Acessibilidade / Reportar erro

Editorial

EDITORIAL

A Saúde Coletiva às vésperas de mais um congresso: a celebração da diversidade

Neste ano, em agosto, se realizará o congresso trienal da ABRASCO no Rio de Janeiro, que nesta edição será simultâneo ao congresso internacional de Saúde Pública. Essa importante ocasião para a comunidade de ensino, pesquisa e serviços de saúde coletiva brasileira (e mesmo internacional) favorece e demanda a reflexão sobre o próprio campo, sua história, seus caminhos e metas para o futuro.

A própria história da ABRASCO e de seus congressos é testemunha evidente de uma área em crescimento, vital e produtiva sob qualquer critério que se possa propor. Parte significativa dessa trajetória vitoriosa está na capacidade de agregação do próprio campo, que une academia e serviços, por um lado, bem como diversas disciplinas e áreas temáticas, por outro. O próprio crescimento da área, contudo, engendra desafios, que esperamos que sejam discutidos e enfrentados pelos participantes do congresso e pela própria área de Saúde Coletiva. Um deles é a tentativa de submeter exatamente a diversidade que tem caracterizado a área desde sua origem a processos disciplinarizadores, no sentido foucaultiano, para a produção de uma "normalidade" acadêmica "produtiva" mas potencialmente estéril, divorciada das realidades éticas e políticas que pautaram – e pautam – o próprio desenvolvimento técnico–científico e institucional da Saúde Coletiva.

O presente número de Physis é uma celebração dessa diversidade, a começar pela ausência de um tema comum, trazendo apenas artigos de demanda espontânea (a próxima edição, já em preparo, retomará o caráter temático). Esta é a nossa contribuição à celebração de um campo pluralista e aberto, em sintonia, temos certeza, com aquilo que o VIII Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva e XI Congresso Internacional de Saúde Pública mostrarão ao mundo: o retrato da diversidade e tolerância que sempre nos caracterizou. Os artigos desta edição mostram, pela variedade temática e metodológica que apresentam, a força e riqueza da produção de nossa comunidade acadêmica.

No primeiro artigo desta edição, Christelle Hamel (traduzido do original francês) mostra como a discriminação e o racismo dirigido aos imigrantes magrebinos e seus descendentes em solo francês reconstroem uma imagem do "estrangeiro machista por natureza", efeito e causa da própria discriminação. Raça e gênero são também abordados no artigo de Flavia Motta, que nos desafia a pensar, para além do horror óbvio de um caso de estupro, na teia de relações entre raça, cultura classe e gênero, com base num estudo de caso (parte de sua tese de doutorado) cujo principal personagem era o filho de uma de suas informantes.

Amparada em Foucault, Clara Virginia Pinheiro, por sua vez, aborda como a produção técnica pela biomedicina de uma nova corporalidade, que coloca em segundo plano a experiência direta individual do próprio corpo, afeta a própria produção da identidade dos sujeitos.

Sérgio Maciel e George Kornis articulam a história de uma técnica (a ortodontia) e a experiência de um serviço (a clínica ortodôntica da UFJF) para ilustrar como o conceito de eqüidade, uma das pedras basilares do SUS, pode ser a alavanca para promover o acesso universal a procedimentos que ainda não são abarcados no repertório da assistência pública à saúde.

Denise Friedrich e Célia Pierantoni descrevem a organização do trabalho de equipes de saúde da família, a partir de um estudo de caso (realizado em Juiz de Fora), mostrando como a expectativa da própria população por atenção médica no modelo tradicional, por um lado, e uma série de obstáculos internos à implementação do próprio programa (como a multiplicidade de vínculos funcionais, incluindo sistuações de precariedade), por outro, tensionam o modelo idealizado e limitam sua resolutividade.

Rosângela Caetano, Cid Vianna, Luiz Cláudio Thuler e Vânia Girianelli comparam, num estudo de custo–efetividade, o tradicional teste de Papanicolau com técnicas alternativas para a detecção precoce do câncer de colo de útero. Concluem que, apesar dos resultados favoráveis ao primeiro, a relação custo–efetividade de algumas das alternativas poderia ser mais favorável com a adoção de preços que onerassem menos o pagador. Como os próprios autores apontam no texto, esse tipo de estudo assume cada vez maior importância estratégica para a adoção de novas práticas diagnósticas e terapêuticas pelo SUS.

Na seção de resenha, temos as contribuições de Flávio Leonel da Silveira, resenhando Terror e danação na Belém do Grão–Pará, de Jane Felipe Beltrão; Ana Teresa Venancio, que apresenta O anjo e a fera: sexualidade, deficiência mental e instituição, de Alan Giami; Cibele Osawa, comentando O caminho que o dekassegui sonhou (dekassegui no yumê–ji): cultura e subjetividade no movimento dekassegui, de Percy Galimbertti; e, encerrando, meu comentário sobre El valor de la salud: historia de la Organización Panamericana de la Salud, de Marcos Cueto.

Um bom congresso para todos os nossos leitores!

KENNETH ROCHEL DE CAMARGO JR.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Set 2006
  • Data do Fascículo
    Jul 2006
PHYSIS - Revista de Saúde Coletiva Instituto de Medicina Social Hesio Cordeiro - UERJ, Rua São Francisco Xavier, 524 - sala 6013-E- Maracanã. 20550-013 - Rio de Janeiro - RJ - Brasil, Tel.: (21) 2334-0504 - ramal 268, Web: https://www.ims.uerj.br/publicacoes/physis/ - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: publicacoes@ims.uerj.br