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Efeitos de uma epidemia no trabalho em saúde: cuidando de crianças com síndrome congênita pelo vírus Zika

Effects of an epidemic on health work: caring for children with Zika Virus congenital syndrome

Resumo

Objetivou-se analisar relatos de profissionais, que atenderam crianças com síndrome congênita pelo vírus Zika (SCVZ), acerca de mudanças no processo de trabalho provocadas pela epidemia. Pesquisa qualitativa realizada em Centro de Referência em Neurodesenvolvimento, em uma capital do Nordeste brasileiro, no período de abril de 2018 a janeiro de 2019. Os participantes foram 12 profissionais de nível superior que trabalhavam na instituição na época da epidemia de Zika. Foram realizadas entrevistas semiestruturadas e observação participante, buscando-se a triangulação dos dados. Foi realizada análise de conteúdo na modalidade temática. Os resultados foram categorizados em: Uma epidemia desconhecida e A (des)organização do cuidado. Tal emergência em saúde pública provocou desde incertezas e inseguranças na população, em geral, e em profissionais de saúde, até mudanças em processos de trabalho e na reorganização de serviço de saúde. A epidemia da Zika também promoveu visibilidade à precariedade da atenção e dos recursos às crianças com necessidade de reabilitação.

Palavras-Chave:
Zika Vírus; Síndrome Congênita de Zika; Processo de trabalho; Pessoal de saúde

Abstract

The article aimed to analyze the reports of professionals who care for children with congenital syndrome caused by the Zika virus (SCVZ), on the changes in the work process caused by the epidemic. Qualitative research with data triangulation carried out at a Reference Center for Neurodevelopment, in a capital of Northeastern Brazil, from April 2018 to January 2019. The participants were 12 higher education professionals who worked at the institution at the time of the epidemic of Zika. They were adapted, semi-structured and participant observation, seeking data triangulation. A content analysis was carried out in the thematic modality. The results were categorized into: An unknown epidemic and the reorganization of care. The emergence of a new epidemic caused uncertainty in professionals, given their ignorance of the recent syndrome. It produced a feeling of insecurity and disorganization in the work process. It was concluded that an epidemic brought to light existing weaknesses and made it urgent to reorganize practices and expand the infrastructure of services.

Keywords:
Zika Virus congenital syndrome; Microcephaly; Work process; Health Personnel; Child

Introdução

Em 2015, a ocorrência progressiva de casos de recém-nascidos acometidos pela Síndrome Congênita pelo Vírus Zika (SCVZ) foi reconhecida pelo Ministério da Saúde (MS) como uma Emergência Sanitária Nacional e, logo em seguida, foi declarada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como Emergência de Saúde Pública de Interesse Internacional (MOREIRA et al., 2018MOREIRA, M. C. N et al. Emergency and permanence of the zika virus epidemic: An agenda connecting research and policy. Cadernos de Saúde Pública, [s. l.], v. 34, n. 8, p. e00075718, 2018. Disponível em: https://doi.org/10.1590/0102-311X00075718.
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).

As primeiras ocorrências foram identificadas no Nordeste brasileiro e, até 2020, um total de 3.523 casos de SCVZ foram confirmados no País. O Nordeste concentrou 2.192 casos confirmados, sendo Bahia (575), Pernambuco (473), Paraíba (220), Ceará (174) e MaranhãoMARANHÃO. Secretaria Estadual de Saúde. Ma.gov: famílias com pacientes com microcefalia recebem atendimento integral na rede estadual de saúde. São Luís, 9 jun. 2017. Disponível em: https://www.ma.gov.br/familias-com-pacientes-com-microcefalia-recebem-atendimento-integral-na-rede-estadual-de-saude/. Acesso em: 06 jun. 2021.
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(170), alguns dos mais afetados da região. No Sudeste, segunda região com maior número de casos confirmados (710), destacou-se o estado do Rio de Janeiro (305), terceiro do país com mais casos de SCVZ (BRASIL, 2020). Esse aumento súbito do número de neonatos com SCVZ acarretou intensa comoção social, principalmente devido ao desconhecimento inicial da causa e dos eventos adversos associados (ALBUQUERQUE et al., 2018ALBUQUERQUE, M. F. P. M. et al. Epidemia de microcefalia e vírus Zika: a construção do conhecimento em epidemiologia. Cadernos de Saúde Pública, [s. l.], v. 34, n. 10, p. e00069018, 2018. Disponível em: https://doi.org/https://doi.org/10.1590/0102-311x00069018.
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). Somaram-se a este quadro ampla cobertura midiática e grande circulação de informações controversas em redes sociais (AGUIAR; ARAUJO, 2016AGUIAR, R.; ARAUJO, I. S. A mídia em meio às ‘emergências’ do vírus Zika: questões para o campo da comunicação e saúde. RECIIS - Revista Eletrônica de Comunicação Informação e Inovação em Saúde, [s. l.], v. 10, n. 1, p. 1-15, 2016. Disponível em: https://doi.org/https://doi.org/10.29397/reciis.v10i1.1088.
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).

O trabalho em saúde é considerado um trabalho vivo pela sua produção e consumo simultâneos, que utiliza instrumentos e conhecimentos técnicos, construídos a partir da gestão de processos políticos, organizacionais e sociais, para a produção do cuidado (MERHY et al., 2003MERHY, E. E. et al. O trabalho em saúde: olhando à experienciando o SUS no cotidiano: o debate no campo da saúde coletiva. 2°. ed. São Paulo: Hucitec Editora, 2003.). Em períodos de crises epidemiológicas, o trabalho em saúde pode tornar-se ainda mais complexo. Em 2015, a explosão de casos da SCVZ provocou mudanças variadas no âmbito da produção e da circulação do conhecimento, bem como da produção do cuidado (DINIZ, 2016DINIZ, D. Zika: Do sertão nordestino à ameaça global. 1°. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2016.).

