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A questão das emoções e da vivência estética: o diálogo entre Vigotski e Stanislávski em torno da psicologia do ator 3 3 Editor responsável: César Donizetti Pereira Leite. https://orcid.org/0000-0001-8889-750X 4 4 Normalização, preparação e revisão textual: Leda Maria de Souza Freitas Farah. leda.farah@terra.com.br 5 5 Apoio: Fapesp 2015/17830-1; Fapesp 2020/04798-0.

Resumo

O artigo objetiva examinar as ocorrências do conceito de vivência em textos vigotskianos sobre arte, particularmente o ensaio sobre Hamlet, de 1915; o livro Psicologia da arte, de 1925; e o capítulo “Educação Estética”, publicado em Psicologia pedagógica, de 1926. Em seguida, o artigo se debruça sobre o texto “A psicologia do trabalho criativo pelo ator”, buscando compreender como nele Vigotski analisa criticamente as ideias de Denis Diderot e Konstantin Stanislávski para propor uma visada original sobre a psicologia da vivência cênica do ator. Visto sob o pano de fundo de escritos anteriores, o artigo pretende contextualizar o texto de 1932 dentro do quadro de interesses de Vigotski, que articula o campo da arte teatral e o estudo das emoções.

Palavras-chave
vivência; teatro; psicologia da arte; emoções

Abstract

The paper examines the occurrences of the perezhivanie concept in Vygotsky’s texts about art, particularly the essay on Hamlet, written in 1915, The Psychology of Art, written in 1925, and the book chapter Aesthetic Education, published in Educational Psychology in 1926. Then, the paper focuses on the text "On the problem of the psychology of the actor's creative work," aiming to understand how Vygotsky critically analyses the ideas of Denis Diderot and Konstantin Stanislavsky to propose his original outlook on the psychology of the actor's scenic perezhivanie. The paper seeks to contextualize the 1932 text in Vygotsky's framework of interests that articulate theatrical art and the study of emotions against the background of previous writings.

Keywords
perezhivanie; theater; psychology of art; emotions

A história e a recepção do conceito de perejivânie em Vigotski e Stanislávski

Alguns autores estabelecem um arco entre a obra inicial e final de Liev Semiónovitch Vigotski (1896-1934), pois alguns temas que são esboçados ou não inteiramente desenvolvidos em seus primeiros textos reaparecem em suas últimas produções (González Rey, 2016González Rey, F. L. (2016). Vygotsky’s concept of Perezhivanie in The Psychology of Art and at the final moment of his work: advancing his legacy. Mind, Culture, and Activity, 23(4), 305-314. https://doi.org/10.1080/10749039.2016.1186196
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; Mok, 2017Mok, N. (2017). On the concept of Perezhivanie: A quest for a critical review. In M. Fleer, F. González Rey, & N. Veresov (Eds.), Perezhivanie, emotions, and subjectivity. Springer.; Rubtsova & Daniels, 2016Rubtsova, O., & Daniels, H. (2016). The concept of drama in Vygotsky’s theory: Application in research. Cultural-Historical Psychology, 12(3). https://doi.org/10.17759/chp.2016120310
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). Este seria o caso do tema das emoções e da vivência (perejivânie), tão relevantes nos textos sobre arte ou nos de cunho crítico ou científico, e menos centrais no período instrumental de sua obra.

Contudo, até recentemente pouca atenção havia sido dedicada a esse conceito. A bem da verdade, ele sequer era reconhecido como uma categoria de análise da teoria histórico-cultural, e só veio a adquirir tal status nos últimos anos. Um marco nesse processo de “descoberta” foi a publicação do número especial da revista Mind, Culture, and Activity (23, 2016) sobre o assunto.

Algo parecido pode ser notado, se observarmos a recepção do conceito perejivânie em Konstantin Stanislávski (1863-1938).6 6 Konstantin Stanislávski (1863-1938) foi um ator, diretor e pedagogo teatral russo. Com Vladímir Nemiróvitch-Dântchenko (1858-1943), Stanislávski foi um dos fundadores do Teatro de Arte de Moscou em 1898 e trabalhou durante muitos anos sobre o que se costuma chamar de Sistema de Stanislávski, um sistema de elementos interarticulados da prática do ator, com o objetivo de produzir a vivência cênica (perejivânie) como uma experiência do vivo. Apenas recentemente se pôde restabelecer uma continuidade entre sua obra inicial e sua obra final (aquela que geralmente é chamada de o “último” Stanislávski). No caso do diretor, pedagogo e ator russo, perejivânie era geralmente entendida como um conceito superado, ligado à assim chamada “memória emocional” e descartado com ela no último período de sua vida.

Tcherkásski (2017)Tcherkasski, S. (2017). Forward – to early Stanislavsky! or Reconstruction of actor training at the first studio of the Moscow Art Theatre, Stanislavski Studies, 5(1), 85-110. https://doi.org/10.1080/20567790.2017.1298347
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sugere que a divisão entre um Stanislávski jovem, romântico, experimentador, e um velho e sábio cientista é fruto de uma cisão artificial gerada no âmbito da construção narrativa de um Stanislávski soviético. Outros trabalhos publicados nos últimos anos (Moschkovich, 2021bMoschkovich, D. (2012b). O último Stanislávski em ação: ensaios para um novo método de trabalho. Perspectiva.; Shevtsova, 2019Shevtsova, M. (2019). Rediscovering Stanislavsky. Routledge.; Tcherásski, 2016; Whyman, 2008Whyman, R. (2008). The Stanislavsky system of acting - Practice and legacy in modern performance. Cambridge University Press.) permitem-nos ver, no entanto, como a perejivânie aparece como categoria central do trabalho teatral de Stanislávski de forma transversal.

Voltando a Vigotski, se atualmente a temática das vivências aparece como um ponto incontornável para compreender as formulações mais elaboradas da teoria histórico-cultural sobre o desenvolvimento infantil, que tem avançado cada vez mais nas pesquisas dessa área, o mesmo não pode ser dito sobre a recepção da obra vigotskiana sobre arte. Um dos autores a resgatar a importância da obra inicial vigotskiana foi González Rey (2016González Rey, F. L. (2016). Vygotsky’s concept of Perezhivanie in The Psychology of Art and at the final moment of his work: advancing his legacy. Mind, Culture, and Activity, 23(4), 305-314. https://doi.org/10.1080/10749039.2016.1186196
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, 2018)González Rey, F. L. (2018). Vygotsky’s “The Psychology of Art”: A foundational and still unexplored text. Estudos de Psicologia, 35(4), 339-35. https://doi. org/10.1590/1982-02752018000400002.
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, que emprega de forma um tanto anacrônica a noção de performance artística para se referir ao objeto de estudo em Psicologia da arte. O autor considera ainda que o principal interesse de Vigotski era a criação artística, outro ponto de difícil comprovação, uma vez que o conceito-chave da psicologia da arte do autor – a reação estética – está não no campo dos processos criativos, mas dos receptivos. Sobre a origem do conceito de perejivânie em Vigotski, a principal hipótese levantada diz respeito a possíveis ligações com as ideias de Stanislávski (Mok, 2017Mok, N. (2017). On the concept of Perezhivanie: A quest for a critical review. In M. Fleer, F. González Rey, & N. Veresov (Eds.), Perezhivanie, emotions, and subjectivity. Springer.). Esta é, como veremos adiante, uma hipótese de difícil comprovação, dadas as diferenças entre as concepções de perejivânie em ambos os autores. Para Rubtsova e Daniels (2016)Rubtsova, O., & Daniels, H. (2016). The concept of drama in Vygotsky’s theory: Application in research. Cultural-Historical Psychology, 12(3). https://doi.org/10.17759/chp.2016120310
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, a obra inicial de Vigotski como crítico teatral seria uma evidência em favor da hipótese do surgimento do conceito de perejivânie na teoria teatral. Ainda sobre as relações entre teatro e psicologia, Capucci e Silva (2017)Capucci, R. R., & Silva, D. N. H. (2017). Quando vida e arte se encontram: um diálogo entre Vigotski e Stanislavski. Psicologia em Estudo, 22(3), 409-420. https://doi.org/10.4025/psicolestud.v22i3.35869.
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consideram que o teatro seria um “microcosmo da vida humana” (p. 418), uma vez que o desenvolvimento pode ser compreendido nos termos do drama.

