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ANÁLISE DAS EMENTAS DE ORIENTAÇÃO PROFISSIONAL EM CURSOS DE PSICOLOGIA: DESAFIOS ATUAIS

Análisis de las propuestas de Orientación Profesional en cursos de Psicología: desafíos actuales

RESUMO

Objetivou-se analisar as ementas das disciplinas de Orientação Profissional (OP) oferecidas nos cursos de Psicologia das universidades brasileiras. Para o levantamento foi extraída uma planilha disponibilizada no site do Ministério da Educação (MEC). Foram selecionadas para análise final 742 instituições de Ensino Superior, sendo recuperadas 234 com oferta da disciplina de OP e destas, 70 ementas foram verificadas. Analisou-se a diversidade dos títulos das disciplinas, sendo Orientação Profissional o mais recorrente com 40,8%, além disso, 70% pertenciam à rede privada e 88,6% eram disciplinas obrigatórias. A região Sudeste representou 40% das ementas analisadas, sendo a carga horária de 60 horas a de maior predominância. Verificou-se que a disciplina é frequentemente ofertada no oitavo semestre. Foram estabelecidas 13 categoriais para análise do conteúdo das ementas. Os resultados foram examinados mediante a literatura científica, indicando a necessidade de maior aprofundamento no conteúdo das ementas, a fim de possibilitar uma melhor formação aos orientadores profissionais.

Palavras-chave:
orientação profissional; ementa; ensino superior; psicologia

RESUMEN

El objetivo de este estudio es analizar las propuestas de las asignaturas de Orientación Profesional (OP) ofrecidas en los cursos de Psicología de las universidades brasileñas. Para la recopilación se sacó una hoja disponible en el sitio del Ministerio de la Educación (MEC). Se seleccionaron para análisis final 742 instituciones de enseñanza universitaria, siendo recuperadas 234 con oferta de la asignatura de OP y de estas, 70 propuestas se verificaron. Se analizó la diversidad de los títulos de las asignaturas, y Orientación Profesional el más recurrentes con el 40,8%, además de eso, el 70% pertenecían a la red privada y el 88,6% eran asignaturas obligatorias. La región Sudeste representó el 40% de las propuestas analizadas, y la carga horaria de 60 horas la de mayor predominancia. Se verificó que la asignatura es frecuentemente ofrecida en el octavo semestre. Se estableció 13 categorías para análisis del contenido de las propuestas. Los resultados se examinaron mediante la literatura científica, indicando la necesidad de más profundización en el contenido de propuesta, con la finalidad de posibilitar una mejor formación a los orientadores profesionales.

Palabras clave:
orientación profesional; propuesta; enseñanza universitaria; psicología

ABSTRACT

The objective was to analyze the syllabus of the Vocational Guidance (VG) disciplines offered in Psychology courses at Brazilian universities. For the survey, a spreadsheet available on the website of the Ministry of Education (MEC) was extracted. A total of 742 Higher Education institutions were selected for final analysis, 234 of which offering the VG subject were retrieved, and 70 of these were verified. The diversity of subject titles was analyzed, with VG being the most recurrent with 40.8%, in addition, 70% belonged to the private network and 88.6% were compulsory subjects. The Southeastern region represented 40% of the analyzed syllabus, with the workload of 60 hours being the most predominant. It was found that the discipline is often offered in the eighth semester. Thirteen categories were established for analyzing the content of the syllabus. The results were examined through the scientific literature, indicating the need for greater depth in the content of the syllabus, in order to enable better training for vocational counselors.

Keywords:
vocational guidance; menu; university education; psychology

INTRODUÇÃO

Desde o seu surgimento, a área de Orientação Profissional (OP) vem passando por transformações tanto em sua concepção teórica quanto prática conforme as necessidades presentes no contexto social e político. De acordo com Ribeiro e Melo-Silva (2011Ribeiro., M. A.; Melo-Silva, L. L. (2011). Compendio de Orientação profissional e de careira: Enfoques teóricos contemporâneos e modelos de intervenção (pp. 1-30). São Paulo: Vetor.), ao longo de mais de um século, muitos investigadores buscaram compreender e explicar o papel do trabalhador e das ocupações em diferentes grupos culturais, desenvolvendo diversos enfoques teóricos, bem como técnicas e estratégias de avaliação e intervenção vocacional, sendo que a maioria se baseia nas ciências psicológicas.

