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Igualdade, Diferença e Conhecimento: o que pode uma base curricular comum em meio à “tensão” entre direitos? 1 1 Editor responsável: Maurício Ernica. https://orcid.org/0000-0001-9911-7011 2 2 Normalização, preparação e revisão textual: Leda Maria de Souza Freitas Farah – leda.farah@terra.com.br 3 3 Apoio: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior: CAPES/PROEX PUC-RIO: Código de Financiamento 001, Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ), CNPQ: 314628/2020-7

Resumo

Partindo de um cenário de desigualdades educacionais que há muito caracteriza a realidade brasileira, o presente texto busca investigar algumas das diferentes concepções sobre o conhecimento escolar e sua distribuição, que preveem justificativas e encaminhamentos distintos para esse quadro. Nesse processo, destacam-se o papel que uma base curricular comum poderia desempenhar nas diferentes perspectivas e as controvérsias que giram em torno da proposta, a partir de um tensionamento entre o direito à igualdade e à diferença. Uma terceira dimensão de direito é então abordada, como parte de uma tentativa de superação daquilo que alguns autores vêm considerando ser uma “crise” nas teorias sobre currículo (Young).

Palavras-chave
desigualdades socioeducacionais; diferenças socioculturais; conhecimento; base nacional comum

Abstract

Taking as a starting point the context of educational inequalities which has long characterized the Brazilian case, the present article aims to investigate some of the different conceptions regarding school knowledge and its distribution, which foresee different justifications and solutions for this scenario. In this process, we highlight the role that a national curriculum framework could play in the different perspectives and controversies around the proposal, from the tension between the right to equality and the right to difference. A third dimension of the idea of right is then brought up to discussion, as an attempt to overcome what some authors consider to be a “crisis” in curriculum theory (Young).

Keywords
socio-educational inequalities; sociocultural differences; knowledge; national curriculum framework

Introdução

Nos últimos anos, a comunidade acadêmica do campo educacional tem-se visto envolvida em acalorados debates acerca da adoção de uma base comum curricular oficial em nível nacional. De fato, as controvérsias geradas pela proposta foram objeto de discussão por parte não apenas de agentes vinculados à academia, mas também de demais profissionais da educação e segmentos da sociedade civil como um todo, que tenderam ao agrupamento em posicionamentos mais favoráveis ou contrários à então iminente política, com destaque para os últimos.

Como aponta Cossentin (2017)Cossetin, V. L. F.(2017). Uma leitura ambivalente sobre a adoção de uma base curricular nacional: para fazer justiça à reflexividade da filosofia da educação.Educar em Revista, 66, 295-311., contudo, os debates provocados pela chamada BNCC vão muito além da proposta oficial em questão: referem-se, na realidade, àquilo que pressupõem e significam a construção de uma base comum e sua implementação nas diversas escolas brasileiras. Por um lado, a iniciativa é vista de forma positiva por aqueles que enfatizam a universalidade da educação e do direito a ela enquanto um direito à igualdade e à inserção social. Nesse sentido, a escola, como instituição republicana e democrática, desempenharia um importante papel na diminuição das desigualdades sociais. Por outro lado, um projeto como esse seria considerado prejudicial à garantia do direito à diferença e contraditório à realidade educacional do País, marcada por contingências locais e ampla diversidade cultural. Esta, por sua vez, acabaria sendo negada em prol de uma uniformização incoerente com a realidade de seus contextos de implementação. Dessa forma, contribuiria para reforçar e reproduzir desigualdades já existentes.

Nos limites do presente ensaio, buscamos analisar alguns desses pressupostos que estão por trás da própria ideia de uma base curricular comum e que dão origem a muitos dos dissensos verificados na discussão da política em si. Desse modo, em vez de debruçarmo-nos sobre o texto oficial, procuramos explorar algumas das tensões que lhe são subjacentes, como aquelas entre universalismo e relativismo, igualdade e diferença, e a aparente disputa pelo que se acredita ser o direito a cada uma delas. A decisão por retomar o foco nos princípios de base de uma política já oficialmente homologada parte da percepção de que as controvérsias que os envolvem são potencialmente reavivadas no nível das escolas e/ou das redes de ensino, quando elas se defrontam com sua implementação – fase que estamos vivenciando no presente momento. Nesse sentido, as dúvidas, as inquietações e os dissensos que marcaram a trajetória da Base são agora reacendidos, ganham novos contornos nos contextos locais e possivelmente geram incertezas quanto àquilo exatamente que se deseja implementar, ressignificar ou resistir. Além disso, o interesse sobre os conhecimentos escolares adquire nova vitalidade num momento em que se observa o crescimento do negacionismo científico e um enfraquecimento da ideia de verdade no cenário nacional.

A leitura aqui proposta busca contribuir como uma espécie de ambientação no campo que relaciona saberes escolares e desigualdades educacionais, por meio da breve revisão de uma bibliografia concentrada na área da sociologia da educação, articulada ao contexto brasileiro e às discussões específicas sobre a BNCC. O esforço em não perder de vista a temática das desigualdades se justifica pelo fato de que sua superação constitui um dos principais objetos de preocupação de políticas que buscam, ao menos em tese, a melhoria da qualidade educacional do País, dentre as quais se enquadraria a BNCC. Dessa forma, ao longo da presente discussão, buscamos atentar para o potencial que uma iniciativa do gênero apresentaria em relação à redução ou reprodução das profundas desigualdades educacionais que caracterizam o contexto brasileiro.

Acreditamos que esse esforço de síntese pode ser particularmente útil àqueles que buscam uma compreensão inicial das diversas disputas que são travadas em torno de políticas educacionais recentes, que, como afirma Moreira (2003)Moreira, A. F. B. (2003). Currículos e programas no Brasil (10ª ed.). Papirus., têm nos saberes escolares seu principal instrumento de concretização. Desse modo, procuramos contribuir para as análises críticas a serem desenvolvidas, por exemplo, por professores em formação ou por aqueles que eventualmente não tenham acompanhado de perto as discussões sobre a adoção de uma base comum anteriormente, e que agora são confrontados com novos debates e embates quando de sua implementação.

Para tanto, o presente texto está dividido em quatro seções, para além desta introdução. Na primeira seção, buscamos traçar um breve diagnóstico do cenário de desigualdades educacionais que vem sendo observado no Brasil, a partir de sua articulação a fenômenos semelhantes ocorridos em outros países que tiveram seus sistemas educacionais ampliados ao longo do século XX. Em seguida, revisitamos as contribuições críticas acerca do fracasso escolar, desenvolvidas inicialmente nesses mesmos países, que trazem para o centro da discussão sobre as desigualdades de desempenho discente a questão dos conhecimentos eleitos. Na terceira seção, passamos a um aprofundamento da temática curricular à luz dos estudos sobre multiculturalismo de corte pós-crítico, que evidenciam tensões entre universalismo e relativismo cultural, e direito à igualdade e à diferença. Por fim, recorremos aos trabalhos mais recentes de Young (2009Young, M. (2009). Curriculum theory and the problem of knowledge: a personal journey and an unfinished project. In L. Waks, & E. Short (Eds.), Leaders in curriculum studies: Intellectual self portraits. Sense Publishers., 2013)Young, M. (2013). Superando a crise na teoria do currículo: uma abordagem baseada no conhecimento. Cadernos Cenpec, 3(2), 225-250., autor que participou ativamente das críticas exploradas na segunda seção, e cujas contribuições atuais (ainda que objeto de ulteriores críticas) representam uma tentativa de superar o que considera ser uma crise na teoria do currículo, com base em um apelo ao “direito ao conhecimento” por parte dos alunos. Nesse momento, buscamos relacionar certas estratégias argumentativas que têm marcado o debate acerca da BNCC às considerações do autor sobre uma perda de foco que estaria sendo verificada em algumas críticas realizadas por teóricos do currículo. Destacamos, ainda, a importância de revisitar esse debate em épocas de negacionismo e obscurantismo no contexto nacional.

A expansão do acesso e a resultante desigualdade de sucesso

É praticamente impossível discutir saberes escolares sem relacioná-los a desigualdades sociais, uma vez que os sistemas educacionais foram historicamente desenvolvidos em sociedades estruturadas por relações sociais desiguais, repercutindo profundamente sobre o rendimento escolar (Valle, 2014Valle, I. R. (2014). Sociologia da Educação: currículo e saberes escolares (2ª ed.). Editora da UFSC., p. 20). A expansão pela qual esses sistemas passaram, sobretudo ao longo do século XX, de forma a incorporar outros grupos populacionais para além de uma pequena elite socioeconômica, é um fenômeno característico das chamadas sociedades modernas, que buscavam reorganizar a estratificação social a partir de outras bases que não a hereditária. Em outras palavras, se anteriormente a posição social dos indivíduos era definida de acordo com seu pertencimento familiar, na então modernidade esse processo deveria ter como base as competências adquiridas por cada um deles ao longo de um “processo educacional competitivo”. Dessa forma, a ampliação do acesso à escolarização se deu em meio às promessas de uma escola “meritocrática”, que contribuiria para que existissem “cada vez mais oportunidades para que os relativamente desfavorecidos consigam vencer através da seleção, extraordinariamente regulamentada por normas universalistas” (Parsons, 1974Parsons, T. (1974). O sistema das sociedades modernas. Pioneira., p. 119). Essas promessas, no entanto, não se concretizaram.