Acerca das ocorrências de perejivânie em Vigotski, Veresov (2016)Veresov, N. (2016). Perezhivanie as a phenomenon and a concept: questions on clarification and methodological meditatons. Cultural-Historical Psychology, 2(3), 129-148. https://doi.org/10.17759/chp.2016120308
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afirma que, inicialmente, o termo aparece para designar um fenômeno ou processo, e apenas mais tarde emerge como conceito para estudar o desenvolvimento infantil no âmbito da teoria histórico-cultural. O primeiro tipo de ocorrência, isto é, como fenômeno psicológico, seria característico da primeira fase de sua obra e não constituiria um conteúdo teórico definido. Com efeito, tratava-se de um termo corrente da filosofia, em John Dewey e Wilhelm Dilthey, e da psicologia, em William James,7 7 Tanto o conceito de experience, de Dewey e James, e Erlebnis, de Dilthey, aparecem em textos russos como perejivânie. Em alemão, assim como em russo e em português, e diferentemente do inglês, há dois vocábulos para o campo semântico de experiência: Erlebnis e Erfahrung, sendo que o primeiro tem em seu radical o verbo leben (viver) e, portanto, estaria mais próximo a perejivânie (derivada do verbo jit, viver), em russo, e “vivência”, em português, opção geralmente adotada nas traduções da obra de Vigotski. Tivemos a oportunidade de discorrer sobre algumas dificuldades da tradução desta palavra em português, especialmente no campo do teatro (Moschkovich, 2012a, p. 14). O prefixo pere tem duas possibilidades de tradução. A primeira, historicamente mais utilizada, equivale ao latino re (daí alguns autores apostarem em revivescência). O sentido do prefixo pere em perejivânie, no entanto, é o do movimento de um ponto a outro, equivalente ao latino trans. Para uma tradução adequada do termo (visando escapar de um interessante, porém confuso neologismo transvivência), temos apostado, nas traduções teatrais, pelo binômio vivênica/experiência do vivo, utilizadas como sinônimos e complementares. Quando a isso, ver a nota de rodapé para Knebel (2016, p. 26). Para este artigo, dadas as diferentes traduções encontradas para perejivânie nos campos dos estudos vigostkianos e stanislavskianos, preferimos manter, sempre que possível, a palavra russa transliterada. e aparecia em Vigotski para designar o conteúdo da experiência psicológica direta e os processos psicológicos envolvidos no modo como algo é experienciado pelo indivíduo (Varcháva & Vigotski, 1931Varcháva, B. E., & Vigotski, L. S. (1931). Psykhologuítcheski slovar. Gossudárstvennoe utchébno/pedagoguítcheskoe izdátelstvo. , p. 128; Veresov & Fleer, 2016Veresov, N., & Fleer, M. (2016). Perezhivanie as a theoretical concept for researching young children’s development. Mind, Culture, and Activity, 23, 325-335. https://doi.org/10.1080/10749039.2016.1186198
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). Apenas mais tarde, entre 1933 e 1934, o termo foi introduzido como conceito dentro da teoria histórico-cultural, na quarta aula, intitulada “O problema do meio na pedologia”, das Aulas de pedologia (Vigotski, 2018Vigotski, L. S. (2018). Sete aulas de L. S. Vigotski sobre os Fundamentos da Pedologia (Zoia Prestes, Trad.). E-papers.).

Pretendemos verificar em que medida a presença da ideia de perejivânie na obra inicial de Vigotski, não obstante algumas inconsistências, que também serão discutidas, já é imbuída de certo rigor e originalidade no pensamento do autor, delineando precocemente um conteúdo próprio e específico que ultrapassa o mero empréstimo de uma terminologia da filosofia e da psicologia existente. Trata-se de uma tentativa de encontrar continuidades e descontinuidades – num esforço análogo ao empreendido por Toassa (2009)Toassa, G. (2009). Emoções e vivências em Vigotski: investigação para uma perspectiva histórico-cultural. [Tese de Doutorado em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano. Universidade de São Paulo: Instituto de Psicologia]. –, mudanças de perspectivas e de diálogos teóricos nesse processo de construção de um conceito.

Partindo do exame da presença da noção de perejivânie em textos vigotskianos sobre arte da primeira fase (ensaio sobre Hamlet, resenhas teatrais, Psicologia da arte e “Educação estética”) e do estabelecimento de um corpo de ideias estéticas que servem de pano de fundo para a compreensão do texto “Sobre a questão da psicologia do trabalho criativo pelo ator” (Vigotski, 2023Vigotski, L. S. (2023). Sobre a questão da psicologia da criação pelo ator. (P.N. Marques, Trad.). Pro-Posições, 34, ed0020210085. http://dx.doi.org/10.1590/1980-6248-2021-0085 (Obra original publicada em 1936).
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), o artigo esboça uma genealogia do conceito em Stanislávski, com o fim de estabelecer algumas diferenças e semelhanças na apreensão dos dois autores. Ainda, discutimos as posições de Vigotski e Stanislávski sobre as postulações de Denis Diderot (1743-1784)8 8 Denis Diderot (1743-1784), filósofo e dramaturgo, foi um dos principais nomes do Iluminismo francês. e tentamos estabelecer algumas ligações entre os dois.

Breve levantamento das ocorrências e acepções de perejivânie na obra vigotskiana sobre arte

O tema das emoções na obra de Vigotski é, ao mesmo tempo, fundamental e vago. O autor não economizou nas declarações sobre a centralidade desse tópico para a psicologia, mas não se pode dizer que tenha conseguido sistematizá-lo teoricamente. O escrito Teoria das emoções (Vigotski, 1984Vigotski, L. S. (1984). Utchênie ob emotsiakh [Teoria das emoções]. In M. G. Iarochévski (Ed.), Sobránie sotchiniénii – Tom 6 [Obra reunida, volume 6]. Pedagoguika.), que seria um passo mais consistente nessa direção, não chegou a ser concluído, e ofereceu antes um comentário crítico sobre as teorias existentes do que uma formulação própria.

Este é um assunto fortemente presente na obra inicial do autor, particularmente nos escritos sobre arte, como se pode observar na própria definição de arte, elaborada em Psicologia da arte, como técnica social dos sentimentos. São também evidências nesse sentido os inúmeros comentários presentes nas resenhas teatrais sobre as diferentes emoções engendradas pelas peças e potencialmente suscitadas no espectador.

Ainda no ensaio sobre Hamlet, Vigotski (1999)Vigotski, L. S. (1999). A tragédia de Hamlet, príncipe da Dinamarca (Paulo Bezerra, Trad.). Martins Fontes. problematiza a fórmula do “prazer estético”, argumentando que, no caso da tragédia, trata-se, antes, de “um sentimento profundo, uma obnubilação do espírito”, ou seja: “a tragédia nos apanha nas redes de sua própria consciência, acende o fogo trágico de nosso ‘eu’, por isso seu vivenciamento [perejivânie] se nos torna profunda angústia, em vez do ‘prazer’ estético aguardado” (p. 185). O final de Hamlet – “o resto é silêncio” –, para Vigotski, indica que a tragédia só se conclui verdadeiramente no espectador: “a tragédia precisa ser concluída, precisamos completá-la em nós mesmos, em nosso vivenciamento [perejivânie]” (p. 185).

Assim, já em 1916, Vigotski aborda o tema da emoção no processo de fruição da arte como aspecto central de sua “crítica de leitor” (Marques, 2012Marques, P. N. (2012). A crítica do leitor de L. S. Vigotski. Dubna Psychological Journal, 3, 88-97.). O caráter emocional da reação estética aparece, por exemplo, na passagem: “o misterioso não se atinge pelo vaticínio mas pela sensação, pelo vivenciamento [perejivânie] do misterioso” (Vigotski, 1999Vigotski, L. S. (1999). A tragédia de Hamlet, príncipe da Dinamarca (Paulo Bezerra, Trad.). Martins Fontes., p. 12). O autor emprega nessa obra o termo perejivânie para descrever tanto a experiência do receptor quanto a do crítico e a do próprio Hamlet.9 9 No caso de Hamlet, Vigotski fala em experiência mística (mistítcheskoe perejivânie), a partir das ideias expressas em The varieties of religious experience por William James (1999). Afirma, além disso, que seu estudo crítico objetiva direcionar a vivência do leitor, como que contagiá-lo com a vivência do crítico (p. 179).

Em Psicologia da arte, Vigotski (2001)Vigotski, L. S. (2001). Psicologia da arte (Paulo Bezerra, Trad.). Martins Fontes. usa de forma intercambiável os termos “vivência estética” (estetítcheskoe perevijânie) e “reação estética” (estetítcheskaia reaktsiia) para descrever a fruição do objeto artístico pelo receptor como uma experiência de caráter eminentemente emocional. Vale ressaltar que, embora o termo perevijânie seja bastante recorrente nessa obra, Vigotski prefere “reação estética” para definir o objeto de estudo de sua psicologia da arte, em uma clara referência à teoria reactológica de Konstantin Kornílov (1879-1957), em voga na época. A distribuição das ocorrências desses termos no primeiro capítulo da obra é significativa: “vivência” e seus derivados (vivenciar, vivenciado) predominam nos dois primeiros terços do capítulo, quando Vigotski trata das diferentes abordagens ao problema psicológico da arte. Já no terço final, em que são estabelecidos os princípios metodológicos de seu estudo, o autor emprega apenas o termo “reação”. Por fim, vale observar que a seção do livro que apresenta exemplos de análise é chamada “Análise da reação estética”.

