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Sujeitos históricos e ensino sob a ótica de Eduardo Coutinho: proposta para a formação de professores de história 1 1 Editor responsável: Silvio Gallo https://orcid.org/0000-0003-2221-5160 2 2 Normalização, preparação e revisão textual: Piero Kanaan (Tikinet) revisao@tikinet.com.br 3 3 Apoio: Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo - Fapesp, (Grant /Award Number: ‘19/18429-0’)

Resumo

O presente trabalho apresenta reflexões sobre as contribuições oportunizadas pelos filmes de conversação de Eduardo Coutinho para delineamento de reflexões associadas ao conceito de sujeito histórico, a ser mobilizado no ensino de história. Tal pesquisa apresenta abordagem qualitativa, natureza aplicada e explicação, mediante emprego de análise bibliográfico, análise documental e observações sistemáticas, segundo perspectiva do tipo ex-post-facto. Os filmes de Coutinho apresentam mulheres, velhos, negros, pobres, periféricos e nordestinos, de modo a tratar com significância suas experiências de vida. A apropriação pedagógica desses filmes é pertinente para construção de processo formativo que se pauta pela abordagem de sujeito histórico a partir de concepções como as dos excluídos/subalternos/de baixo e que é voltado para professores que lecionam História na Educação Básica.

Palavras-chave
Ensino de história; Cinema e Ensino; Sujeitos Históricos; Processo formativo

Abstract

This paper presents reflections on the contributions made by Eduardo Coutinho’s conversation films to outline reflections associated with the concept of historical subject, to be addressed in the teaching of history. This research presents a qualitative approach, applied nature and explanation, using bibliographic analysis, document analysis and systematic observations, from an ex-post-facto perspective. Coutinho’s films feature women, the elderly, blacks, poor, peripheral and northeastern people, in order to treat their life experiences with significance. The pedagogical appropriation of these films is relevant for the construction of a training process that is guided by the approach of the historical subject from conceptions such as those of the excluded/subaltern/from below and which is aimed at teachers who teach History in Basic Education.

Keywords
History Teaching; Cinema and Teaching; Historical Subjects; Formative Process

Apresentando o problema

É bastante conhecido o adágio popular segundo o qual o Brasil não é para amadores. Nele, dentre as possibilidades interpretativas, existe a que sublinha as marcas históricas das venturas e desventuras de um país atravessado por tensões, disputas e lutas sociais em diferentes matizes (classe, raça, gênero, trabalho), porém, cimentado com o indisfarçável talante autoritário, autocrático, elitista e violento dos grupos e classes dominantes.

Nessa sociedade, fazer-se sujeito histórico (individual, plural, coletivo) e ver-se reconhecido institucionalmente era (e continua sendo) tarefa inglória e, não poucas vezes, trágica – vide as práticas de estigmatização, perseguição e assassinato contra pretos, pardos, indígenas, mulheres, trabalhadores ou LGBTs. Um cotidiano permeado por intensos processos de deslegitimação desses sujeitos na história. Não é para menos.

Originário de miscelânea espacial tributária das capitanias hereditárias e da nefasta experiência escravocrata nas relações de trabalho, produção e sociabilidade, o Brasil tornou-se independente sem desfrutar concretamente de um Estado moderno e, menos ainda, de configurar-se uma nação (Jancsó & Pimenta, 2000Jancsó, I, & Pimenta, J. P. G. (2000). Peças de um mosaico (ou apontamentos para o estudo da emergência da identidade nacional brasileira) In C. G. Mota (Org.), Viagem incompleta: a experiência brasileira 1500-2000 (formação: histórias) (pp.127-176). SENAC/SESC.; Holanda, 2003Holanda, S. B. (2003). A herança colonial – sua desagregação. In S. B. Holanda, O Brasil monárquico, Tomo II: o processo de emancipação (pp.13-47). Bertrand Brasil.) – exceto nos discursos e práticas elitistas do progresso com ordem (Hardman, 1988Hardman, F. F. (1988). Trem Fantasma – A modernidade na selva. Companhia das Letras.; Sevcenko, 2003Sevcenko, N. (2003). Literatura como missão: tensões sociais e criação cultural na Primeira República. Companhia das Letras.).

Desde a segunda metade do século XIX, o que se assistiu no âmbito do Estado no Brasil foi a construção de narrativas históricas alicerçadas nas questões da identidade nacional e do ser brasileiro. Uma escrita paradigmática novecentista foi História Geral do Brasil, de 1850, de Francisco Adolfo de Varnhagen, apresentada em concurso promovido pelo Instituto Histórico e Geográfico do Brasil (IHGB) (Reis, 2003Reis, J. C. (2003). As identidades do Brasil – de Varnhagen à FHC. Editora FGV.; Parada & Rodrigues, 2018Parada, M. & Rodrigues, H. E. (2018). Os historiadores – clássicos da História do Brasil: Vol. 4 - Dos primeiros relatos a José Honório Rodrigues. Vozes.).

A obra, definidora de marcos históricos oficiais da identidade nacional brasileira (Pinsky, 2009Pinsky, J. (2009). O ensino de História e a criação do fato. Contexto.)4 4 Haja vista que vinha ao encontro dos interesses das elites pós independência, ao estabelecer uma narrativa que garantia a desejada unidade nacional sem abalar as hierarquias sociais, as forças político-econômicas e a atuação centralizadora do Estado. (Pinsky, 2009). , não limitava-se a expressar os interesses de círculos estreitos das elites imperiais do período, mas incluía também iniciativas e ações político-institucionais voltadas ao ensino formal de história às crianças e jovens, pois “. . . eram os objetivos da historiografia comprometida com o Estado e sua produção alcançava os bancos das escolas por meio dos programas oficiais e dos livros didáticos, elaborados sob estreito controle dos detentores do poder” (Fonseca, 2006Fonseca, T. N. L. (2006). História e ensino de História. Autêntica., p. 24).

Da obra de Varnhagen, embora longe de estar restrita a ela5 5 Apenas no campo da educação, deve-se levar em conta também a criação do Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico do Brasil e seus congêneres regionais, a criação do Colégio Pedro II, a formulação de legislação educacional clivada pela exclusão social e a partilha de concepções como o darwinismo social e as teorias racialistas (Schwarcz, 1993). , emergiu a constituição de uma narrativa matricial, responsável pela invenção de uma tradição (Hobsbawm & Ranger, 1997Hobsbawm, E., & Ranger, T. (1997). A invenção das tradições. Paz e Terra.) que, em linhas gerais, apresentava os seguintes pressupostos historiográficos:

  • Apagamento (total ou parcial) de tensões, conflitos e lutas de classes, grupos étnicos e regionais, em favor da construção de um sentimento nacional;

  • Ausência de valorização das especificidades históricas de povos e/ou comunidades viventes há vários séculos no Brasil, em prol de uma história a partir da escrita que evita (ou oculta) a abordagem da diversidade cultural;

  • Tratamento depreciativo de elementos perturbadores e subversivos, sinônimo de inimigos da ordem – daí o emprego de expressões como invasão ou ataque em nome da naturalização de agentes formadores da nação (o colonizador português).

Embora essas questões tenham sido enfrentadas de modos distintos por intelectuais como Sérgio Buarque de Holanda, Gilberto Freyre, Caio Prado Júnior e Florestan Fernandes (Parada & Rodrigues, 2018Parada, M. & Rodrigues, H. E. (2018). Os historiadores – clássicos da História do Brasil: Vol. 4 - Dos primeiros relatos a José Honório Rodrigues. Vozes.), fato é que o tratamento dispensado aos sujeitos históricos não pertencentes aos grupos dominantes e dirigentes marcou a historiografia e o ensino de história até, pelo menos, a década de 1980.

