço” que o escrito causou. A sensação da professora diante dos questionamentos das alunas e alunos evidencia que o currículo que compõe a escola não é algo pronto a ser transmitido e acatado, mas sim o resultado das relações sociais que organizam a sociedade e a escola, de maneira que o currículo diz de escolhas e de construção de conhecimento. Diante das questões, a professora poderia assumir o desafio de problematizá-las em meio a uma sociedade em que a sexualidade é tomada como oportunidade de agressão, como resultado das relações de gênero, que estabelecem lugares para homens e mulheres, que dizem da intimidade como algo privado, enfim, tomar o interesse das alunas e alunos como componente curricular. Outra possibilidade seria também utilizar o currículo para não discutir as questões, argumentando que as disciplinas de Português e Literatura não preveem a discussão das sexualidades no currículo. De uma forma ou de outra, o entendimento de currículo que organizou a ação é aquele em que o currículo é compreendido como “uma construção e seleção de conhecimentos e práticas produzidas em contextos concretos e em dinâmicas sociais, políticas e culturais, intelectuais e pedagógicas. Conhecimentos e práticas expostos às novas dinâmicas e reinterpretados em cada contexto histórico” (Moreira et al., 2007Moreira, A. F., Arroyo, M. G., Beauchamp, J., Pagel, S. D., Nascimento, A. R. (Orgs.), & Lima, E. S. (2007). Indagações sobre currículo: currículo e desenvolvimento humano. Brasília, DF: Ministério da Educação., p. 9).

Prosseguir explicando como se darão as avaliações da disciplina é também uma forma de dar uma pausa para pensar o que será feito com aquilo, que atitude tomar diante do inesperado. A relação entre novidade e regularidade que está organizando o surgimento e funcionamento das ações das alunas e alunos e da professora só pode ser entendida por seus efeitos. O acontecimento nos convida a colocar sob interrogação a sua formação, ou seja, por que a sexualidade é tomada como ponto de instabilidade, usada para desestabilizar? Sala de aula é lugar de conflito e negociação porque é atravessada por relações de poder. Para Foucault (1988)Foucault, M. (1988). História da sexualidade 1: a vontade de saber. Rio de Janeiro: Edições Graal., as relações de poder não estão nos sujeitos, mas são entendidas como forças que estão na relação, que vai de um ao outro e que comportam as resistências. O poder pode ser entendido como uma rede de relações em constante tensão entre saber e subjetividades, em constante atividade. A sala de aula está marcada por esta constante tensão e atividade das relações de poder e de resistência, o que a transforma no lugar do imprevisível e do acaso, que marcaram este confronto e a incitação a falar da sexualidade como novidade, ruptura e, portanto, como um acontecimento. “É preciso aceitar introduzir a casualidade como categoria na produção dos acontecimentos. Aí também se faz sentir a ausência de uma teoria que permita pensar as relações do acaso e do pensamento” (Foucault, 2002Foucault, M. (2002). A ordem do discurso: aula inaugural no Collège de France, pronunciada em 2 de dezembro de 1970. São Paulo: Edições Loyola., p. 59).

No contexto escolar, nos acostumamos com a previsibilidade de nossos planejamentos, muitos deles rígidos e fechados em si mesmos, sem nos darmos conta de que o ato educativo está marcado pela instabilidade e pelo inesperado, e que perseguir o controle e um destino prévios, em geral, não nos ajuda a duvidar de nossas práticas, a continuamente desconstruí-las, suspeitar delas, desviando do que foi pensado a princípio para que, assim, nos aventuremos, nos coloquemos à deriva. Inclusive esse é um dos aprendizados que, para Veiga-Neto (2011)Veiga-Neto, A. (2011). Foucault & a educação (3a ed.). Belo Horizonte: Autêntica Editora., podemos tirar do próprio Foucault, o de uma contínua suspeita daquilo que se pensa e se escreve, ou seja, uma desconfiança de si mesmo. O que está em jogo nas relações da sala de aula parece ser a constituição da professora e professor e seu desejo de controle.

Apostando de alguma forma na novidade, esta pode nos mobilizar a olhar para o contexto escolar de outra maneira, mudar nossos rumos, inclusive a analisar estrategicamente o acontecido para discutir o que, até então, era impensável, o que provocou a ruptura ao que estava posto. Conforme trazido por Revel (2005)Revel, J. (2005). Foucault: conceitos essenciais. São Carlos: Claraluz., pensando com base em Foucault, é interessante que busquemos os traços de acontecimentos e as leituras que podemos fazer a partir deles: “O método arqueológico foucaultiano busca, ao contrário [das análises históricas], reconstituir atrás do fato toda uma rede de discursos, de poderes, de estratégias e de práticas” (Revel, 2005Revel, J. (2005). Foucault: conceitos essenciais. São Carlos: Claraluz., p. 13).