Nessa mesma obra, Vigotski (2001)Vigotski, L. S. (2001). Psicologia da arte (Paulo Bezerra, Trad.). Martins Fontes. toma a obra de arte como um sistema de estímulos organizados de forma consciente para suscitar uma reação de natureza específica, pois origina-se do contato com um objeto estético, e, portanto, é denominada “reação estética”. Com o objetivo de elaborar uma psicologia objetiva da arte, o estudioso busca reconstruir indiretamente a reação estética a partir de indícios objetivos, isto é, da própria estrutura da obra (sua forma), de modo a eliminar idiossincrasias ligadas especificamente ao psiquismo do criador ou do receptor. O método que viabiliza este objetivo, denominado por Vigotski de “método objetivo analítico”, é indireto, pois chega à reação estética não pelo estudo direto do receptor, mas pelas pistas encontradas na obra (Ivanov, 2001Ivanov, V. V. (2001). Iskússtvo psikhologuítcheskogo issliédovnia. In L. S. Vygótski, Analiz estetítcheskoi reáktsii: Traguédia o Gamlete, printse Datskom & Psikhologuia iskússtva. Labirint., p. 420; Vigotski, 2001Vigotski, L. S. (2001). Psicologia da arte (Paulo Bezerra, Trad.). Martins Fontes., p. 25; Vigotski, 2004Vigotski, L. S. (2004). O significado histórico da crise da psicologia. In L. S. Vigotski, Teoria e método em Psicologia (Claudia Berliner, Trad.). Martins Fontes., p. 371). Trata-se, assim, do estudo da reação em sua forma abstraída, a qual “não pertencerá a nenhum indivíduo particular nem refletirá nenhum processo psíquico individual em toda sua concretude” (Vigotski, 2001Vigotski, L. S. (2001). Psicologia da arte (Paulo Bezerra, Trad.). Martins Fontes., p. 26).

Assim, a vivência e a emoção estéticas são marcadas por características que as distinguem das vivências e emoções cotidianas. A primeira delas é o fato de elas serem produtos do contato com a obra de arte e, portanto, serem marcadas pela contraposição dialética de emoções de sentidos opostos, que se resolve no plano da fantasia. A manifestação externa dessa emoção é retida, e sua resolução se dá num plano abstrato, de tal forma que “as emoções da arte são emoções inteligentes” (Vigotski, 2001Vigotski, L. S. (2001). Psicologia da arte (Paulo Bezerra, Trad.). Martins Fontes., p. 267). A não expressão motora não implica, contudo, em que a emoção não seja real. Ao contrário, as emoções da arte são vivenciadas com realidade e força. Mediante a contraposição de emoções opostas, a vivência estética resulta em uma transformação dos sentimentos, o que exige um elevado grau de atividade criativa também por parte do receptor.

Assim, além de pressupor um caráter ativo do receptor e implicar numa ligação particular entre emoção e fantasia, a vivência estética em Psicologia da arte (Vigotski, 2001Vigotski, L. S. (2001). Psicologia da arte (Paulo Bezerra, Trad.). Martins Fontes.) tem sentido social, uma vez que “a arte nunca poderá ser explicada até o fim a partir de um pequeno círculo da vida individual, mas requer forçosamente a explicação de um grande ciclo da vida social” (p. 99).

Escrita em 1925, A obra Psicologia da arte (2001), não pertence ao corpus vigotskiano sobre psicologia do desenvolvimento, de modo que o emprego da ideia de vivência nela não pode ser generalizado para esse campo de estudo. Ademais, o autor dialogava naquele momento com os pressupostos teóricos da reflexologia e da reactologia e não havia ainda constituído os pilares da chamada psicologia histórico-cultural. Não obstante, um exame atento das primeiras obras é capaz de revelar a originalidade da perspectiva vigotskiana. Sua elaboração inicial da noção de vivência (estética) é mais do que uma repetição ou reformulação de outros autores e inclusive já apresenta algumas das características importantes do conceito que seria desenvolvido posteriormente. Assim, é possível dizer que entre as diferentes fases de sua produção há não apenas descontinuidades, mas também alguns fios de continuidade.

O tema da vivência estética marca presença também no capítulo “Educação estética” do livro Psicologia pedagógica, obra publicada em 1926 (Vigotski, 2003Vigotski, L. S. (2003). Educação estética. In L. S. Vigotski, Psicologia pedagógica (Guillermo Blanck, Organização, Prefácio e Notas; Claudia Schilling, Trad.). Artmed.). É um manual adotado em cursos de formação de professores, daí sua linguagem acessível, com estilo abundante em metáforas, e o caráter panorâmico e não exaustivo de algumas análises e referências. Para Vigotski, a educação estética implica na promoção de vivências estéticas, particularmente durante a infância. O autor rejeita que a vivência estética deva ter por finalidade o ensinamento de valores morais, de conhecimentos teóricos ou de prazer, isto é, a educação para a arte não deve estar subordinada a fins pedagógicos, morais ou hedonistas. A seguir, o autor elenca os traços fundamentais da vivência estética: seu caráter ativo, seu significado biológico e sua característica psicológica. Todos esses pontos estão, em alguma medida, presentes em Psicologia da arte.

Em Psicologia pedagógica, a equiparação dos termos “vivência” e “reação” aparece de forma ainda mais explícita, como se verifica na citação a seguir: “Nesse sentido, podemos dizer claramente que a vivência estética é estruturada conforme o modelo exato de uma reação comum, que necessariamente pressupõe a presença de três componentes: excitação, elaboração [processamento] e resposta” (Vigotski, 2003Vigotski, L. S. (2003). Educação estética. In L. S. Vigotski, Psicologia pedagógica (Guillermo Blanck, Organização, Prefácio e Notas; Claudia Schilling, Trad.). Artmed., p. 229). Não obstante certa passividade e atitude contemplativa que a apreciação da arte envolve, a vivência estética não se resume a esse momento. Os elementos da obra de arte são captados pelo receptor, que os reelabora internamente, num processo (cri)ativo que envolve algumas funções psíquicas, como percepção, memória e pensamento associativo, e é denominado por Vigotski como “síntese criadora secundária”. A mesma ideia aparece em Psicologia da arte (Vigotski, 2001Vigotski, L. S. (2001). Psicologia da arte (Paulo Bezerra, Trad.). Martins Fontes.):

a percepção da arte também exige criação … não basta simplesmente vivenciar com sinceridade o sentimento que dominou o autor, não basta entender da estrutura da própria obra: é necessário ainda superar criativamente o seu próprio sentimento, encontrar sua catarse, e só então o efeito da arte se manifestará em sua plenitude. (p. 314).

Ao abordar o significado biológico da arte e da vivência estética, Vigotski retoma a função prática e utilitária original da música, por exemplo, como acompanhamento e organização do trabalho e da luta, no exército. Tal função é menos direta no mundo moderno, mas a arte permanece como um mecanismo biológico, por ser o veículo que permite superar excitações não realizadas na vida. Nessa versão vigotskiana da sublimação de Freud, a educação estética deve

criar na pessoa um canal permanente de funcionamento correto que deriva e desvia a pressão do inconsciente para necessidades úteis. A sublimação executa de formas socialmente úteis o que o sonho e a doença realizam de forma individual e patológica

(Vigotski, 2003Vigotski, L. S. (2003). Educação estética. In L. S. Vigotski, Psicologia pedagógica (Guillermo Blanck, Organização, Prefácio e Notas; Claudia Schilling, Trad.). Artmed., p. 232).

A visão psicanalítica da arte é discutida criticamente por Vigotski no quarto capítulo de Psicologia da arte. Nesse texto, o autor critica o determinismo sexual e inconsciente que marca o entendimento da criação artística. Mais do que isso, a principal falha dessa teoria foi ter ignorado o papel da forma artística, que faz com que a arte seja equiparada a chistes, sonhos, devaneios (Vigotski, 2001Vigotski, L. S. (2001). Psicologia da arte (Paulo Bezerra, Trad.). Martins Fontes., pp. 81-99).

Acerca da vivência estética, Vigotski (2003)Vigotski, L. S. (2003). Educação estética. In L. S. Vigotski, Psicologia pedagógica (Guillermo Blanck, Organização, Prefácio e Notas; Claudia Schilling, Trad.). Artmed. afirma: “quando observamos … uma reação estética, percebemos que seu objetivo final não é a repetição de qualquer reação real, mas a superação e triunfo sobre ela” (p. 232). Assim, a especificidade da vivência estética consiste nessa função de superação de um determinado conteúdo real, de elevação em relação ao cotidiano. Ela possui ainda a capacidade de atuar como organizadora do comportamento futuro, uma vez que, “como toda vivência intensa, a vivência estética cria um estado muito sensível para as ações posteriores” (p. 234). A relação entre a vivência da arte e o comportamento futuro está também desenvolvida no último capítulo de Psicologia da arte, no qual a arte é desvelada em seu potencial para a construção da vida social e do novo homem, um potencial que, embora não inteiramente conhecido, é tido pelo autor como decisivo: “Sem a nova arte não haverá o novo homem” (Vigotski, 2001Vigotski, L. S. (2001). Psicologia da arte (Paulo Bezerra, Trad.). Martins Fontes., p. 329).