A contar desse momento, movendo-se, em boa medida, na esteira da reemergência de sujeitos até então subalternizados e desarticulados politicamente durante a ditadura civil-militar, bem como na luta pelo final desse regime e a restituição das garantias democráticas (caso dos trabalhadores), uma produção historiográfica no campo da educação escolar passava a lançar críticas ao caráter autoritário da legislação e da organização do ensino, ao mesmo tempo em que anunciava a necessidade de um currículo mediado pela pesquisa e a criticidade e que valorizasse a diversidade de abordagens e a multiplicidade dos sujeitos históricos (Almeida Neto, Lourenço, & Carvalho, 2020Almeida Neto, A. S., Lourenço, E., & Carvalho, J. P. F. (2020). Ensino de história em tempos torpes. leituras e reflexões. Navegando Publicações; Bittencourt, 2006Bittencourt, C. M. F. (2006). O saber histórico na sala de aula.Contexto., 2009Bittencourt, C. M. F. (2009). Ensino de História: fundamentos e métodos. Cortez.; Fonseca, 1993Fonseca, S. G. (1993). Caminhos da história ensinada. Papirus., 2009Fonseca, S. G. (2009). Didática e prática de ensino de história. Papirus.; Leite, 2010Leite, J. L. (2010). Fazendo gênero na história ensinada: uma visão além da (in)visibilidade. In M. M. D. Oliveira (coord.), História: ensino fundamental (pp. 193-212). Ministério da Educação/Secretaria de Educação Básica.; Leme et al., 1986Leme, D. M. P. C., Hofling, E. M., Zamboni, E., & Balzan, N. C. (1986). O ensino de Estudos Sociais no Primeiro Grau. Atual.; Monteiro et al., 2019Monteiro, A. M., & Ralejo, A. (2019). Cartografias da pesquisa em ensino de história. Mauad.; Peixoto, 2015Peixoto, M. do R. da C. (2015). Ensino como pesquisa: um novo olhar sobre a história no ensino fundamental. Como e por que aprender/ensinar história. Revista História & Perspectivas, 28(53), 37-70.; Silva, 1984Silva, M. A. (1984). Repensando a história. Editora Marco Zero/ANPUH-SP.; Tourinho, 2008Tourinho, M. A. C. (2008). Os sujeitos históricos e o ensino de História: os heróis precisam ser banidos? Tempos Históricos, 12, 57-79.).

Nesse contexto histórico, e na contramão das práticas deslegitimadoras das elites e da mídia hegemônica, podemos inferir também acerca do lugar ocupado pelo cineasta e diretor Eduardo Coutinho (1933-2014), no âmbito do cinema-documentário brasileiro, e suas possíveis contribuições para o ensino de história, por meio de filmes que têm sido denominados de conversação6 6 Por filmes de conversação entende-se conjunto de filmes lançados entre 1999 e 2005, marcados pelo registro de experiências de personagens anônimos, relato de situações corriqueiras e aparentemente banais, mais repletas de significações políticas, sociais e culturais, bem como presença de noção diferenciada de temporalidade, em que o passado é capturado no calor do presente, retroativamente. Além disso, nesses filmes Coutinho depura tecnicamente seu estilo, renunciando a roteiro prévio, voz over, diversidade de planos cinematográficos e de posições de câmera, emprego de trilha musical não diegética, transições e outros efeitos na montagem. Por fim, deve-se ainda considerar que se trata de filmes em que Eduardo Coutinho vai a campo, em busca de seus personagens. (Lins, 2004, 2013). – casos de Santo Forte (1999)Coutinho, E. (Diretor). (1999). Santo Forte[Filme]. Brasil. VideoFilmes., Babilônia 2000 (2000)Coutinho, E. (Diretor). (2001). Babilônia 2000 [Filme]. VideoFilmes., Edifício Master (2002)Coutinho, E. (Diretor). (2002). Edifício Master [Filme]. VideoFilmes., Peões (2004)Coutinho, E. (Diretor). (2004). Peões [Filme]. Brasil. VideoFilmes. e O fim e o princípio (2005)Coutinho, E. (Diretor). (2005). O fim e o princípio [Filme]. VideoFilmes..

Integrante da geração do Cinema Novo, Coutinho compôs o grupo de cineastas viventes na década de 1960 envolvidos com a crítica do cinema estrangeiro, a veiculação entre cinema e política e a construção de narrativas fílmicas centradas em questões como o subdesenvolvimento, a cultura popular e a força da alegorização (Bernardet, 2003Bernardet, J-C. (2003). Cineastas e imagens do povo. Companhia das Letras.; Simonard, 2006Simonard, P. (2006). A geração do Cinema Novo. Mauad X.; Xavier, 2004Xavier, I. (2004). Indagações em torno de Eduardo Coutinho e seu diálogo com a tradição moderna. Comunicação e Informação, 7(2), 180-187.).

Ao trabalhar, a partir de 1975, no programa Globo Repórter, da Rede Globo, e, meio a esta condição de trabalho, no processo de realização de Cabra Marcado para Morrer, produção de 1984, Coutinho descobriu um modo paradigmático de filmar o real, que guardaria relações intersticiais com pessoas comuns. Homens e mulheres das camadas populares, classes trabalhadoras e setores médios empobrecidos, todos igualmente capazes de contar histórias extraordinárias.

Avesso aos padrões estético-narrativos e culturais da mídia hegemônica e às produções cinematográficas de viés sociologizante presentes no Brasil desde os anos de 1950 e 1960, o cineasta valorizaria a palavra filmada e a escuta sensível do outro, ao transformar o ato da filmagem numa oportunidade única, irrepetível, de produzir encontros e conversas7 7 Encontros e conversas destituídas, ao longo de sua experiência cinematográfica, das fórmulas populistas, ilusões românticas de classe ou complacências de ordem moral (características dos setores dominantes). (Bernardet, 2003; Weller, 2012). com personagens que, diante das câmeras, assumiam a posição de sujeitos históricos.

Nesse sentido, este artigo propõe-se a expor e analisar algumas reflexões voltadas à apropriação pedagógica de conhecimentos éticos, estéticos e epistemológicos do cinema de Coutinho, procurando articulá-los à ótica da problematização dos sujeitos históricos em possibilidades de ensino. Trata-se de pensarmos a construção de abordagens do conceito de sujeitos históricos em processos formativos comprometidos com a perspectiva de uma história vista de baixo e voltados para professores que lecionam história na educação básica.

Se a assertiva de Marx (2011, p. 25)Marx, K. (2011). O 18 de Brumário de Luís Bonaparte. Boitempo., segundo a qual “Os homens fazem a sua própria história; contudo não a fazem por livre e espontânea vontade”, mantém-se como baliza teórica (e política) significativa para pensar uma concepção de sujeito histórico – a dialética entre as ações humanas e a síntese de suas múltiplas determinações –, nos valemos igualmente das contribuições de Edward Thompson (1981Thompson, E. P. (1981). Miséria da teoria ou um planetário de erros. Jorge Zahar., 1998)Thompson, E. P. (1998). Costumes em comum: estudos sobre a cultura popular tradicional. Companhia das Letras. e de Carlo Ginzburg (1989Ginzburg, C. (1989). O nome e o como – troca desigual e mercado historiográfico. In C. Ginzburg, A micro-história e outros ensaios(pp. 169-178). Difel., 2007a)Ginzburg, C. (2007a). Mitos, emblemas e sinais – Morfologia e História. Companhia das Letras. para compreender os sujeitos históricos nos filmes de conversação de Coutinho.

De Thompson, imprescindível são as suas análises sobre as categorias históricas de cultura e experiência, especialmente por estarem voltadas ao estudo de temas e objetos caros aos mundos do trabalho e dos trabalhadores, sujeitos vindos de baixo. Para o historiador britânico, se os sujeitos são culturalmente determinados por relações sociais, modos de vida e pertencimentos de classe, não menos importante são as formas de apropriação e usos de uma determinada cultura na construção e (re)elaboração das experiências de grupo e de classe.

No que tange a micro história de Ginzburg, cabe destacar a revalorização crítica dos sujeitos (inclusive em sua dimensão subjetiva e individual) a partir do método indiciário e da redução da escala de análise, na medida em que promove – tal qual um primeiro plano (ou plano detalhe) de câmera cinematográfica – um olhar circunscrito e detalhado dos testemunhos de homens e mulheres, com o objetivo de compreender as experiências, as visões de mundo e as redes de relações dos sujeitos pesquisados.

Não menos relevante, contudo, o diálogo com a concepção metodológica de sujeitos históricos presentes em alguns estudos sobre historiografia e ensino de história no Brasil, desde o final dos anos 1980 (Davies, 2009Davies, N. (2001). As camadas populares nos livros de história do Brasil. In J. Pinsky, C. Bittencourt, E. Nadai, N. Davies, P. Miceli (Org), O ensino de história e a criação do fato (pp. 93-104). Contexto.; Leite, 2010Leite, J. L. (2010). Fazendo gênero na história ensinada: uma visão além da (in)visibilidade. In M. M. D. Oliveira (coord.), História: ensino fundamental (pp. 193-212). Ministério da Educação/Secretaria de Educação Básica.; Tourinho, 2008Tourinho, M. A. C. (2008). Os sujeitos históricos e o ensino de História: os heróis precisam ser banidos? Tempos Históricos, 12, 57-79.).