O acontecimento apresentado neste texto irrompeu a singularidade da sala de aula, gerou incômodo para a docente e boa parte da sua turma, de maneira que extrapolou o próprio espaço, envolvendo as alunas e os alunos de outras salas que saíam das suas classes para ver os escritos.

Esse acontecimento também pode ser visto como uma fuga, uma interrupção do que estaria previamente traçado não só para a aula em si, mas para a chamada rotina da escola. Por isso gerou tanta repercussão em outros espaços, adentrando inclusive a sala das professoras e professores. O efeito que os escritos produziram nas outras professoras após saberem do acontecido foi de especularem entre si para identificar o autor dos dizeres. Descobrir quem escreveu as perguntas no quadro mobilizou boa parte das pessoas, inclusive algumas estudantes da turma que, a princípio, exigiam também uma punição para ele. São indícios de como o acontecimento provocou incômodos e movimentou a escola.

Sexualidade na sala de aula: do que estamos falando?

A sexualidade passou a ser algo que cada um de nós possui e que precisamos ou somos educados (ou incitados) a buscar em nós, a confessar nossos desejos para “saber” as nossas “verdades”, diretamente ligadas às nossas classificações sexuais. No conjunto de livros que compõe a História da Sexualidade, Michel Foucault (1984Foucault, M. (1984). História da sexualidade 2: o uso dos prazeres. Rio de Janeiro: Edições Graal., 1985Foucault, M. (1985). História da sexualidade 3: o cuidado de si. Rio de Janeiro: Edições Graal., 1988)Foucault, M. (1988). História da sexualidade 1: a vontade de saber. Rio de Janeiro: Edições Graal. fortalece a ideia de que sexualidade é uma construção histórica que marca a experiência humana. Sexualidade, na sua origem histórica, é algo que os indivíduos possuem. Diferentes saberes e instituições são chamados a produzir conhecimentos sobre a sexualidade e, por consequência, sobre os sujeitos. Combatendo a “hipótese repressiva”, Foucault (1988)Foucault, M. (1988). História da sexualidade 1: a vontade de saber. Rio de Janeiro: Edições Graal. demonstra que as instituições modernas organizam a sociedade disciplinar que nos constitui e nos cobram um preço pelos benefícios que oferecem – o preço do controle: sobre nós mesmos, sobre nossos impulsos e desejos, emoções e revelações. As escolas estão neste contexto, de maneira que elas participam da constituição da sociedade disciplinar. Ainda hoje, as nossas escolas são herdeiras dessa sociedade disciplinar, participando amplamente dela, sobretudo na constituição dos corpos dóceis, regulados e controlados nas suas ações. Mas essa repressão também dá lugar às resistências, já que o poder também é lugar de produção de prazeres.

Repressão e prazer estão na organização do acontecimento, da ação das alunas e alunos na elaboração e direcionamento das questões para a professora. Podemos pensar que esta atividade só foi possível porque também fala de transgressão, de prazer e de poder das alunas e alunos em trazer para o debate a sexualidade, algo que é do sujeito, mas que deve ficar fora das salas de aula. Sexualidade é entendida como um aspecto da vida íntima e privada dos sujeitos. Talvez, quando as alunas e alunos propõem estas questões e perguntam se a professora viu o que estava escrito, minimamente elas e eles estão querendo tirá-la do lugar ao introduzir esta temática “proibida” e “reprimida” nas escolas. Não podemos afirmar que as questões eram direcionadas à professora como provocação. Trata-se de uma professora que tinha acabado de defender uma dissertação sobre as relações de gênero e sexualidade e, neste sentido, podemos supor que as questões também fossem uma forma de propor um campo de discussão, um currículo. No entanto, dado o grau de entendimento que temos da sexualidade e dos locais que devem ocupar, a professora entendeu como “provocação”:

Precisava improvisar algo, pois percebi que a intenção de quem escreveu e de quem apoiava era de fato provocar, incendiar todos e todas, inclusive eu, professora, mulher. Depois que fechamos o acordo sobre as notas, disse que iria incluir uma pesquisa relacionada ao que estava exposto ali. Dessa maneira, solicitei que fizessem uma pesquisa sobre pornografia baseada nas seguintes questões: por que temos necessidade de nos valer da pornografia? Há um lugar específico para utilizarmos pornografia? Ela soa bem aos olhos e ouvidos de todas as pessoas? Ela possui o poder de desqualificar alguém? Em se tratando das frases utilizadas, poderíamos pensar que também se configurava como violência de gênero?