Outro aspecto fundamental da vivência estética é seu caráter dialético. O funcionamento dialético da arte permite que a emoção seja reorganizada por meio da “mais complexa atividade de uma luta interna que é resolvida pela catarse” (Vigotski, 2003Vigotski, L. S. (2003). Educação estética. In L. S. Vigotski, Psicologia pedagógica (Guillermo Blanck, Organização, Prefácio e Notas; Claudia Schilling, Trad.). Artmed., p. 235). Vigotski trata extensivamente dos afetos de caráter oposto (terror e piedade) que produzem a catarse, segundo Aristóteles.10 10 “É pois a Tragédia imitação de uma ação de caráter elevado, completa e de certa extensão, em linguagem ornamentada e com várias espécies de ornamentos distribuídas pelas diversas partes [do drama], [imitação que se efetua] não por narrativa, mas mediante atores, e que, suscitando o ‘terror e a piedade, tem por efeito a purificação das emoções’.” (Aristóteles, 2013, p. 37). Para o autor, contudo, o conflito entre emoções contraditórias leva à elevação e à superação, isto é, a catarse em Vigotski (2001)Vigotski, L. S. (2001). Psicologia da arte (Paulo Bezerra, Trad.). Martins Fontes. é representada não pela ideia aristotélica de purificação ou purgação das emoções, mas de transformação, destruição11 11 Vigotski retoma a forma schilleriana, segundo a qual a forma destrói o conteúdo (Schiller, 1991, p. 117). Não obstante, devemos levar em conta o alerta de Iarochévski (2013, p. 180) de que por destruição não se deve entender a eliminação do conteúdo em prol do domínio de uma forma vazia, não semântica, mas a “descoberta de uma associação especial entre forma e conteúdo, inerente à arte, específica de uma determinada organização desse conteúdo, que conferiria a ele um caráter de realidade estética, capaz de impactar de outro modo o comportamento e a estrutura interna da personalidade humana, diferentemente de outros fenômenos da cultura”. e curto-circuito: “a lei da reação estética é uma só: encerra em si a emoção que se desenvolve em dois sentidos opostos e encontra sua destruição no ponto culminante, como uma espécie de curto-circuito” (p. 270). Da mesma maneira, Vigotski (2003)Vigotski, L. S. (2003). Educação estética. In L. S. Vigotski, Psicologia pedagógica (Guillermo Blanck, Organização, Prefácio e Notas; Claudia Schilling, Trad.). Artmed. se opõe à ideia de que a arte apresenta uma versão facilitada da realidade e que, por isso, do contato com ela obtém-se prazer (p. 231). A vivência artística, ao contrário, representa uma complexificação da realidade, uma percepção desautomatizada. Nesse sentido, o autor incorpora quase integralmente o conceito de estranhamento do Formalismo Russo (Vigotski, 2001Vigotski, L. S. (2001). Psicologia da arte (Paulo Bezerra, Trad.). Martins Fontes., p. 65, Marques, 2020Marques, P. N. (2020) O Formalismo Russo sob a lente de L. S. Vygótski: influência e crítica. Revista RUS, 11(16), 125-145. https://doi.org/10.11606/issn.2317-4765.rus.2020.172165
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).

No que se refere ao campo da educação estética, Vigotski discute a importância da vivência estética e da criação artística no contexto do desenvolvimento infantil. Ressalta-se, como já foi dito, que a vivência tem em si mesma um caráter ativo e criador, de modo que ambas são tomadas pelo autor em sua natureza comum. A criação tem a função de fazer com que a criança se eleve em relação às vivências imediatas. É uma ferramenta do desenvolvimento psíquico infantil, que, portanto, tem um caráter utilitário e não estético. Trata-se, antes, de dar vazão ao potencial criador da criança num ambiente não sufocado por regras, mas que pode incluir a introdução de certos conhecimentos técnicos para alargar o repertório infantil. O contato com a arte, isto é, a promoção da vivência estética, e a criação artística na infância são, assim, objetos da educação social. Eles devem ser conduzidos e direcionados de maneira consciente, com o objetivo de

ampliar ao máximo os limites da experiência pessoal restrita, para organizar o contato da psique da criança com as esferas mais amplas possíveis da experiência social já acumulada, para inserir a criança na rede da vida com a maior amplitude possível

(Vigotski, 2003Vigotski, L. S. (2003). Educação estética. In L. S. Vigotski, Psicologia pedagógica (Guillermo Blanck, Organização, Prefácio e Notas; Claudia Schilling, Trad.). Artmed., p. 238).

De forma resumida, podemos dizer que a vivência estética, na fase inicial da obra do autor, é um tipo de experiência que: a) diferencia-se da vivência cotidiana (isto é, não suscitada pela arte) e, mais do que isso, implica a superação dela; b) tem natureza emocional ou, dito de forma mais exata, envolve certa transformação dos sentimentos mediante a produção de emoções inteligentes; c) tem caráter social, pois seu significado ultrapassa os limites da psicologia individual; d) tem caráter ativo, pois, para que se realize, envolve processos psíquicos do receptor, tais como a percepção e a fantasia; e) exerce um papel no desenvolvimento humano, tanto na idade infantil quanto na produção do “novo homem” .12 12 Sobre esse último ponto, ressalta-se que a vivência estética está voltada para a vida real e para a construção do futuro. Assim, ainda que a vivência e a emoção estética sejam específicas, distinta das cotidianas, o efeito delas se dá sobre as relações entre indivíduo e sociedade e, portanto, repercute na vida social. Para Vigotski, a arte serve não ao adornamento, mas à reelaboração criativa da vida. Nesse sentido, o autor incorpora de maneira entusiasmada o lema do movimento futurista expresso por Tchuják (1923, p. 12) sobre a arte como forma de construção da vida: “[…] a arte é apenas um método de construção da vida quantitativamente peculiar, temporário, que envolve o predomínio das emoções, e como tal, não pode ficar isolado ou, menos ainda, prolongadamente independente em relação a outras formas de construção da vida”.

Perejivânie em Stanislávski: pontos de contato e distanciamento

Como se sabe, perejivânie é uma categoria central também do pensamento de Stanislávski, o que levou a algumas suposições acerca da inter-relação deste pensamento com o de Vigotski (Capucci & Silva, 2017Capucci, R. R., & Silva, D. N. H. (2017). Quando vida e arte se encontram: um diálogo entre Vigotski e Stanislavski. Psicologia em Estudo, 22(3), 409-420. https://doi.org/10.4025/psicolestud.v22i3.35869.
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; Mok, 2017Mok, N. (2017). On the concept of Perezhivanie: A quest for a critical review. In M. Fleer, F. González Rey, & N. Veresov (Eds.), Perezhivanie, emotions, and subjectivity. Springer.). No entanto, não se trata de uma afirmação simples, e traçar este caminho requer uma investigação de fôlego. Limitamo-nos, neste artigo, a apontar alguns possíveis pontos de convergência e de distanciamento entre os dois pensadores.

Zaltron (2021)Zaltron, M. (2021). Stanislávski e o trabalho do ator sobre si mesmo. São Paulo: Perspectiva. desenvolve uma explanação dessa categoria na obra de Stanislávski. O primeiro aspecto destacado pela autora é a ligação indissolúvel deste termo, na língua russa, com a palavra emoção (tchúvstvo). Em O trabalho do ator sobre si mesmo I, o primeiro de seus livros sobre seu “sistema”, Stanislávski (1954)Stanislávski, K. (1954). Sobránie sotchiniénii v 8 tomakh. Tom 2. [Obras escolhidas em 8 tomos. Tomo 2.]. Iskússtvo. é enfático ao definir o teatro que ele representa como um teatro de perejivânie (p. 22). Sua discussão acerca do conceito em questão é elaborada nos seguintes termos: ao “pensar, querer, aspirar e agir em cima do palco ... nas condições da vida do papel e em total analogia a ela”, o ator “se aproxima do papel e começa a sentir junto com ele” (p. 25). É esse sentir que, segundo Stanislávski, chama-se, no jargão teatral, de perejivânie.

Os trabalhos de Tcherkásski (2016)Tcherkasski, S. (2016). Masterstvó artióra. Stanislávski, Boleslávski, Strasberg. RGISI. e Whyman (2008)Whyman, R. (2008). The Stanislavsky system of acting - Practice and legacy in modern performance. Cambridge University Press. fazem, cada um à sua maneira, reconstruções históricas e teóricas dos termos presentes no “sistema” de Stanislávski. Nesse corpo de conhecimento vemos como se encontram lado a lado elementos tão díspares como memória afetiva (tomado da psicologia experimental francesa do século XIX) e prana (tomado do yoga); inconsciente (inspirado pela obra do alemão Eduard von Hartmann) e ação cênica. Ambos os referidos pesquisadores coincidem em afirmar que Stanislávski partia de sua própria prática como ator e diretor. O recurso ao empréstimo da terminologia científica – e, em alguns casos, metafísica – da época se dá principalmente através de um recurso descritivo e não ontológico dessas categorias. Em seu exemplar da edição russa de Psicologia das emoções, de Théodule Ribot, Stanislávski sublinha, em 1908: “Poderiam as imagens… de emoções vivenciadas [perejítykh, forma de particípio passado de perejivát] reaparecer involuntariamente na consciência ou serem causadas pela força de vontade, sem qualquer acontecimento exterior?” (referido por Tcherkásski, 2016, p. 71). Ou seja: perejvánie aparece como a maneira específica como as emoções são vivenciadas.