Nicholas Davies, por exemplo, questionou o tratamento dispensado às camadas populares no ensino de história – seja deixando de explicitar suas “condições de vida e trabalho”, seja “enfatizando as resistências populares à dominação e buscando encontrar heróis populares, até para se contrapor aos heróis dos grupos dominantes” (Davies, 2009Davies, N. (2001). As camadas populares nos livros de história do Brasil. In J. Pinsky, C. Bittencourt, E. Nadai, N. Davies, P. Miceli (Org), O ensino de história e a criação do fato (pp. 93-104). Contexto., p. 121) – embora alertasse que “história a serviço das camadas populares não é necessariamente uma história que fale bem delas e as coloque no altar da veneração” (Davies, 2009Davies, N. (2001). As camadas populares nos livros de história do Brasil. In J. Pinsky, C. Bittencourt, E. Nadai, N. Davies, P. Miceli (Org), O ensino de história e a criação do fato (pp. 93-104). Contexto., p. 124).

Em outra chave de leitura, Maria Tourinho (2008)Tourinho, M. A. C. (2008). Os sujeitos históricos e o ensino de História: os heróis precisam ser banidos? Tempos Históricos, 12, 57-79. promoveu discussão sobre a diversidade de sujeitos no ensino de história, destacando a significância dos homens comuns. A autora indica que essa abordagem guarda relação com debates historiográficos em torno da valorização do cotidiano, caso da relação entre práticas e representações, além da ótica dos vencidos e das relações de poder, resistências e apropriações.8 8 Tourinho (2008) registra, entretanto, que essa abordagem não deve significar abandono do tratamento dos heróis, pois isso representaria prejuízo do entendimento dos processos históricos, inclusive, daqueles responsáveis pela valorização destes personagens.

Por fim, Juçara Leite (2010)Leite, J. L. (2010). Fazendo gênero na história ensinada: uma visão além da (in)visibilidade. In M. M. D. Oliveira (coord.), História: ensino fundamental (pp. 193-212). Ministério da Educação/Secretaria de Educação Básica. ressaltou a importância do ensino de história incluir as mulheres, segundo perspectiva dos estudos de gênero. Segundo essa estudiosa, refletir sobre as mulheres no ensino de história foi algo negligenciado ou, quando existente, apresentado segundo paradigma que insiste por associar estas personagens “ao exemplo adequado de virtudes, castidade, maternidade e submissão, isto é, um determinado ideal de mulher para a pátria brasileira” (Leite, 2010Leite, J. L. (2010). Fazendo gênero na história ensinada: uma visão além da (in)visibilidade. In M. M. D. Oliveira (coord.), História: ensino fundamental (pp. 193-212). Ministério da Educação/Secretaria de Educação Básica., p. 195-196).

Em diferentes perspectivas, as análises anteriores nos auxiliam a refletir um ensino que procure redesenhar o conceito de sujeito histórico em dimensões ativas, particulares e plurais, sem que percamos de vista os limites de abordagem. Assim, ao lado delas, utilizamos pesquisas sobre educação, ensino e cinema (Duarte, 2002Duarte, R. (2002). Cinema & educação. Autêntica.; Duarte, & Reis, 2008; Fantin, 2006Fantin, M. (2006). Crianças, cinema e mídia-educação: olhares e experiências no Brasil e na Itália. [Tese de Doutorado em Educação, Universidade Federal de Santa Catarina]. Repositório Institucional UFSC. https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/88793
https://repositorio.ufsc.br/handle/12345...
, 2013Fantin, M. (2013). Cinema, participação estética e imaginação. Revista Pedagógica, 1(30), 534-560.; Fischer, 2009Fischer, R. M. B. (2009). Docência, cinema e televisão: questões sobre formação ética e estética. Revista Brasileira de Educação, 14(40), 93-102., 2011a, 2011b; Fresquet, 2013Fresquet, A. M. (2013). Cinema e educação. Autêntica., 2015Fresquet, A. M. (2015). Cinema e educação: a lei 13.006. Universo.; Setton, 2004Setton, M. G. J. (2004). A cultura da mídia na escola. Annablume., 2010Setton, M. G. J. (2010). Mídia e educação. Contexto.), que tem possibilitado a exposição de problemas e caminhos em torno do protagonismo de professores e estudantes em processos formativos mediados pelas tecnologias.

Quanto à metodologia de pesquisa científica, trabalharemos com as dimensões qualitativa (Bicudo, 1993Bicudo, M. A. V. (1993). Pesquisa em Educação Matemática. Pro-Posições, 4(1), 18-23.), aplicada e explicativa da filmografia coutiniana9 9 A pesquisa qualitativa favorece abordagem problematizadora da subjetividade dos sujeitos, isto é, os sentidos e significados que estes atribuem às suas experiências durante as filmagens. Aplicada, porque objetiva gerar conhecimentos dirigidos à formação de professores de história na educação básica, valendo-se de filmografia do cineasta. E explicativa, pois exige mobilização de dados empíricos (filmes), a serem refletidos com base em conceitos e conteúdos apreendidos na leitura de bibliografia e na observação sistemática dos pressupostos e expedientes empregados pelo cineasta. , empregando análise bibliográfica e documental, bem como de observações sistemáticas, segundo perspectiva do tipo ex-post-facto (Alves-Mazzotti & Gewandsznajder, 1999Alves-Mazzotti, A, & Gewandsznajder, F. (1999). O método nas ciências naturais e sociais. Pioneira.; Gamboa, 1997Gamboa, S. S. (1997). Pesquisa educacional. Cortez.; Gil, 1994Gil, A. C. (1994). Métodos e técnicas de pesquisa social. Atlas., 2007Gil, A. C. (2007). Como elaborar projetos de pesquisa. Atlas.; Minayo, 2000Minayo, M. C. S. (2000). Pesquisa social. Vozes.; Trivinõs, 1987Trivinõs, A. N. S. (1987). Introdução à pesquisa em ciências sociais. Atlas.).

Não menos importante, o artigo em tela procura referenciar-se em literatura voltada ao tratamento metodológico da linguagem cinematográfica, com destaque para análises que privilegiam esteticamente a construção das narrativas fílmicas e possibilitam compreender a posição e o lugar dos personagens em tais narrativas na história e teoria do cinema (Aumont, & Marie, 2001Aumont, J, & Marie, M. (2001). A imagem. Papirus., 2005Aumont, J, & Marie, M. (2005). A estética do filme. Papirus., 2010Aumont, J, & Marie, M. (2010). A análise fílmica. Texto & Grafia.; Bauer & Gaskell, 2015Bauer, M. W., & Gaskell, G. (2015). Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som. Vozes.; Carrière, 2015Carrière, J-C. (2015). A linguagem secreta do cinema. Nova Fronteira.; Stam, 2003Stam, R. (2003). Introdução à teoria do cinema. Papirus.; Vanoye & Goliot-Lété, 1994Vanoye, F; Goliot-Lété, A. (1994). Ensaio sobre a Análise Fílmica. Papirus.)10 10 Trata-se, portanto, de considerar que o filme é constituído de uma linguagem própria, formada por planos, ângulos de câmera, trilha sonora, montagem, entre outros elementos. Nesse conjunto, cumpre papel importante os personagens, ou seja, seres que são humanos ou que apresentam traços humanos, dotadas de determinada caracterização (etnia, idade, gênero, formas de vestir, falar e de pensar), responsáveis por intervir numa obra e que são, por conta disso, impulsionadores das ações. .

A concepção de sujeitos históricos em Eduardo Coutinho

Os debates em torno de uma nova abordagem dos sujeitos históricos contida nos documentários de Coutinho vêm sendo promovidos nos campos da história (Mager, 2020Mager, J. M. (2020). Jogo de cena – história, memória e testemunho no documentário de Eduardo Coutinho. Alameda.; Mesquita, 2016Mesquita, C. (2016). Entre agora e outrora – a escrita da história no cinema de Eduardo Coutinho. Galáxia, 31, 54-65.) e do cinema (Bezerra, 2014Bezerra, C. (2014). A Personagem no documentário de Eduardo Coutinho. Papirus.; Mattos, 2019Mattos, C. A. (2019). Sete faces de Eduardo Coutinho. Boitempo/Itaú Cultural/IMS.) em chaves interpretativas que têm primado por analisar as dimensões fabuladoras, performáticas e pró ativas das “personagens” coutinianas. Contudo, tais debates ainda representam uma novidade no campo da educação e do ensino – especialmente na área de história.