Um importante marco na ruptura com essa visão “otimista” foi a divulgação de diversas pesquisas macrossociológicas – apoiadas em enquetes quantitativas e análises estatísticas – que, encomendadas pelos governos inglês, francês e estadunidense4 4 Tendo sua origem principal na Inglaterra, dentro do que se costuma chamar de “aritmética política” (o cálculo das chances de atingir etapas diversas no processo educacional que alunos advindos de diferentes contextos sociais teriam), alguns estudos que se apoiaram nessa abordagem sociológica empírica e que ganharam destaque nesse período foram o Relatório Coleman nos Estados Unidos, em 1966, e os trabalhos realizados dentro do Instituto Nacional de Estudos Demográficos (INED), na França. Para maiores informações, ver Nogueira (1995). a partir do final da década de 1950, buscavam relacionar acesso à escola e mobilidade social. Os resultados desses estudos apontavam que, a despeito da ampliação do acesso, mantinham-se fortes relações entre o desempenho escolar e a origem social, étnica e econômica dos alunos, a qual parecia determinar seu alcance dentro do sistema.

No caso brasileiro, em que a expansão escolar ocorreu tardiamente, os impactos verificados sobre a estrutura de desigualdades não foram diferentes. Em épocas de acesso restrito à instituição escolar, historicamente reservada “à preparação das individualidades condutoras” (Schwartzman et al., 2000Schwartzman, S. Bomeny, H. M. B., & Costa, W. M. R. (2000). Tempos de Capanema. Paz e Terra; Fundação Getúlio Vargas., p. 210), as principais expectativas de melhoria da educação e redução das desigualdades sociais eram depositadas em seu processo de expansão, o qual se tornou objeto de demanda popular. De fato, como pontuado por Nunes (2000)Nunes, C. (2000). O “velho” e “bom” ensino secundário: momentos decisivos. Revista Brasileira de Educação, 14, 35-60., a ampliação do acesso ao ensino secundário no Brasil – por meio, por exemplo, da abertura de ginásios públicos – foi fruto da pressão feita por parte das camadas populacionais urbanas, com destaque para as médias e operárias, organizadas em torno de movimentos reivindicatórios pela democratização da escolarização. Dessa forma, por acreditarem que a escola pós-primária traria melhores oportunidades de ascensão social, tais grupos demandavam maior acesso a esse segmento, na expectativa de poder usufruir igualmente dos bens culturais que somente as classes mais abastadas pareciam alcançar, os quais, por sua vez, lhes permitiriam obter retornos desejados no mercado de trabalho.

Essa distribuição desigual das oportunidades de escolarização teria sido responsável, na ótica de autores como Oliveira e Araújo (2005)Oliveira, R. P., & Araujo, G. C. (2005). Qualidade do ensino: uma nova dimensão da luta pelo direito à educação. Revista Brasileira de Educação, 28, 5-24., pela primeira dimensão que assumiu a ideia de qualidade educacional, centrada na perspectiva do acesso à escola. No entanto, cabe destacar que a dimensão dos conhecimentos escolares (focalizados mais adiante) sempre esteve presente na discussão, desde esse primeiro momento, ainda que de forma implícita. Afinal, como pontua Soares (2014, p. 73)Soares, M. (2014). Linguagem e escola: uma perspectiva social (17ª ed.). Ática.: “[as camadas populares] reivindicam o direito de acesso à escola porque reconhecem que os conhecimentos e habilidades de que as classes dominantes mantêm o monopólio [ênfase adicionada] são indispensáveis como instrumento de luta contra as desigualdades econômicas e sociais.”.

Contudo, observou-se uma frustração similar àquela verificada em outros países que haviam apostado no potencial redutor de desigualdades relacionado à expansão escolar. Desse modo, as dificuldades de permanência com sucesso enfrentadas pelos alunos recém-ingressados na escola teriam dado origem a outras duas dimensões de qualidade educacional. Essas, por sua vez, estariam centradas sobre o fluxo escolar (progressão ao longo das séries e etapas de ensino) e a aprendizagem efetiva dos estudantes durante esse percurso (Oliveira & Araújo, 2005Oliveira, R. P., & Araujo, G. C. (2005). Qualidade do ensino: uma nova dimensão da luta pelo direito à educação. Revista Brasileira de Educação, 28, 5-24.).

Diversos são os estudos nacionais que, também lançando mão de um olhar mais macrossociológico, evidenciam esse cenário de desigualdades escolares no contexto brasileiro, apontando para a persistência da estratificação educacional a despeito da expansão escolar. Silva (2003)Silva, N. V. (2003). Expansão escolar e estratificação educacional no Brasil. In N. V. Silva, & C. Hasenbalg (Eds.). Origens e destinos: desigualdades sociais ao longo da vida (pp. 105-138). Topbooks. observa, por exemplo, um deslocamento das desigualdades de chances de escolarização para as etapas mais elevadas de ensino. Fernandes (2005)Fernandes, D. C. (2005). Race, Socioeconomic development and the education stratification process in Brazil. Research in Social Stratification and Mobility, 22, 365-422., por sua vez, aponta para um aumento no efeito de características como raça e origem urbana ou rural no alcance educacional dos estudantes ao longo da expansão educacional. Em estudo mais recente, Alves et al. (2016)Alves, M. T., Soares, J. F., & Xavier, F. P. (2016). Desigualdades educacionais no ensino fundamental de 2005 a 2013. Hiato entre grupos sociais. Revista Brasileira de Sociologia, 4, 49-81. reforçam esses achados no plano da discussão sobre o aprendizado dos estudantes, ao examinar as desigualdades entre grupos de alunos com base em variáveis como sexo, cor e nível socioeconômico, a partir de seu desempenho nas edições de 2005 a 2013 da Prova Brasil. Os autores constatam que, apesar de uma melhora geral dos índices obtidos ao longo das diferentes avaliações, a desigualdade entre os grupos não somente permanece, como parece se acentuar. Alunos com nível socioeconômico (NSE) mais baixo podem apresentar uma defasagem de aprendizagem de dois ou mais anos, quando comparados a alunos de NSE mais elevado, inseridos no mesmo ano escolar. Quando as diferentes variáveis são analisadas de forma combinada, essa diferença pode chegar a mais de três anos. Esse seria o caso, por exemplo, de meninos pretos de baixo nível socioeconômico, cujo aproveitamento em provas de Leitura se mostrou significativamente inferior àquele alcançado por meninas brancas de NSE mais alto. Do mesmo modo, meninas pretas de baixo nível socioeconômico acumulam maior desvantagem em provas de Matemática quando comparadas a meninos brancos de NSE mais elevado.

Estudos como esses sugerem, nas palavras dos próprios autores, que “a melhoria das médias de proficiências tem funcionado como um círculo virtuoso apenas para os grupos sociais mais favorecidos” (Alves et al., 2016Alves, M. T., Soares, J. F., & Xavier, F. P. (2016). Desigualdades educacionais no ensino fundamental de 2005 a 2013. Hiato entre grupos sociais. Revista Brasileira de Sociologia, 4, 49-81., p. 49). Tais conclusões reforçam a importância de atentar para aspectos da desigualdade nas discussões sobre qualidade da educação, levando esse conceito a incorporar a dimensão da equidade. Esta, por sua vez, conforme apontado pelos autores, estaria relacionada à noção de justiça, um conceito cujo significado se encontra em permanente disputa e, quando aplicado ao campo educacional, inevitavelmente incorpora discussões sobre conhecimento e cultura. Na perspectiva de Dubet (2004)Dubet, F. (2004). O que é uma escola justa? Cadernos de Pesquisa, 343(123), 539-555., por exemplo, um sistema escolar justo (ou menos injusto) seria aquele que busca, entre outras coisas, proteger os alunos menos favorecidos, ao garantir-lhes “o acesso a bens escolares fundamentais” (p. 553).

No contexto brasileiro, é possível traçar paralelos entre essa perspectiva e a proposta oficial de uma base curricular que estabeleceria o conjunto de “aprendizagens essenciais” a serem desenvolvidas por todos os alunos da Educação Básica, expressando “a igualdade educacional sobre a qual as singulares devem ser consideradas e atendidas” (Brasil, 2017Brasil (2017). Ministério da Educação. Base Nacional Curricular Comum. http://basenacionalcomum.mec.gov.br, 2017.
http://basenacionalcomum.mec.gov.br...
, p.15). Um dos grandes focos de disputa e controvérsia, no entanto, reside justamente no que seria esse “mínimo cultural” e em quem seria responsável por defini-lo, como será mais bem explorado adiante.