Não obstante, o significado de perejivânie para Stanislávski, apesar de confirmado por suas leituras científicas, é extraído, segundo Whyman (2008)Whyman, R. (2008). The Stanislavsky system of acting - Practice and legacy in modern performance. Cambridge University Press., do pensamento estético de Lev Tolstói, expresso de forma mais ou menos acabada em seu O que é Arte?, de 1897. Para Tolstói (2015)Tolstói, L. (2015). Tchto takoe iskusstvo? [O que é arte?]. Prospekt. (assim como para Stanislávski), perejivânie é a qualidade emocional que distingue o caráter artístico ou não artístico de uma obra. Para Tolstói, a arte é a comunicação humana realizada de forma direta pelas emoções, sem a mediação da razão. Assim, uma obra pode ser qualificada como arte quando a emoção do artista é também experimentada, vivenciada pelo espectador. Perejivânie, portanto, é o que possibilita o contágio das emoções entre artista e público e – no caso do teatro – entre palco e plateia.

Essa rápida genealogia da utilização da palavra vivência no trabalho de Stanislávski – ou seja, tanto sua inspiração na psicologia experimental francesa do século XIX como a partilha da ontologia da arte com Tolstói – sugere dois pontos acerca das diferenças e semelhanças entre perejivânie para Stanislávski e para Vigotski: a primeira é a aproximação desses autores no reconhecimento do caráter emocional da perejivânie. Por outro lado, eles se distanciam no sentido em que, para Stanislávski, a perejivânie é uma experiência particular, íntima e pertinente ao coletivo teatral (incluído aí o público), enquanto para Vigotski ela é eminentemente uma experiência histórica e social.

A perejivânie cênica em Vigotski: o caso da psicologia da criação pelo ator

Em “Sobre a questão da psicologia do trabalho criativo pelo ator”, Vigotski fala em vivência cênica e vivência do ator, mais ou menos como sinônimos, e vivência artística e cotidiana (jitéiskaia), como termos contrapostos. Além disso, o autor emprega a forma verbal vivenciar (perejivát) em dois momentos-chave do texto: primeiro na formulação do paradoxo do ator: “deve o ator vivenciar aquilo que ele representa ou sua interpretação é uma ‘macaquice’ sublime, a imitação de uma imagem ideal?”; e em uma citação de Stanislávski sobre o fato de os sentimentos vivenciados pelo ator no palco serem diferentes dos da vida.

A distinção entre vivência ou emoção comum (cotidiana) e a de tipo estético, como já foi apontado anteriormente, é crucial para o ponto de vista do autor desde suas obras iniciais. A ideia de vivência estética está intrinsecamente ligada a uma concepção de arte como produto altamente específico da criatividade humana e da vida social. A arte aparece como um ponto de intersecção entre individual e social, que, por meio da forma artística, produz uma tal elaboração do campo da emoção humana capaz de transformá-la.13 13 Vejam-se, por exemplo, as fórmulas encontradas em Psicologia da arte: “a arte é o social em nós” (Vigotski, 2001, p. 315) e a definição de arte como técnica social do sentimento (Vigotski, 2001, p. 308).

Essa face social e supraindividual da emoção na arte, enfatizada por Vigotski, é expressa no texto sobre a psicologia do ator em termos metodológicos, em particular quando o autor insiste na necessidade de extrapolar os limites do empirismo estrito. A vivência do ator, da mesma forma que a vivência estética do receptor, não se resume apenas à experiência imediata, como na definição apresentada no Dicionário de Psicologia (Varcháva & Vigotski, 1931Varcháva, B. E., & Vigotski, L. S. (1931). Psykhologuítcheski slovar. Gossudárstvennoe utchébno/pedagoguítcheskoe izdátelstvo. , p. 128). Assim, a elaboração conceitual presente nos escritos iniciais e no texto sobre o ator não constitui mera repetição de uma noção psicológica genérica, mas revela um movimento explícito do autor, por se distanciar do empirismo e do subjetivismo.

A emoção pessoal constitui a matéria-prima que será elaborada artisticamente, e a autopercepção do ator é tomada como apenas uma das fontes possíveis para a investigação de sua psicologia. Notamos aqui um vestígio do tratamento das noções de forma e conteúdo presentes em Psicologia da arte, uma vez que o conteúdo – a emoção do ator – resulta transformado pela maneira como se vê organizado na obra. Além disso, a análise da ocorrência particular e individual revela-se insuficiente para que se possam captar a complexidade e a natureza da vivência estética em todas as suas implicações.

Para além do aspecto subjetivo, há uma série de outras camadas que devem ser levadas em conta no estudo da vivência cênica: em primeiro lugar é necessário considerar que a emoção que o ator busca transmitir no palco recebeu antes uma expressão literária – Vigotski cita o exemplo da angústia tchekhoviana em As três irmãs. A emoção encarnada pelo ator no palco é, ela mesma, um produto da cultura, em geral na forma de literatura dramática, que antecede e extrapola a subjetividade do intérprete. Ademais, as obras devem ser entendidas como uma forma específica de ideologia que, por sua vez, está ligada à elaboração da esfera das emoções na consciência social (Bukhárin, 2008; Vigotski, 2001Vigotski, L. S. (2001). Psicologia da arte (Paulo Bezerra, Trad.). Martins Fontes.).

Assim, as emoções e as vivências cênicas são marcadas por um caráter extrapessoal. Elas são engendradas pelo campo social e orientadas para ele; pertencem, de igual maneira, ao autor, à plateia e à consciência social. Tal aspecto, contudo, não anula o caráter também subjetivo da vivência do ator. Para Vigotski, porém, a esfera emocional particular do ator se vê instrumentalizada, isto é, aparece como matéria-prima que receberá uma formulação específica conforme a tarefa estética e estilística que a encenação procura resolver. A subordinação da vivência do ator aos objetivos estabelecidos para a montagem constitui um aspecto crucial da compreensão vigotskiana para superar a dicotomia entre sentimento real e imitação, que está na base do paradoxo do ator.

Assim como os demais objetos artísticos, a vivência do ator é constituída por: material, conteúdo e forma, elementos indissociáveis entre si. Para compreender esses elementos, podemos recorrer a uma analogia com as artes plásticas: a tinta e a tela seriam o material, o conteúdo seria a imagem representada (uma paisagem, uma cena histórica etc.) e a forma corresponderia aos procedimentos estilísticos empregados na execução da obra. A indissociabilidade entre esses elementos é apontada por Vigotski também no caso da vivência cênica, uma vez que a forma como um ator representa seu papel está intrinsecamente ligada ao conteúdo da imagem cênica, à relação com essa imagem, ao significado sócio-histórico da imagem, e ao objetivo pretendido pela vivência cênica.

Vigotski apresenta o exemplo do diretor teatral Evguêni Vakhtángov (1883-1922), que fora aluno de Stanislávski, para explicitar como uma mesma imagem, ao se ver subordinada a objetivos estilísticos distintos (sátira, elogio), produzirá vivências cênicas também distintas. Assim, um ator que interprete a inação de Hamlet numa chave irônica, por exemplo, recrutará uma série de emoções e buscará compor e transmitir uma vivência inteiramente distinta do profissional que se submeta ao pathos trágico do texto shakespeariano. Dessa forma, a vivência cênica é explicada e fundamentada segundo o sistema de tarefas estilísticas ao qual ela está subordinada e, por isso mesmo, ela difere das vivências do dia a dia.

Outro elemento que Vigotski (2023)Vigotski, L. S. (2023). Sobre a questão da psicologia da criação pelo ator. (P.N. Marques, Trad.). Pro-Posições, 34, ed0020210085. http://dx.doi.org/10.1590/1980-6248-2021-0085 (Obra original publicada em 1936).
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traz para sua análise é a consideração de que os diferentes sistemas de interpretação e também as diferentes tarefas estilísticas e as vivências cênicas que deles podem derivar têm uma natureza social. Desse modo, a vivência do ator varia em termos de classe e do contexto histórico, e deve, portanto, necessariamente ser analisada, em sua manifestação concreta, sob uma perspectiva histórica. O centro desta argumentação, para Vigotski (2023)Vigotski, L. S. (2023). Sobre a questão da psicologia da criação pelo ator. (P.N. Marques, Trad.). Pro-Posições, 34, ed0020210085. http://dx.doi.org/10.1590/1980-6248-2021-0085 (Obra original publicada em 1936).
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, é o texto Paradoxo sobre o ator, do francês Denis Diderot, em cuja base está, precisamente, a questão da perejivânie.