Em busca dos personagens de seus documentários, Coutinho percorreu vários espaços. O assistimos, por exemplo, subir morros e dirigir-se às favelas em Santo Forte; invadir (em suas próprias palavras) corredores, elevadores e apartamentos em Edifício Master, bem como percorrer ruas, residências e sindicato do ABCD paulista, em Peões – sem esquecer do vagar por sítios num bairro rural da Paraíba em O Fim e o Princípio. Nos filmes de conversação:

A habilidade de Coutinho como entrevistador adquire aqui um apuro excepcional para evidenciar, com um mínimo de intervenção, o caráter universal de histórias particulares e a natureza performática dos atos de fala

(Bezerra, 2014Bezerra, C. (2014). A Personagem no documentário de Eduardo Coutinho. Papirus., p. 30, grifo nosso).

Características essas que andavam, pari passu, ao lado da sua ênfase em retratar “pessoas comuns” ou a “vida dos homens infames”, conforme assertiva de Consuelo Lins (em diálogo com Michel Foucault), numa passagem da obra sobre o cineasta em que explica: “a infâmia em questão não diz respeito àquele que é ‘baixo e vil’, mas àquele que é no-famoso, segundo a etiologia latina da palavra” (Lins, 2004Lins, C. (2004) O documentário de Eduardo Coutinho. Jorge Zahar., p. 32).

Não à toa, críticos de cinema, como Jean-Claude Bernardet, permitem afirmar que os filmes de Coutinho configuram uma rica oportunidade para se pensar formas cinematográficas de representação imagética do povo, na medida em que pertence a um conjunto diversificado de produções indissociável do “palco de conflitos ideológicos e estéticos dos cineastas na sua relação com a temática popular” (Bernardet, 2003Bernardet, J-C. (2003). Cineastas e imagens do povo. Companhia das Letras., p. 9), diferenciando-os, porém, em dois modelos de abordagem.

De um lado, o modelo antropológico de cinema, que adota depoimentos diretos, autorrepresentações e/ou entrevistas dialógicas, valorizando a subjetividade e pessoalidade. E, de outro, o modelo sociológico de cinema, baseado em apresentações promovidas por narrador em off (a popular: voz de Deus), estudiosos considerados autoridades no tema e/ou entrevistas ilustrativas e comprobatórias.

Em seus filmes, Coutinho empregava expedientes que o filiam ao “modelo antropológico” e, por conta disso, dialogava fortemente com a historiografia responsável por valorizar os homens comuns e as histórias particulares. (Lins, 2013Lins, C. (2013). O cinema de Eduardo Coutinho: entre o personagem fabulador e o espectador montador. In M. Ohata (Org.), Eduardo Coutinho (pp. 375-388). Cosac Naify/Sesc.). É o que podemos apreender nas palavras desse cineasta quando, em uma entrevista, asseverou:

E na verdade, os filmes que eu faço são preocupados com a história cotidiana, com a história no nível. . . história com h pequeno, história do povo miúdo, entende? Não tô preocupado em fazer filme sobre a Revolução Francesa, a Revolução. . . o Golpe de 64, a História do Brasil, a História do. . . sobre. . . dos presidentes, Tancredo Neves, não tô interessado em filme histórico dele tipo. . . interessa a vida cotidiana, as pessoas anônimas.

(Neiva, 2014Neiva, S. [Sandro Neiva]. (2014, Fevereiro 5). H Documentário “Coutinho e o Outro” [Vídeo]. YouTube. https://www.youtube.com/watch?v=VtTVSYwHiBU
https://www.youtube.com/watch?v=VtTVSYwH...
, grifo nosso).

Nesse âmbito, miremos os filmes selecionados. Santo Forte (1999) e Babilônia 2000 (2000), por exemplo, põem em tela moradores de favelas cariocas, segundo preocupação de retratar aspectos de suas vidas. O Fim e o Princípio (2005) se dedica a retratar moradores de bairro rural do sertão de Alagoas, ouvindo-os naquilo que se propõem a dizer. Já Peões (2004) dá voz aos antigos metalúrgicos das greves ocorridas no ABC paulista e cujas experiências não haviam sido alvo de maior atenção. Por fim, em Edifício Master (2002), conhecemos personalidades anônimas de bairro de classe média mundialmente conhecido, como é Copacabana.

Em todas essas obras, podemos identificar excluídos/subalternos/os de baixo da história. Por excluídos, entende-se os grupos silenciados pela historiografia tradicional – caso das mulheres, operários e prisioneiros – ou seja, silenciados pela perspectiva masculina, burguesa e afeita aos documentos oficiais (Perrot, 2017Perrot, M. (2017). Os excluídos da história: operários, mulheres e prisioneiros. Paz e Terra.). Os subalternos são entendidos como os grupos excluídos dos mercados e das representações político-legais (Spivak, 2010Spivak, G. C. (2010). Pode o subalterno falar? UFMG.). Por sua vez, a expressão “os de baixo” vem associada às pessoas tidas como comuns (no sentido político e econômico), cujo entendimento das experiências cotidianas revelam-se pertinentes para compreensão de aspectos da realidade (Sharpe, 1992Sharpe, J. (1992). A história vista de baixo. In P. Burke, (Org.), A Escrita da história: novas perspectivas (pp. 39-62). Unesp.).

Em textos e registros audiovisuais, é possível apreender a definição de Eduardo Coutinho sobre essas pessoas e suas relações com a história. Num texto de próprio punho, o diretor afirmou que seus filmes tratam “de acontecimentos e pessoas singulares, mergulhadas nas contingências da vida” e que suas entrevistas envolvem a “necessidade que tenho do ‘real’ dos outros como trampolim de associações e estruturas”. (Coutinho, 2013Coutinho, E. (2013). Para Sexta-feira. 1998 (Entrevista). In M. Ohata (Org.), Eduardo Coutinho (pp. 222-230). Cosac Naify., p. 16-17). No mesmo texto supracitado, Coutinho ensaia uma síntese de sua obra:

As desilusões políticas e pessoais, entre outros fatores, ajudaram a detonar uma paixão imediata por uma coisa simples – olhar e escutar pessoas, em geral pobres, do campo e da cidade – o outro social e cultural. Tentar entender o país, o povo, a história, a vida e a mim mesmo, mas sempre fixado no concreto, no microcosmo.

(Coutinho, 2013Coutinho, E. (2013). Para Sexta-feira. 1998 (Entrevista). In M. Ohata (Org.), Eduardo Coutinho (pp. 222-230). Cosac Naify., p. 17, grifo nosso).

Embora tratados como pobres, a presença dos personagens nos filmes de Coutinho envolve marcadores sociais diferentes. São conjugados raça-etnia, posição nas metrópoles, idade, classe, regionalismos, gênero e sexualidade.

Não por acaso, predominam os enfoques em mulheres, velhos, negros, pobres, periféricos e nordestinos nas produções cinematográficas do diretor. Diante das câmeras, eles apresentam suas experiências, suas crenças, enfim, desfiam a maneira como viveram e vivem, longe de abordagens que primam pela busca do exótico, do pitoresco, da superação, da lição de vida ou de qualquer outra objetivação do outro, conforme frisou o próprio Coutinho em outro texto:

Como falar de olhar, tema suposto deste texto, quando o povo é visto na TV como uma espécie rara de orquídea que convém olhar com distante consideração, ou então, de muito perto, como um ingênuo repositório de folclore e “sabedoria”?

(Coutinho, 2013Coutinho, E. (2013). Para Sexta-feira. 1998 (Entrevista). In M. Ohata (Org.), Eduardo Coutinho (pp. 222-230). Cosac Naify., p. 19)

Em um debate promovido em 2009, na Casa do Saber, localizada no Rio de Janeiro, por conta de reflexões sobre documentário, Coutinho explicou a lógica que o movia a entrevistar pessoas a partir da observância de marcadores sociais diferentes:

É possível falar além das diferenças, se você admitir que há diferença. . . . Você tem que fazer da diferença um trunfo. . . e as pessoas tentam abolir as diferenças. . . de classe social, de língua, de sexo, de condição, do que seja. . . e o que é rico é a diferença, pô! E é por isso que eu não escondo nunca a câmera, entendeu? . . . E é por isso que eu faço a montagem, é por isso que eu faço a edição e é por isso que eu mostro pra eles [entrevistados]

(Moraes, 2015Moraes, N. [Ninho Moraes]. (2015, Junho 23). Entrevista – “Diverso – Eduardo Coutinho – Parte 1” [Vídeo]. YouTube. https://www.youtube.com/watch?v=n4c45FKDPHU&list=PLP_uF-vdCKfPVubZbJSyp6-nbJhFndQSB&index=17
https://www.youtube.com/watch?v=n4c45FKD...
, acréscimo nosso).