A presente seção buscou tratar brevemente da forma como as profundas desigualdades educacionais verificadas no Brasil, analogamente ao que vinha acontecendo em outros países que expandiram seu sistema escolar, aos poucos deixaram de se concentrar sobre o acesso à escola e tornaram-se mais evidentes em relação às chances de sucesso dos diferentes grupos – compreendido enquanto progressão ao longo do sistema e aproveitamento efetivo dessa experiência em termos de aprendizagem. Mantendo um esforço comparativo com o cenário internacional, a próxima seção recorre aos estudos desenvolvidos dentro da Nova Sociologia da Educação, na tentativa de criar sentido sobre o chamado “fracasso escolar” vivenciado pelos grupos socialmente menos privilegiados. A partir desse momento, ganham destaque as discussões a respeito do caráter do conhecimento e da cultura escolar, e em que medida esse caráter seria responsável pelo malogro da escolarização de massa.

A perspectiva bourdieusiana e o direito à igualdade: a problemática dos conhecimentos eleitos

Ao passo que os estudos sobre estratificação colocavam em evidência as desigualdades sociais no alcance educacional a partir da análise de um grande conjunto de dados estatísticos, outros teóricos buscavam atribuir sentido para essa realidade que se desvelava com base em reflexões críticas da sociologia do conhecimento. Foi nesse contexto que se desenvolveu inicialmente na Inglaterra a chamada “Nova Sociologia da Educação”, que tinha como um de seus principais fundamentos a ideia de que o mundo – e, consequentemente, fenômenos como a educação, o conhecimento e o próprio currículo – era uma construção social.

Um importante marco desse movimento é comumente identificado na publicação, em 1971, do livro Knowledge and control: New directions for the sociology of education, que, editado por Michael F. D. Young, contava com a contribuição de autores como Pierre Bourdieu e Basil Bernstein. A principal crítica apresentada na obra se dirigia à concepção tecnicista do currículo, que o tratava como algo fixo, neutro, ao qual todos deviam se adaptar sem questionamento dos processos de seleção e transmissão por trás dos conhecimentos que o compunham. Passou-se a questionar, dessa forma, o que estava sendo ensinado, por que razão, e quem detinha o poder de definição, uma vez que essas dinâmicas teriam implicações diretas sobre a exclusão de determinados grupos. A estratificação social estaria, nesse sentido, articulada à estratificação do conhecimento, operando de modo a marginalizar os saberes das classes trabalhadoras e manter o monopólio do poder das classes dominantes5 5 Quando os estudos desenvolvidos dentro da chamada “Nova Sociologia da Educação” chegam aos Estados Unidos, os questionamentos desses processos de seleção e da estratificação dos saberes passam a englobar outras dimensões culturais para além da referência à classe social. Trabalhos como o de Michael Apple (1982) são um importante referencial nesse sentido. , dotadas dos saberes considerados elevados e/ou legítimos.

Uma das principais referências nesse momento foi a chamada teoria da reprodução, desenvolvida principalmente pelo sociólogo francês Pierre Bourdieu. Contrariamente a uma visão da escolarização formal como uma via libertadora, a instituição escolar era concebida como uma instância reprodutora de desigualdades preexistentes, na medida em que selecionaria um determinado “arbitrário cultural” para compor o currículo a ser ensinado. O currículo eleito, que então ganhava legitimidade e aparente caráter universal, dissimulava sua vinculação aos conhecimentos particulares das classes dominantes. A maior proximidade entre a cultura valorizada no interior da escola e aquela transmitida no seio familiar dos alunos provenientes de contextos mais privilegiados acabava por favorecer seu sucesso escolar. De modo contrário, a maior distância entre a cultura escolar e as experiências prévias dos filhos das camadas populares potencializava suas chances de protagonizar o chamado “fracasso escolar”.

Para o autor, no entanto, a forma mais efetiva – e possivelmente mais perversa – de reprodução das desigualdades iria além da seleção desse currículo. Talvez até mesmo mais importante do que ela seria a valorização de uma relação “natural” com a cultura escolar, que só os “herdeiros” poderiam ter, em oposição à oferta para todos de um ensino sistemático e metódico da cultura exigida. Nesse sentido, a igualdade puramente formal de tratamento que a escola oferecia aos alunos em condições desiguais de êxito conformaria um mecanismo de reprodução da condição subalterna das classes trabalhadoras e de legitimação das desigualdades sociais preexistentes à entrada no sistema educacional. É nesse sentido que Bourdieu (2015)Bourdieu, P. (2015) A escola conservadora: as desigualdades frente à escola e à cultura. In M. A. Nogueira, & A. Catani, (Orgs.), Escritos de Educação (16ª ed., pp. 43-72). Vozes. pontua: “Deixando de dar a todos, através de uma educação metódica, aquilo que alguns devem ao seu meio familiar, a escola sanciona, portanto, aquelas desigualdades que somente ela poderia reduzir [ênfases adicionadas] (p.68).

Nessa citação, o autor abre certo espaço para uma atuação escolar redutora das desigualdades. Para tanto, seria necessário o que chamou de “pedagogia racional e universal”: uma pedagogia que

se obrigaria a tudo em favor de todos e se organizaria metodicamente em referência ao fim explícito de dar a todos os meios de adquirir aquilo que não é dado, sob a aparência do dom natural, senão às crianças das classes privilegiadas.

(Bourdieu, 2015Bourdieu, P. (2015) A escola conservadora: as desigualdades frente à escola e à cultura. In M. A. Nogueira, & A. Catani, (Orgs.), Escritos de Educação (16ª ed., pp. 43-72). Vozes., p. 59)

A visão crítica apresentada por Bourdieu (2015)Bourdieu, P. (2015) A escola conservadora: as desigualdades frente à escola e à cultura. In M. A. Nogueira, & A. Catani, (Orgs.), Escritos de Educação (16ª ed., pp. 43-72). Vozes. sobre a cultura escolar enquanto composta por saberes e valores mais “universalizados” do que “universais” propriamente ditos – visto que partiriam da seleção de um repertório particular – será retomada e desenvolvida por estudiosos do multiculturalismo de corte pós-crítico, como exploraremos a seguir. No entanto, é importante lembrar que, ao fazer referência a uma pedagogia metódica, racional e universal, o autor de certa forma deixa de lado a problematização dos conteúdos curriculares em si, e passa a focalizar em estratégias de redistribuição daquilo que seria, nas palavras já mencionadas de Soares (2014, p. 47)Soares, M. (2014). Linguagem e escola: uma perspectiva social (17ª ed.). Ática., “os conhecimentos e habilidades de que as classes dominantes mantêm o monopólio”.

Essa observação a partir das contribuições clássicas de Bourdieu é relevante para a presente discussão, uma vez que os elementos que sustentarão os principais posicionamentos em relação à proposta de uma base curricular comum, dos mais favoráveis aos mais contrários, dependem do tipo de leitura realizada sobre a natureza do conhecimento escolar e sua transmissão. Por exemplo, se o princípio do qual se parte é o de que os conhecimentos e as habilidades escolares têm alguma validade em si, independentemente da origem social que apresentam, e o problema reside no seu domínio exclusivo por alguns segmentos, parte da solução incidiria sobre a democratização desses conteúdos. Essa perspectiva enfatiza a problemática da desigualdade no acesso a bens culturais que deveriam ser distribuídos de forma mais equânime entre os grupos e atribui destaque ao direito de todos os alunos à igualdade de oportunidades escolares.

De fato, pesquisas nacionais realizadas no início das discussões recentes sobre a adoção de uma base curricular comum, que buscaram mapear os posicionamentos em relação à ideia de base – focalizada no presente ensaio –, apontavam que as perspectivas mais favoráveis compartilhavam de princípios semelhantes aos expostos acima. É o caso do estudo realizado pelo CENPEC6 6 Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária durante os meses finais de 2013 e iniciais de 2014 (publicado em 2015), que analisou dados oriundos de entrevistas conduzidas com 1037 7 Segundo nota do relatório de pesquisa, uma entrevista foi excluída da amostra inicial por “inconsistências nas respostas”, resultando em um total de 102 entrevistas analisadas (CENPEC, 2015, p.8). agentes do campo educacional, dentre eles: professores universitários e da educação básica pública, gestores públicos (secretários municipais e estaduais de Educação) e gestores de escolas privadas, representantes de organizações não governamentais e de associações da sociedade civil, consultores e sindicalistas.

Aqueles que se mostravam majoritariamente favoráveis à ideia de um núcleo mínimo ou comum, a ser complementado em cada escola, salientavam o entendimento do direito à educação básica como direito de todos à integração social, reconhecendo a dívida da sociedade brasileira com os grupos excluídos. Partindo do princípio de que a escola não seria, em si, uma instituição inevitavelmente reprodutora de desigualdades, mas de que certos erros no sistema estariam gerando seu “mau funcionamento”, tais falhas poderiam ser corrigidas a partir de iniciativas como a formulação de um currículo bem estruturado. Esse, por sua vez, seria um “passo fundamental para dar racionalidade ao sistema” (CENPEC, 2015CENPEC. (2015). Consensos e dissensos sobre a Base Nacional Comum Curricular.http://www.cenpec.org.br/2015/09/21/relatorio-da-pesquisa-consensos-e-dissensos-sobre-a-base-nacional-comum-curricular.
http://www.cenpec.org.br/2015/09/21/rela...
, p. 45). Dentro dessa perspectiva, o acesso de todos a conhecimentos tidos como fundamentais seria um meio de enfrentar a forte desigualdade social e escolar existente no País, contribuindo para a inclusão das camadas sociais historicamente excluídas. Seria papel da escola, portanto, promover uma melhor distribuição desses conhecimentos essenciais para um projeto de integração social, o que seria facilitado por um determinado nível de padronização curricular. A própria presença de termos como “racionalidade” e “acesso de todos” possibilita comparações entre essa perspectiva e a ação pedagógica “racional e universal” mencionada por Bourdieu.