O processo de trabalho em saúde é um campo que contempla a prática dos trabalhadores inseridos na produção e consumo dos serviços de saúde, compreendendo a dinâmica de trabalho, seus meios e condições, objeto e sujeito, e as relações técnico-sociais e de poder que são construídas e reproduzidas em contextos de ação (de resistência, subordinação e/ou de negociação) de agentes em interação (DESLANDES, 2001DESLANDES, S. F. O processo de trabalho na emergência. In: DESLANDES, S. F. Frágeis deuses: profissionais da emergência entre os danos da violência e a recriação da vida. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2001. p. 45-94.).

Este trabalho busca analisar as mudanças produzidas pela epidemia no processo de trabalho, a partir de relatos de profissionais que atenderam crianças com SCVZ.1 1 Artigo desenvolvido como produto de tese de doutorado, a partir de dados coletados na pesquisa guarda-chuva “Síndrome congênita pelo Zika vírus, soroprevalência e análise espacial e temporal de vírus Zika e Chikungunya no Maranhão”. Esta foi fomentada pelo Programa de Pesquisa para o SUS (PPSUS), após submissão ao Edital n° 008/2016 da FAPEMA/CNPq (FINANCE CODE 001).

Metodologia

Trata-se de uma pesquisa exploratória com abordagem qualitativa, do tipo estudo de caso, realizada no período de abril de 2018 a janeiro de 2019, em uma capital do nordeste brasileiro. O local do estudo foi o centro de referência estadual para a assistência integral à saúde e acompanhamento de crianças com síndromes neurológicas. Este centro, em suas duas unidades, atende cerca de 96,8% dos pacientes confirmados com microcefalia do Estado, o que justifica sua escolha.

Esta pesquisa utilizou triangulação de dados (FLICK, 2009FLICK, U. Qualidade na pesquisa qualitativa. 2009. p. 196-196.) em dois aspectos: triangulação de técnicas de coleta de dados, sendo utilizadas entrevistas e observação, com o intuito ampliar a compreensão do contexto das falas; e triangulação de informantes, incluindo diferentes categorias profissionais.

A pesquisa aconteceu em dois momentos. No primeiro, foi realizada a exploração do campo, com o levantamento do quadro de profissionais, observação dos serviços prestados e acompanhamento do funcionamento das unidades. Durante essa primeira fase, foi aplicado um questionário a todos os profissionais buscando identificar aqueles que trabalhavam na assistência às crianças com SCVZ e que participaram da reorganização do serviço.

Foram identificados, na ocasião da pesquisa, 33 profissionais na primeira unidade e 23 na segunda, sendo: dois gestores, sete fisioterapeutas, 10 terapeutas ocupacionais, seis fonoaudiólogos, seis enfermeiros, quatro psicólogos, três psicopedagogos, três assistentes sociais e 15 médicos, sendo três pediatras, três neuropediatras, quatro neonatologistas, um geneticista, um infectologista, um psiquiatra e dois oftalmologistas. Foram selecionados todos os 15 profissionais que informaram ter trabalhado no Centro de Referência durante a epidemia, sendo que um não aceitou participar e dois, apesar de não recusarem, não se disponibilizaram a agendar a entrevista.

Para coleta de dados, empregaram-se dois métodos: entrevistas semiestruturadas, previamente agendadas, gravadas e posteriormente transcritas, com roteiro que incluía questões relativas à percepção dos profissionais sobre a epidemia e às mudanças no processo de trabalho; e a observação realizada durante a exploração do campo, nas entrevistas e após as mesmas, com registro documental em diário de campo.

Foi realizada Análise de Conteúdo na modalidade temática (MINAYO, 2014MINAYO, M. C. S. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 14°ed. Rio de Janeiro: HUCITEC EDITORA, 2014.), de acordo com os seguintes passos: pré-análise; categorização do material e busca dos núcleos de sentido, ou seja, as unidades de compreensão do texto.

A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa com seres humanos do Hospital Universitário da UFMA, CAAE nº 65897317.1.0000.5086, obedecendo à Resolução 466/12, do Conselho Nacional de Saúde (CNS). Para garantir o anonimato, os nomes dos entrevistados foram substituídos por nomes aleatórios.

Resultados e Discussão

Foram entrevistados 12 profissionais, sendo dois gestores, duas fisioterapeutas, uma terapeuta ocupacional, uma enfermeira, uma assistente social, uma fonoaudióloga, duas pediatras, uma neuropediatra e uma psicóloga. O tempo médio de formação dos entrevistados foi de 15 anos e todos já trabalhavam com crianças em neurorreabilitação, no local do estudo, há pelo menos dois anos. Quanto à formação profissional, sete tinham título de especialista e três de mestrado.

Todos os profissionais que atuavam no Centro em análise eram mulheres, com exceção de um. Historicamente, as tarefas cotidianas voltadas ao cuidado e, especificamente, ao cuidado de crianças têm sido desempenhadas por mulheres. O espaço em análise reproduz relações hierárquicas de gênero presentes em outros espaços sociais, de modo que o único homem entrevistado exercia o cargo de gestor, replicando o lugar de poder. À exceção dos médicos, todos os profissionais eram contratados sob o regime da Consolidação de Leis Trabalhistas (CLT), com carga horária semanal de 30 horas, distribuídas em seis horas diárias de segunda a sexta-feira.

A epidemia de SCVZ trouxe desafios ao sistema de saúde. O número de casos, a gravidade e a cronicidade dos casos caracterizaram um cenário de incertezas e dilemas enfrentado pelos profissionais de saúde. De acordo com os entrevistados, antes da epidemia do vírus Zika, a assistência era realizada de modo diferente, no que diz respeito ao modelo de organização e de divisão do trabalho. O atendimento era realizado em duas salas separadas, sendo uma reservada para médicos e outra para as demais categorias profissionais da equipe. Não havia reuniões de discussão de casos. As propostas terapêuticas eram decididas individualmente. Após a experiência da epidemia pelo vírus Zika, houve uma mudança neste modelo de atenção e os profissionais passaram a atuar de modo mais integrado.

Após análise do material, emergiram duas categorias: Uma epidemia desconhecida e A (des)organização do cuidado.