Marcado, sobremaneira, pela força da alteridade nos filmes de conversação, Coutinho chegou a cunhar a expressão “entender as razões do outro” para resumir um procedimento metodológico associado à escuta sensível e compenetrada desses sujeitos históricos ignorados não poucas vezes na sociedade e na mídia hegemônica (Lins & Mesquita, 2008Lins, C. & Mesquita, C. (2008). Filmar o real: sobre o documentário brasileiro contemporâneo. Jorge Zahar.).

Vários são os registros11 11 Ver: https://www.youtube.com/watch?v=NobGhzE9liE&list=PLP_uF-vdCKfPVubZbJSyp6-nbJhFndQSB&index=105. em que ele se indispõe contra o que denomina por cinema de esquerda, cinema militante, visão de classe média ou visão de intelectual na abordagem dos excluídos/subalternos/os de baixo da história. Em uma entrevista, Coutinho expôs sua perspectiva e aquela que recusa, respectivamente:

O outro como vítima, o outro como coitadinho, você só vai procurar o cara que é meio montado. . . Todo cinema – especialmente de documentário – mundial. . . é feito um pouco na perspectiva do intelectual que sabe. Daí eu falo: pra que fazer? Entendeu? O cara já quer mudar o mundo a partir da filmagem. . . ele só vai procurar aquele cara cuja a fala vai interessar a ele, para os fins daquilo que ele quer

(Moraes, 2015Moraes, N. [Ninho Moraes]. (2015, Junho 23). Entrevista – “Diverso – Eduardo Coutinho – Parte 1” [Vídeo]. YouTube. https://www.youtube.com/watch?v=n4c45FKDPHU&list=PLP_uF-vdCKfPVubZbJSyp6-nbJhFndQSB&index=17
https://www.youtube.com/watch?v=n4c45FKD...
, grifo nosso).

Coutinho apresentava a oralidade como matéria-prima especial para acessar o passado. Isso ocorre, segundo Laécio Rodrigues (2011)Rodrigues, L. R. A. (2011). Coutinho, leitor de Benjamin. Devires, 8(2), 118-137., por meio de um ponto de vista muito próximo das concepções de história apresentadas por Walter Benjamin (2020)Benjamin, W. (2012). Magia e técnica, arte e política. Brasiliense.. Isso porque os filmes de Coutinho contém “esforços de demover dos escombros as vozes esquecidas, de lhes retirar o lacre do silêncio e de lhes possibilitar ribalta para enunciar seus desejos e aflições” (Rodrigues, 2011Rodrigues, L. R. A. (2011). Coutinho, leitor de Benjamin. Devires, 8(2), 118-137., p. 125). Agindo assim, abre oportunidade para construção “de um conhecimento histórico que comporte descontinuidades e que contemple os derrotados” (Rodrigues, 2011Rodrigues, L. R. A. (2011). Coutinho, leitor de Benjamin. Devires, 8(2), 118-137., p.127).

A proximidade entre Coutinho e Benjamin também envolve articulações entre narrativa, memória e experiência. O cineasta parecia partir da noção de que a “experiência que passa de boca em boca é a fonte a que recorreram todos os narradores” (Benjamin, 2012Benjamin, W. (2012). Magia e técnica, arte e política. Brasiliense., p. 214), bem como da ideia de que as melhores narrativas “são as que menos se distinguem das histórias orais contadas pelos inúmeros narradores anônimos” (Benjamin, 2012Benjamin, W. (2012). Magia e técnica, arte e política. Brasiliense., p. 214), podendo os narradores serem viajantes ou “o homem que ganhou honestamente sua vida sem sair do seu país e que conhece suas histórias e tradições” (Benjamin, 2012Benjamin, W. (2012). Magia e técnica, arte e política. Brasiliense., p. 214).

O encontro e a escuta dos sujeitos históricos por Eduardo Coutinho

Mas tão importante quanto a preocupação com as pessoas comuns é a maneira como Coutinho promovia os registros delas nos filmes. Esses sujeitos não eram abordados enquanto representantes de um grupo: tais marcações de pertencimento a grupo acabavam tratadas como um a posteriori, o que significava deslocá-los do momento da filmagem para a experiência de assistirem a si no filme. Isso ocorria, porque Coutinho não tomava como objetivo “definir o personagem à revelia dele, nem tomá-lo como um fenômeno da realidade, dotado de rígidos traços típico-sociais” (Lins, 2004Lins, C. (2004) O documentário de Eduardo Coutinho. Jorge Zahar., p. 24).

Assim, as delimitações de grupo formam um ponto de partida na metodologia traçada por Coutinho, jamais de chegada. Via de regra, ele definia delimitações espaciais (favela, prédio, bairro rural) para compor seu dispositivo de filmagem, de modo a se situar diante do fluxo social. Contudo, ao entrevistar seus personagens, Coutinho provocava uma espécie de implosão de qualquer identificação coletiva e, ao invés disso, pretendia “identificar as variações, as inflexões, as marcas sutis que mostram que essas trajetórias anônimas não são homogêneas” (Lins, 2004Lins, C. (2004) O documentário de Eduardo Coutinho. Jorge Zahar., p. 33).

Foram diversas as ocasiões em que o cineasta evidenciou a preocupação em respeitar os sujeitos em seus filmes. Respondendo sobre Edifício Master, salientou: “É um prédio! E nesse prédio vai ter uma particularidade que, de repente, pode aludir ao geral, ao bairro ou ao país. Mas a preocupação é com a pessoa que tá lá, que é única” (Rede Puc, 2013Rede Puc. (2013, Abril 11). Sem Frescura - Paulo Cesar Peréio entrevista Eduardo Coutinho - Parte 1 [Vídeo]. YouTube. https://www.youtube.com/watch?v=AKWejvKNhB4&list=PLP_uF-vdCKfPVubZbJSyp6-nbJhFndQSB&index=52
https://www.youtube.com/watch?v=AKWejvKN...
, grifo nosso)12 12 Ver: https://www.youtube.com/watch?v=AKWejvKNhB4&list=PLP_uF-vdCKfPVubZbJSyp6-nbJhFndQSB&index=51&t=28s . Ainda quanto ao filme Edifício Master, mas noutra ocasião, o documentarista externou outra vez sua diferença de tratamento estético-narrativo diante das abordagens generalizantes:

A outra coisa que é proibida também é o seguinte; esse cara é bom, porque ele é típico da classe média, dizer isso tá morto, não trabalha comigo, sabe?! . . . quando você filma uma pessoa e diz que ela é típica, você foi ao típico, você simplesmente. . . do ponto de vista simbólico. . . você tá matando ela. . .

(Moraes, 2015Moraes, N. [Ninho Moraes]. (2015, Junho 23). Entrevista – “Diverso – Eduardo Coutinho – Parte 1” [Vídeo]. YouTube. https://www.youtube.com/watch?v=n4c45FKDPHU&list=PLP_uF-vdCKfPVubZbJSyp6-nbJhFndQSB&index=17
https://www.youtube.com/watch?v=n4c45FKD...
, grifo nosso).

Sua atenção estava voltada quase que obsessivamente para os sujeitos marginalizados, aqueles que enfrentavam dificuldades e pressões que lhes são impostas pelas forças históricas constituintes do cotidiano, fosse por meio de estratégias (resistências expressas no gasto do tempo), fosse pelas táticas (habilidades presentes na utilização do tempo). A tal respeito, mencionou o próprio Coutinho:

Então, a partir disso, esse é o problema: sentir que existem, em todas as coisas, as pressões coletivas, que a pessoa repete a ideologia que existe etc, mas sempre tem algo de singular: nenhuma voz é igual à outra, embora possa repetir muita coisa. E tentar encontrar nesse cara o que ele projeta como sua singularidade, real ou suposta. É isso que justifica sua vida. E, a partir disso, você aceita o outro. Você tem que aceitar o outro como tem que aceitar tudo o que existe no mundo natural. É uma especie de assentimento, de concordância, não é dar razão ao outro, esse é o problema. Eu quero conhecer a razão do outro, não a minha

(Valentinetti, 2003Valentinetti, C. (2003). O cinema segundo Eduardo Coutinho. M. Farami., p. 19).