De acordo com o estudo, tais posicionamentos mais próximos do polo favorável à política foram encontrados principalmente entre os entrevistados vinculados à sociedade civil organizada, gestores educacionais públicos e alguns professores do ensino fundamental, juntamente com um grupo minoritário de professores vinculados à academia. Em meio a este último, podemos destacar como exemplo a perspectiva de Micarello (2016)Micarello, H. A. L. S. (2016). A BNCC no contexto de ameaças ao Estado Democrático de Direito. EccoS – Revista Científica, 41, 61-75., que compreende o sentido e a relevância de uma base nacional comum a partir de seu papel como política pública de Estado, o qual deve buscar garantir a qualidade social da educação dentro de uma sociedade democrática de direitos. Desse modo, ganha importância a definição de conhecimentos fundamentais aos quais todos devam ter acesso – a ser realizada coletivamente entre os diferentes atores sociais por meio da tessitura de entendimentos – juntamente com o reconhecimento e o acolhimento da diversidade.

Por outro lado, se o ponto de partida da discussão recai sobre a problematização da natureza do conhecimento escolar em si, considerado apenas enquanto fruto da seleção de um repertório particular, realizada por grupos com maior poder de influência, elege-se outro foco de problema e, consequentemente, prevê-se outro tipo de solução. Nessa perspectiva, a adoção de uma base curricular comum poderia significar menos uma tentativa de democratização de oportunidades, e mais uma estratégia homogeneizadora de imposição cultural. A próxima seção se dedica justamente ao aprofundamento dessa perspectiva crítica e de sua relação com posicionamentos mais contrários à proposta da BNCC, recorrendo a contribuições advindas dos estudos culturais e pós-críticos no campo educacional.

Multiculturalismo, pós-estruturalismo e Educação: a importância do direito à diferença

Em artigo dedicado à análise de tensões entre a igualdade e a diferença em um mundo cada vez mais multicultural, Candau (2008)Candau, V. M. (2008). Direitos humanos, educação e interculturalidade: as tensões entre igualdade e diferença.Revista Brasileira de Educação, 13(37), 45-56. destaca que, embora o direito de todos os seres humanos à igualdade tenha sido majoritariamente enfatizado na modernidade, parece estar em curso uma crescente reivindicação do direito à diferença, no que passou a ser chamado de pós-modernidade. Apesar da tendência de marcar o início dessa “condição contemporânea” no período pós-guerra, a partir dos anos 1950, a também chamada modernidade líquida ou fluida se refere mais a uma descontinuidade na lógica do pensamento moderno e iluminista do que a um recorte temporal propriamente dito (Lopes, 2013Lopes, A. C. (2013). Teorias pós-críticas, política e currículo. Educação, Sociedade & Culturas, 39, 7-23.). Nesse sentido, como destaca a autora, trata-se de “um tempo de fim das utopias e das certezas, de desmoronamento da ideia de verdade centrada na prova empírica, na objetividade, na natureza ou na evidência matemática” (p. 8).

No que se refere especificamente à educação e sua relação com as desigualdades, ao passo que as perspectivas críticas de teor moderno apostavam na unificação de lutas em torno da estruturação de uma sociedade mais justa e igualitária, que passava também pela emancipação de sujeitos por meio do acesso a conhecimentos que garantiriam esse projeto comum, as teorias desenvolvidas na pós-modernidade tendem a adotar outro enfoque. Em leituras frequentemente denominadas pós-críticas e pós-estruturalistas, tais projetos são tidos mais como utópicos e incertos, visto que prevalecem os dissensos, a ausência de clareza, e a multiplicidade e a fragmentação de identidades e ideologias.

No contexto brasileiro, como aponta Lopes (2013)Lopes, A. C. (2013). Teorias pós-críticas, política e currículo. Educação, Sociedade & Culturas, 39, 7-23., as teorias pós-críticas no campo do currículo se fazem presentes desde os anos 1990, tendo tido como uma de suas principais bases as reflexões foucaultianas acerca do discurso. Aprofunda-se, nessa perspectiva, a concepção da realidade como uma construção mediada pela linguagem – compreendida dentro de um paradigma pós-estruturalista que não prevê uma estabilidade dos significados e a fixação de sentidos prévios aos significantes, sob o risco de essencializá-los. Trata-se de teorias, portanto, que tendem a privilegiar a questão linguística e identitária, e a primazia do discurso sobre as estruturas. Como verificado pela mesma autora, pode-se falar em uma hegemonia de estudos que compartilham desse enfoque dentro do Grupo de Trabalho de Currículo da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd). Considerando que nesse grupo estão reunidas as principais lideranças do campo de currículo no País, pode-se concluir que a perspectiva pós-crítica desfruta atualmente de bastante legitimidade no campo acadêmico.

A partir da intensificação dos fluxos globais migratórios, passa-se a observar a crescente coexistência, em um mesmo espaço, de grupos com diferentes pertencimentos étnico-raciais, linguísticos, geográficos, religiosos, entre outros, dando origem ao que Forquin (2000)Forquin, J. (2000) O currículo entre o relativismo e o universalismo. Educação & Sociedade, 21(73), 47-70. chama de “multiculturalismo” em seu sentido descritivo. Esse cenário traz, então, a problemática cultural para o centro das discussões sobre justiça e superação das desigualdades, que em um momento anterior parecia se concentrar exclusivamente sobre questões estruturais e de disputa de classes. Para além da influência, portanto, das teorias de análise do discurso, as abordagens pós-críticas dos saberes escolares contam com a contribuição de outros estudos, comumente referenciados sob o termo guarda-chuva “estudos culturais”.

Uma das principais premissas que os estudos antropológicos e culturais trazem às discussões em educação é a ideia de relativismo cultural, segundo o qual todas as culturas – enquanto sistemas de significado que dão sentido à ação humana e que permitem a interpretação da ação alheia (Hall, 1997Hall, S. (1997). A centralidade da cultura: notas sobre as revoluções culturais do nosso tempo. Educação e Realidade, 2(22), 15-46.) – são igualmente legítimas. Nessa perspectiva, a diferença cultural não seria considerada deficiência, como muitas vezes ocorreria na escola, tomada enquanto instituição assentada em bases etnocêntricas. Não seriam previstas, ainda, hierarquizações entre culturas, visto que não haveria uma cultura melhor do que outra.

Considerando que questões culturais envolvidas no debate educacional costumam vir à tona a partir de sua inserção em estudos sobre multiculturalismo, cabe um breve resumo sobre a polissemia do termo e alguns de seus principais entendimentos. Ainda em diálogo com Forquin (2000)Forquin, J. (2000) O currículo entre o relativismo e o universalismo. Educação & Sociedade, 21(73), 47-70., mencionado anteriormente quando da referência a um sentido descritivo do multiculturalismo, é importante destacar o que o autor considera ser seu sentido mais prescritivo, quando se trata de uma “aplicação” ao contexto escolar. Nessa perspectiva, o autor faz uma distinção entre um multiculturalismo diferencialista, que prevê a oferta diversificada de possibilidades de escolarização para os diferentes grupos e uma abordagem que chama de “aberta e interativa”, a qual pressupõe o encontro, em uma mesma escola, de alunos com diferentes identidades culturais. Ao passo que defende esta última abordagem, o autor apresenta um questionamento que está na base de outro tipo de tensão evidenciada no debate curricular: aquela entre universalismo e relativismo.

Concomitantemente à defesa de um multiculturalismo aberto e interativo, Forquin (2000)Forquin, J. (2000) O currículo entre o relativismo e o universalismo. Educação & Sociedade, 21(73), 47-70. aponta o problema que a proposta evidencia no plano pedagógico, relacionado à definição dos critérios de seleção e justificativa dos conteúdos do ensino. Ao afirmar que “com efeito, é preciso ensinar certas coisas em vez de outras e ensiná-las como válidas e valendo para todos e não somente para um determinado grupo” (p. 62), pode-se dizer que o autor, embora tematize as tensões entre princípios relativistas e universalistas no currículo, sugere a afirmação de certo caráter universalista na instituição escolar e em seus conteúdos ensinados. Esses últimos seriam tidos, portanto, como “saberes públicos”, válidos independentemente de particularidades culturais.