O crescimento da OP ao longo dos últimos anos se deve ao fato de tratar-se de um processo que facilita a escolha e construção da trajetória profissional, buscando o desenvolvimento do autoconhecimento e do conhecimento das atividades profissionais (Bardagi & Nunes, 2017Bardagi, M. P.; Nunes, M. F. O. (2017). Avaliação em intervenções de carreira. In M. R. C. Lins; J. C. Borsa (Eds.), Avaliação Psicológica: aspectos teóricos e práticos (pp. 446-457). Petrópolis. RJ: Vozes.). Esse processo passa por diferentes etapas, sendo uma delas a reafirmação profissional que se caracteriza pela consolidação dos motivos e interesses profissionais durante o estudo ou preparação para o desempenho da futura profissão (Álvarez & Iglesias, 2020Álvarez, I. N.; Iglesias, A. A. (2020). La reafirmación profesional en la especialidad Informática de la Educación Técnica y Profesional: proyecto educativo. Mendive, 18(2), 206-218. Recuperado dehttp://mendive.upr.edu.cu/index.php/MendiveUPR/article/view/1865
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). Deste modo, o principal objetivo da OP é preparar o indivíduo para a tomada de decisão profissional e para administração da sua carreira (Ambiel, Campos, & Campos, 2017Ambiel, R. A. M.; Campos, M. I.; Campos, P. P. T. V. Z. (2017). Análise da Produção Científica Brasileira em Orientação Profissional: Um Convite a Novos Rumos. Psico-USF, 22(1), 133-145. https://doi.org/10.1590/1413-82712017220112
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; Mitran & Pârvu, 2017Mitran, P. C.; Pârvu, I. (2017). Organization of the counseling and vocational guidance centers within pre-university education. Economics, Management and Financial Markets, 12(2), 105. Recuperado de https://www.questia.com/library/journal/1P4-1918794287/organization-of-the-counseling-and-vocational-guidance
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; Perry & Shanoon, 2017Perry, J. C.; Shannon, L. (2017). How vocational psychologists can make a difference in K-12 education. International Journal for Educational and Vocational Guidance, 17(1), 97-115. https://doi.org/10.1007/s10775-016-9335-9
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).

Nesse sentido, a atuação em OP não se restringe a um momento de vida ou público específico, pois pode ser aplicada em populações variadas (Oliveira, Santos, & Dias, 2016). Na atualidade, novas perspectivas de OP e de carreira vêm surgindo, impulsionadas por mudanças na relação entre as pessoas e suas carreiras (Guichard, 2015). Assim, as discussões e a efetiva aplicação da OP no século XXI deve considerar a conjuntura atual do mundo do trabalho, caracterizada por mudanças constantes, instabilidade, transições ocupacionais e criatividade, compreendendo assim, que o trabalhador pode estabelecer novos padrões de relação para a oferta de seus serviços (Ambiel, 2019Ambiel, R. A. M.; Zuanazzi, A. C.; Sette, C. P.; Costa, A. R. L.; Cunha, F. A. (2019). Análise de Ementas de Disciplinas de Avaliação Psicológica: novos tempos, velhas questões. Avaliação Psicológica, 18(1), 21-30. https://doi.org/ 10.15689/ap.2019.1801.15229.03
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; Bardagi & Nunes, 2017Bardagi, M. P.; Nunes, M. F. O. (2017). Avaliação em intervenções de carreira. In M. R. C. Lins; J. C. Borsa (Eds.), Avaliação Psicológica: aspectos teóricos e práticos (pp. 446-457). Petrópolis. RJ: Vozes.; Ribeiro et al., 2016Ribeiro, M. A.; Uvaldo, M. C. C.; Fonçatti, G.; Audi, D. A.; Agostinho, M. L.; Malki, Y. (2016). Ser adolescente no século XXI. In R. S. Levenfus(Ed.), Orientação Vocacional e de Carreira em contextos clínicos e educativos (pp. 13-23). Porto Alegre: Artmed.).

Com as transformações do ponto de vista teórico e metodológico na área de OP, bem como a mudança do perfil comportamental das novas gerações, influenciadas pela popularização tecnológica, evidencia-se que a formação do profissional de Psicologia deve acompanhar essas atualizações (Machado & Oliveira, 2019Machado, Y. F.; Oliveira, F. K. (2019). Orientação profissional, gamificação e educação profissional e tecnológica: uma revisão sistemática de literatura. Educação Profissional e Tecnológica em Revista, 3(1), 108-126. Recuperado de https://ojs.ifes.edu.br/index.php/ept/article/view/380/341
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). Com isso, vale apontar os pressupostos teóricos e práticos atuais inerentes à OP e sua relevância para o ensino e aprendizagem dos conteúdos dessa disciplina (Noronha & Ambiel, 2006Noronha, A. P. P.; Ambiel, R. A. M. (2006). Orientação profissional e vocacional: análise da produção científica. Psico-USF, 11(1), 75-84. Recuperado dehttp://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1413-82712006000100009&script=sci_abstract&tlng=pt
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; Nunes, Noronha, & Ambiel, 2007Nunes, M. F. O.; Noronha, A. P. P.; Ambiel, R. A. M. (2007). Conteúdos ensinados em disciplinas de orientação profissional na graduação em psicologia. Estudos e Pesquisas em Psicologia, 7(1), 127-137. Recuperado dehttp://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S180842812007000100011&lng=pt&tlng=pt.
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). Mediante as constantes mudanças, será que as instituições de ensino atualizaram seus conteúdos?