Vigotski e Diderot: a superação dialética do paradoxo pela psicologia concreta

A produção vigotskiana sobre arte, desde os textos de caráter crítico aos de cunho científico, não tem por finalidade propor uma agenda estética, ou seja, o autor não faz a defesa deste ou daquele tipo de arte – digamos, da arte clássica em detrimento da moderna, ou vice-versa. Isso não significa, contudo, que ele se furte ao dever de avaliar a qualidade de obras artísticas, em especial, naturalmente, nos textos críticos, mas também em Psicologia da arte (Vigotski, 2001Vigotski, L. S. (2001). Psicologia da arte (Paulo Bezerra, Trad.). Martins Fontes.), quando ele estabelece uma hierarquia entre os gêneros literários em termos de complexidade.14 14 Com o objetivo de realizar as necessárias generalizações, Vigotski (2001) organiza o estudo “do mais simples para o mais complexo”, isto é “a fábula, a novela e a tragédia como três formas literárias que gradualmente se complexificam e se sobrepõem umas às outras” (p. 103). A mesma postura pode ser identificada no texto sobre a psicologia do ator (Vigotski, 2023Vigotski, L. S. (2023). Sobre a questão da psicologia da criação pelo ator. (P.N. Marques, Trad.). Pro-Posições, 34, ed0020210085. http://dx.doi.org/10.1590/1980-6248-2021-0085 (Obra original publicada em 1936).
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).

Uma elaboração inicial do problema da psicologia do ator é identificada por Vigotski (2023)Vigotski, L. S. (2023). Sobre a questão da psicologia da criação pelo ator. (P.N. Marques, Trad.). Pro-Posições, 34, ed0020210085. http://dx.doi.org/10.1590/1980-6248-2021-0085 (Obra original publicada em 1936).
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no pensamento diderotiano, sintetizado principalmente no texto “O paradoxo do comediante” (Diderot, 1985Diderot, D. (1985). Textos escolhidos (Marilena de Souza Chaui & J. Guinsburg, Trads. e notas). Abril Cultural.). Partindo da diferença básica entre a emoção do ator e a emoção do papel, Diderot considera o trabalho do ator como essencialmente técnico e imitativo. A transmissão dos sentimentos não passa de uma habilidade aprendida, que requer técnica apurada e não tem (nem deve ter) qualquer relação com a intimidade do artista. A subjetividade do ator é vista, antes, como empecilho à boa interpretação, que é engendrada por gestos, palavras e tons meticulosamente calculados.

Diderot (1985)Diderot, D. (1985). Textos escolhidos (Marilena de Souza Chaui & J. Guinsburg, Trads. e notas). Abril Cultural. defende – como fará também Vigotski (2023)Vigotski, L. S. (2023). Sobre a questão da psicologia da criação pelo ator. (P.N. Marques, Trad.). Pro-Posições, 34, ed0020210085. http://dx.doi.org/10.1590/1980-6248-2021-0085 (Obra original publicada em 1936).
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– o emprego dos recursos do ator (voz, tom, gesto, ação) como matéria-prima para o cumprimento de uma tarefa estilística, por exemplo, na seguinte passagem:

não é a expressão amo-vos, que foi arrancada ao recato de uma mulher austera, dos projectos de uma leviana, da virtude de uma mulher sensível: é o tremor na voz com o qual é pronunciado; as lágrimas, os olhares que o acompanham

(p. 154).

Aqui, assim como fará Vigotski, Diderot distingue o conteúdo textual da forma pela qual ele é interpretado, que varia conforme a tarefa estilística posta.

Vigotski (2023)Vigotski, L. S. (2023). Sobre a questão da psicologia da criação pelo ator. (P.N. Marques, Trad.). Pro-Posições, 34, ed0020210085. http://dx.doi.org/10.1590/1980-6248-2021-0085 (Obra original publicada em 1936).
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menciona a lei de unidade da declamação defendida por Diderot (2004)Diderot, D. (1985). Textos escolhidos (Marilena de Souza Chaui & J. Guinsburg, Trads. e notas). Abril Cultural.: “Esta unidade impõe roupagens, um tom, um gesto, uma contenção, desde a cadeira colocada nos templos até aos palcos erigidos nas encruzilhadas” (p. 157). Este princípio é intransigentemente defendido pelo autor russo em muitos de seus textos críticos. Para marcar essa posição, Vigotski (2022)Vigotski, L. S. (2022). Liev S. Vigotski: escritos sobre arte (Priscila Marques, Trad.). Mireveja. recorre à imagem do jogo de xadrez para descrever o caráter intencional e não aleatório que deve perpassar qualquer montagem teatral:

Uma ideia única do diretor, qualquer que seja, penetra todo espetáculo do início ao fim: tudo é planejado, calculado, medido, levado em consideração e executado conscientemente na medida das forças artísticas, na realização de toda a ideia cênica da peça.

(p. 160-161).

Outro ponto defendido por Diderot (1985)Diderot, D. (1985). Textos escolhidos (Marilena de Souza Chaui & J. Guinsburg, Trads. e notas). Abril Cultural. e que também se faz presente em Vigotski é o caráter supraindividual e artificial da emoção transmitida no palco. A emoção se vê subjugada ao intelecto: “Nós [o público] sentimos; eles [os atores] observam, estudam e pintam … não é seu coração, mas sua cabeça que faz tudo” (p. 164). Embora a perspectiva vigotskiana sobre as emoções seja claramente distinta da filosofia iluminista francesa, na medida em que esta última as desvaloriza como elementos disruptivos e desorganizadores,15 15 Como observamos em: “A sensibilidade nunca se apresenta sem fraqueza de organização” (Diderot, 1985, p. 164). sua posição quanto ao caráter artificial e impessoal da emoção estética aparece como importante ponto de convergência.

Um eloquente exemplo disto é a resenha sobre a apresentação da bailarina Ekaterina Guéltser, de 1922, em que Vigotski (2022)Vigotski, L. S. (2022). Liev S. Vigotski: escritos sobre arte (Priscila Marques, Trad.). Mireveja. faz uma entusiasmada defesa do balé como linguagem artificial do movimento: “Toda técnica da dança clássica – voos, saltos, giros do corpo, posição de ponta dos pés, e assim por diante – é um sistema de movimento artificial” (p. 273). A ideia de que a arte produz emoções inteligentes, embora esteja longe de uma desvalorização das emoções em favor do intelecto, implica na noção de que a emoção estética se diferencia e, mais precisamente, se eleva em relação à cotidiana, o que se dá graças a uma ação especial e combinada de diferentes funções psíquicas (percepção, memória, emoção e fantasia). A distinção entre a vida no palco e fora dele é outro ponto em comum entre os autores. A ideia de Diderot de que o grande ator não morre no palco como se morre no leito, é ecoada por Vigotski (2022)Vigotski, L. S. (2022). Liev S. Vigotski: escritos sobre arte (Priscila Marques, Trad.). Mireveja. em uma de suas resenhas:

a fala é incomum, não cotidiana. É abertamente cênica, ou seja, declamatória, elevada e solene. Como diz um ator francês, no palco não se fala, se pronuncia. De fato, entonação e sons são materiais para a criação do ator tanto quanto a tinta o é para o artista plástico. Ele é livre para empregá-los conforme seu objetivo. Na vida não se fala da mesma forma que no placo.

(p. 221)

Vejamos, agora, como a questão é posta para Stanislávski.

Stanislávski e Diderot: resolução analítico-descritiva do paradoxo

Embora nenhum de seus textos publicados em vida cite o ensaio de Diderot, há, na biblioteca de Stanislávski, um exemplar completamente anotado do Paradoxo sobre o comediante. Além disso, Whyman (2008, pp. 45-46)Whyman, R. (2008). The Stanislavsky system of acting - Practice and legacy in modern performance. Cambridge University Press. menciona a troca de correspondência e as conversas anotadas que Stanislávski teve em 1914 com Liubóv Guriévitch, crítica e historiadora do teatro, que seria ainda sua editora ao longo de quase 30 anos. Nessa documentação é possível observar o estudo – com a assessoria de Guriévitch – do problema posto por Diderot e as diversas tentativas de solucioná-lo.

O primeiro movimento de Stanislávski em relação às posições de Diderot, que evidentemente contradizem o teatro que, segundo ele, deveria ter a perejivânie como categoria central, é buscar respaldo para suas posições na literatura científica disponível. O tema do paradoxo do ator havia voltado à tona em 1896, trazido por Alfred Binet, uma das referências em psicologia para Stanislávski. Em seu livro On Double Consciousness, de 1896, Binet desenvolve o chamado problema da “dupla-consciência das histéricas”. Um de seus experimentos, no entanto, é com a “dupla-consciência” dos atores. Binet descreve alguns experimentos com nove atores e atrizes franceses que o teriam levado à conclusão de que Diderot estava errado e de que a emoção experimentada em cena era, de fato, real. Sem considerar que a experimentação havia sido realizada com fins totalmente diversos dos seus, o estudo dos artigos de Binet foi suficiente para que Stanislávski pudesse reivindicar o lugar da perejivânie como elemento central do teatro (Whyman, 2008Whyman, R. (2008). The Stanislavsky system of acting - Practice and legacy in modern performance. Cambridge University Press., p. 47). Isso, no entanto, trazia outros problemas. Como lidar com a arte de atores e atrizes como Benoit-Constant Cocquelin16 16 Benoît-Constant Coquelin (1841-1909) foi um dos maiores atores da Comédie Française do século XIX. Stanislávski o considerava um expoente da arte da representação. e Sarah Berhardt,17 17 Sarah Bernhardt (1844-1923) foi uma famosa atriz francesa do século XIX, considerada também, por Stanislávski, um dos maiores expoentes do que este chamava de “arte da representação” (iskusstvo predstavléniia). por exemplo, que não apenas reivindicavam as posições diderotianas, mas também eram capazes de exemplificá-las na prática, em seu próprio jogo de cena? É assim que vemos, em O trabalho do ator sobre si mesmo I (Stanislávski, 1954Stanislávski, K. (1954). Sobránie sotchiniénii v 8 tomakh. Tom 2. [Obras escolhidas em 8 tomos. Tomo 2.]. Iskússtvo.), a diferenciação do teatro em três diferentes tendências.