Em diálogo crítico com o sociólogo francês, autores brasileiros como Candau (2000Candau, V. M. (2000). O currículo entre o relativismo e o universalismo: dialogando com Jean-Claude Forquin. Educação & Sociedade, 21(73), 79-83., 2009)Candau, V. M. (2009). Educação escolar e cultura(s): multiculturalismo, universalismo e currículo. In V. M. CANDAU (Org), Didática: Questões contemporâneas (1. ed., pp. 47-62). Forma & Ação. e Silva (2000)Silva, T. T.(2000). Currículo, universalismo e relativismo:uma discussão com Jean-Claude Forquin. Educação & Sociedade, 21(73), 71-78. problematizam a própria construção do caráter universalista desses conteúdos, questionando se aquilo que é tido como conhecimento universal não representaria, na realidade, “a universalização de saberes particulares, construídos a partir de bases etnocêntricas que se consideram portadoras de universalidade” (Candau, 2000Candau, V. M. (2000). O currículo entre o relativismo e o universalismo: dialogando com Jean-Claude Forquin. Educação & Sociedade, 21(73), 79-83., p. 81). Sinalizam, ainda, que não são explicitados os critérios que levam a tomar determinados saberes como públicos e válidos universalmente, o que remete a uma visão essencialista de conteúdos supostamente preexistentes, e não historicamente construídos.

Esse tipo questionamento em relação à natureza do conhecimento escolar, baseado em discussões levantadas pelos estudos culturais de corte pós-crítico, apresenta uma raiz sociológica bastante similar à bourdieusiana e embasa muitas das argumentações contrárias à ideia de qualquer padronização curricular. Na análise desse tipo de posicionamento, realizada pelo estudo do CENPEC (2015)CENPEC. (2015). Consensos e dissensos sobre a Base Nacional Comum Curricular.http://www.cenpec.org.br/2015/09/21/relatorio-da-pesquisa-consensos-e-dissensos-sobre-a-base-nacional-comum-curricular.
http://www.cenpec.org.br/2015/09/21/rela...
mencionado anteriormente, a escola é vista sobretudo como local de construção identitária, dado o longo processo de socialização ao qual os estudantes estão submetidos e durante o qual aprendem quem são e quais são suas aptidões. Nesse sentido, a proposição padronizada de certos conteúdos acarretaria a sua legitimação como aqueles “corretos” e “naturais”, pressupondo a existência de modos errados ou piores de se falar ou pensar. Considerando que o padrão em questão coincide com os saberes e culturas hegemônicos dos grupos dominantes – ou é mais próximo deles –, um currículo padronizado poderia gerar um efeito de exclusão dos grupos já marginalizados e o aprofundamento das desigualdades educacionais. Como alternativa, propõe-se um ensino baseado nos modos locais de produção de conhecimento, que conformam a identidade desses grupos.

Segundo o mapeamento do CENPEC, esses posicionamentos mais próximos do polo fortemente contrário à adoção de uma base comum curricular foram encontrados predominantemente entre os entrevistados vinculados ao campo acadêmico – importantes bolsistas de pesquisa, membros de comissões avaliadoras de cursos, membros do Conselho Nacional de Educação à época, entre outros –, que dispõem de considerável poder de influência e legitimidade na formação de opiniões relacionadas à questão curricular. Os resultados encontrados condizem, dessa forma, com a hegemonia da abordagem pós-crítica no campo acadêmico dedicado aos estudos de currículo no País, conforme mencionado por Lopes (2013)Lopes, A. C. (2013). Teorias pós-críticas, política e currículo. Educação, Sociedade & Culturas, 39, 7-23. anteriormente. É importante reconhecer, portanto, que os posicionamentos contrários à ideia de base comum, independentemente da forma que a política tomou ao longo de suas diferentes versões, têm sido preponderantes na academia desde o início das discussões. Nesse sentido, podemos destacar como exemplo a perspectiva de Süssekind (2014)Süssekind, M. L. (2014). As (im)possibilidades de uma Base Comum Nacional. Revista e-Curriculum, 12(3), 1512-1529., segundo a qual a uniformização de conteúdos em nível nacional cria uma “linha abissal” em relação aos currículos já existentes nas escolas, pensados e praticados por professores a partir de suas experiências vividas, e que são colocados em posição de invisibilidade e exclusão. Além disso, para a autora, esses docentes são submetidos a um controle estatal que lhes retira sua autonomia profissional, preocupação também levantada por outros atores contrários à BNCC, como o Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (ANDES-SN) e a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE).

Pode-se dizer, portanto, que, apesar da aproximação com a sociologia bourdieusiana no tocante à crítica ao caráter universalizado (e não universal) do currículo escolar, a perspectiva que enfatiza o direito à diferença e à diversidade cultural dificilmente compartilharia a mesma solução implícita na primeira. Em outras palavras, uma “pedagogia racional e universal” que prevê ações compensatórias para garantir o acesso de todos os estudantes àquilo “que não é dado ... senão às crianças das classes privilegiadas” (Bourdieu, 2015Bourdieu, P. (2015) A escola conservadora: as desigualdades frente à escola e à cultura. In M. A. Nogueira, & A. Catani, (Orgs.), Escritos de Educação (16ª ed., pp. 43-72). Vozes., p. 59) poderia ser considerada menos uma medida promotora de igualdade e mais uma estratégia assimilacionista. Esta, segundo Candau (2009)Candau, V. M. (2009). Educação escolar e cultura(s): multiculturalismo, universalismo e currículo. In V. M. CANDAU (Org), Didática: Questões contemporâneas (1. ed., pp. 47-62). Forma & Ação., seria identificada em políticas que favorecem a incorporação de grupos culturais em situação de desvantagem à sociedade tal como ela é, sem efetivamente criticar ou alterar seu caráter monocultural (presente, por exemplo, nos currículos escolares.). Essa posição, também identificada por McLaren (1997)McLaren, P. (1997). Multiculturalismo crítico. Cortez. como “multiculturalismo conservador”, defenderia, portanto, a construção de uma cultura comum, de aspirações universais, que acabaria por deslegitimar outros saberes, crenças e valores. Como já sugerido aqui, os posicionamentos contrários à adoção de uma base curricular tendem a criticar justamente a lógica assimilacionista que estaria subjacente à proposta.

Entre essa lógica e aquela chamada de diferencialista por Candau (2009)Candau, V. M. (2009). Educação escolar e cultura(s): multiculturalismo, universalismo e currículo. In V. M. CANDAU (Org), Didática: Questões contemporâneas (1. ed., pp. 47-62). Forma & Ação. – que, ao enfatizar o reconhecimento da diferença, pode acabar promovendo uma visão essencialista e estática das identidades culturais, levando a um apartheid sociocultural –, a autora se situa em busca de uma terceira via, que chama de interculturalidade e considera uma abordagem que procura promover a inter-relação entre diferentes grupos, rompendo tanto com as visões diferencialistas de culturas quanto com a perspectiva assimilacionista, que não contempla a riqueza das diferenças. Privilegiando processos de desestabilização, reconstrução e hibridização cultural, sem menosprezar as assimetrias de poder que envolvem as relações intra e inter culturas, a perspectiva intercultural buscaria romper com a tensão igualdade-diferença e relativismo- universalismo. Para tanto, promoveria uma educação para a negociação entre culturas, na perspectiva de construir um projeto comum, que lute contra formas de discriminação, mas que não prescinda do reconhecimento do direito à diferença. Nessa perspectiva, fala-se menos em valores e conhecimentos “universais” e mais em saberes “comuns” ou “transculturais”, aos quais se chegaria a partir do diálogo intercultural.

As reflexões traçadas até aqui permitem algumas considerações iniciais e a elaboração de ulteriores questionamentos. Com base no “diagnóstico” delineado na primeira seção, é possível concluir que permanecem, hoje, desigualdades historicamente observadas na apreensão do conhecimento escolar. Tais desigualdades são sociais, na medida em que determinados grupos – e não indivíduos distribuídos aleatoriamente entre grupos – apresentam maiores dificuldades na apreensão desses saberes, ao menos quando se trata de seu desempenho em avaliações de larga escala. Tais avaliações, embora indubitavelmente limitadas em sua capacidade de diagnosticar a situação da educação brasileira, algo dizem a seu respeito.

Essa constatação abriu espaço para diversos questionamentos e pontos de vista acerca de onde se localizaria a origem do problema: nos conteúdos em si, que deveriam ser questionados enquanto saberes particulares etnocêntricos que não fazem sentido para todos os alunos; ou, ainda, na monopolização desses conteúdos, que deveriam ser democratizados por terem algum valor intrínseco. As seções anteriores buscaram tratar de algumas dessas questões à luz de diferentes pressupostos teóricos.

A partir do tensionamento de diferentes perspectivas, no entanto, parecem surgir outros desdobramentos no plano reflexivo. Por exemplo, o quanto dos saberes escolares constituiria, de fato, uma universalização de particulares, e que parte deles configuraria saberes válidos transculturalmente, que justificassem uma política pública para sua garantia? Ao adotarmos uma perspectiva intercultural na educação, como seria possível a construção de um projeto comum? Como alcançar a realização de tal projeto, ainda que temporária, por meio de uma base comum que equalizasse o direito à igualdade e à diferença? Quem deveria participar, no plano da negociação cultural, do processo de definição desses saberes – especialistas, professores, os próprios alunos a partir de seus interesses?