As universidades são as principais difusoras do conhecimento no campo da OP, com destaque para os cursos de Psicologia, que são os que mais oferecem disciplinas e estágios na área, seguidos dos cursos de Pedagogia. Sua estrutura permite a criação de núcleos de pesquisa e oferta de serviços de extensão oferecidos à comunidade (Melo-Silva, Lassance, & Soares, 2004Melo-Silva, L. L.; Lassance, M. C. P.; Soares, D. H. P. (2004). A orientação profissional no contexto da educação e trabalho. Revista Brasileira de Orientação Profissional, 5(2), 31-52. Recuperado de https://repositorio.usp.br/item/001468909
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). Algumas instituições disponibilizam o conteúdo de OP em disciplinas específicas dedicadas a essa temática, enquanto outras se referem às disciplinas mais abrangentes que abordam outros temas como, por exemplo, Psicologia Escolar e/ou Psicologia Organizacional. Ademais, essa disciplina pode constar tanto na grade curricular obrigatória como em caráter optativo (Luna, 1999Luna, I. N. (1999). A formação do psicólogo como um orientador profissional reflexivo e criativo.Revista da ABOP, 3(1), 97-107. Recuperado dehttp://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-88891999000100009&lng=pt&tlng=pt
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).

O estudo realizado por Ambiel, Zuanazzi, Sette, Costa e Cunha (2019Ambiel, R. A. M.; Zuanazzi, A. C.; Sette, C. P.; Costa, A. R. L.; Cunha, F. A. (2019). Análise de Ementas de Disciplinas de Avaliação Psicológica: novos tempos, velhas questões. Avaliação Psicológica, 18(1), 21-30. https://doi.org/ 10.15689/ap.2019.1801.15229.03
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) buscou analisar as ementas de Avaliação Psicológica em cursos de Psicologia, sendo identificada como insuficiente a carga horária dedicada a essas disciplinas. Ademais, Paula, Pereira e Nascimento (2007Paula, A. V.; Pereira, A. S.; Nascimento, E. (2007). Opinião de alunos de psicologia sobre o ensino em avaliação psicológica. Psico-USF, 12(1), 33-43. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-82712007000100005
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) verificaram que os estudantes de Psicologia também consideram insatisfatórias as competências ensinadas para a sua prática do profissional nos diferentes contextos. Nesse cenário, é por intermédio da educação continuada, desenvolvida de maneira minuciosa, que estudantes se tornam profissionais preparados para a prática e, consequentemente, prestam serviços de qualidade à população (Ambiel & Hernández, 2016Ambiel, R. A. M. (2019). Avaliação psicológica aplicada aos processos de escolha e transição de carreira. In M. N. Baptista et al. (Eds.), Compêndio de Avaliação Psicológica (pp. 262-272). Petrópolis, RJ: Vozes.; Borsa, 2016Borsa, J. C. (2016). Considerações sobre a formação e a prática em avaliação psicológica no Brasil. Temas Em Psicologia, 24(1), 131-143. https://doi.org/10.9788/TP2016.1-09
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; Freires, Silva Filho, Monteiro, Loureto, & Gouveia, 2017Freires, L. A.; Silva Filho, J. H.; Monteiro, R. P.; Loureto, G. D. L.; Gouveia, V. V. (2017). Ensino de avaliação psicológica no Norte brasileiro: analisando as ementas das disciplinas. Avaliação Psicológica, 16(2), 205-214. https://doi.org/10.10689/AP2017.1602.11
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; Lamas, 2017Lamas, K. C. A. (2017). Conceito e relevância dos interesses profissionais no desenvolvimento de carreira: estudo teórico. Temas em Psicologia, 25(2), 703-717. https://doi.org/10.9788/TP2017.2-16Pt
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).

Melo-Silva, Bonfim, Esbrogeo e Soares (2003Melo-Silva, L. L.; Bonfim, T. A.; Esbrogeo, M. C.; Soares, D. H. P. (2003). Um estudo preliminar sobre práticas em Orientação Profissional. Revista Brasileira de Orientação Profissional, 4(1-2), 21-34. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1679-33902003000100004
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) realizaram uma pesquisa com 84 orientadores profissionais brasileiros, psicólogos e pedagogos. Os resultados evidenciaram que a principal necessidade referida foi de formação e capacitação do orientador profissional para enfrentar os desafios na atualidade. Nesses trabalhos, foi destacada a necessidade de realização de pesquisas, sobretudo longitudinais e a ampla divulgação dos resultados para os profissionais. Políticas públicas que tornem a orientação acessível a quem dela necessite foram mencionadas e enfatizou-se também a importância da ampliação e universalização da OP nas escolas, visando além dos estudantes de Ensino Médio o alcance aos demais níveis da educação, bem como trabalhadores e os desempregados.

Ainda quanto ao estudo de Melo-Silva et al. (2003Melo-Silva, L. L.; Bonfim, T. A.; Esbrogeo, M. C.; Soares, D. H. P. (2003). Um estudo preliminar sobre práticas em Orientação Profissional. Revista Brasileira de Orientação Profissional, 4(1-2), 21-34. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1679-33902003000100004
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), foi verificado pelos autores que 30% dos psicólogos consideraram a disciplina de OP em sua formação como excelente, 28% a avaliaram como fraca, 24% deixaram de avaliar e 18% a consideraram boa. As avaliações que consideraram a disciplina como fraca e as ausências de registros de avaliação advertem para a necessidade de maior aprofundamento dos docentes da área em relação aos conteúdos, métodos e perspectivas de atuação.