Os alunos e alunas trouxeram algumas pesquisas abordando o assunto de uma maneira geral e, após lermos todos os trabalhos, fizemos um debate sobre o assunto. Algumas meninas disseram que se sentiram violentadas com tais escritas. Perguntei por que então elas não haviam apagado as frases, e elas não responderam diretamente, mas afirmaram que se sentiram intimidadas por muitos colegas da classe; poderiam, com essa atitude, tornar-se vulneráveis a ameaças e xingamentos. Por isso também não chamaram ninguém da direção escolar. Outras disseram que a vergonha era tanta que não queriam mexer “naquilo lá”. Enfatizei que, naquele momento, não me interessava saber quem havia realizado a ação, mas era necessário pensarmos em muitas coisas relacionadas ao feminino, embora houvesse alguns suspeitos.

Uma pergunta que surge nessa discussão é: que efeitos aquelas perguntas provocaram na professora? Ao mesmo tempo em que ela entendeu como “provocação”, ela também percebeu o jogo de poder e de confronto estabelecido: “a intenção de quem escreveu e de quem apoiava era de fato provocar, incendiar todos e todas, inclusive eu, professora, mulher”. Para a professora, o questionário escrito no quadro também pode ser visto como algo que colocou em xeque o próprio lugar dela enquanto docente, pois ao se identificar como mulher, de alguma forma, se sente perturbada com as perguntas ali apresentadas, o que também está relacionado à própria construção do ser mulher em nossa sociedade.

Na sociedade ocidental, a sexualidade da mulher, ao longo do tempo, esteve atrelada aos desejos do homem heterossexual. Beauvoir (1967)Beauvoir, S. (1967). O segundo sexo: a experiência vivida. São Paulo: Difusão Europeia do Livro. já dizia que as mulheres, fossem elas esposas ou amantes, eram, em geral, frustradas quanto à vivência sexual e sentimental, pois a vida delas estava subordinada aos interesses e vontades dos homens, já que eram ensinadas a ser passivas e subjugadas a eles. Eram os homens que tomavam iniciativa nos relacionamentos (namoro ou mesmo casamento); o prazer sexual estava atrelado ao gozo estritamente do homem, enquanto a mulher não podia manifestar seus desejos; a virgindade da mulher era uma condição intrínseca para que ela fosse considerada uma mulher decente; os homens tinham livre trânsito para sair, se divertir, inclusive sexual e amorosamente, muito diferente das mulheres e, além disso, muitos homens ainda utilizam da violência como meio de sustentação do lugar hegemônico.

Não é à toa que a genitália da mulher foi utilizada nas questões colocadas pelo aluno. Poderíamos pensar os efeitos das questões se elas tratassem da “curiosidade” a respeito da genitália do homem. O que cabe a homens e mulheres no que diz respeito à intimidade e à sexualidade? É possível dizer que os homens não se sentiriam agredidos se encontrassem no quadro algo semelhante no que diz respeito à genitália masculina?

Beauvoir (1967)Beauvoir, S. (1967). O segundo sexo: a experiência vivida. São Paulo: Difusão Europeia do Livro. relatava que a mulher se sentia passiva, sobretudo na relação sexual, porque ela já se pensava, previamente, como de domínio do homem, submissa a este, mas isso não quer dizer que ela não pudesse contestar esses lugares e construir a relação como troca, sem esses lugares hierárquicos e delimitados.

Hoje, podemos identificar a mudança neste quadro apontado por Beauvoir, resultado das lutas feministas que têm problematizado a cultura heteronormativa como constituidora das relações desiguais de gênero e sexualidade. As mulheres vêm assumindo outros lugares, de maneira que são mais capazes de enfrentar situações como essa encontrada pela professora na sala de aula de forma mais propositiva. A maneira da professora se comportar, convocando as alunas e alunos a pensar o ocorrido a partir do conhecimento, é um convite para associarem a história do pensamento com nossas ações e formas de pensar e agir. As questões das alunas e alunos e aquelas inscritas no quadro estabelecem uma visão homogênea da mulher e esquecem que é impossível falar de um modelo típico de mulher.

Rich (2010)Rich, A. (2010). Heterossexualidade compulsória e existência lésbica. Bagoas, (5), 17-44. Recuperado de https://periodicos.ufrn.br/bagoas/article/view/2309/1742
https://periodicos.ufrn.br/bagoas/articl...
amplia essa análise da sexualidade das mulheres e faz críticas acirradas às feministas por focarem apenas na questão das relações de gênero. Falar de mulher envolve a diversidade, de maneira que não se pode falar de mulher como categoria homogênea, como se existisse uma mulher típica. Nesta diversidade, muitas vezes desconsideramos os efeitos da heterossexualidade compulsória na produção de um lugar fixo para a mulher e da naturalização de determinadas questões como o do desejo sexual e afetivo intrínseco e obrigatório das mulheres por homens. Quando fazemos isso, colocamos as lésbicas em um lugar de desviantes, indesejáveis e invisíveis.