A próxima seção busca lançar luz sobre algumas dessas questões, a partir da referência a um outro direito ao qual os alunos deveriam ter acesso, e que está estritamente relacionado às discussões sobre escola e currículo: o direito ao conhecimento.

A abordagem de Michael Young e o direito ao conhecimento “poderoso”: uma discussão a ser revisitada em tempos de “pós-verdade”

Conforme já brevemente discutido na segunda seção deste ensaio, as contribuições trazidas pela Nova Sociologia da Educação na Inglaterra a partir dos anos 1960 e 1970 são comumente percebidas como o início das teorias críticas que abandonam uma concepção tecnicista, rígida e meramente instrutiva de currículo, e passam a reorientar o foco do campo para a explicitação das relações de poder envolvidas nos processos de seleção e transmissão dos saberes escolares. Dessa forma, começa-se a observar um número cada vez maior de obras comprometidas com a identificação de um currículo oculto, o chamado “conhecimento dos poderosos” – aqueles capazes de impor seus interesses e ideologias por meio da escolarização de massa, e que assim mantinham inalterada a estrutura de desigualdades. Um dos principais autores, à época, que apontavam para a base social na produção do conhecimento era Michael F. D. Young, responsável por editar a obra também já mencionada, que viria a se tornar um marco desse movimento (Knowledge and control, publicada em 1971).

Como explorado na terceira seção, essa perspectiva foi aprofundada dentro das teorias pós-críticas, que complexificaram a análise a partir da centralidade da questão cultural e de abordagens focalizadas no discurso. Dentro da chamada pós-modernidade, ganhou ainda mais força, portanto, a ideia de que não existe uma verdade ou validade dos enunciados que seja transcontextual, sendo a plausibilidade das epistemologias apenas um reflexo da adesão de comunidades específicas (Bourdieu, 2000Bourdieu, P. (2015) A escola conservadora: as desigualdades frente à escola e à cultura. In M. A. Nogueira, & A. Catani, (Orgs.), Escritos de Educação (16ª ed., pp. 43-72). Vozes., citado por Valle, 2014Valle, I. R. (2014). Sociologia da Educação: currículo e saberes escolares (2ª ed.). Editora da UFSC., p. 73). Como pontua Lopes (2013, p. 16)Lopes, A. C. (2013). Teorias pós-críticas, política e currículo. Educação, Sociedade & Culturas, 39, 7-23., conceitos como razão e verdade são colocados em crise, e “o único consenso entre os pós-modernos é que não há possibilidade de consenso, não há autoridade final”, parecendo “não mais haver princípios que possam agir como critérios de valor universais transcendentais para coisa alguma”.

É em meio a esse contexto de “crise” que se desenvolvem as produções mais recentes de Michael Young (2009Young, M. (2009). Curriculum theory and the problem of knowledge: a personal journey and an unfinished project. In L. Waks, & E. Short (Eds.), Leaders in curriculum studies: Intellectual self portraits. Sense Publishers., 2013)Young, M. (2013). Superando a crise na teoria do currículo: uma abordagem baseada no conhecimento. Cadernos Cenpec, 3(2), 225-250., inicialmente inseridas na tradição da Nova Sociologia da Educação. Ao discutir o que deveria ser o centro de preocupação das teorias do currículo, o autor tem apresentado um reposicionamento teórico e proposto que, ao enfoque no chamado “conhecimento dos poderosos”, seja conjugada a adoção de uma perspectiva centrada no que seria o “conhecimento poderoso”, ao qual os alunos teriam o direito de acessar. Em outras palavras, para além do foco naqueles que estão tomando decisões sobre o currículo, o autor afirma a importância de olhar para o próprio conhecimento em questão e se perguntar de que forma ele pode incorporar saberes que sejam poderosos para os jovens que o adquiram, no sentido de ampliar suas possibilidades de interpretação e ação sobre o mundo.

Reconhecendo a importância dos estudos críticos, com os quais ele próprio contribuiu, o autor destaca que restringir o olhar àqueles que detêm o poder para definir o currículo gerou uma negligência em relação a um dado da realidade – o quanto alguns tipos de conhecimento podem ser efetivamente capazes de empoderar aqueles que têm acesso a eles, dentro de uma determinada conjuntura sociopolítica:

O foco no “conhecimento dos poderosos” [ênfase no original], a despeito de seus pontos fortes, quase inevitavelmente desloca a análise daquilo que se passa na escola para o que está ocorrendo com a distribuição de poder na sociedade em geral e oferece pouco aos professores e aos movimentos sociais que buscam uma abordagem mais equitativa do currículo.

(Young, 2013Young, M. (2013). Superando a crise na teoria do currículo: uma abordagem baseada no conhecimento. Cadernos Cenpec, 3(2), 225-250., p. 230)

Em suma, o autor acredita que a mudança do modelo tecnicista para a crítica ideológica tenha sido acompanhada por uma perda progressiva do objeto fundamental da teoria do currículo, ou seja, o que se ensina e aprende na escola. Esse processo poderia servir para endossar a menor atenção que governos e formuladores de políticas curriculares vêm dispensando aos teóricos enquanto especialistas na área, uma vez que seus esforços de investigação estariam centrados na análise crítica dos interesses e das relações de poder existentes por trás das definições realizadas nessas instâncias, e não sobre os critérios em si que deveriam norteá-las. Essa tarefa de definição, por sua vez, estaria sendo cada vez mais compreendida como uma incumbência exclusiva das comunidades escolares com base em seus contextos locais, sob a pena de representarem imposições culturais externas.

Para Young (2013)Young, M. (2013). Superando a crise na teoria do currículo: uma abordagem baseada no conhecimento. Cadernos Cenpec, 3(2), 225-250., embora seja fundamental questionar a origem de dado conhecimento, apenas considerar o currículo enquanto uma imposição de um arbitrário cultural não promove, por si só, o avanço em relação a alternativas curriculares. O autor demonstra certa preocupação, ainda, com o que considera ser uma ideia cada vez mais aceita por parte de pesquisadores do campo educacional: a de que o conhecimento não tem qualquer significado ou validade que lhe sejam intrínsecos. Dessa visão, poderia resultar uma limitação da reflexão docente à pergunta “este currículo faz sentido para meus alunos?”, desconsiderando o questionamento a respeito dos sentidos que podem se abrir aos alunos a partir de determinado currículo. Em outras palavras, em que medida um currículo poderia levá-los para além de sua própria experiência particular, que precisa ser valorizada e considerada – principalmente como ponto de partida nas mediações didáticas –, mas que não deveria constituir seu único ponto de chegada. Sua principal conclusão, portanto, seria a de que a educação escolar tem como principal objetivo garantir o acesso dos alunos ao “melhor”8 8 Neste texto, sempre que usarmos a palavra “melhor” vinculada a conhecimento, a colocaremos entre aspas, de modo a evitar (e refutar) uma leitura etnocêntrica de que certas culturas e seus saberes seriam superiores a outros. Como discutido nesta seção, o conceito diz respeito ao avanço, em cada área de estudos e pesquisas, na busca por saberes científicos mais fidedignos e confiáveis, que façam jus à realidade (ou a múltiplas realidades) dos fatos. Embora reconheçamos a densidade das discussões epistemológicas sobre o que é “verdade”, que ultrapassam o escopo do presente trabalho, também demonstramos certa preocupação com os riscos que uma era da “pós-verdade” pode trazer, ao desconsiderar completamente o compromisso científico (de produção de conhecimento) com aquilo que é verdadeiro – ainda que sempre de forma aproximada e permeada por subjetividades –, apelando somente a crenças e valores individuais ou, até mesmo, a falsas informações. conhecimento historicamente construído até então, a fim de habilitá-los à construção de novos conhecimentos. Ainda que reconheça a dificuldade de definição de tal objeto e a necessidade de sua renovação constante, o autor sinaliza a importância de que não se escape a esse debate.

Na tentativa de delinear sua abordagem curricular, o autor pontua que em todo campo de pesquisa haveria um conhecimento considerado “melhor”, no sentido de ser mais confiável e próximo da verdade sobre o mundo em que se vive, ainda que seja sempre falível e passível de ser desafiado. A esse conhecimento, o autor chama de “conhecimento poderoso”, cujas principais características seriam o fato de ser especializado – por exemplo, produzido e socializado em escolas e universidades – e de ir além das experiências que os alunos levam para a escola, sem que isso signifique desconsiderá-las ou menosprezá-las. Embora não seja um conhecimento geral (ou “universal”, fazendo um paralelo com discussões anteriores), teria alguma capacidade de transcender contextos particulares.

Ao fazer referência às principais objeções que se colocam à sua abordagem, Young (2013)Young, M. (2013). Superando a crise na teoria do currículo: uma abordagem baseada no conhecimento. Cadernos Cenpec, 3(2), 225-250. destaca aquelas de caráter epistemológico e político, realizadas por acadêmicos que defendem teorias do conhecimento pós-modernistas e pós-estruturalistas. Nessa perspectiva, todo conhecimento apresenta um ponto de vista, de forma que a identificação de um deles como “poderoso” praticamente induz à aceitação das normas hegemônicas de conhecimento. Se todo conhecimento é tido como arbitrário, uma abordagem como aquela proposta seria apenas ideológica, podendo ser resumida à imposição de interesses específicos – diferentes, por exemplo, dos interesses e das preferências dos alunos, que constituiriam um critério curricular igualmente válido dentro dessa ótica.