Nunes, Noronha e Ambiel (2007Nunes, M. F. O.; Noronha, A. P. P.; Ambiel, R. A. M. (2007). Conteúdos ensinados em disciplinas de orientação profissional na graduação em psicologia. Estudos e Pesquisas em Psicologia, 7(1), 127-137. Recuperado dehttp://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S180842812007000100011&lng=pt&tlng=pt.
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) analisaram os conteúdos ensinados em disciplinas de OP na graduação em Psicologia e avaliaram 25 ementas disponibilizadas nos sites das universidades. Os resultados indicaram uma pequena variação nas nomenclaturas empregadas, assim como verificaram que a maior parte pertencia ao currículo obrigatório das instituições. Observaram ainda que a maioria das disciplinas ocorrem na segunda metade dos cursos de graduação, com carga horária média de 62,6 horas. Por fim, a análise de conteúdo das ementas foi empregada com uma divisão em 19 categorias de respostas, o que indicou certa ênfase em elementos introdutórios da OP e na testagem empregada para esse fim.

Desde a década de 1990, houve um crescimento de estudos e publicações na área de OP (Ambiel, 2019Ambiel, R. A. M.; Zuanazzi, A. C.; Sette, C. P.; Costa, A. R. L.; Cunha, F. A. (2019). Análise de Ementas de Disciplinas de Avaliação Psicológica: novos tempos, velhas questões. Avaliação Psicológica, 18(1), 21-30. https://doi.org/ 10.15689/ap.2019.1801.15229.03
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; Mitran & Pârvu, 2017Mitran, P. C.; Pârvu, I. (2017). Organization of the counseling and vocational guidance centers within pre-university education. Economics, Management and Financial Markets, 12(2), 105. Recuperado de https://www.questia.com/library/journal/1P4-1918794287/organization-of-the-counseling-and-vocational-guidance
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), no entanto isso não corresponde à prática aplicada e muito menos à formação dos profissionais. Nesse mesmo período, houve um declínio na oferta de disciplinas e de estágios em OP nos cursos de Ensino Superior de Psicologia e Pedagogia no Brasil (Lisboa & Soares, 2017Lisboa, M. D.; Soares, D. H. P. (2017). Orientação profissional em ação: Formação e prática de orientadores. In M. D. Lisboa; D. H. P. Soares, (Eds.), A formação de orientadores profissionais: um compromisso social multiplicador (pp. 11-23). São Paulo: Summus Editorial.).

Conforme destaca Luna (1999Luna, I. N. (1999). A formação do psicólogo como um orientador profissional reflexivo e criativo.Revista da ABOP, 3(1), 97-107. Recuperado dehttp://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-88891999000100009&lng=pt&tlng=pt
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), quando se fala em construção do conhecimento, a didática adotada é fundamental. Em se tratando de OP, é importante considerar o conhecimento teórico, a habilidade prática e a condição pessoal necessária ao desempenho da função. Sobre a formação do orientador profissional nos cursos de Psicologia, é necessário discutir o Projeto Pedagógico, que deve incluir o perfil do profissional a ser formado. Assim, se considerarmos a diminuição da oferta da disciplina de OP ao longo dos anos, é cabível questionar qual o perfil de profissional efetivamente preparado para esse contexto estaria sendo formado ao longo da graduação.

Lisboa e Soares (2017Lisboa, M. D.; Soares, D. H. P. (2017). Orientação profissional em ação: Formação e prática de orientadores. In M. D. Lisboa; D. H. P. Soares, (Eds.), A formação de orientadores profissionais: um compromisso social multiplicador (pp. 11-23). São Paulo: Summus Editorial.) postulam que o papel do orientador profissional hoje, deve ser contextualizado de acordo com a situação política, econômica e social. Necessita não somente orientar para futuro, mas sim, para o presente repleto de urgências e incertezas que permeiam o mundo do trabalho e ainda, colocando o sujeito como ativo nesse processo. A formação do profissional deve favorecer a reflexão, construção do conhecimento e análise crítica sobre a situação subjetiva e objetiva do orientando. Estimulá-lo na busca por novas formas de ação, com base em teorias diversas da área; favorecer suas potencialidades e autoconhecimento das habilidades para o desempenho de seu papel de orientado. Por fim, deve capacitá-lo para agir com o máximo de competência e ética.

Com base nas conjecturas teóricas e empíricas apresentadas, a presente pesquisa teve como objetivo o mapeamento e análise das ementas de disciplinas voltadas a OP ministradas nos cursos de graduação em Psicologia nas instituições brasileiras. A escolha das ementas como elemento de análise se justifica pelo fato de que seus conteúdos devem representar aspectos primordiais a serem desenvolvidos nas disciplinas, no que tange tanto aos conhecimentos esperados, quanto às habilidades e práticas a serem desenvolvidas junto ao discente. Ademais, entender como essas transformações se fazem presentes atualmente no modelo educacional adotado pelas instituições de ensino, no que diz respeito ao conteúdo das disciplinas do curso de Psicologia, é de fundamental importância para a compreensão da atuação do Psicólogo no contexto da OP.