Além de negar às mulheres a vivência de sua sexualidade, para a autora, a perspectiva masculina heterocêntrica força as mulheres à sexualidade masculina

por meio de estupro (inclusive o estupro marital) e agressão da esposa; do incesto pai-filha, irmão-irmã; da socialização das mulheres para que elas sintam que a “pulsão” sexual masculina consiste em um direito; da idealização do romance heterossexual na arte, na literatura, na mídia, na propaganda etc.; do casamento infantil; do casamento arranjado; da prostituição; do harém; das doutrinas psicanalíticas da frigidez e do orgasmo vaginal; das descrições pornográficas das mulheres a responder com prazer à violência sexual e à humilhação (em que a mensagem subliminar seria que o sadismo heterossexual é mais “normal” do que a sexualidade das mulheres)

(Rich, 2010Rich, A. (2010). Heterossexualidade compulsória e existência lésbica. Bagoas, (5), 17-44. Recuperado de https://periodicos.ufrn.br/bagoas/article/view/2309/1742
https://periodicos.ufrn.br/bagoas/articl...
, p. 24).

Essa talvez seja uma das questões mais perturbadoras quando se discute a sexualidade da mulher, pois problematiza a essencialização dos desejos masculinos por meio da agressão às mulheres. Por outro lado, isso não quer dizer que elas não possam questionar e subverter isso.

Foucault (2015)Foucault, M. (2015). Microfísica do poder (2a ed.). Rio de Janeiro: Paz e Terra. nos relata que o movimento feminista criou uma inversão estratégica das relações de poder entre os gêneros, partindo da sexualidade que procurou colonizá-las, problematizando-a e produzindo outras verdades sobre a sexualidade da mulher. Pensando nisso e retomando o acontecimento, é possível olhar para os escritos na lousa e, através deles, construirmos outras verdades sobre a buceta, produzindo outros efeitos nas relações de gênero que escapem inclusive da perspectiva sexista e heterocentrada?

Essa pergunta não é tão simples de ser respondida, pois, para além do que já foi exposto, há uma vigilância ainda expressiva em relação à sexualidade das mulheres que são professoras, em especial da educação básica. Louro (1997)Louro, G. L. (1997). Gênero, sexualidade e educação: uma perspectiva pós-estruturalista. Petrópolis: Editora Vozes. nos apontou que a construção identitária das professoras foi produzida pela negação da sua sexualidade. Mesmo esse raciocínio tendo se modificado com recusas a essa produção discursiva das identidades, ainda vivenciamos resquícios da ideia da professora como “solteirona” e “titia”. Havia também um controle rigoroso sobre os trajes e o comportamento ideal ou desejável para elas, o que incluía a discrição da vida pessoal. Isso fortaleceu a representação identitária da professora como assexuada. Portanto, resistir a toda essa produção não é fácil, e as estratégias não estão tão visíveis, embora estejam presentes.

Nessa mesma direção, também nos questionamos como as estudantes reagiram diante dos escritos. Algumas delas encararam como uma forma de violência. A professora lhes indagou o porquê de não terem apagado o quadro ou mesmo de não terem chamado alguém da equipe gestora e, conforme relatado, algumas estudantes se sentiram intimidadas pelos colegas e ficaram com medo de serem insultadas ou sofrerem ameaças. De alguma maneira, há pistas de que as alunas não se sentiram instigadas a se posicionar na sala de aula ou na escola e a questionar quando se sentiram agredidas. Talvez também precisemos pensar nessa construção das feminilidades e masculinidades que ainda produz o homem como aquele que tem a voz, que fala, e a mulher como ouvinte, que se cala ou deve permanecer quieta.

Nesse jogo das relações de poder que atravessam o acontecimento, a professora busca se manter no lugar de docente. Ela afirma que precisava “improvisar”, visto que o fato era uma ruptura, uma descontinuidade, enfim, um acontecimento na perspectiva foucaultiana. Improvisar significava manter-se no lugar da professora, recuperar a continuidade, o que significou, em última análise, transformar o acontecimento numa atividade didática. A professora pega a “provocação” das alunas e alunos e dá uma função didática ao confronto: “disse que iria incluir uma pesquisa relacionada ao que estava exposto ali”. Ao propor essa atividade, ela dá um nome ao conjunto de cinco questões: pornografia. De alguma forma, as questões postas no quadro, para a professora, se configuravam como uma possibilidade de pornografia. Mas como podemos pensar a pornografia? Quais discursos sobre a pornografia nos capturam ou capturaram a professora e outras/outros estudantes?