A primeira, segundo Stanislávski (1945)Stanislávski, K. (1954). Sobránie sotchiniénii v 8 tomakh. Tom 2. [Obras escolhidas em 8 tomos. Tomo 2.]. Iskússtvo., é a tendência do artifício (remesló). Trata-se da corrente de teatro que, segundo ele, não deve ser considerada arte, pois não trabalha com a perejivânie em nenhum de seus aspectos. O principal elemento deste tipo de teatro é o clichê – para Stanislávski, a forma mecanicamente apropriada e desprovida de perejivânie, a falsa cópia dos maneirismos e interpretações de atores anteriores que fizeram o mesmo papel.

A segunda tendência é a do teatro da perejivânie, ou seja, aquela em que não apenas as emoções são experimentadas durante a performance, mas na qual este tipo de vivência é a própria finalidade do teatro.

Na terceira tendência e, por último, Stanislávski (1954)Stanislávski, K. (1954). Sobránie sotchiniénii v 8 tomakh. Tom 2. [Obras escolhidas em 8 tomos. Tomo 2.]. Iskússtvo. apresenta o que chama de teatro da representação, que deve também ser considerado uma forma de arte. O trabalho do ator descrito neste teatro é, precisamente, o preferido por Diderot em seu ensaio. Aqui, para Stanislávski, a atitude predominante é a capacidade técnica de apreender, dissecar e recompor friamente as emoções, com a finalidade de reproduzir sua forma externa durante a apresentação.

Assim, como proposta de resolução do paradoxo sobre o comediante, Stanislávski (1954)Stanislávski, K. (1954). Sobránie sotchiniénii v 8 tomakh. Tom 2. [Obras escolhidas em 8 tomos. Tomo 2.]. Iskússtvo. adota um procedimento analítico-descritivo. Diferentemente de Vigotski que, como vimos, aborda a questão do paradoxo de um ponto de vista da historicidade do problema, Stanislávski cria uma tipologia teatral abstrata na qual possa categorizar os tipos de teatro que, segundo ele, devem ser reconhecidos como arte, mas que não têm a perejivânie como finalidade.

Considerações finais

O presente artigo teve por objetivo inicial mapear a construção da noção de vivência estética em Vigoski, considerando o amplo arco que vai de suas obras iniciais, ainda pré-psicológicas, a um de seus últimos textos, o capítulo “Sobre a questão da psicologia do trabalho criativo pelo ator” (Vigotski, 2023Vigotski, L. S. (2023). Sobre a questão da psicologia da criação pelo ator. (P.N. Marques, Trad.). Pro-Posições, 34, ed0020210085. http://dx.doi.org/10.1590/1980-6248-2021-0085 (Obra original publicada em 1936).
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). O exame desse corpus revela que, já nas obras iniciais, a ideia de perejivânie é mais do que mera repetição ou reformulação das ideias de outros autores, embora ainda haja certa inconsistência inclusive de ordem terminológica, como observamos, por exemplo, no fato de que as noções de vivência e reação estética são usadas, inicialmente, como sinônimos. O estudo das obras iniciais resultou na consolidação dos seguintes elementos como traços distintivos do conceito vivência estética na perspectiva vigotskiana: difere da vivência cotidiana e implica a superação desta; tem natureza emocional e envolve a transformação dos sentimentos; tem caráter social e ativo; e exerce um papel no desenvolvimento humano. Ainda nessa primeira parte do artigo, observamos que um movimento análogo ocorre em relação à recepção das ideias de Stanislávski em suas fases iniciais e tardias.

Do estudo da obra inicial, passamos à análise do texto de 1934, sobre a psicologia do trabalho criativo realizado pelo ator. Para tanto, colocamos em perspectiva e em diálogo as ideias de Konstantin Stanislávski e de Denis Diderot sobre o chamado “paradoxo do ator”, em busca de pontos de convergência e divergência. Um primeiro ponto que precisa ser ressaltado nesse diálogo é que, ao discutir as proposições de Diderot e de Stanislávski para o trabalho do ator, Vigotski não expressa adesão a nenhuma dessas correntes, mas discute ambas criticamente. Em uma postura marcadamente dialética, Vigotski rejeita e aceita parcialmente tanto as ideias de Diderot quanto as de Stanislávski, num claro movimento de negação e superação dialética.

No que diz respeito ao caráter marcadamente emocional da perejivânie, há um ponto de convergência da visão vigotskiana com a stanislavskiana. Como foi visto, para o teórico do teatro, perejivânie aparece como a maneira específica como as emoções são vivenciadas, enquanto, para Vigotski, a perejivânie estética engendra uma emoção específica que se origina do contato com a obra de arte.

Observamos que ambos os autores dialogam com teóricos da psicologia para formular o conceito dentro de seus próprios corpos teóricos. Stanislávski recorreu a obras científicas com a finalidade de corroborar sua prática. Na introdução ao seu livro sobre o trabalho do ator, Stanislávski (1954)Stanislávski, K. (1954). Sobránie sotchiniénii v 8 tomakh. Tom 2. [Obras escolhidas em 8 tomos. Tomo 2.]. Iskússtvo. ressalta que sua terminologia não deve ser entendida como científica e que seu movimento, ao articular os diferentes elementos de seu Sistema, foi dotar de significado prático-teatral termos já correntemente usados no jargão teatral de sua época (p. 5). Vigotski, por sua vez, está interessado precisamente em elaborar uma psicologia própria. Num primeiro momento, essa psicologia é classificada como objetiva e, mais tarde, isto é, no texto sobre a psicologia do ator, insere-se no campo da psicologia concreta.18 18 A elaboração vigotskiana sobre a psicologia concreta que aparece no texto sobre a psicologia do ator é também esboçada no manuscrito que ficou conhecido sob o título “Psicologia concreta humana” (Vigotski, 2005). Dessa forma, ainda que haja deslocamentos e ajustes, a intenção de Vigotski sempre esteve atrelada a um projeto científico, excluídos daí os textos de cunho crítico da fase inicial.

Como foi dito, entre as fontes do conceito de perejivânie para Stanislávski estão as ideias de Tolstói sobre o contágio. Este é outro importante ponto de afastamento entre o teatrólogo e o psicólogo, uma vez que Vigotski, embora fale em contágio em seu primeiro trabalho – o ensaio sobre Hamlet, de 1915 –, rejeitará firmemente essa noção nas obras a partir de 1920, nas quais conclui que a vivência estética é mais do que a reprodução do sentimento do artista na psique do receptor: trata-se, antes, de um processo em que o sentimento sofre uma alteração qualitativa, que o autor equipara metaforicamente ao milagre bíblico da transformação da água em vinho. Além disso, entre os interlocutores centrais para as ideias vigotskianas sobre arte estão os autores do Formalismo Russo (ver Marques, 2020Marques, P. N. (2020) O Formalismo Russo sob a lente de L. S. Vygótski: influência e crítica. Revista RUS, 11(16), 125-145. https://doi.org/10.11606/issn.2317-4765.rus.2020.172165
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), ao passo que Stanislávski dedicou uma grande parte de seus escritos à argumentação contra o formalismo e, especialmente, os conceitos de estranhamento e grotesco (Toporkov, 2016Toporkov, V. (2016). Stanislávski ensaia. Memórias (Diego Moschkovich, Trad.). É realizações., pp. 75-79).

Nesse sentido, merece destaque o fato de que, para Vigotski, a emoção produzida pela vivência estética pode ser considerada uma emoção inteligente, para cuja produção todo um sistema de funções entra em ação: percepção, imaginação e fantasia. Esse processo é eminentemente consciente, e nesse sentido a psicologia vigotskiana se afasta das interpretações psicanalíticas sobre a criação e a recepção artística. Por outro lado, para Stanislávski (1958)Stanislávski, K. (1958). Sobránie sotchiniénii v 8 tomakh. Tom 5. [Obras Escolhidas em 8 tomos. Tomo 5]. Iskússtvo., a arte é a comunicação humana realizada de forma direta pelas emoções, sem a mediação da razão (p. 470).