Uma epidemia desconhecida

A chegada dos casos

Os primeiros casos surgiram no centro de referência, em janeiro de 2016. Uma após outra foram chegando crianças com microcefalia em busca de atendimento neurológico, em número superior à demanda considerada “normal”. Este fato chamou a atenção dos profissionais. Algo inusitado parecia estar acontecendo.

Posteriormente a essa demanda espontânea, a Secretaria Estadual de Saúde enviou para a unidade, uma relação com mais de 120 crianças com suspeita de SCVZ. Ao mesmo tempo, começaram as notícias de outros estados, o que despertou, ainda mais, a atenção de alguns profissionais para o que estava acontecendo não só no estado, mas em todo o país.

Então, começaram a chegar os casos de microcefalia com uma frequência maior do que o comum e elas tinham o mesmo fenótipo. Nós percebemos que não era uma microcefalia como as outras. (Sandra, neuropediatra, 11 anos de experiência com crianças).

O aumento de casos de microcefalia "que não era como as outras" sugeria uma possível epidemia. Mas sua associação com infecção pelo vírus Zika em gestantes demorou um tempo, pois inicialmente este vírus foi considerado mais inofensivo, a associação entre a epidemia do vírus Zika e os casos de microcefalia ocorreu, apenas, no primeiro semestre de 2015 (DINIZ, 2016DINIZ, D. Zika: Do sertão nordestino à ameaça global. 1°. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2016.; LÖWY, 2019LÖWY, I. Zika no Brasil: história recente de uma epidemia. 1°. ed. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2019.).

Inicialmente, as políticas estabelecidas pelo Estado Brasileiro expressaram uma postura de combate ao mosquito transmissor, retirando o foco das famílias e crianças que estavam sendo atingidas pela doença (NUNES; PIMENTA, 2016NUNES, J.; PIMENTA, D. N. A epidemia de Zika e os limites da saúde global. Lua Nova: revista de cultura e política, [s. l.], n. 98, p. 21-46, 2016. Disponível em: https://doi.org/http://dx.doi.org/10.1590/0102-6445021-046/98.
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; DINIZ, 2016DINIZ, D. Zika: Do sertão nordestino à ameaça global. 1°. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2016.).

Segundo parte dos profissionais entrevistados, a descoberta de que uma epidemia de microcefalia associada ao vírus Zika estava ocorrendo, no Brasil, aconteceu por intermédio da mídia, para outros, ocorreu simultaneamente com a chegada dos casos e de informações veiculadas pelas mídias, conforme Luana e Viviane sinalizaram:

Eu acho que foi tudo ao mesmo tempo. Acho que ao mesmo tempo que a mídia colocou, nós estávamos também recebendo. (Luana, terapeuta ocupacional, 4 anos de experiência com crianças).

É... eu acho que como todo mundo, né? Pela mídia, pela televisão, porque foi aquele ‘boom’, aquela loucura que ninguém sabia direito o que era. (Viviane, fisioterapeuta/supervisora, 2 anos de experiência).

A SCVZ era, até então, uma doença nova, que desafiava o conhecimento científico, e alcançou, inclusive, repercussão global e intensa divulgação. A epidemia despertou o interesse da mídia e nesta conjuntura de acesso instantâneo às informações pelos meios de comunicação, a pesquisa na web e o uso das redes sociais se destacaram por condensar milhares de conteúdos de forma simples e rápida (SOUSA-JÚNIOR, 2016SOUSA-JÚNIOR, G. K. A. Epidemia do vírus Zika: a difusão de notícias por meio das mídias eletrônicas. 38 f. 2016. Universidade de Brasília, Brasília, 2016.).

A mídia assumiu importante papel como meio de transmissão de informações em saúde e contribuiu para o esclarecimento sobre o que estava acontecendo, porém também veiculou informações falsas, incompletas e contraditórias sobre a epidemia do vírus Zika, o que dificultou o conhecimento da realidade, até mesmo por parte dos profissionais que atuavam na linha de frente de combate a esta epidemia (OLIVEIRA et al., 2019OLIVEIRA, P. S. et al. Experiências de pais de crianças nascidas com microcefalia, no contexto da epidemia de Zika, a partir da comunicação do diagnóstico. Cadernos de Saúde Pública, [s. l.], v. 35, n. 12, p. e00226618, 2019. Disponível em: https://doi.org/10.1590/0102-311X00226618.
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).

Nessa perspectiva, a chegada dos casos para os profissionais, inicialmente vistos apenas como microcefalia, foi veiculada pela mídia e por outros profissionais que observaram o aumento súbito. Após a associação com a epidemia do vírus Zika e o atendimento contínuo das crianças, os profissionais começaram a identificar novos sinais além do baixo perímetro cefálico, sendo então chamado de síndrome congênita associada ao vírus Zika (SCVZ).

A caixinha de surpresa

O número de casos aumentava a cada semana e o desconhecimento sobre a nova síndrome seguia produzindo insegurança entre os profissionais. Havia dificuldade em definir diagnósticos, propor terapias e realizar orientações aos pais.

Ela [a zika] veio como uma caixinha de surpresa, né? (Vanessa, fonoaudióloga, 9 anos de experiência com crianças).

Então, assim... era aquela coisa que foi assustadora porque foi uma avalanche de casos chegando e ninguém sabia como lidar. (Luana, terapeuta ocupacional, 4 anos de experiência com crianças).

O grande número de casos que chegava ao serviço especializado de saúde, à semelhança de uma “avalanche”, provocava um efeito nos profissionais que, a despeito de sua formação e prática profissional, assistiam atônitos uma situação para a qual não tinham resposta.