Entendemos que há uma instabilidade nas conceituações de pornografia e, com isso, nas várias leituras que podem ser feitas dela. De início, um dos conceitos trazidos por Moraes e Lapeiz (1985)Moraes, E. R., & Lapeiz, S. M. (1985). O que é pornografia? São Paulo: Abril Cultural, Brasiliense. é o de que a pornografia estaria relacionada ao obsceno, ao indecoroso, ou seja, ao que é exposto, mas deveria estar encoberto. A pornografia se constituiria pelo escandalizar, violando a moral vigente. Isso tem relação direta com os efeitos provocados pelos escritos na lousa. São questões que não poderiam estar em cena, deveriam estar escondidas. As palavras usadas – buceta, pinguelão e cacete – nas questões expostas no quadro branco, por si só, já são vistas como algo a não ser proferido, o não dizível, são palavras tidas como (in)decentes.

Maio (2011)Maio, E. R. (2011). O nome da coisa. Maringá: Unicorpore. realizou uma pesquisa com familiares e professoras e professores de diferentes regiões do Brasil a fim de identificar os diferentes nomes dados a determinados órgãos genitais e algumas práticas sexuais. Sobre a vulva, ela diz que um dos primeiros nomes utilizados pelo colonizador ao adentrar as terras brasileiras foi “vergonhas”, associando esta ideia da genitália como algo de que se deve ter pudor. Na investigação realizada por Maio, a genitália externa feminina foi uma das palavras que teve mais nomes, inclusive “buceta”, e ela entende que isso talvez decorra “de toda a proibição e de todos os interditos que a terminologia exerce sore a repressão sexual feminina” (Maio, 2011Maio, E. R. (2011). O nome da coisa. Maringá: Unicorpore., p. 104).

Nos escritos da lousa trazidos nesta investigação, as perguntas sobre a buceta ou como se faz o sexo oral no homem são lidas como despudor, por isso algumas meninas se sentiram envergonhadas com os dizeres e nem se encorajaram a mexer no quadro. A construção da vergonha se dá pela exposição de questões que, a princípio, seriam privativas. Para além de tudo isso, dependendo das respostas das mulheres àquelas perguntas, elas seriam enquadradas em determinados lugares do ponto de vista sexual, alguns desejáveis socialmente e outros não; poderiam ser nomeadas donzelas, recatadas, piriguetes ou mesmo putas. Elas estariam expostas.

Essas análises nos permitem pensar esse lugar da pornografia no contexto mais atual, inclusive porque, desde os textos literários e passando pelo cinema, a pornografia já era narrada. Para Duarte e Rohden (2016, p. 720)Duarte, L. C., & Rohden, F. (2016). Entre o obsceno e o científico: pornografia, sexologia e a materialidade do sexo. Revista Estudos Feministas, 24(3), 715-737. Recuperado de http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-026X2016000300715&lng=en&nrm=iso
http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...
: “a pornografia é uma das peças centrais da composição dos roteiros sexuais do indivíduo moderno e a primeira fonte de informação sobre sexualidade para milhões de pessoas”. Elas também nos mobilizam a pensar que, embora se tenha produzido a pornografia como algo obsceno e a sexologia como conhecimento, elas se entrelaçam, pois uma cena sexual, como a masturbação ou o intercurso sexual, dependendo de como é lida, pode ser entendida como pornográfica ou científica. Nos dizeres das autoras, pornografia e sexologia são disputas culturais e políticas em torno do sexo e, além disso, “são extremamente pedagogizantes, pois o cerne de sua empreitada é estabelecer parâmetros de normalidade e tornar conhecida a aparência do desejo sexual, do orgasmo e dos corpos (com ênfase, evidentemente, nos genitais)” (Duarte & Rohden, 2016Duarte, L. C., & Rohden, F. (2016). Entre o obsceno e o científico: pornografia, sexologia e a materialidade do sexo. Revista Estudos Feministas, 24(3), 715-737. Recuperado de http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-026X2016000300715&lng=en&nrm=iso
http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...
, p. 732).

Isso não quer dizer que não existam problematizações da pornografia, especialmente quando tratamos do chamado mercado pornográfico, que tem determinados interesses econômicos com a venda de vídeos e fotos. Por exemplo, Rich (2010)Rich, A. (2010). Heterossexualidade compulsória e existência lésbica. Bagoas, (5), 17-44. Recuperado de https://periodicos.ufrn.br/bagoas/article/view/2309/1742
https://periodicos.ufrn.br/bagoas/articl...
é uma das questionadoras da pornografia tradicional e mercadológica, pois, para ela, nessas imagens há uma valorização do sadismo em que as mulheres são produzidas como objeto ou mercadoria sexual para atender às fantasias eróticas dos homens, reiterando o discurso de que as mulheres sentem mais prazer quando o sexo é violento. Ainda para a autora, essa produção do sexo como violência também está associada ao pensamento de que, no intercurso heterossexual, a força é tomada, via de regra, como algo instintivo do sexo, intrínseco a ele. Ao pensar a pornografia desta forma, o que resta é censurá-la, lutar contra ela. Contudo, nos questionamos: são possíveis outras leituras da pornografia? As mulheres podem subverter essa lógica da pornografia que as coloca como objeto de desejo e prazer do masculino, associado, muitas vezes, à violência, e transgredi-la? São questões que permanecem e nos desestabilizam.