MÉTODO

Critérios e procedimentos de busca das ementas

Trata-se de um estudo documental, cujas fontes de análise foram as ementas disponíveis na disciplina de OP de cursos de graduação em Psicologia (bacharelado e licenciatura) de instituições brasileiras públicas e particulares. Para tanto, foi extraída em maio de 2019, uma planilha em Excel disponibilizada no site do Ministério da Educação (MEC) para levantamento dos cursos de graduação em Psicologia ativos de instituições cadastradas considerando as cinco regiões do país.

Em seguida, foi verificado no site de cada instituição cadastrada, se havia disciplinas de OP na grade curricular e, em seguida, se estas estavam disponíveis para acesso público. Ressalta-se que as instituições com mais de uma unidade foram consideradas como um todo, ou seja, não foram analisadas as ementas independentemente. Nos casos em que a ementa da disciplina não estava disponível no site da instituição, um e-mail era enviado ao coordenador do curso ou a outro contato disponível (fale conosco, e-mail geral), explicando os objetivos desta pesquisa e solicitando o envio da ementa vigente em um prazo de 30 dias.

Destaca-se que todos os critérios foram estabelecidos pelos autores do presente artigo, com elaboração das categorias em conjunto e treinamento presencial para padronização do procedimento. Inicialmente era preenchido o nome da instituição, se esta encontrava-se ativa, inativa ou em extinção no site do MEC (somente as ativas foram analisadas), e por fim, se possuía a disciplina de OP. Para a organização dos resultados de busca, foram propostas categorias de análise dispostas em planilha eletrônica.

Como critério de seleção das ementas, foram levantadas palavras-chave que poderiam estar presentes no nome das disciplinas, sendo: Orientação Profissional, Orientação Vocacional, Carreira, Orientação de Carreira, Aconselhamento de Carreira, Seleção e Gestão de Carreira, Escolha Profissional. A seleção inicial resultou em um total de 1.082 instituições que, após a aplicação dos critérios de exclusão somaram um total de 742, conforme será detalhado no tópico de Resultados e Discussão.

Procedimentos de análise das ementas

As ementas selecionadas foram organizadas em uma planilha de Excel com as informações referentes às categorias de análise, a saber: título da disciplina, região do Brasil da instituição de ensino, caráter da disciplina (obrigatória ou optativa), categoria administrativa da instituição (pública ou privada), semestre e carga horária ofertada e descrição da ementa.

Além disso, foram realizadas análises descritivas e de conteúdo das ementas das disciplinas de OP. No primeiro caso, essas se referiram aos dados de frequência para cada uma das categorias anteriormente mencionadas. Quanto à análise documental de conteúdo, as ementas selecionadas foram divididas em unidades de texto, conforme os preceitos de Bardin (1977Bardin, L. (1977). Análise de Conteúdo. São Paulo: Edições 70.), para que o conteúdo fosse explorado como unidades de análise. Para tanto, foram criadas categorias de acordo com o assunto pautado nas respectivas ementas e então, analisadas individualmente, os dados foram contabilizados conforme identificado o mesmo assunto nas demais ementas. O objetivo desse levantamento foi identificar quais os assuntos mais frequentemente abordados.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Com base no objetivo proposto, os resultados foram analisados segundo duas vertentes. Primeiro, realizaram-se as análises descritivas e, posteriormente, os conteúdos das ementas foram explorados enquanto unidades de análise, ou seja, qualitativamente. Assim, primeiramente serão apresentados os resultados da busca total e na sequência aqueles relacionados às ementas das disciplinas.

Inicialmente, foram encontradas no site do MEC 1.082 instituições de ensino com o curso de Psicologia. Dessas instituições, cinco foram excluídas pelo curso constar como “inativo” e 18 por estarem “em extinção”. Assim, considerou-se para análise subsequente 1.059 instituições. Na sequência, foram excluídas 317 instituições que estavam duplicadas no site do MEC, o que se deve, possivelmente, à atualização do sistema eletrônico. Diante do exposto, foram selecionadas para análise final 742 instituições de Ensino Superior.

Das 742 instituições, procedeu-se à análise da existência de disciplinas de OP. Considerando as instituições ativas e aquelas em que foi possível obter a informação se oferece ou não a disciplina de OP, obteve-se um total de 498, sendo 48 públicas e 450 privadas. Desse total, 29 instituições públicas e 205 privadas ofertavam, efetivamente, a disciplina de OP, perfazendo a soma de 234 instituições.

Sobre a análise das ementas, foram recuperadas 70 que constavam no próprio site das instituições, ou então fornecidas eletronicamente, via e-mail, pelo coordenador do curso de Psicologia. Assim, os resultados apresentados na sequência referem-se exclusivamente às 70 ementas analisadas.

Em relação ao nome das disciplinas, verificou-se mais de dez títulos, sendo o mais recorrente Orientação Profissional (40,8%), seguido por Orientação Vocacional (22,5%) e Orientação Profissional e de Carreira (8,5%). Houve, ainda, Orientação para escolha profissional (2,8%) e Processos de escolha profissional (2,8%). Os demais títulos (15 encontrados) apareceram apenas uma vez. Desta feita, pode-se dizer que apesar de tal diversidade, há um predomínio no que se refere à Orientação Profissional, seguido por Orientação Vocacional, que obtiveram valores sobrepujantes em relação aos demais.

