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A PSICOLOGIA E A CONSTRUÇÃO DA ESCOLA DEMOCRÁTICA

La Psicología y la construcción de la escuela democrática

RESUMO

O presente texto refere-se à conferência apresentada pelo autor na abertura do XV Congresso Nacional de Psicologia Escolar (CONPE), promovido pela ABRAPEE, em julho de 2022. Na primeira parte, apresentam-se as principais concepções sobre o papel da escola nas sociedades capitalistas e seus impactos nas práticas desenvolvidas. Buscou-se compreender se a escola representa um espaço para a atuação dos educadores comprometidos com a formação de cidadãos críticos e transformadores. Na sequência, apresentam-se dados sobre a realidade educacional brasileira, marcada pelas contradições de um sistema dualista e cindido entre os interesses privativistas e publicistas. Na segunda parte, analisa-se o conceito de escola democrática, a partir de três dimensões: quantitativa (escola para todos e permanência), qualitativa (função e qualidade do ensino) e das relações internas (trabalho coletivo). Finalmente, defende-se que a Psicologia pode ter uma fundamental contribuição para a construção da escola democrática, desde que algumas condições sejam assumidas pelos psicólogos: ação interdisciplinar junto aos educadores, trabalho basicamente preventivo direcionado ao planejamento educacional e a superação de concepções teóricas conservadoras, como o Modelo Médico.

Palavras-chave:
política educacional; escola democrática; psicologia escolar; papel do psicólogo; trabalho coletivo

RESUMEN

El presente texto se refiere a la conferencia presentada por el autor en la apertura del XV Congreso Nacional de Psicología Escolar (CONPE), promovido por la ABRAPEE, en julio de 2022. En la primera parte, se presentan las principales concepciones sobre el papel de la escuela en las sociedades capitalistas y sus impactos en las prácticas desarrolladas. Se buscó comprender si la escuela representa un espacio a la actuación de los educadores comprometidos con la formación de ciudadanos críticos y transformadores. En la secuencia, se presentan datos sobre la realidad educacional brasileña, subrayada por las contradicciones de un sistema dualista e incluido entre los intereses privativos y publicistas. En la segunda parte, se analiza el concepto de escuela democrática, a partir de tres dimensiones: cuantitativa (escuela para todos y permanencia), cualitativa (función y calidad de la enseñanza) y de las relaciones internas (trabajo colectivo). Finalmente, se defiende que la Psicología puede tener una fundamental contribución a la construcción de la escuela democrática, desde que algunas condiciones sean asumidas por los psicólogos: acción interdisciplinar junto a los educadores, trabajo básicamente preventivo direccionado a la planificación educacional y la superación de concepciones teóricas conservadoras, como el Modelo Médico.

Palabras clave:
política educacional; escuela democrática; psicología escolar; papel del psicólogo; trabajo colectivo

SUMMARY

This text refers to the conference presented by the author at the opening of the XV CONPE, promoted by ABRAPEE, in July 2022. In the first part, the main conceptions about the role of the school in capitalist societies and their impacts on the practices developed are presented. We sought to understand whether the school represents a space for the performance of educators committed to the formation of critical and transformative citizens. Next, data are presented on the Brazilian educational reality, marked by the contradictions of a dualistic system and divided between privatist and publicist interests. In the second part, the concept of democratic school is analyzed from three dimensions: quantitative (school for all and permanence), qualitative (function and quality of teaching) and internal relations (collective work). Finally, it is argued that Psychology can have a fundamental contribution to the construction of the democratic school, provided that some conditions are assumed by psychologists: interdisciplinary action with educators, basically preventive work directed to educational planning and the overcoming of conservative theoretical conceptions, as the Medical Model.

Keywords:
educational policy; democratic school; school psychology; role of the psychologist; collective work

INTRODUÇÃO

Em julho de 2022, recebi o honroso convite para realizar a conferência de abertura do XV CONPE, Congresso Nacional de Psicologia Escolar e Educacional, promovido pela ABRAPEE2 2 Conferência de abertura realizada pelo autor no XV CONPE - Congresso Nacional de Psicologia Escolar e Educacional, promovido pela ABRAPEE, em julho de 2022. . Naquele evento, desenvolvi algumas reflexões sobre o tema, abordando aspectos que, no meu entender, são cruciais para todos os profissionais da área educacional, incluindo, obviamente, os psicólogos que atuam nessa importante zona de intersecção Psicologia - Educação. Sem a pretensão de esgotar o assunto, apresento neste texto as principais questões analisadas.

UMA PRIMEIRA QUESTÃO: AFINAL, QUAL A FUNÇÃO DA ESCOLA EM NOSSA SOCIEDADE?

Embora seja uma pergunta aparentemente simples, sua resposta sempre se constituiu um assunto complexo. Isso porque, além de não haver consenso entre os estudiosos e educadores sobre a questão, observa-se que, historicamente, houve diferentes concepções dominantes em diferentes momentos históricos das sociedades capitalistas.