Violência de gênero

Outro entendimento que esse acontecimento gera é o atravessamento nas relações de gênero. Na aula marcada em que as alunas e os alunos entregaram a pesquisa solicitada, foi aberto um debate relacionado às frases e às pesquisas realizadas. Sobre esse momento, a professora relatou o seguinte:

Conversando com todos e todas, perguntei-lhes se haviam pensado em algum momento se as frases poderiam se configurar como violência de gênero. Em se tratando desse aspecto, expliquei-lhes que as frases não se tratavam apenas de transgressão, ou de se referir ao público feminino apenas daquele ambiente, mas se estendia a todo o público feminino, como as mulheres da família de cada um/uma que estava ali. Assim, acrescentei que seria interessante pensarmos que, geralmente, a aproximação com o feminino é passível de violência. Isso é fato se considerarmos os meninos efeminados, as mulheres trans e travestis, os homens estupradores que, ao serem presos, são apresentados por policiais aos demais presidiários para que façam deles “as mulherzinhas”. Aproveitei também para citar Renato, meu entrevistado, que, quando criança, precisava pular o muro da escola ou sair por último, e nunca se aventurava a ir pelo portão principal para não ser agredido pelos colegas, e o motivo de tanta agressão era exatamente porque ele escapava da performance hegemônica de gênero masculino. Alguns alunos e alunas admitiram que não haviam pensado dessa forma, porém algumas alunas afirmaram que o gênero feminino é alvo de palavras e ações discriminatórias em nossa sociedade, que conduz à inferiorização diante do gênero masculino. Isso é tão verdadeiro, confirmaram algumas meninas, que naturalizamos a traição dos homens e sempre nos espantamos com a traição das mulheres nos relacionamentos heterossexuais. Outros pontos foram levantados, como as piadas sobre mulheres guiando automóveis ou outros veículos, a exigência de um padrão de beleza e o serviço doméstico.

No fragmento acima, vamos tomar como ponto de partida o lugar de fala do jovem que escreveu os enunciados. Nesse sentido, quando o aluno expôs as perguntas no quadro, trouxe à tona as questões que envolvem desigualdade de gênero, já que ele, homem, põe em evidência questionamentos relacionados à buceta, uma parte do corpo sexual da mulher, e não perguntas voltadas ao corpo de outro homem. Sobre o acontecimento, a professora menciona que perguntou à classe se alguém havia pensado a respeito das frases expostas no quadro como configurando uma violência relacionada ao gênero. Mais ainda, se elas e eles poderiam se referir a outras mulheres que não estavam naquele ambiente, mas faziam parte da vida delas e deles. Esse pensamento se traduz em perceber que a violência manifestada se ampliaria para atingir também o corpo de todas as mulheres, visto que a violência de gênero tem sido pensada com base em um viés histórico em que a mulher não era reconhecida em sua autonomia corpórea, pois havia um só sexo: o masculino. Desse período herdou-se a hierarquia de gênero de onde se tem produzido o discurso de que a mulher é frágil e, em consequência dessa característica, deve ser sempre submissa ao homem, seja no espaço familiar ou não.

Em seguida, a professora continua instigando a classe, dizendo que “seria interessante pensarmos que, geralmente, a aproximação com o feminino é passível de violência”. Ao fazer tal enunciado, ela posiciona a violência de gênero para além do sexo/gênero atrelado à genitália, exemplificando, em seguida, as discriminações que há sobre os meninos efeminados, as mulheres trans e as travestis, acrescentando nesse bojo a situação de homens pedófilos e estupradores quando seus corpos passam a ser violentados nos presídios como castigo, tornando-se “mulherzinhas” de outros prisioneiros. Provocando as alunas e os alunos nessa direção, há uma inclinação na professora em estabelecer uma compreensão maior dos sentidos atribuídos aos corpos por meio de suas performances que escapam ao modelo hegemônico de gênero e, devido a essa característica, são ainda mais marginalizados.