Conforme apontado por Nunes et al. (2007Nunes, M. F. O.; Noronha, A. P. P.; Ambiel, R. A. M. (2007). Conteúdos ensinados em disciplinas de orientação profissional na graduação em psicologia. Estudos e Pesquisas em Psicologia, 7(1), 127-137. Recuperado dehttp://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S180842812007000100011&lng=pt&tlng=pt.
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), tal fato pode indicar que todo o conteúdo de OP frequentemente é alocado em disciplinas com nomenclaturas mais abrangentes, o que não necessariamente contemplaria uma formação com os assuntos específicos e aprofundados sobre a temática nos cursos de graduação. Além disso, conforme já destacado anteriormente por Noronha e Ambiel (2006Noronha, A. P. P.; Ambiel, R. A. M. (2006). Orientação profissional e vocacional: análise da produção científica. Psico-USF, 11(1), 75-84. Recuperado dehttp://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1413-82712006000100009&script=sci_abstract&tlng=pt
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), a diversidade de nomenclaturas estaria relacionada a uma confusão conceitual na área, uma vez que muitos termos são usados para definir a Orientação Profissional. Assim, tem-se a necessidade de uma organização e definição mais clara dos termos utilizados e dos conteúdos abarcados.

Quanto à categoria administrativa das instituições, 70% eram privadas e 30% instituições públicas. No que diz respeito ao caráter da disciplina, 62 (88,6%) faziam parte do currículo obrigatório e 8 (11,4%) eram optativas. Conforme apontado pela literatura, algumas universidades disponibilizam a disciplina de OP na grade curricular de forma optativa e não obrigatória para que seja cursada (Luna, 1999Luna, I. N. (1999). A formação do psicólogo como um orientador profissional reflexivo e criativo.Revista da ABOP, 3(1), 97-107. Recuperado dehttp://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-88891999000100009&lng=pt&tlng=pt
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).

É válido mencionar que a graduação em Psicologia permite que o profissional atue em diversas áreas após sua formação, incluindo a orientação profissional. Nesse sentido, a não obrigatoriedade da disciplina relacionada à OP ao longo da graduação impossibilita que o discente entre em contato com esta área e saiba como conduzir as especificidades de sua prática caso se faça necessário. A formação em Psicologia tem como perspectiva a necessidade da aproximação entre a teoria e a prática (MEC, 2011), sendo que o núcleo comum desse curso explicita por diversas vezes a necessidade de uma formação que contemple o domínio básico dos conhecimentos psicológicos e a capacidade de utilizá-los em diferentes contextos de aplicação.

Em relação às regiões das instituições que continham ementas, essas foram diversificadas. A Tabela 1, apresentada na sequência, indica os resultados.

Tabela 1
Região das Instituições de Ensino com ementas de OP.

Com base na Tabela 1, verifica-se uma distribuição pouco proporcional entre o número de instituições que possuem disciplinas com ementa de OP, com predominância das regiões Sudeste e Sul, sendo a menor concentração da região Centro-Oeste, seguida pelo Norte. Tal resultado corrobora os achados de Ambiel et al. (2017Ambiel, R. A. M.; Campos, M. I.; Campos, P. P. T. V. Z. (2017). Análise da Produção Científica Brasileira em Orientação Profissional: Um Convite a Novos Rumos. Psico-USF, 22(1), 133-145. https://doi.org/10.1590/1413-82712017220112
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), que em sua revisão de literatura encontraram uma predominância de publicações relativas às regiões Sudeste e Sul do Brasil. Assim, pode-se presumir que nessas regiões do país há um interesse maior no ensino e na sistematização das pesquisas em OP.

A esse respeito dois pontos merecem ser mencionados. O primeiro deles diz respeito ao predomínio da região Sudeste na maior parte das análises que consideram variáveis acadêmicas, quer seja na quantidade de cursos de graduação cadastrados pelo MEC, como também nos cursos de pós-graduação e na quantidade de doutores (Ambiel et al., 2017Ambiel, R. A. M.; Campos, M. I.; Campos, P. P. T. V. Z. (2017). Análise da Produção Científica Brasileira em Orientação Profissional: Um Convite a Novos Rumos. Psico-USF, 22(1), 133-145. https://doi.org/10.1590/1413-82712017220112
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; Ambiel, Zuanazzi, Sette, Costa, & Cunha 2019Ambiel, R. A. M.; Zuanazzi, A. C.; Sette, C. P.; Costa, A. R. L.; Cunha, F. A. (2019). Análise de Ementas de Disciplinas de Avaliação Psicológica: novos tempos, velhas questões. Avaliação Psicológica, 18(1), 21-30. https://doi.org/ 10.15689/ap.2019.1801.15229.03
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). O segundo ponto seria que a presente pesquisa foi realizada somente com 70 ementas de graduação. No entanto, seu número reduzido traz indicativos, ainda que em menor abrangência, das hipóteses supracitadas, sendo necessários outros estudos de maior abrangência para uma verificação mais aprofundada.