Outras pesquisas, a exemplo de Ribeiro et al. (2017)RIBEIRO, E. M. et al. From the perception of a cluster of cases of children with microcephaly to congenital Zika syndrome in Brazil: The lessons we have learned and the challenges that lie ahead of us. Journal of Venomous Animals and Toxins Including Tropical Diseases, [s. l.], v. 23, n. 1, 2017. Disponível em: https://doi.org/10.1186/s40409-017-0107-x.
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, afirmam que o medo e a incerteza por parte dos profissionais permearam o trabalho durante a epidemia do vírus Zika, enquanto Diniz (2016) relata a surpresa dos profissionais ao examinar imagens do cérebro de bebês que não condiziam com a literatura da medicina fetal conhecida, até então. A comunidade médica se movimentava em busca de respostas e a discussão dos casos ocorria por meio de redes sociais e de reuniões científicas disseminadas em eventos nacionais.

Outra discussão levantada pelos resultados foi que os profissionais se perceberam em um cenário descrito por alguns como “furacão”: crianças com uma malformação congênita inexplicada, pais demandando respostas, mídia disseminando informações, aumento no número de atendimentos. Além disso, relataram a necessidade de buscar conhecimento sobre a doença para dar um feedback para as famílias e prover uma assistência de qualidade.

A gente tem que estudar porque a gente tem que dar uma resposta para essas mães. Então, no boom, no furacão, foi uma coisa assim. (Viviane, fisioterapeuta/supervisora, 2 anos de experiência com crianças).

A epidemia da SCVZ foi um fenômeno vivenciado por profissionais como algo que desconstruiu certezas do conhecimento. Além disso, não havia protocolos que ajudassem no manejo dessa nova situação, desta forma não podiam esclarecer as dúvidas dos pais, já que também não tinham projeções claras para questionamentos sobre o prognóstico das crianças. (GARCIA; CARDOSO, 2019GARCIA, M.; CARDOSO, J. M. Deu Zika na Rede: uma análise sobre a produção de sentidos sobre a Epidemia de Zika e Microcefalia no Facebook. Revista Mídia e Cotidiano, [s. l.], v. 13, n. 1, p. 187-211, 2019.; OLIVEIRAOLIVEIRA, W. A. et al. Impactos psicológicos e ocupacionais das sucessivas ondas recentes de pandemias em profissionais da saúde: revisão integrativa e lições aprendidas. Estudos de Psicologia (Campinas), [s. l.], v. 37, p. e200066, 2020. Disponível em: https://doi.org/https://doi.org/10.1590/1982-0275202037e200066.
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, et al., 2019).

A despeito da experiência profissional, conquistada pela prática de anos de assistência em neurorreabilitação infantil, tais profissionais sentiram-se inseguros diante da nova doença. A busca por conhecimento científico e a proposta de reorganização da assistência para garantir um atendimento mais integrado às crianças e uma resposta às demandas das famílias foi uma estratégia adotada. A experiência profissional acumulada se constituiu em recurso que possibilitou a busca por novas condutas. Tais mudanças, no entanto, ocorreram em meio a desentendimentos quanto às medidas a serem adotadas.

A (des)organização do cuidado

Para a maioria dos profissionais, a grande demanda foi o principal fator desorganizador do processo de trabalho, pois o número acima do esperado dificultava a prestação de uma assistência com qualidade, prejudicando o atendimento.

Pela demanda ser muito grande, às vezes a gente não conseguia... Por ter muitos pacientes, às vezes a gente não consegue tantos atendimentos como deveria. (Luana, terapeuta ocupacional, 4 anos de trabalho com crianças).

Eu tava com uma demanda muito grande, ao invés de atender 6 [pacientes], eu tava atendendo 10, 12, né? (Melissa, psicóloga, 14 anos de experiência com crianças).

O aumento de pacientes foi ressaltado por todos os entrevistados como um fator de mudança de grande impacto. Houve casos de profissionais que referiram que dobraram o seu atendimento diário e precisaram reorganizar os seus horários para o atendimento às necessidades das crianças com SCVZ e das suas famílias.

O impacto ocupacional para os profissionais da saúde, que lidam com situações de epidemias, está frequentemente relacionado a mudanças introduzidas na rotina dos serviços, como aumento do número de horas de trabalho e da demanda de assistência, reorganização dos serviços, mudança de protocolos, incertezas sobre como controlar a doença, sua gravidade e seus desdobramentos (SCHMIDT et al., 2020SCHMIDT, B. et al. Saúde mental e intervenções psicológicas diante da pandemia do novo coronavírus (COVID-19). Estudos de Psicologia (Campinas), [s. l.], v. 37, p. e200063, 2020. Disponível em: https://doi.org/https://doi.org/10.1590/1982-0275202037e200063.
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).

Além disso, os profissionais não sabiam as características da doença, sua evolução e, sobretudo, sua expressão nas crianças recém-nascidas. Se em condições de normalidade é relativamente comum, no âmbito da saúde pública, situações de carência nos serviços de saúde, a excepcionalidade do aumento da demanda provocada pela epidemia de Zika, assim como outras crises epidemiológicas, a exemplo da COVID-19, torna ainda mais evidente tais carências (SOUSA, 2020). Por outro lado, esta crise, descrita pelos profissionais como “boom”, “furacão”, promoveu alterações de modo mais intenso e rápido para dar conta das exigências do momento.

Para aprimorar a assistência, os profissionais ressaltaram que participaram de aperfeiçoamentos e fizeram reuniões com as famílias, a fim de escutar as dificuldades e buscar soluções. Tais estratégias teriam proporcionado para a equipe maior interação, por meio da discussão dos casos e das necessidades dessa nova demanda.

Ah, a gente fez várias reuniões, várias conversas. Conversas com a família, conversa entre a equipe, entre a equipe com a família, explicando, conversando, ouvindo também eles, né? Pra saber dos anseios, aquilo que eles estavam pensando, dessas dificuldades... E, assim, através de cada fala, de cada um, a gente foi tentando melhorar e aí foi organizando um pouquinho melhor. (Vanessa, fonoaudióloga, 9 anos de trabalho com crianças).

Com o intuito de compreender a nova doença que surgia e traçar um plano de assistência para os pacientes com SCVZ, os profissionais de saúde se perceberam em meio a uma necessidade de estreitar relações, tanto entre si, quanto com a família, buscando conhecimento e aperfeiçoamento para reduzir as dificuldades que se apresentavam.