O autor reforça, então, que o argumento radicalmente relativista de que não existe qualquer conhecimento que seja direito de todos os alunos (e que, portanto, deva ser democratizado) reduz a teoria do currículo unicamente ao lugar de crítica. Ao mesmo tempo em que parte do princípio de que o currículo não tem capacidade de, sozinho, reduzir as desigualdades sociais – o que seria uma tarefa política mais ampla, e não apenas educacional –, Young (2013)Young, M. (2013). Superando a crise na teoria do currículo: uma abordagem baseada no conhecimento. Cadernos Cenpec, 3(2), 225-250. acredita que cabe aos teóricos do campo o esforço de desenvolver princípios curriculares que potencializem as chances de acesso de todos os alunos ao “melhor” (no sentido apresentado anteriormente) conhecimento disponível em qualquer área na qual tenham interesse.

Como o próprio autor reconhece, a premissa de que o conhecimento e o currículo são frutos de uma construção social sempre compromete, em alguma medida, seu objetivo de atingir a “verdade”. No entanto, embora continue compartilhando dessa perspectiva, afirma que o caráter socialmente constitutivo do conhecimento escolar não impede que se faça uma reflexão crítica sobre os níveis de legitimidade também historicamente atribuídos a ele – os quais não mais representariam única e exclusivamente uma imposição de arbitrários particulares (Galian & Louzano, 2014Galian, C. V. A., & Louzano, P. B. J. (2014). Michael Young e o campo do currículo: da ênfase no “conhecimento dos poderosos” à defesa do “conhecimento poderoso”. Educação e Pesquisa, 40(4), 1109-1124.). Para Young (2013)Young, M. (2013). Superando a crise na teoria do currículo: uma abordagem baseada no conhecimento. Cadernos Cenpec, 3(2), 225-250., portanto, esse cenário de “crise” que se faria presente em torno das teorias do currículo teria sido delineado a partir da negligência de seu principal papel, dado o enfoque principal no poder de quem define os saberes, e a relutância em contemplar temas de caráter epistemológico que se debruçam sobre as questões da verdade e confiabilidade das diversas formas de conhecimento. No entanto, se os próprios especialistas no campo acreditam não ser possível construir qualquer consenso em relação aos conhecimentos que todos os alunos deveriam poder desenvolver na escola – uma ideia que embasa a BNCC, por exemplo –, o autor teme que a resposta seja relegada a decisões pragmáticas e ideológicas tomadas por gestores, políticos e demais grupos de interesse.

Em uma breve comparação com o contexto brasileiro, pode-se dizer que muitas das argumentações críticas à BNCC dentro do campo acadêmico educacional se baseiam justamente na baixa legitimidade conferida àqueles que assumiram o protagonismo no processo de mobilização para que se construísse uma política curricular nacional, ou seja, aqueles “por trás das definições”. Um exemplo desses atores seriam os chamados “reformistas empresariais da educação” (Freitas, 2014Freitas, L. C. (2014). Os reformadores empresariais da educação e a disputa pelo controle do processo pedagógico na escola. Educação & Sociedade, 35(129), 1085-1114.) identificados nas empresas, nos institutos e em fundações privadas ligadas ao setor educacional, que o concebem como um mercado potencialmente lucrativo. Como apontam diversos estudos (Avelar & Ball, 2017Avelar, M., & Ball, S. J. (2017) Mapping new philanthropy and the heterarchical state: The mobilization for the national learning standards in Brazil. International Journal of Educational Development. http://dx.doi.org/10.1016/j.ijedudev.2017.09.007
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; Costa, 2018Costa, V. S. S. (2018). Base Nacional Comum Curricular como política de regulação do currículo, da dimensão global ao local: o que pensam os professores? (Tese de Doutorado). http://bdtd.ibict.br/vufind/Record/PUC_SP-1_5fefe3ea959e26c9660dfe8d4619fed3.
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), esses grupos favoráveis à ideia de base comum curricular buscaram se articular desde o início das discussões a seu respeito, com vistas a garantir a colocação da política na agenda governamental. No que diz respeito especificamente à formulação do texto oficial, nota-se que esses mesmos grupos assumiram um lugar de destaque na elaboração de sua última versão, realizada após a profunda crise política pela qual passava o País ter culminado na destituição da Presidente Dilma Rousseff9 9 Ainda que a análise dos textos da política extrapole o objetivo do presente ensaio, cabe destacar que a terceira versão da base, posteriormente homologada, trouxe mudanças significativas em relação aos princípios que vinham orientando as versões anteriores, submetidas a um amplo processo consultivo. A orientação com base em “objetivos e direitos de aprendizagem” foi então substituída pela organização em torno de competências e habilidades, o que aumentou mais ainda a rejeição à política, visto que se trata de uma proposta que vem sendo alvo de críticas desde os anos 1990, associada ao neoliberalismo nas reformas educacionais. A esse respeito, ver, por exemplo, Ramos (2016). . Cabe destacar, contudo, que o posicionamento contrário à ideia de base comum, adotado por grande parte dos pesquisadores do campo do currículo, não esteve restrito a esse momento, conforme já exploramos anteriormente, tendo-se feito presente desde o início dos debates sobre a proposta. Apesar de não ser o foco deste trabalho, a observação dessas dinâmicas permite que se desenvolvam posteriores reflexões acerca da medida em que os posicionamentos assumidos na comunidade acadêmica em relação a políticas como essa repercutem sobre a margem de participação que demais grupos encontram nesse processo, guiados, muitas vezes, por outros interesses que não estritamente educacionais.

Por fim, compreender que a ampliação das oportunidades educacionais se dá a partir da redução das desigualdades na distribuição dos recursos permite aproximarmos a perspectiva de Young (2013)Young, M. (2013). Superando a crise na teoria do currículo: uma abordagem baseada no conhecimento. Cadernos Cenpec, 3(2), 225-250. da premissa de que as desigualdades escolares estariam também relacionadas ao persistente monopólio de determinados conhecimentos “poderosos” por parte de grupos específicos, e não simplesmente a uma relevância restrita desses saberes a esses grupos. O autor conclui, portanto, sinalizando que um currículo melhor continuaria sendo a mais alta prioridade, uma vez que “a luta pela educação sempre foi uma luta pelo conhecimento – e este deve ser o foco do debate curricular atual” (p. 244).

É importante destacar que a perspectiva de Young não representa a superação definitiva daquilo que chamou de “crise” nos estudos sobre currículo, no sentido de fechar a questão sobre a definição dos saberes escolares. Tampouco sua abordagem está imune a críticas no contexto nacional, a exemplo daquelas apresentadas por Zanardi (2013)Zanardi (2013, setembro 29-outubro 02). A. C. Conhecimento poderoso e conhecimento contextualizado: o currículo entre Young e Freire. 36ª Reunião Nacional da ANPED, Cidade., que exploram em maior profundidade outras ideias do autor, como a defesa da centralidade das disciplinas e seu distanciamento da experiência cotidiana. Também não buscamos defender no presente ensaio a ideia de que o “conhecimento poderoso” não esteja permeado pela cultura, configurando uma espécie de saber neutro, estéril e a-histórico inexistente.

A opção por revisitar suas contribuições – assim como as teorias sociológicas clássicas que articulam escolarização, desigualdade e conhecimento – representa primeiramente um movimento de volta “às bases da Base”, na tentativa de compreender melhor as controvérsias que marcaram a formulação de uma política que estabelece conhecimentos comuns a serem garantidos a todos em um país socialmente desigual e culturalmente diverso como o Brasil. Tais controvérsias agora tendem a ser reavivadas nas escolas, à época de sua implementação – aqui compreendida como um processo crítico e criativo, que envolve tradução, interpretação e (re)significação, e não meramente executivo. Nesse sentido, é importante destacar, ainda, que as desigualdades anteriormente mencionadas também se estendem às condições efetivas que as diferentes escolas e redes de ensino encontram ao seu dispor para colocar em prática uma política como a BNCC. A depender da estrutura que os diferentes sistemas apresentarem, corre-se o risco de observar uma passagem dos mínimos aos máximos, ou seja, uma volta a um modelo tecnicista e mecânico de instrução, que busca “dar conta dos conteúdos”.

Em segundo lugar, e em relação às contribuições específicas de Young, acreditamos que o debate sobre a existência de ‘conhecimentos poderosos’ encontra terreno fértil no presente momento histórico. No período de escrita deste ensaio, encontramo-nos em meio à maior pandemia vivenciada no último século, que, para além do profundo luto coletivo gerado pela enorme quantidade de perdas humanas – também atravessadas por desigualdades sociais, étnico-raciais e de gênero –, é agravada no País por uma forte crise política e científica. Destaca-se, nesse sentido, o enfraquecimento da legitimidade conferida à autoridade e ao saber de especialistas, a negação (ou tentativa de ocultação) das evidências apontadas por pesquisas científicas desenvolvidas com rigor metodológico, e uma considerável disseminação de fake news e informações falsas ou pouco fundamentadas sobre a realidade.