Quanto à carga horária das disciplinas, a média encontrada foi de 63,70 horas, sendo predominantes disciplinas com 60 horas (32,9%), seguida por 40 horas (14,3%) e 80 horas (11,4%), respectivamente. A carga horária mínima encontrada foi de 30 horas e a máxima 136 horas. Esse dado indica a discrepância entre as instituições no que se refere à quantidade de horas dedicadas à disciplina de OP, corroborando com os achados de Nunes et al. (2007Nunes, M. F. O.; Noronha, A. P. P.; Ambiel, R. A. M. (2007). Conteúdos ensinados em disciplinas de orientação profissional na graduação em psicologia. Estudos e Pesquisas em Psicologia, 7(1), 127-137. Recuperado dehttp://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S180842812007000100011&lng=pt&tlng=pt.
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) no que se refere a uma predisposição por carga horária com cerca de 60 horas. Por outro lado, no estudo citado, a média do tempo destinado à OP foi de 63,70 horas, o que corresponde ao dobro dos achados da presente pesquisa.

Pressupõe-se que, com o passar dos anos, apesar do crescente aumento e interesse na área de OP (Mitran & Pârvu, 2017Mitran, P. C.; Pârvu, I. (2017). Organization of the counseling and vocational guidance centers within pre-university education. Economics, Management and Financial Markets, 12(2), 105. Recuperado de https://www.questia.com/library/journal/1P4-1918794287/organization-of-the-counseling-and-vocational-guidance
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; Perry & Shanoon, 2017Perry, J. C.; Shannon, L. (2017). How vocational psychologists can make a difference in K-12 education. International Journal for Educational and Vocational Guidance, 17(1), 97-115. https://doi.org/10.1007/s10775-016-9335-9
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), a ela vem sendo dedicado menos tempo nos cursos de graduação em Psicologia. Tal afirmativa encontra-se em consonância ao indicado por Lisboa e Soares (2017Lisboa, M. D.; Soares, D. H. P. (2017). Orientação profissional em ação: Formação e prática de orientadores. In M. D. Lisboa; D. H. P. Soares, (Eds.), A formação de orientadores profissionais: um compromisso social multiplicador (pp. 11-23). São Paulo: Summus Editorial.) sobre o declínio do oferecimento da disciplina e de estágios em OP nos cursos de Ensino Superior de Psicologia e Pedagogia no Brasil. Vale rememorar o objetivo da OP, que seria preparar o indivíduo para a tomada de decisão profissional e para administração da sua carreira (Ambiel, 2019Ambiel, R. A. M.; Zuanazzi, A. C.; Sette, C. P.; Costa, A. R. L.; Cunha, F. A. (2019). Análise de Ementas de Disciplinas de Avaliação Psicológica: novos tempos, velhas questões. Avaliação Psicológica, 18(1), 21-30. https://doi.org/ 10.15689/ap.2019.1801.15229.03
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; Ambiel et al., 2017Bardagi, M. P.; Nunes, M. F. O. (2017). Avaliação em intervenções de carreira. In M. R. C. Lins; J. C. Borsa (Eds.), Avaliação Psicológica: aspectos teóricos e práticos (pp. 446-457). Petrópolis. RJ: Vozes.). Diante isso, na atual conjuntura do mundo do trabalho, com especificidades e mudanças constantes, tal disciplina possui um caráter de exímia importância, possibilitando a ação recorrente de profissionais capacitados diante das novas demandas da sociedade.

Dando sequência aos resultados, a maior parte das disciplinas ocorre na segunda metade do curso de graduação. Os achados estão dispostos para verificação na Tabela 2.

Tabela 2
Semestre nos quais as disciplinas são oferecidas.

Diante do exposto na Tabela 2 é possível observar que, na maior parte das vezes, a disciplina de OP é ofertada no oitavo semestre, seguido pelo sétimo. 17,1% das instituições não apresentavam esta informação, bem como, conforme já elucidado, 11,4% se referiam a disciplinas ofertadas de modo optativo. Esse resultado se assemelha aos achados de Nunes et al. (2007Nunes, M. F. O.; Noronha, A. P. P.; Ambiel, R. A. M. (2007). Conteúdos ensinados em disciplinas de orientação profissional na graduação em psicologia. Estudos e Pesquisas em Psicologia, 7(1), 127-137. Recuperado dehttp://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S180842812007000100011&lng=pt&tlng=pt.
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), em que a maior concentração de disciplinas de OP também ocorreu no quarto ano do curso de Psicologia. Ao considerar a importância do caráter teórico/prático da disciplina de OP, é cabível que essa seja ministrada após a metade do curso, pois, assim, o estudante já apresentaria as habilidades requeridas para atuar na prática exercitando o fazer profissional. Sobre a questão do caráter prático das disciplinas do curso de Psicologia, Borsa (2016Borsa, J. C. (2016). Considerações sobre a formação e a prática em avaliação psicológica no Brasil. Temas Em Psicologia, 24(1), 131-143. https://doi.org/10.9788/TP2016.1-09
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) afirma que o planejamento acadêmico deve assegurar, por meio de carga horária e planejamento dos currículos, atividades individuais e de equipe que incluam a avaliação de estratégias, recursos, técnicas e o uso de instrumentos psicológicos.