Surgia dessa abordagem, o objetivo de compreender o sujeito histórico segundo os vacilos, as resistências, as apropriações que promoviam, a partir de certas franjas sociais ou condições de possibilidade.

João Moreira Salles (2013, p. 373), por exemplo, tratando de um dos filmes de conversação, foi categórico ao afirmar que “Coutinho inaugurou, com Santo Forte, um cinema cujos personagens resistem aos sistemas. Tente enquadrá-los, e haverá sempre quem escape”. Marilena Chauí, por sua vez, identifica o emprego desse expediente num período anterior, em Cabra marcado para morrer, ao comparar o projeto do filme de 1964 com a versão finalizada em 1984:

Na linha cultural do CPC, o filme de 1964 pretendia ser exemplar: épico e pedagógico, lição de política e construção de heróis, lutadores, clara partição entre o bem e o mal, personagens funcionando mais como arquétipos do que como seres humanos reais. Em contraponto, o documentário nos coloca na presença de criaturas de carne e osso, com dúvidas e indecisões, medos e esperanças, meditando sobre o passado e avaliando o presente

(Chauí, 2013Chauí, M. (2013). Do épico-pedagógico ao documentário. In M. Ohata (Org.), Eduardo Coutinho (pp. 455-459). Cosac Naify/Sesc., p. 457, grifo nosso).

A complexidade do real não é entendida graças aos expedientes teóricos que enquadram o sujeito em categorias definidas externamente a eles, por quem os deseja conhecer. Ela é alcançada pela escuta dos personagens diante das câmeras e a capacidade de pinçar suas narrativas, os fios/vozes/discursos presentes e constituintes da realidade (Saraiva, 2013Saraiva, L. (2013). Narrativa da subjetividade em Edifício Master. In M. Ohata (Org.), Eduardo Coutinho (pp. 558-573). Cosac Naify/Sesc.). Nesse sentido, estudiosos de sua obra registraram:

[Em “Santo Forte”] narrar não é relatar o mundo como já-reconhecido, narrar é insurgir diante do enigma do real. E se propor com muita delicadeza a deixar qualquer projeto monolítico de país, Estado ou mesmo de cinematografia obediente a qualquer ambição de totalização de identidade cultural e psicológica de calças na mão

(Bragança, 2013Bragança, F. (2008). Eduardo Coutinho. Azougue Editoral., p. 549, grifo nosso).

Como critério para acessar as narrativas e experiências dos sujeitos filmados, Coutinho se valia de um aspecto fundamental em seu método cinematográfico, denominado por ele mesmo de prisão. Foi Consuelo Lins quem, a nosso ver, melhor delineou esta concepção de trabalho ao afirmar:

. . . Coutinho percebeu que delimitar claramente uma geografia era se ater – dentro da multiplicidade de escolhas possíveis ao realizar um documentário – a algo essencialmente concreto, era criar os seus próprios limites, inventar sua própria ‘prisão’

(Lins, 2004Lins, C. (2004) O documentário de Eduardo Coutinho. Jorge Zahar., p. 65).

Esses recortes, não apenas espaciais, como temporais, da vida social determinavam o momento das conversas. Daí a escolha por filmar entrevistas com moradores de favelas durante a visita do papa ao Brasil (Santo Forte); a passagem do ano, num dia (Babilônia 2000); um prédio de apartamentos, em três semanas (Edifício Master); os operários do ABCD paulista no período de eleições presidenciais (Peões); os sertanejos por quatro semanas (O fim e o princípio).

Não poucas vezes, ele abordou esse aspecto de seu método:

[respondendo a pergunta: qual é o seu método?”] Olha, primeiro lugar, “Santo Forte” é filmado numa pequena favela de 2000 pessoas. . . o “Babilônia 2000”, que é no morro da Babilônia, num fim do ano, é um morro de 3000 pessoas, então, pra mim, é importante escolher um lugar do qual não me afasto. . . é uma espécie de prisão, de limite que me imponho. . . pra partir desse limite, estar inteiramente livre

(Moraes, 2015Moraes, N. [Ninho Moraes]. (2015, Junho 23). Entrevista – “Diverso – Eduardo Coutinho – Parte 1” [Vídeo]. YouTube. https://www.youtube.com/watch?v=n4c45FKDPHU&list=PLP_uF-vdCKfPVubZbJSyp6-nbJhFndQSB&index=17
https://www.youtube.com/watch?v=n4c45FKD...
, acréscimo e grifo nosso).

[comentando as dificuldade de filmar “Peões”] Outro problema é que eu não tinha um espaço fechado. . . o ABC é enorme, né?! Dois milhões de habitantes . . . muito aberto, já começava a me deixar zonzo, sabe? Já não tenho foco!

(Moraes, 2015Moraes, N. [Ninho Moraes]. (2015, Junho 23). Entrevista – “Diverso – Eduardo Coutinho – Parte 1” [Vídeo]. YouTube. https://www.youtube.com/watch?v=n4c45FKDPHU&list=PLP_uF-vdCKfPVubZbJSyp6-nbJhFndQSB&index=17
https://www.youtube.com/watch?v=n4c45FKD...
, grifo nosso).

Os filmes de conversação revelam recorrentemente o modo pelo qual Coutinho apresentava a complexidade dos sujeitos, ao observá-los bem de perto.

Ao entrevistar personagens como Fátima e Djanira, em Babilônia 2000 (2001), ele contrariava os estigmas sobre favelados, revelando que eram trabalhadores, tinham experiências ricas de vida e apresentavam, em especial, capacidade reflexiva.

Já a escuta de personagens como Socorro e Djalma, em Peões (2004), oportunizava ampliar o entendimento acerca da vida e o cotidiano dos operários metalúrgicos, ao verificar a diferença entre gêneros, a relação entre vida pública e privada e o peso cultural (rural, nordestina etc.) na construção da consciência de classe.

Eduardo Coutinho e a micro-história

Um ponto que consideramos paradigmático na obra cinematográfica coutiniana era a maneira adotada pelo diretor de se colocar diante dos sujeitos filmados – o que o aproximava sensivelmente da prática historiográfica de Carlo Ginzburg (2002Ginzburg, C. (2002). Relações de força –História, Retórica, Prova. Companhia das Letras., 2007aGinzburg, C. (2007a). Mitos, emblemas e sinais – Morfologia e História. Companhia das Letras., 2007b)Ginzburg, C. (2007b). O fio e os rastros – Verdadeiro, falso, fictício. Companhia das Letras..

Para Coutinho, todo sujeito carregava consigo a história; entretanto, para interpretá-la, era necessário a prática da leitura vagarosa, atenta aos indícios, bem como predisposta ao reconhecimento de elementos fundamentais na constituição dos processos sociais – caso da circularidade cultural e das apropriações. Nos filmes, as pessoas expressavam a história, pois ela as atravessava, porém, segundo uma lógica própria, cujo entendimento exigia sensibilidade e erudição.

Muitas falas do cineasta registradas em vídeo reforçam um diálogo com Ginzburg. Comentando sobre a melhor forma de filmar, o diretor assinalara a importância do micro: “. . . o ideal seria fazer um filme sobre o Brasil com uma pessoa. Se não der, com uma família” (Mesquita, 2013Mesquita, C. (2013). Fé na lucidez. In M. Ohata (Org.), Eduardo Coutinho(pp. 237-250). Cosac Naify/Sesc., p. 238). Noutra ocasião, reforçara a significância do micro, ao mencionar uma citação, que remetia à Aby Warburg, uma das referências do historiador italiano:

Um historiador de arte disse o seguinte: “Deus está no particular”. E outro falou:”o coração da totalidade está no particular”. Então, eu parto do síngular, do particular. Essa noção que se tem da totalidade, ou da classe, ou da comunidade, isso vem ou não depois. Depois, o filme pode revelar coisas sobre o geral. A visão de totalidade inicial me afasta como o diabo da cruz

(Valentinetti, 2003Valentinetti, C. (2003). O cinema segundo Eduardo Coutinho. M. Farami., p. 82, grifo nosso).