Em meio a um cenário que vem sendo progressivamente compreendido a partir da ideia de “pós-verdade” (McIntyre, 2018McIntyre, L. (2018). Post-Truth. MIT Press.), cabe a reflexão sobre quais seriam os ‘conhecimentos poderosos’, especializados, fidedignos, desenvolvidos por comunidades científicas diversas, plurais e multiculturais ao redor do mundo, e que deveriam ser, portanto, tornados acessíveis a todos – de modo a permitir que se identifiquem e refutem os achismos, as falsas informações, o negacionismo. É possível que estejamos em um momento em que seja necessário resgatar e fixar novamente (ainda que de forma provisória e sempre crítica) alguns dos sentidos que vêm sendo desestabilizados ao longo da pós-modernidade, como a ideia de fato, verdade, ciência e evidência. Cabe repensar, portanto, sobre o papel que a instituição escolar assume nesse sentido, como local que tem como uma de suas funções obrigatórias “ensinar conhecimentos”, e é também espaço de pesquisa e crítica cultural (Moreira, 2012Moreira, A. F. B. (2012). Os princípios norteadores de políticas e decisões curriculares. RBPAE, 28(1), 180-194.).

Considerações Finais

O presente trabalho partiu dos profundos dissensos que giram em torno da recente política que prevê uma Base Nacional Comum Curricular para as escolas brasileiras. Sem adentrar no texto oficial da política, o foco eleito foram algumas das tensões que se encontram subjacentes à própria ideia de uma base comum, independentemente da forma que assumiu sua versão final. Embora reconheçamos que a discussão ganha contornos ainda mais complexos quando se trata da discussão da base específica que foi aprovada, pensamos ser importante explorar aspectos fundacionais do debate, na tentativa de observar se há um consenso mínimo sobre a ideia de alguma base. Esse movimento torna-se particularmente interessante na medida em que as controvérsias e disputas que caracterizaram a trajetória da política são reavivadas no momento de sua implementação.

Para tanto, elegemos a perspectiva dos direitos – articulada à concepção sobre o conhecimento escolar – como o foco de disputa que perpassa toda a discussão a respeito da relevância e da possibilidade de uma base comum, e de seu efeito reprodutor ou redutor de desigualdades. O ponto de partida foi localizado no cenário de desigualdades educacionais que caracteriza a realidade brasileira, principalmente no tocante aos níveis discrepantes em que diferentes grupos sociais parecem conseguir se apropriar do conhecimento escolar. A partir dessa constatação, buscamos examinar as diferentes perspectivas desenvolvidas para dar sentido a esse quadro, e as soluções que lhes eram implícitas, sobretudo no que diz respeito à questão curricular.

Observamos, de um lado, a ideia de que uma das principais causas das desigualdades seria uma má distribuição dos recursos escolares – dentre os quais estariam o próprio conhecimento e a cultura escolar – que deveriam ser democratizados a fim de garantir maior justiça social. Nesse sentido, a garantia de conteúdos mínimos a serem ensinados a todos os alunos, independentemente de sua origem social, seria uma iniciativa relevante. Por outro lado, ao localizar a causa das desigualdades na própria natureza do conhecimento escolar em si, que não teria um valor universal, mas, sim, particular a uma determinada cultura, visões mais críticas enfatizavam o questionamento sobre quem definiria os conteúdos curriculares, em detrimento da forma que esses conteúdos deveriam assumir, dado seu caráter potencialmente contingencial. A proposta de uma base comum a todos os alunos poderia soar, nessa perspectiva, como uma estratégia assimilacionista e homogeneizadora.

Por fim, fizemos referência à proposta de Michael Young a respeito de uma abordagem curricular baseada no direito do aluno ao conhecimento tido como “poderoso”, que buscaria resgatar o compromisso dos estudos curriculares com o que é ensinado nas escolas, para além de quem o define. Para o autor, a democratização do acesso àquilo que seria o “melhor” conhecimento em cada área do saber deixa de ser apenas uma questão epistemológica, para ser também um fator de justiça social, tendo em vista que as disputas das camadas populares pela escola historicamente representaram uma luta pelo acesso ao conhecimento.

No que diz respeito a alguns paralelos que podemos traçar com o caso brasileiro, destacamos a reflexão a respeito da medida em que os debates sobre currículo e base curricular vêm privilegiando a questão dos conhecimentos em si, para além da crítica (fundamental) aos agentes que estão por trás desse processo. Não se trata, de forma alguma, de desprezar a importância do desvelamento de diversos interesses que embasam uma política de amplitude nacional e que envolve dimensões econômicas bastante significativas. No entanto, cabe atentarmos para o risco de que venhamos a observar um fenômeno análogo àquele chamado por Young (2013)Young, M. (2013). Superando a crise na teoria do currículo: uma abordagem baseada no conhecimento. Cadernos Cenpec, 3(2), 225-250. de negligência à questão do conhecimento em debates sobre políticas curriculares. Questão essa que, em épocas de negacionismo científico, torna-se ainda mais urgente.

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    Normalização, preparação e revisão textual: Leda Maria de Souza Freitas Farah – leda.farah@terra.com.br
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    Apoio: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior: CAPES/PROEX PUC-RIO: Código de Financiamento 001, Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ), CNPQ: 314628/2020-7
  • 4
    Tendo sua origem principal na Inglaterra, dentro do que se costuma chamar de “aritmética política” (o cálculo das chances de atingir etapas diversas no processo educacional que alunos advindos de diferentes contextos sociais teriam), alguns estudos que se apoiaram nessa abordagem sociológica empírica e que ganharam destaque nesse período foram o Relatório Coleman nos Estados Unidos, em 1966, e os trabalhos realizados dentro do Instituto Nacional de Estudos Demográficos (INED), na França. Para maiores informações, ver Nogueira (1995)Nogueira, M. A. (1995). A Sociologia da Educação no imediato Pós-Guerra: orientações teórico-metodológicas. Caderno de Ciências Sociais, 4(6), 43-66..
  • 5
    Quando os estudos desenvolvidos dentro da chamada “Nova Sociologia da Educação” chegam aos Estados Unidos, os questionamentos desses processos de seleção e da estratificação dos saberes passam a englobar outras dimensões culturais para além da referência à classe social. Trabalhos como o de Michael Apple (1982)Apple, M. (1982). Ideologia e currículo. São Paulo: Brasiliense. são um importante referencial nesse sentido.
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    Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária
  • 7
    Segundo nota do relatório de pesquisa, uma entrevista foi excluída da amostra inicial por “inconsistências nas respostas”, resultando em um total de 102 entrevistas analisadas (CENPEC, 2015CENPEC. (2015). Consensos e dissensos sobre a Base Nacional Comum Curricular.http://www.cenpec.org.br/2015/09/21/relatorio-da-pesquisa-consensos-e-dissensos-sobre-a-base-nacional-comum-curricular.
    http://www.cenpec.org.br/2015/09/21/rela...
    , p.8).
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    Neste texto, sempre que usarmos a palavra “melhor” vinculada a conhecimento, a colocaremos entre aspas, de modo a evitar (e refutar) uma leitura etnocêntrica de que certas culturas e seus saberes seriam superiores a outros. Como discutido nesta seção, o conceito diz respeito ao avanço, em cada área de estudos e pesquisas, na busca por saberes científicos mais fidedignos e confiáveis, que façam jus à realidade (ou a múltiplas realidades) dos fatos. Embora reconheçamos a densidade das discussões epistemológicas sobre o que é “verdade”, que ultrapassam o escopo do presente trabalho, também demonstramos certa preocupação com os riscos que uma era da “pós-verdade” pode trazer, ao desconsiderar completamente o compromisso científico (de produção de conhecimento) com aquilo que é verdadeiro – ainda que sempre de forma aproximada e permeada por subjetividades –, apelando somente a crenças e valores individuais ou, até mesmo, a falsas informações.
  • 9
    Ainda que a análise dos textos da política extrapole o objetivo do presente ensaio, cabe destacar que a terceira versão da base, posteriormente homologada, trouxe mudanças significativas em relação aos princípios que vinham orientando as versões anteriores, submetidas a um amplo processo consultivo. A orientação com base em “objetivos e direitos de aprendizagem” foi então substituída pela organização em torno de competências e habilidades, o que aumentou mais ainda a rejeição à política, visto que se trata de uma proposta que vem sendo alvo de críticas desde os anos 1990, associada ao neoliberalismo nas reformas educacionais. A esse respeito, ver, por exemplo, Ramos (2016)Ramos, M. N. (2016). Políticas educacionais: da pedagogia das competências à pedagogia histórico-crítica. In M. V. Barbosa, S. Miller, & S. A. Mello (Orgs.), Teoria Histórico-Cultural: Questões Fundamentais para a Educação Escolar. Cultura Acadêmica..

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Editado por

1
Editor responsável: Maurício Ernica. https://orcid.org/0000-0001-9911-7011

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Jun 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    06 Mar 2020
  • Revisado
    30 Jun 2020
  • Aceito
    13 Jan 2021
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