A integração de cuidados tem sido descrita como um conjunto de práticas articuladas em torno da necessidade dos usuários, envolvendo, neste caso, a discussão entre pais/profissionais e profissionais/profissionais, levando em consideração a atenção com base em diagnósticos e centrada na necessidade da demanda. Desse modo, a equipe tem a possibilidade de traçar planos de intervenção e ter resolubilidade na assistência (OUVERNEY; NORONHA, 2013OUVERNEY, A. M.; NORONHA, J. C. Modelos de organização e gestão da atenção à saúde: redes locais, regionais e nacionais. 1. ed. [S. l.]: Editora Fiocruz, 2013. Disponível em: https://doi.org/10.7476/9788581100173.0006.
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).

Dentro da dinâmica do processo de trabalho em saúde temos a relação entre profissional e usuário, efetivando assim o consumo simultâneo do produto desse processo, que é o cuidado. Conforme observou-se nas falas, as mudanças no modo de produção da assistência e na produção de cuidados a estas crianças e suas famílias foram propostas a partir da epidemia.

Inicialmente, as crianças com suspeita ou diagnóstico confirmado eram encaminhadas para o Centro de Reabilitação (CER), de gestão estadual, onde tratamento e reabilitação ocorriam semanalmente. Entretanto, a escassez do serviço especializado para o número de crianças com tal necessidade, associado à dificuldade de acesso ao CER, localizado distante do centro da cidade, foram considerados fatores preponderantes para o abandono do tratamento e/ou demora para atendimentos.

Nesse contexto, esse público foi inserido no serviço de transporte de pacientes fornecido pelo Estado, chamado “Travessia”. Uma van fazia o traslado de crianças e seus responsáveis até o serviço de reabilitação, garantindo, assim, seu acesso ao tratamento. Posteriormente, foi criada a Casa de Apoio do Centro de Referência em Neurorreabilitação, que no início atendia apenas crianças acometidas pela SCVZ.

Organização do centro de referência durante a epidemia

A ideia de que a epidemia do vírus Zika foi um desencadeador para a reorganização do centro de referência e para a criação de uma nova unidade, com modalidade diferenciada de tratamento, apareceu no relato de profissionais. Inicialmente, o serviço de caráter ambulatorial era voltado para o atendimento de crianças provenientes de Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN) e que precisavam de acompanhamento neurológico e de reabilitação, como crianças pré-termo e com outros distúrbios neurológicos. Os atendimentos eram especializados e realizados de forma fragmentada, conforme descrito anteriormente.

O aumento da demanda de crianças com SCVZ no serviço fez com que os profissionais refletissem acerca da necessidade de transformar o modo de organização do trabalho, a fim de adequar a assistência à nova demanda. Nessa perspectiva, a ideia inicial foi reunir todos os atendimentos em um único serviço para agilizar a assistência. Desta forma, apesar de não serem oriundas de UTI e nem prematuras, as crianças com SCVZ foram incluídas na população atendida pois, a necessidade de reabilitação e estimulação eram consideradas semelhantes. Iniciaram-se reuniões entre a equipe multiprofissional para a criação de um projeto assistencial: o centro de referência para neurorreabilitação.

Antes eram pequenos núcleos. Então, era preciso fundir tudo, formar um protocolo só de atendimento, porque as crianças têm as mesmas necessidades. Transformar isso num serviço para um funcionamento melhor, com neuropediatra, pediatra, genética, esse foi o primeiro. Com a vinda da Zika... Olha, vai se fazer basicamente a mesma coisa, reabilitar e estimular. Esse foi o pensamento inicial. (Viviane, fisioterapeuta/supervisora, 2 anos de experiência com crianças).

A epidemia da SCVZ gerou discussões e divergências entre gestores e profissionais de saúde, em vários estados brasileiros, acerca das necessidades de mudanças na estrutura e organização de serviços, incluindo processo de trabalho dos profissionais e outras questões como a fragmentação dos serviços ofertados, bem como seus impactos sobre os itinerários terapêuticos (DINIZ, 2016DINIZ, D. Zika: Do sertão nordestino à ameaça global. 1°. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2016.; SCOTT et al., 2018SCOTT, R. P. et al. Therapeutic paths, care and assistance in the construction of ideas about maternity and childhood in the context of the zika virus. Interface: Communication, Health, Education, [s. l.], v. 22, n. 66, p. 673-684, 2018. Disponível em: https://doi.org/10.1590/1807-57622017.0425.
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).

Com a abertura do Centro de Referência, os atendimentos, que já eram prestados pelo governo às crianças com SCVZ, foram integrados em um único espaço, para maior agilidade de acesso às crianças e suas famílias, promovendo uma maior integralidade do cuidado.

Os profissionais consideraram que a epidemia despertou a atenção dos órgãos responsáveis para a necessidade de uma nova estrutura para o serviço de neurorreabilitação, conforme observamos nos relatos abaixo:

A estrutura física, primeiramente, teve que mudar. Foi criado agora um setor, né? Teve toda a estrutura de sala, aumentaram o número de profissionais, foi criado também a casa de apoio depois, por último, pra poder atender melhor essas mães... (Larissa, enfermeira, 4 anos de experiência com crianças).

[...] Foi assim, uma mudança boa, porque eu tenho meu espaço, agora para meus serviços, para os materiais, entendeu? Foi uma grande mudança, também. (Silvana, fisioterapeuta, 5 anos de experiência com crianças).

A nova estrutura do Centro de Referência, que incluiu a redistribuição de salas e a organização do fluxo de atendimento para atender novos pacientes, promoveu mudanças que foram consideradas um ponto positivo por todos. As discussões em torno da falta de infraestrutura para a assistência adequada indicavam que crianças nessas condições e suas mães levariam uma vida de grandes dificuldades. Portanto, considerou-se necessário, além de qualificar o pessoal, aperfeiçoar os protocolos, incorporar novas tecnologias e aprimorar as estruturas físicas (FREITAS et al., 2018FREITAS, P. et al. Políticas Emergenciais em Saúde: os paradoxos da epidemia do Zika vírus. In: Questões sobre direitos humanos: justiça, saúde e meio ambiente. 1. ed. Espírito Santo: Editora PROEX/UFES, 2018. p. 144-168. Disponível em: https://doi.org/10.30712/isbn9788565276474.144-168.
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).