A compreensão sobre violência de gênero, conforme percepção da professora quando se refere ao tema, faz um alerta à classe de que há muitas outras situações violentas relacionadas ao gênero que não apenas as agressões físicas, mas também as simbólicas, expressas por meio de gestos, olhares e da linguagem, como o ocorrido na sala de aula. A professora evidencia, com esse pensamento, que a violência de gênero é um fenômeno que abriga vários sentidos e se articula por múltiplas facetas: psicológica, moral e física (Bandeira, 2014Bandeira, M. L. (2014). Violência de gênero: a construção de um campo teórico e de investigação. Sociedade e Estado, 29(2), 449-469. Recuperado de http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-69922014000200008&lng=en&nrm=iso&tlng=pt
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) e, como é algo persistente, desdobra-se do âmbito familiar para as relações interpessoais em espaços públicos, como locais de trabalho, escolas e vias públicas. Para esta autora, a violência de gênero possui finalidades de hierarquizar as relações de gênero e, por isso,

suas manifestações são maneiras de estabelecer uma relação de submissão ou de poder, implicando frequentemente em situações de medo, isolamento, dependência e intimidação para a mulher. É considerada como uma ação que envolve o uso da força real ou simbólica, por parte de alguém, com a finalidade de submeter o corpo e a mente à vontade e liberdade de outrem

(Bandeira, 2014Bandeira, M. L. (2014). Violência de gênero: a construção de um campo teórico e de investigação. Sociedade e Estado, 29(2), 449-469. Recuperado de http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-69922014000200008&lng=en&nrm=iso&tlng=pt
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, p. 460).

No acontecimento em sala de aula, um rapaz gay, que também é um sujeito inferiorizado em uma sociedade heteronormativa, se coloca, naquele momento, no lugar de um homem heterossexual que traz o modelo hegemônico de masculinidade, desconsiderando outras subjetividades que o produzem e não refletindo, a princípio, sobre quais consequências sua ação traria para as mulheres que estavam ali. Na ação, ele não se vê também como uma pessoa subalternizada por não corresponder a um modelo heterossexual imposto pelas normas sexuais. Sem pensar em seu lugar na sociedade diante da turma, ele agride, por meio da linguagem, outras pessoas que também são subalternizadas na sociedade hegemônica.

Quanto à reação das meninas que se indignaram com as sentenças expostas no quadro branco, elas transferiram para a professora a intenção de se manifestar contra a atitude do colega. No episódio, ocorreu a busca pelo apoio de alguém semelhante a elas com relação ao sexo/gênero, mas, de certa forma, diferente delas, uma pessoa com autoridade suficiente para fazer parar a violência. Elas esperavam e desejavam que a professora tomasse a iniciativa de defendê-las, ao mesmo tempo em que estaria se defendendo pelo fato de também ser mulher e, ainda, defendendo todas as mulheres, resistindo às estratégias de poder exercidas pelo rapaz. A relação de poder presente no acontecimento nos remete a Foucault (2015)Foucault, M. (2015). Microfísica do poder (2a ed.). Rio de Janeiro: Paz e Terra. quando menciona o seguinte:

O que faz com que o poder se mantenha e que seja aceito é simplesmente que ele não pesa só como uma força que diz não, mas que de fato ele permeia, produz coisas, induz ao prazer, forma saber, produz discurso. Deve-se considerá-lo como uma rede produtiva que atravessa todo o corpo social muito mais do que uma instância negativa que tem por função reprimir (p. 45).

Ao escrever as frases no quadro, o rapaz gay perturbou todas as pessoas da classe e provocou reações como risos, expressões de repúdios por quem não apoiava o ato e visitações de estudantes de outras classes. Sua ação também produziu outros efeitos, tais como a reação das meninas que pediram uma atitude da professora, a atitude da própria professora quando solicitou a pesquisa e, por último, a produção deste texto. Mas há outras situações que necessitam ser observadas.

Vamos pensar na frase introdutória que abre a lista de oito questionamentos sobre a buceta. No conjunto que segue até a sexta questão, o rapaz se refere a qualquer mulher, independentemente de sua orientação sexual, que, nesse caso, pode ser uma mulher lésbica, bissexual ou transexual; em seguida, essas possibilidades de relação são rompidas ao serem lançadas as duas últimas perguntas: “7. Você chupa o ovo sem babar? 8. Você engole o cacete inteiro?” Nesse par de perguntas, a mulher é compreendida apenas em uma relação heterossexual, destinada a um homem e não a outra mulher, fechando as possibilidades para as outras relações afetivas/sexuais entre mulheres. Nas duas questões, há a emergência mais forte de uma linguagem falocêntrica, visto que o rapaz faz disparar em sua fala um discurso que exalta a masculinidade e coloca a mulher subordinada aos desejos do homem – aliás, de um determinado modelo de ser homem. Com isso, talvez deseje reiterar a sua própria masculinidade para o público presente ou generalizar tais aspectos mediante os enunciados para outros homens, muito embora ele não tenha conhecimento de que haja muitas formas de masculinidade e de feminilidade, ou também ainda não saiba que a maneira pela qual ele evidencia a masculinidade já seja considerada algo incerto ou subjacente, como citam Connell e Messerschmidt (2013)Connell, W. R., & Messerschmidt, J. W. (2013). Masculinidade hegemônica: repensando o conceito. Revista Estudos Feministas, 21(1), 241-282. Recuperado de http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-026X2013000100014&lng=en&nrm=iso
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:

O conceito de masculinidade é criticado por ter sido enquadrado no seio de uma concepção heteronormativa de gênero que essencializa a diferença macho-fêmea e ignora a diferença e a exclusão dentro das categorias de gênero. Ao conceito de masculinidade é atribuído o fato de esse permanecer logicamente numa dicotomização do sexo (biológico) versus gênero (cultural) (p. 250).

No contexto da sala de aula, existe algo paradoxal no rapaz ao fazer emergir essa concepção de masculinidade heteronormativa, já que ele faz parte de uma masculinidade subalterna diante da heterossexualidade compulsória, em decorrência de sua orientação sexual. Ao transpor para a escrita seu pensamento, ele não pensa em sua posição de sujeito homossexual e, ao mesmo tempo, está essencializando as diferenças sexuais, sendo que isso o desloca do lugar que escapa à heterossexualidade, pois o discurso presente nos enunciados se articula com o sexo biológico e anula as concepções de gênero vistas como construções culturais.

Ao longo de todo texto, esse é o nosso argumento central, ou seja, a defesa das relações de gênero e os entendimentos discursivos de sexualidade como resultado de construções históricas e culturais, que marcam aquilo que sabemos e o que somos. Estamos defendendo que as palavras e os sujeitos têm história e que o lugar da problematização está justamente na recuperação destas descontinuidades históricas para nos questionarmos sobre a história do pensamento na nossa constituição. O que nos chama atenção é pensar que este acontecimento só tomou forma pela ação da professora em se pegar “surpresa” com os efeitos destas questões sobre si mesma, sobre as alunas e os alunos e sobre a escola. O que o acontecimento estabelece na escola é algo novo para esse contexto. Ao mesmo tempo em que as questões e seus desdobramentos revelam todo poder de articulação em torno da sexualidade que marca nossa sociedade, elas também recuperam o lugar da escola em uma sociedade do controle. Há certa potencialidade no fato, de maneira que a própria professora compreende a relação de forças que organizou os entendimentos e ações desde o início até os seus desdobramentos. O modo como o aluno estruturou o questionário também está na lógica de poder de questionar na escola. O enunciado se estrutura nos padrões/moldes das perguntas que as alunas e os alunos recebem em provas e/ou exercícios de averiguação do conhecimento ou desconhecimento delas e deles sobre a matéria, e não na estrutura de discussão sobre um tema. Até no modo de provocar/perguntar/questionar, o aluno se pauta na estrutura de controle. A professora “quebra” essa estrutura também ao propor que se discuta, pesquise etc. Ela assume o quadro nessa perspectiva inclusive no quesito da forma. Potencialidade que parece estar em tomar o acontecimento para colocar sob suspeita nossas formas de pensar, ser e estar no mundo, que marca nossas relações com a sexualidade, com os nossos desejos e corpos, com os outros, com os saberes, com os lugares que ocupamos e com as escolas. Mas também residem aí alguns desafios. Um primeiro seria tomar o interesse das alunas e alunos pela discussão da sexualidade, por mais que isso possa ser entendido de maneira atravessada, como intenção de “provocar” ou mesmo “agredir”. O que elas e eles estão revelando é que, se não partir da escola, surgirá delas e deles. Outro desafio que nos parece posto é a relação com o currículo, de maneira que a escola seja capaz de lidar com a imprevisibilidade que marca o currículo sem apelar para a disciplina e punição como formas de evitar o imprevisível que marca a sala de aula. E, por último, queremos recuperar o desafio de pensar os sujeitos nas suas relações com os saberes e relações de poder que marcam nossos posicionamentos na escola. Recuperar a pergunta foucaultiana “como me tornei o que sou?”, neste sentido, não pode significar a manutenção de si, mas é investir na transformação de si e dos outros pela problematização da relação saber-poder-ser.

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    Apoio: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes)
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    Normalização, preparação e revisão textual: Aline Maya (Tikinet) – revisao@tikinet.com.br

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    02 Dez 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    13 Maio 2018
  • Revisado
    28 Ago 2018
  • Aceito
    03 Set 2018
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