A descrição apresentada no conteúdo das ementas também foi analisada. Para tanto, foram estabelecidas 13 categorias, conforme o exposto na Tabela 3. Vale destacar que a organização das categorias se deu a partir das unidades de análise, tal como preconizado por Bardin (1977Bardin, L. (1977). Análise de Conteúdo. São Paulo: Edições 70.), sendo realizada a contagem da frequência com que cada categoria foi identificada dentre as 70 ementas analisadas.

Tabela 3
Categorias de análise das ementas, descrição e frequência.

Conforme indicado na Tabela 3, a maior frequência das ementas foi pautada, respectivamente, em: Prática, técnicas e instrumentos (19,5%), Teorias (17,3%), Definição/conceito (12,3%) e em Diferenças individuais (11,8%). Tal fato revela uma tendência bastante remota de relacionar, essencialmente, a OP com o emprego de técnicas e instrumentos psicológicos. Conforme indicado por Ambiel (2019Ambiel, R. A. M.; Zuanazzi, A. C.; Sette, C. P.; Costa, A. R. L.; Cunha, F. A. (2019). Análise de Ementas de Disciplinas de Avaliação Psicológica: novos tempos, velhas questões. Avaliação Psicológica, 18(1), 21-30. https://doi.org/ 10.15689/ap.2019.1801.15229.03
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), a história da OP enquanto subárea de conhecimento mistura-se com a da avaliação psicológica em termos de seu surgimento e desenvolvimento no século XIX. No entanto, por mais que os avanços no que tange aos instrumentos de avaliação tenham conferido um caráter científico a essas duas áreas, atualmente, em OP, os instrumentos padronizados devem exercer um papel de apoio à promoção do autoconhecimento, dissociado de uma relação causal e inexorável.

Ademais, evidencia-se também o quanto a questão da definição de conceitos e teorias é sobrepujante nos cursos de graduação que contam com a disciplina de OP. Sobre esse fato, é cabível o destaque por tratar-se de elementos introdutórios para o entendimento da temática (Nunes et al., 2007Nunes, M. F. O.; Noronha, A. P. P.; Ambiel, R. A. M. (2007). Conteúdos ensinados em disciplinas de orientação profissional na graduação em psicologia. Estudos e Pesquisas em Psicologia, 7(1), 127-137. Recuperado dehttp://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S180842812007000100011&lng=pt&tlng=pt.
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); contudo, é esperado que também seja dada importância aos conteúdos mais específicos e aprofundados na disciplina. A título de exemplo, pode-se citar a questão da ética em OP, que foi abordado em apenas 1,4% das ementas analisadas.

Destarte, cabe o questionamento, se as disciplinas se concentram, sobretudo, na questão do emprego de instrumentos e técnicas, bem como das definições teóricas em ementas, muitas vezes optativas e com carga horária reduzida, qual o perfil de orientador profissional que está sendo desenvolvido? Ademais, em que momento do curso são tratados os modelos mais atuais de compreensão da temática, especialmente no que tange a questão do autoconhecimento do indivíduo frente à sua identidade e as demandas atuais do mercado de trabalho?

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo teve como objetivo analisar as ementas das disciplinas de OP, do curso de Psicologia, ofertadas pelas instituições de Ensino Superior em todas as regiões do país. Esse levantamento se faz relevante mediante às transformações tanto na sua concepção teórica quanto prática conforme as necessidades trazidas pelo contexto social e político na atualidade. Sendo assim, essa análise permite o fomento da promoção de novas práticas e conteúdos, sobretudo no que tange às organizações curriculares para a área, seguindo os avanços científicos alcançados ao longo do tempo.

Os resultados indicaram alguns aspectos semelhantes a outros estudos sobre a temática, bem como diferenciações importantes a serem consideradas, tais como uma menor carga horária dedicada às disciplinas de OP e uma preponderância de elementos mais introdutórios presentes nas ementas. Tais aspectos levam a problematizações no que tange às habilidades teóricas e práticas que vêm sendo desenvolvidas nos discentes do curso de Psicologia, sendo que estes, após sua formação, têm a possibilidade de atuar como orientadores profissionais. Verifica-se a necessidade de maior aprofundamento no conteúdo das ementas, a fim de possibilitar uma melhor formação aos orientadores profissionais, em vias de que a atuação contemple as tendências atuais em OP, com rigor científico e ético indispensável à profissão.

Apesar de sua originalidade e relevância, o presente estudo apresenta algumas limitações. Uma delas é o fato de que apenas 29% das instituições identificadas inicialmente disponibilizaram a ementa da disciplina de OP, quer seja no site ou mediante solicitação eletrônica. Desse modo, as análises empregadas referiram-se às ementas encontradas e disponibilizadas. Vale ressaltar que os dados são fruto de um retrato e que as grades curriculares das instituições estão em constantes mudanças. Por fim, a diversidade da nomenclatura da disciplina dificulta a certificação quanto ao pertencimento dos critérios de inclusão e objeto de estudo estabelecidos nesta pesquisa, sendo escolhidos os termos empregados com maior frequência na literatura. Não obstante, muitos outros podem referir-se à temática e não terem sido encontrados.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Jan 2023
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    07 Mar 2020
  • Aceito
    06 Nov 2020
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