Mesmo com os investimentos financeiros, devido à declaração de emergência, o sistema de saúde pública ainda enfrentou dificuldades estruturais em muitos estados brasileiros, onde os serviços não se prepararam para lidar com os desafios da epidemia do Zika (OPAS, 2018OPAS. A resposta do Sistema Único de Saúde à epidemia de Zika Relatório 30 anos de SUS, que SUS para 2030? Brasília: OPAS, 2018.). Para os profissionais, a ideia de criar um centro de neurorreabilitação já existia, bem como a necessidade de um espaço maior, entretanto, a epidemia provocou um sentimento de urgência e compreensão da necessidade de mudanças e reorganização do serviço de saúde.

Com ela [Zika], não é que ela veio pra reorganizar, mas com ela nós tentamos reorganizar um serviço que era salpicado dentro do hospital. (Mariana, médica pediatra, 25 anos de experiência com crianças).

Foi a epidemia que favoreceu toda essa preocupação com a estrutura, com os pacientes... Aí, foi criado esse setor separado. (Larissa, Enfermeira, 4 anos de experiência com crianças).

A Zika foi vista como um evento que acentuou a necessidade de um novo projeto de atenção à saúde. As dificuldades como insuficiência de materiais para reabilitação, jornada de trabalho exaustiva, necessidade de capacitação, divisão das atividades e falta de investimentos, presentes no cotidiano desses profissionais foram colocadas em evidência.

Segundo relatos, um grupo de profissionais propunha a reorganização do serviço, a partir da inclusão de patologias associadas ao neurodesenvolvimento, enquanto outro grupo sugeria a criação de um novo centro de atendimento voltado exclusivamente para crianças afetadas pela SCVZ.

Na verdade, falaram que ia ter um centro pra gente, né? Que nós íamos atender essas crianças [...] Ia ser o centro de referência de crianças com microcefalia. (Silvana, fisioterapeuta, 5 anos de experiência com crianças).

Se ia ter tomógrafo liberado, se ia ter psiquiatra, oftalmo, por que esse oftalmo não poderia ser aberto para as outras crianças que também precisam? Por que que esse psiquiatra não ia…. Entendeu? (Mariana, médica pediatra, 25 anos de experiência com crianças).

A epidemia representou um momento crítico em que os profissionais não conseguiam organizar a dinâmica de trabalho, dado o aumento da demanda, do número de horas de trabalho e das incertezas sobre o prognóstico. Tais mudanças na rotina de trabalho, além da falta de controle da doença, gerou o que os profissionais identificavam como um estresse no ambiente de trabalho. Todavia, o que gerou uma ruptura no grupo de profissionais entrevistados foi a proposta de atendimento exclusivo para pacientes de Zika enquanto outros pacientes com necessidades semelhantes foram excluídos do projeto.

A prioridade das ações governamentais, em caráter emergencial, para as crianças afetadas pela epidemia de SCVZ reforçou a invisibilidade, já existente, na assistência a outras doenças, e intensificou ainda mais a precariedade da rede de atendimento para outras deficiências, pois estas ações emergenciais garantiram prioridade nas listas de espera de quase todos os serviços, exclusivamente para crianças afetadas pela SCVZ (SCOTT et al., 2017).

Dessa forma, para um grupo de profissionais, as mudanças na atenção, provocadas pela epidemia da Zika, precisavam ser expandidas para outras crianças com as mesmas necessidades de cuidado, embora tivessem outras síndromes. A discordância quanto à organização de um centro voltado para o atendimento exclusivo de crianças com Zika, ao invés de universalizar o acesso às demais síndromes neurológicas infantis, provocou uma ruptura entre os profissionais de saúde. Neste contexto, alguns optaram por se retirar do processo de organização do centro por não concordarem com a exclusividade no atendimento das crianças com SCVZ.

Eu me retirei do processo, por isso, eu via a demanda, a dificuldade de você pedir um parecer de um psiquiatra e levar um ano pra você conseguir marcar uma consulta. Você pede uma avaliação oftalmológica, e se você não ficar ligando pra um amigo pra conseguir... Então, eu fui contra essa forma de lidar assim, tudo vai ficar com a Zika. (Mariana, médica pediatra, 25 anos de experiência com crianças).

Essa divergência entre profissionais é reflexo do quanto a epidemia da SCVZ trouxe à tona a situação de outras crianças com distúrbios neurológicos, para os quais não existiam programas específicos de atendimento. Enquanto para a SCVZ vieram recursos financeiros específicos, para as outras síndromes negligenciadas, a condição de invisibilidade só era reforçada, dada a resposta e priorização das ações governamentais, em caráter emergencial, para as crianças afetadas pelo vírus Zika, o que levou os profissionais a se questionarem quanto ao destino de recursos tão esperados por eles, e que, até então não tinham sido destinados.

Sendo assim, observou-se que o projeto assistencial inicial, que tinha como proposta unificar os atendimentos direcionados para reabilitação neurológica infantil, foi superado por outro projeto, voltado exclusivamente para o atendimento das crianças com SCVZ.

O Centro de Referência em Neurorreabilitação

Após a reorganização dos serviços do centro de referência que culminou na mudança de prédio, contratação de novos profissionais e criação de um novo fluxo para atender às crianças com SCVZ, percebeu-se que uma parte dessa clientela residia no interior do estado. A localização de moradia distante do centro de reabilitação, situado na capital, foi encarado pelos profissionais como algo que poderia inviabilizar a continuidade do tratamento, devido aos custos semanais com transporte, alimentação e, eventualmente, estadia para reabilitação das crianças.