Mas, se todos são atravessados pela história, então, qualquer um pode ser alvo de atenção, por parte de quem tem sede pelo entendimento dos homens no tempo? Coutinho procurava resolver esse dilema através da seleção dos entrevistados. E fora a contar dos filmes de conversação que ele definiu um estilo cinematográfico marcado pelos grandes narradores.

Nota-se em seus filmes, que ele apresentava uma predileção pelos grandes narradores, porque demonstravam, justamente, a capacidade de partilhar experiências que os atravessavam (Bezerra, 2014Bezerra, C. (2014). A Personagem no documentário de Eduardo Coutinho. Papirus.). Em nosso entendimento, os grandes narradores são sujeitos que, além de repletos de fios/vozes/discursos reveladores da história, são dotados da competência para apresentá-los diante da câmera, tornando públicas as experiências privadas, valendo-se para isso da mise-en-scene e da fabulação.

Tem caras que viajam o mundo todo, são assaltados no Egito, viram deuses na Índia e contam pra você e você fala: que saco! Tem caras que foram a Sumaré, São Paulo. . . ou foram à favela do [inaudível], mas sabe, viveram uma vida de, de. . . carteiro, carteiro, 30 anos. . . e ele é maravilhoso, falando da vida! Que é igual a todos os dias, entende? . . . Então, saber contar é essencial!

(FlipFlop 013, 2013FlipFlop 013. (2013, Julho 6). Entrevista “Flip 2013 – Encontro com Eduardo Coutinho – Eduardo Escorel [1/5]”) [Vídeo]. YouTube. https://www.youtube.com/watch?v=NobGhzE9liE&list=PLP_uF-vdCKfPVubZbJSyp6-nbJhFndQSB&index=105
https://www.youtube.com/watch?v=NobGhzE9...
, grifo nosso).

A opção por narradores competentes revela a adoção de um critério artístico, mas que também é político. Isso porque as experiências partilhadas revelam visões discordantes, fortemente carregadas de ambivalências, inclusive, o que garante a apresentação de vozes diversas e marcadas pelo dissenso, algo fundamental para experiências alargadas e plurais de democracia (Rancière, 2009Ranciére, J. (2009). A partilha do sensível. Editora 34.). Portanto, compreendemos que os filmes de Coutinho importam em processos formativos por conta de quem diz, o que diz e como diz.

Tratam-se de filmes que tornam possível ver e ouvir excluídos/subalternos/os de baixo da história, conhecer passagens de suas vidas e configurar espaços públicos (na acepção política do termo). Dos sujeitos históricos, optava o cineasta por escolher aqueles que podiam ser os melhores narradores, o que significava selecionar pessoas com maior capacidade de mobilização pela linguagem: os narradores (se) encantavam e, ao fazerem isso, prendiam a atenção do espectador, provocando-lhe sentimentos e reflexões – caso da religiosidade em “Santo Forte” (Weller, 2012Weller, F. (2012). O cinema direto e a estética da intimidade no documentário dos anos 60. [Tese de Doutorado em Comunicação, Universidade Federal de Pernambuco]. Attena. Repositório Digital da UFPE. https://repositorio.ufpe.br/handle/123456789/10867
https://repositorio.ufpe.br/handle/12345...
).

Ao selecionar grandes narradores, Coutinho aproximava-se do conceito de excepcional normal, de Edoardo Grendi13 13 De acordo com Carlo Ginzburg: “. . . existe também aquilo que Edoardo Grendi chamou, sugestivamente, o ‘excepcional normal ‘. A esta expressão podemos atribuir pelo menos dois significados. Antes de mais nada, ela designa a documentação que só aparentemente é excepcional. . . . Mas, o ‘excepcional normal’ pode ter ainda outro significado. Se as fontes silenciam e/ou distorcem sistematicamente a realidade social das classes subalternas, um documento que seja realmente excepcional (e, portanto, estatisticamente não frequente) pode ser muito mais revelador do que mil documentos estereotipados. Os casos marginais, como notou Kuhn, põem em causa o velho paradigma, e por isso mesmo ajudam a fundar um novo, mais articulado e mais rico. Quer dizer, funcionam como espias ou indícios de uma realidade oculta que a documentação, de um modo geral, não deixa transparecer. Partindo de experiências diversificadas e trabalhando em temas diversificados, os dois autores deste escrito são unânimes em reconhecer a importância decisiva daqueles traços, aquelas espias, aqueles erros que perturbam, desordenando-a, a superfície da documentação. Para além dela é possível atingir aquele nível mais profundo, invisível, que é constituído pelas regras do jogo, ‘a história que os homens não sabem que fazem’.” (Ginzburg, 1989, p. 176-178). . Os personagens apresentados nos seus filmes eram normais quanto às expressões das histórias contadas e às marcas específicas que continham, especialmente quando observada a realidade brasileira e alguns de seus corolários históricos, como o patriarcalismo, o racismo, a desigualdade social, a primazia da violência, a importância da religiosidade e a riqueza cultural.

Captar a tensão entre o público e o privado, ou ainda, a relação entre a grande e a pequena história, era um desejo incessante de Coutinho:

Juntar a grande história e a pequena história é maravilhoso. No Brasil, em que quase não existe cidadania, se você for perguntar como uma pessoa viveu o golpe de 1964, você vai ver que tudo que eles viveram nesse ano, tirando uma minoria politizada, são visões da vida familiar. Os marcos provêm da vida privada. Se você falar da Copa de 1950, isso tem, penetração, as pessoas ligam com sua vida real, mas os marcos históricos. . . eu queria fazer um filme só sobre isso. Eu gosto de mostrar (demonstrar é uma palavra que eu não gosto) e aguçar essa separação entre o real e o ideal.

(Coutinho, 2013Coutinho, E. (2013). Para Sexta-feira. 1998 (Entrevista). In M. Ohata (Org.), Eduardo Coutinho (pp. 222-230). Cosac Naify., p. 228, grifo nosso).

Por outro lado, os personagens eram excepcionais, porque eram capazes de apresentar os fios/vozes/discursos que os ligavam à história, tendo em vista o desejo de falarem diante das câmeras e o fazerem com qualificação narrativa ímpar. Tal qualificação, entretanto, não seria incorporada – ou não latentemente – se não fossem as condições de produção da filmagem garantidas por Coutinho. Dois pequenos exemplos, pinçados nos filmes de conversação, ilustram essas reflexões e encerram nossa análise.

No relato de Braulino, em Santo forte (1999), é possível notar o emprego de palavras e expressões como: “pito”, “negro da cozinha”, “negro de confiança” e “marafo”: todas guardavam (e ainda guardam) uma relação intrínseca com a cultura dos povos indígenas e africanos, o processo histórico de escravização e a influência das religiões afrobrasileiras.

Em Edifício Master (2002), durante o relato da personagem Maria Pia – espanhola radicada no Brasil desde a adolescência – emerge, em certo momento, uma visão de mundo contraditória e surpreendente. Para ela, empregada doméstica, não existia pobreza no Brasil: as pessoas pobres é que não trabalhavam, porque eram preguiçosas e dadas à mentira. Intrigante, pois esse fragmento do relato revela a incorporação, por parte de uma trabalhadora, de uma concepção liberal clássica e de certa ética protestante do trabalho.

Considerações Finais

Reconhecer essa tratativa dos sujeitos históricos por parte de Eduardo Coutinho em seus filmes faz pensar no emprego dessas obras em processos formativos voltados para professores que lecionam história na educação básica.

Tais obras parecem configurar um exemplo evidente da máxima expressa na frase “todos fazem história”, dotando-a de efetividade. Os personagens dos filmes de Coutinho expressam essa máxima porque a revelam no seu dia a dia, quando tratam das situações sociais diversas das quais fazem parte (trabalho, vizinhança, família, comunidade religiosa, espaços e instituições governamentais) e as partilham com os espectadores.

Os cursos de formação de professores dedicados ao ensino de história podem ganhar muito com o emprego dos filmes de Eduardo Coutinho. Tais obras são capazes de oferecer experiências de sujeitos históricos comuns e diversos, tidos como excluídos/subalternos/os de baixo, o que os aproxima das teorias historiográficas e pedagógicas que apregoam a valorização do cotidiano de casos concretos, passíveis, inclusive, de serem identificados nos grupos sociais dos próprios discentes e entre membros das comunidades que formam as escolas.