Por fim, um aspecto crucial da psicologia do ator esboçada por Vigotski é sua proximidade com o campo da ideologia. Para o autor, “as vivências do ator, suas emoções, se apresentam não como função de sua vida psíquica pessoal, mas como fenômeno que possui sentido e significado objetivo e social, que serve de estágio de transição da psicologia para a ideologia” (Vigotski, 2023Vigotski, L. S. (2023). Sobre a questão da psicologia da criação pelo ator. (P.N. Marques, Trad.). Pro-Posições, 34, ed0020210085. http://dx.doi.org/10.1590/1980-6248-2021-0085 (Obra original publicada em 1936).
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, neste dossiê). A vivência do ator não tem, assim, valor e conteúdo absolutos, mas se constitui como uma categoria que se desenvolve social e historicamente. Dessa forma, o próprio paradoxo do ator é um fenômeno historicizável: “ao invés de um paradoxo do ator estabelecido de uma vez por todas para todos os tempos e povos, temos diante de nós uma série de paradoxos históricos de atores de determinados meios e épocas”. Trata-se de um movimento teórico distinto daquele realizado por Stanislávski, para quem existe uma certa concepção de perejivânie – experiência do vivo – que marca um tipo específico de teatro com valor artístico, isto é, o teatro da perejivânie. Se, por um lado, Vigotski trouxe à tona o aspecto social da vivência cênica e o inseriu numa compreensão materialista e histórica, Stanislávski operacionalizou esse conceito no âmbito individual, para construir sua própria prática e pedagogia teatral, as quais, por sua vez – vistas sob a ótica vigotskiana –, respondem a tarefas artísticas e estilísticas específicas e historicamente determinadas.

  • 1
    Para mais informações, ver: Vigotski (2023).
  • 2
    Dossiê Temático organizado por: Priscila Nascimento Marques https://orcid.org/0000-0002-7111-6372 eAna Luiza Bustamante Smolka https://orcid.org/0000-0002-2064-3391.
  • 4
    Normalização, preparação e revisão textual: Leda Maria de Souza Freitas Farah. leda.farah@terra.com.br
  • 5
    Apoio: Fapesp 2015/17830-1; Fapesp 2020/04798-0.
  • 6
    Konstantin Stanislávski (1863-1938) foi um ator, diretor e pedagogo teatral russo. Com Vladímir Nemiróvitch-Dântchenko (1858-1943), Stanislávski foi um dos fundadores do Teatro de Arte de Moscou em 1898 e trabalhou durante muitos anos sobre o que se costuma chamar de Sistema de Stanislávski, um sistema de elementos interarticulados da prática do ator, com o objetivo de produzir a vivência cênica (perejivânie) como uma experiência do vivo.
  • 7
    Tanto o conceito de experience, de Dewey e James, e Erlebnis, de Dilthey, aparecem em textos russos como perejivânie. Em alemão, assim como em russo e em português, e diferentemente do inglês, há dois vocábulos para o campo semântico de experiência: Erlebnis e Erfahrung, sendo que o primeiro tem em seu radical o verbo leben (viver) e, portanto, estaria mais próximo a perejivânie (derivada do verbo jit, viver), em russo, e “vivência”, em português, opção geralmente adotada nas traduções da obra de Vigotski. Tivemos a oportunidade de discorrer sobre algumas dificuldades da tradução desta palavra em português, especialmente no campo do teatro (Moschkovich, 2012aMoschkovich, D. (2012a). Prefácio do tradutor. In V. Meyerhold, Do teatro. Iluminuras., p. 14). O prefixo pere tem duas possibilidades de tradução. A primeira, historicamente mais utilizada, equivale ao latino re (daí alguns autores apostarem em revivescência). O sentido do prefixo pere em perejivânie, no entanto, é o do movimento de um ponto a outro, equivalente ao latino trans. Para uma tradução adequada do termo (visando escapar de um interessante, porém confuso neologismo transvivência), temos apostado, nas traduções teatrais, pelo binômio vivênica/experiência do vivo, utilizadas como sinônimos e complementares. Quando a isso, ver a nota de rodapé para Knebel (2016, p. 26)Knebel, M. (2016). Análise-ação. Práticas das ideias teatrais de Stanislávski. Editora 34.. Para este artigo, dadas as diferentes traduções encontradas para perejivânie nos campos dos estudos vigostkianos e stanislavskianos, preferimos manter, sempre que possível, a palavra russa transliterada.
  • 8
    Denis Diderot (1743-1784), filósofo e dramaturgo, foi um dos principais nomes do Iluminismo francês.
  • 9
    No caso de Hamlet, Vigotski fala em experiência mística (mistítcheskoe perejivânie), a partir das ideias expressas em The varieties of religious experience por William James (1999)James, W. (1999). The varieties of religious experience: a study in human nature. The Modern Library..
  • 10
    “É pois a Tragédia imitação de uma ação de caráter elevado, completa e de certa extensão, em linguagem ornamentada e com várias espécies de ornamentos distribuídas pelas diversas partes [do drama], [imitação que se efetua] não por narrativa, mas mediante atores, e que, suscitando o ‘terror e a piedade, tem por efeito a purificação das emoções’.” (Aristóteles, 2013Aristóteles (2013). Poética. In R. Duarte (Org.), O belo autônomo: Textos clássicos de estética. Autêntica; Crisálida., p. 37).
  • 11
    Vigotski retoma a forma schilleriana, segundo a qual a forma destrói o conteúdo (Schiller, 1991Schiller, F. (1991). Cartas sobre a educação estética da humanidade. EPU., p. 117). Não obstante, devemos levar em conta o alerta de Iarochévski (2013, p. 180)Iarochévski, M. G. (2013). L. S. Vigotski: v poiskakh novoi psikhologuii [L. S. Vigotski: em busca de uma nova psicologia]. Knijni Dom Librokom. de que por destruição não se deve entender a eliminação do conteúdo em prol do domínio de uma forma vazia, não semântica, mas a “descoberta de uma associação especial entre forma e conteúdo, inerente à arte, específica de uma determinada organização desse conteúdo, que conferiria a ele um caráter de realidade estética, capaz de impactar de outro modo o comportamento e a estrutura interna da personalidade humana, diferentemente de outros fenômenos da cultura”.
  • 12
    Sobre esse último ponto, ressalta-se que a vivência estética está voltada para a vida real e para a construção do futuro. Assim, ainda que a vivência e a emoção estética sejam específicas, distinta das cotidianas, o efeito delas se dá sobre as relações entre indivíduo e sociedade e, portanto, repercute na vida social. Para Vigotski, a arte serve não ao adornamento, mas à reelaboração criativa da vida. Nesse sentido, o autor incorpora de maneira entusiasmada o lema do movimento futurista expresso por Tchuják (1923, p. 12)Tchuják, N. F. (1923). Pod znákom jiznestroiêniia (opit ossoznániia iskusstva dnia) [Sob a bandeira da construção da vida (experiência de conscientização sobre a arte do dia)]. LEF, 1. sobre a arte como forma de construção da vida: “[…] a arte é apenas um método de construção da vida quantitativamente peculiar, temporário, que envolve o predomínio das emoções, e como tal, não pode ficar isolado ou, menos ainda, prolongadamente independente em relação a outras formas de construção da vida”.
  • 13
    Vejam-se, por exemplo, as fórmulas encontradas em Psicologia da arte: “a arte é o social em nós” (Vigotski, 2001Vigotski, L. S. (2001). Psicologia da arte (Paulo Bezerra, Trad.). Martins Fontes., p. 315) e a definição de arte como técnica social do sentimento (Vigotski, 2001Vigotski, L. S. (2001). Psicologia da arte (Paulo Bezerra, Trad.). Martins Fontes., p. 308).
  • 14
    Com o objetivo de realizar as necessárias generalizações, Vigotski (2001)Vigotski, L. S. (2001). Psicologia da arte (Paulo Bezerra, Trad.). Martins Fontes. organiza o estudo “do mais simples para o mais complexo”, isto é “a fábula, a novela e a tragédia como três formas literárias que gradualmente se complexificam e se sobrepõem umas às outras” (p. 103).
  • 15
    Como observamos em: “A sensibilidade nunca se apresenta sem fraqueza de organização” (Diderot, 1985Diderot, D. (1985). Textos escolhidos (Marilena de Souza Chaui & J. Guinsburg, Trads. e notas). Abril Cultural., p. 164).
  • 16
    Benoît-Constant Coquelin (1841-1909) foi um dos maiores atores da Comédie Française do século XIX. Stanislávski o considerava um expoente da arte da representação.
  • 17
    Sarah Bernhardt (1844-1923) foi uma famosa atriz francesa do século XIX, considerada também, por Stanislávski, um dos maiores expoentes do que este chamava de “arte da representação” (iskusstvo predstavléniia).
  • 18
    A elaboração vigotskiana sobre a psicologia concreta que aparece no texto sobre a psicologia do ator é também esboçada no manuscrito que ficou conhecido sob o título “Psicologia concreta humana” (Vigotski, 2005Vigotski, L. S. (2005). Konkriétnaia psikhológuiia tcheloviéka. Psikhológuia razvítiia tcheloviéka [Psicologia concreta do ser humano. Psicologia do desenvolvimento humano]. Smysl.).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Dez 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    01 Jul 2021
  • Revisado
    23 Fev 2022
  • Aceito
    19 Ago 2022
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