Depois de um tempo trabalhando com essas mães, a gente viu que tinham outras necessidades, por isso que foi pensado [a inclusão do] o psiquiatra, por isso que foi pensada a música, por isso que foi pensada a hospedagem, foi um diferencial da reabilitação. Porque a reabilitação seria aquele momento do paciente vir, entrar no consultório, ser atendido por um profissional, não envolvia tanto a família. Aqui, a gente já envolve mais a família, a família já participa das atividades. Esse foi o diferencial da casa. (Betânia, gestora hospitalar, 18 anos de experiência com crianças).

O Centro de reabilitação para crianças com SCVZ tem capacidade para receber cerca de 15 famílias, ou seja, um responsável, frequentemente a mãe, e a criança, durante uma semana, período em que uma equipe interprofissional desenvolve atividades que envolvem os responsáveis e as crianças.

A nova unidade, localizada em uma das áreas mais nobres da cidade, tem como proposta a atuação conjunta dos profissionais durante os atendimentos. Seu caráter inovador e singular tem a família como unidade de cuidado. Os profissionais buscam transmitir conhecimentos técnicos para a mãe, encorajando-a e capacitando-a para realizar estimulações cotidianas,a partir do uso de materiais adaptados e de baixo custo, ensinados em oficinas realizadas no Centro. Esta proposta visa possibilitar a continuidade de cuidados, reduzindo as dificuldades no acesso à reabilitação.

A Casa possui em sua estrutura quartos coletivos preparados para receber famílias, vindas do interior, que ficam alojadas durante a semana. Famílias residentes na capital também são atendidas, mas não pernoitam na casa. A inovação com relação ao atendimento é o caráter de imersão. Ao longo de uma semana, a criança e seu responsável convivem com uma equipe composta por médico, enfermeiro, fisioterapeuta, fonoaudiólogo, psicólogo, terapeuta ocupacional, pedagogo e professores de música e arte.

O Centro também dispõe de acompanhamento de nutricionista e de chefe de cozinha que ensinam às mães desde variedades no preparo de alimentos para as crianças até oficinas de cunho profissionalizante para que as mulheres, que deixaram de trabalhar fora para cuidar de seus filhos, possam obter uma renda extra com a comercialização de produtos como bolos, cookies, entre outros. Há também uma quadra onde acontecem os encontros dos grupos de apoio, um auditório e salas de atendimento multiprofissional.

Outra inovação diz respeito à proposta de capacitação de profissionais de saúde de demais municípios para que os mesmos possam realizar o acompanhamento das crianças com SCVZ em sua própria cidade natal. O modelo de reabilitação que dá suporte ao projeto do Centro está calcado numa perspectiva processual e principalmente na participação da família. A organização do processo de trabalho na atividade do Centro de Referência está pautada em um trabalho em equipe que planeja uma assistência integral tendo a família como unidade de cuidado, mas também, um processo de trabalho pensado por cada profissional dentro da sua especialidade profissional. Para isso, os profissionais precisaram conhecer a realidade e necessidade da família, conforme foi observado na fala da Betânea.

Segundo os profissionais, durante o processo de organização deste centro, os pais tiveram importante presença, cobravam respostas dos profissionais e gestores e exigiam atendimento exclusivo. Informaram também que os pais se articularam em grupos nas redes sociais e reivindicaram, junto ao governo, direitos à saúde das crianças.

Foi um pedido das famílias! As famílias pediram que esse centro, é ..., aumentasse, e as famílias começaram a pedir por transporte porque estavam vendo as dificuldades, e as famílias não estavam mais indo para o centro de referência. (Betânia, gestora hospitalar, 18 anos de experiência com crianças).

A luta dos pais e o apoio encontrado nas redes sociais fortaleceu a participação da família como sujeito ativo do processo de cuidar. O conhecimento empírico e prático do cotidiano das famílias instrumentaliza o plano de cuidados para essas crianças (BARBOSA, 2016BARBOSA, N. S. A formação das redes de apoio em torno da microcefalia e síndrome congênita do zika. Rio de Janeiro: [s. n.], 2016.).

Diniz (2016) ressalta a importância da família como “ciência doméstica” que se move em paralelo à ciência da medicina como fator que identifica os novos sinais e sintomas da SCVZ, pois eles estão presentes diariamente ao lado das crianças. Contemplá-los como parte integrante do cuidado e da tomada de decisões foi uma prática adotada pelo novo Centro que buscou estabelecer uma parceria com as mães, principais cuidadoras.

Ter o apoio da família facilita o acesso e a aceitação das orientações realizadas, pois a intimidade, a confiança e o vínculo estabelecido, favorecem a qualidade da assistência e resultam em maior gratificação pessoal e profissional, influenciando diretamente no processo de trabalho em saúde (SOUZA; MATOS, 2018SOUZA, S. E.; MATOS, S. S. Percepção de profissionais de saúde sobre reabilitação para crianças com síndrome congênita do Zika vírus em uma unidade de Vitoria de Santo Antão Pernambuco. Revista Idealogando, [s. l.], v. 2, n. 1, p. 138-148, 2018.).

Segundo os profissionais, após a epidemia de SCVZ, acolher a família como parte do processo de reabilitação e reconhecer a unidade familiar como uma dimensão mais ampla do cuidado foi uma orientação que passou a ser seguida por todos.

Aqui é porta aberta para as mães, elas entram aqui, resolvem, passam o dia, talvez por isso que aqui é bem movimentado, porque aqui elas têm a liberdade de chegar e dizer: isso aqui, o que eu faço, eu tenho uma foto do meu filho, posso trazer? Eu: Pode! (Betânia, gestora hospitalar, 18 anos de experiência com crianças).

O profissional quando ele entra pra trabalhar aqui, a gente passa logo pra ele se colocar no lugar dessas famílias (...) a gente passa pra eles que não tem essa diferença, que todo mundo aqui olha pra criança e não pra deficiência. (César, gestor, 5 anos de experiência com crianças).