A defesa de abordagem do sujeito histórico no ensino de história, diferentemente da consagrada visão das elites como protagonista dos processos, ocorre há certo tempo. Desde a redemocratização do país, processada na década de 1980, é que esse método se faz presente por parte de propostas de ensino, de organização de currículos e de estudos. Pensar processos formativos voltados para esse intento e que sejam constituídos de propostas que vão além da leitura e da discussão de textos parece ser tarefa melhor matizada, visando um passo a mais nessa direção.

Levando em conta esse contexto, o emprego dos filmes de Coutinho representam um caminho promissor para a constituição de processos formativos dessa natureza. As obras da fase tida como filmes de conversação empregam de maneira contundente o desfile de vozes de personagens que destoam da associação entre história e elites. Assistir e pensar sobre esses filmes remete ao encontro com personagens anônimos e que fazem história em suas ações cotidianas, ao vivê-la segundo os limites de possibilidade que lhe são impostos.

Os filmes de conversação de Coutinho valem não necessariamente pelo que dizem seus personagens. O importante nessas obras é o efeito de sentido que produzem. Assisti-los e pensar sobre eles implica na possibilidade do encontro com teoria da história que insiste na importância das coisas tidas como miúdas, do cotidiano e que dizem sobre o viver fora dos centros formalmente constituídos de poder. Daí, a possibilidade que esses filmes encerram de estabelecerem entendimentos diferentes da noção de sujeito histórico e da própria história.

O conceito de sujeito histórico é de suma importância no ensino de história pretendido para a educação básica. Tal demanda reforça a validade da apropriação dos filmes de conversação de Eduardo Coutinho para a formação inicial e/ou continuada de professores. Tais filmes não oportunizam apenas abordar o conceito de sujeito histórico, mas fazê-lo de modo potencialmente critico, dada a concepção histórica que comportam e expressam. É também nesse ímpeto, que esses filmes colaboram para tornar mais densa e questionadora a proposta de sujeitos históricos contida, por exemplo, na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) (Brasil, 2017Brasil. (2017). Base Nacional Comum Curricular. Ministério da Educação.).

É por conter esse potencial, que os filmes de conversação oportunizam romper com a longuíssima tradição narrativa cunhada por Adolfo Varnhagen e resistir/enfrentar os avanços conservadores e reacionários contemporâneos, que intencionam hegemonizar discursos negacionistas da história – em ambos os casos, apagadores de conflitos e lutas (classe, grupos étnicos), desvalorizadores da diversidade cultural e desqualificadores da arte de escutar as narrativas e experiências de sujeitos tantas vezes esquecidos da história. Nada mais avesso ao olhar de Coutinho.

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    Normalização, preparação e revisão textual: Piero Kanaan (Tikinet) revisao@tikinet.com.br
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    Apoio: Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo - Fapesp, (Grant /Award Number: ‘19/18429-0’)
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    Haja vista que vinha ao encontro dos interesses das elites pós independência, ao estabelecer uma narrativa que garantia a desejada unidade nacional sem abalar as hierarquias sociais, as forças político-econômicas e a atuação centralizadora do Estado. (Pinsky, 2009Pinsky, J. (2009). O ensino de História e a criação do fato. Contexto.).
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    Apenas no campo da educação, deve-se levar em conta também a criação do Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico do Brasil e seus congêneres regionais, a criação do Colégio Pedro II, a formulação de legislação educacional clivada pela exclusão social e a partilha de concepções como o darwinismo social e as teorias racialistas (Schwarcz, 1993Schwarcz, L. M. (1993). O espetáculo das raças: cientistas, instituições e questão racial no Brasil, 1870-1930. Companhia das Letras.).
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    Por filmes de conversação entende-se conjunto de filmes lançados entre 1999 e 2005, marcados pelo registro de experiências de personagens anônimos, relato de situações corriqueiras e aparentemente banais, mais repletas de significações políticas, sociais e culturais, bem como presença de noção diferenciada de temporalidade, em que o passado é capturado no calor do presente, retroativamente. Além disso, nesses filmes Coutinho depura tecnicamente seu estilo, renunciando a roteiro prévio, voz over, diversidade de planos cinematográficos e de posições de câmera, emprego de trilha musical não diegética, transições e outros efeitos na montagem. Por fim, deve-se ainda considerar que se trata de filmes em que Eduardo Coutinho vai a campo, em busca de seus personagens. (Lins, 2004Lins, C. (2004) O documentário de Eduardo Coutinho. Jorge Zahar., 2013Lins, C. (2013). O cinema de Eduardo Coutinho: entre o personagem fabulador e o espectador montador. In M. Ohata (Org.), Eduardo Coutinho (pp. 375-388). Cosac Naify/Sesc.).
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    Encontros e conversas destituídas, ao longo de sua experiência cinematográfica, das fórmulas populistas, ilusões românticas de classe ou complacências de ordem moral (características dos setores dominantes). (Bernardet, 2003Bernardet, J-C. (2003). Cineastas e imagens do povo. Companhia das Letras.; Weller, 2012Weller, F. (2012). O cinema direto e a estética da intimidade no documentário dos anos 60. [Tese de Doutorado em Comunicação, Universidade Federal de Pernambuco]. Attena. Repositório Digital da UFPE. https://repositorio.ufpe.br/handle/123456789/10867
    https://repositorio.ufpe.br/handle/12345...
    ).
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    Tourinho (2008)Tourinho, M. A. C. (2008). Os sujeitos históricos e o ensino de História: os heróis precisam ser banidos? Tempos Históricos, 12, 57-79. registra, entretanto, que essa abordagem não deve significar abandono do tratamento dos heróis, pois isso representaria prejuízo do entendimento dos processos históricos, inclusive, daqueles responsáveis pela valorização destes personagens.
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    A pesquisa qualitativa favorece abordagem problematizadora da subjetividade dos sujeitos, isto é, os sentidos e significados que estes atribuem às suas experiências durante as filmagens. Aplicada, porque objetiva gerar conhecimentos dirigidos à formação de professores de história na educação básica, valendo-se de filmografia do cineasta. E explicativa, pois exige mobilização de dados empíricos (filmes), a serem refletidos com base em conceitos e conteúdos apreendidos na leitura de bibliografia e na observação sistemática dos pressupostos e expedientes empregados pelo cineasta.
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    Trata-se, portanto, de considerar que o filme é constituído de uma linguagem própria, formada por planos, ângulos de câmera, trilha sonora, montagem, entre outros elementos. Nesse conjunto, cumpre papel importante os personagens, ou seja, seres que são humanos ou que apresentam traços humanos, dotadas de determinada caracterização (etnia, idade, gênero, formas de vestir, falar e de pensar), responsáveis por intervir numa obra e que são, por conta disso, impulsionadores das ações.
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    De acordo com Carlo Ginzburg: “. . . existe também aquilo que Edoardo Grendi chamou, sugestivamente, o ‘excepcional normal ‘. A esta expressão podemos atribuir pelo menos dois significados. Antes de mais nada, ela designa a documentação que só aparentemente é excepcional. . . . Mas, o ‘excepcional normal’ pode ter ainda outro significado. Se as fontes silenciam e/ou distorcem sistematicamente a realidade social das classes subalternas, um documento que seja realmente excepcional (e, portanto, estatisticamente não frequente) pode ser muito mais revelador do que mil documentos estereotipados. Os casos marginais, como notou Kuhn, põem em causa o velho paradigma, e por isso mesmo ajudam a fundar um novo, mais articulado e mais rico. Quer dizer, funcionam como espias ou indícios de uma realidade oculta que a documentação, de um modo geral, não deixa transparecer. Partindo de experiências diversificadas e trabalhando em temas diversificados, os dois autores deste escrito são unânimes em reconhecer a importância decisiva daqueles traços, aquelas espias, aqueles erros que perturbam, desordenando-a, a superfície da documentação. Para além dela é possível atingir aquele nível mais profundo, invisível, que é constituído pelas regras do jogo, ‘a história que os homens não sabem que fazem’.” (Ginzburg, 1989Ginzburg, C. (1989). O nome e o como – troca desigual e mercado historiográfico. In C. Ginzburg, A micro-história e outros ensaios(pp. 169-178). Difel., p. 176-178).

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Editor responsável: Silvio Gallo https://orcid.org/0000-0003-2221-5160

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Fev 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    16 Dez 2021
  • Revisado
    25 Mar 2023
  • Aceito
    25 Nov 2023
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