Os profissionais passaram a estimular mais a participação da família na definição e no planejamento da assistência, com vistas a instrumentalizá-la para tomar decisões relacionadas com a saúde e com a doença. Tornando assim, a família como sujeito ativo do processo saúde-doença. Ouverney e Noronha (2013) afirmam que, para esse modelo de assistência ocorrer, o processo de trabalho deve ganhar contornos específicos, tais como qualificação e perfil diferenciado da equipe profissional, já que a ênfase da assistência não está nos procedimentos técnicos, mas sim, na inter-relação equipe/família e equipe/equipe.

Ressalta-se que a participação da família na definição e planejamento da assistência pode ser pensada como uma forma de reduzir a hierarquia na relação entre profissionais de saúde e usuários e seus familiares. Há também uma transferência de conhecimento para os familiares para que possam continuar exercitando as crianças cotidianamente.

Diante da adaptação necessária para contemplar esse novo público, as mudanças estruturais, nas relações de trabalho e na prestação da assistência, resultaram no surgimento de um novo serviço de reabilitação, que traz consigo, alguns princípios doutrinários do SUS como norteadores desse novo serviço, sendo a integralidade, o mais presente.

Ressalta-se ainda que, embora os pais tenham participado ativamente da busca desse novo serviço, eles não participaram da gestão do serviço de saúde como sujeito ativo nas tomadas de decisão e cogestores. Observa-se que eles são sujeitos ativos na assistência das crianças, sendo incluídos como unidade do cuidado e empoderados quanto a necessidade dos seus filhos, através de uma ação interprofissional. As relações sociais precisaram ser reconfiguradas para uma assistência interdisciplinar, o que proporciona uma diminuição na hierarquia entre os profissionais e entre os profissionais e pacientes.

Destarte, reitera-se que, as crises epidemiológicas apenas agravam situações de crise vividas pela sociedade, evidenciando necessidades já existentes. A exemplo do impacto da pandemia da Covid-19, a epidemia do vírus Zika provocou uma necessidade de reestruturação dos serviços de saúde; é um desafio para a ciência e para profissionais de saúde tanto no sentido da etiologia da doença quanto do prognóstico e terapêutica; tais doenças ampliam ainda mais as desigualdades sociais (SANTOS, 2020SANTOS, B. S. A cruel pedagogia do vírus. Coimbra: Edições Almedina, 2020.).

É importante considerar que existe um devir histórico no âmbito da saúde coletiva acerca dos princípios do SUS, principalmente quanto a participação social na gestão dos serviços de saúde. O centro de neurorreabilitação foi um projeto único, que partiu da assistência interdisciplinar, com a coparticipação das famílias como sujeitos ativos no cuidado, buscando o empoderamento dessas famílias através do conhecimento para a reabilitação das crianças.

Considerações finais

A epidemia de SCVZ trouxe vários desafios para a saúde pública. Foi vivenciada pelos profissionais de saúde como algo inesperado e desconhecido que, no primeiro momento, desorganizou a dinâmica do trabalho realizado na assistência, em virtude do aumento da demanda. Diante da nova doença, profissionais experimentaram a exaustão por causa da intensa mudança na dinâmica do trabalho, além das incertezas sobre prognósticos e o controle da doença.

A classificação da epidemia como emergência de saúde pública de interesse internacional, a grande repercussão na mídia e, sobretudo, as dificuldades das equipes de saúde, para realizar o acompanhamento das crianças, propiciaram discussões acerca da necessidade de mudanças na organização dos serviços. O debate sobre as vantagens e desvantagens da junção de especialidades em um único serviço ou sua fragmentação já era algo discutido anteriormente. Todavia, o impacto provocado pela epidemia criou condições para que mudanças nos serviços acontecessem num ritmo mais acelerado do que num tempo de “normalidade” anterior à epidemia.

A epidemia da Zika também evidenciou a invisibilidade de outros distúrbios neurológicos infantis, visto a ausência de programas e acesso a tratamentos específicos. A prioridade de ações voltadas para o atendimento de crianças afetadas pela SCVZ aumentou a precariedade das condições da assistência à saúde para outras deficiências neurológicas infantis.

Discordâncias com relação ao projeto de criação de centro de reabilitação exclusivo para pacientes de Zika causou descontentamentos e rupturas entre os profissionais, sobretudo entre os que defendiam a acessibilidade de novos recursos a crianças com mesmas necessidades, mas com outras síndromes neurológicas.

O novo serviço de saúde tem como características a realização de um trabalho interdisciplinar em que profissionais atuam em conjunto entre si e em parceria com a família, especialmente a mãe, principal cuidadora, a partir de uma perspectiva integral da criança em processo de reabilitação.

A falta de investimentos no sistema de saúde, em termos materiais e na força de trabalho, indica que em momentos críticos, como a da epidemia da Zika e atualmente a da Covid-19, ocorre uma sobrecarga dos profissionais de saúde, que ficam submetidos a mudanças no processo de trabalho em saúde. Estas transformações na organização do espaço, sua dinâmica e os meios de trabalho afetam suas vidas profissional e pessoal.

As epidemias são desafios para a saúde pública que impulsionam mudanças e provocam insegurança nos profissionais pela falta de prognóstico, dessa forma, percebe-se que as epidemias modificam o processo de trabalho em saúde e são capazes de evidenciar uma situação de crise que já existe, impulsionando mudanças e adaptações para atender a nova demanda e subsidiar conhecimentos para reduzir impactos de futuras crises epidemiológicas.

  • 1
    Artigo desenvolvido como produto de tese de doutorado, a partir de dados coletados na pesquisa guarda-chuva “Síndrome congênita pelo Zika vírus, soroprevalência e análise espacial e temporal de vírus Zika e Chikungunya no Maranhão”. Esta foi fomentada pelo Programa de Pesquisa para o SUS (PPSUS), após submissão ao Edital n° 008/2016 da FAPEMA/CNPq (FINANCE CODE 001).

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Editor responsável: Rogério Azize

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    07 Jul 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    07 Jan 2022
  • Aceito
    24 Mar 2022
  • Revisado
    03 Out 2022
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