No entanto, tal questão é fundamental e deve ser objeto de discussão e reflexão de todos os profissionais que atuam na área educacional, pela seguinte razão: as formas de atuação concreta dos diversos profissionais envolvidos na área educacional - por exemplo, a maneira como professores, gestores e demais profissionais atuam em uma escola - depende, em grande parte, das idéias que esses profissionais têm a respeito da própria função do sistema educacional - ou, em outras palavras, das funções da própria escola. Aliás, essa relação não se restringe apenas às questões educacionais: podemos generalizar, afirmando que, em todas as áreas da atividade humana, as idéias - bases teóricas - que os sujeitos têm, independentemente do grau de sistematização delas, determinam, em parte, a maneira como lidam com os respectivos objetos em questão.

Na área educacional, talvez a grande dúvida subjacente a essa discussão seja expressa por questões como as que se seguem, que vêm sendo objetos de reflexão de vários autores, nas últimas décadas, incluindo de educadores e profissionais da área: será que a escola - em especial a escola pública - tem, efetivamente, condições de colaborar na formação de sujeitos críticos e transformadores? Terão as escolas, principalmente nos países capitalistas, possibilidades de propiciar experiências relevantes para seus alunos, de forma a se comprometerem com a construção de uma sociedade mais justa e humana?

Bárbara Freitag (1986Freitag, B. (1986). Escola, Estado & Sociedade. São Paulo: Editora Moraes.), já nos anos 70 do século passado, oferecia-nos importantes lições sobre o tema aqui abordado, ao demonstrar, por exemplo, que as políticas educacionais desenvolvidas nos diversos países refletem, inevitavelmente, as condições existentes nas três grandes esferas: econômica, política e social. Especificando: a educação sempre expressa uma determinada fundamentação ideológica3 3 Segundo Werneck (1982, p. 60), “Ideologia aqui será considerada como um fenômeno característico da estrutura do pensamento que expressa o modo pelo qual se entende o relacionamento vivido pelos homens e que, portanto, se manifesta em todo relacionamento social, em toda comunicação dos homens entre si... Poderia tornar-se consciente...e seria, em suma, a característica do relacionamento social comum, que faz com que toda a interpretação dos fatos seja feita segundo um ponto de vista”. Sendo entendida como o conjunto de representações e valores introjetados a partir das relações sociais - fenômeno tipicamente humano - situa-se, portanto, como um dos determinantes do comportamento. Além disto, pode dissimular e ocultar as reais condições da situação social, o que pode ser superado pelo desenvolvimento e exercício da consciência crítica. - concepção de Homem, de mundo, de relações humanas, de valores etc. - determinada por uma política educacional traçada por setores dominantes da sociedade. Nas sociedades capitalistas, por exemplo, isto tem se revelado nas contínuas tentativas do Estado em direcionar o sistema educacional para a formação de mão de obra, visando atender às demandas da produção, em detrimento de outras opções de projetos político-pedagógicos para as escolas.

Aprofundando a análise, a autora identifica algumas concepções sobre o papel da escola, especialmente vinculadas aos países capitalistas, que merecem nossa atenção, principalmente porque várias delas estão presentes em discursos veiculados pela mídia, incluindo de profissionais da área, muitas vezes sem o devido olhar crítico.

Assim, uma das mais difundidas concepções de escola relaciona-se à sua função socializadora, defendida por importantes autores, como Emile Durkheim (1972Durkheim, É. (1972). Educação e Sociologia. São Paulo: Melhoramentos . ) e Talcott Parsons (1964Parsons, T. (1964). The Social System. Londres: The Free Press of Glencoe.). Segundo essa posição, a principal função da educação é preparar o indivíduo para a vida em sociedade, assumindo que o Homem nasce como ser egoísta. Caberia à família e às instituições do Estado - como a escola - garantir o processo educacional, que deveria possibilitar ao jovem acesso aos valores, normas e experiências acumuladas, para se tornar um ser social. Assim, a Educação é entendida como um fato social, condição necessária para o processo de adaptação do sujeito; segundo Durkheim, é o processo através do qual o egoísmo pessoal é superado e transformado em altruísmo que, em última instância, beneficiaria a própria sociedade.

Tal concepção, atualmente, é bastante questionada na medida em que representa uma visão estática e conservadora de educação, detendo-se apenas no seu caráter de transmissão de conhecimento necessário para manter a estrutura e funcionamento social, ou seja, identifica apenas a sua função de reprodução cultural.

Diferindo dessas concepções, situam-se autores como John Dewey (1971Dewey, J. (1971). Vida e Educação. 7a ed. São Paulo: Melhoramentos. ) e Karl Manheim (1950)Mannheim, K. (1950). Freedom, Power and Democratic Planning. New York: Oxford University Press., defensores de uma abordagem conhecida como pragmatismo. Diferente da função puramente adaptativa, esses autores defendem que a escola tem um papel fundamental no sentido de preparar o indivíduo para a vida democrática, o que inclui a dinamização das estruturas sociais, através do ato inovador do próprio indivíduo. Assim, para Dewey, a escola deve organizar-se como uma pequena comunidade, em que o aluno tenha a possibilidade de vivenciar as relações democráticas, o que possibilitaria, posteriormente, transferir esse aprendizado para a sociedade democrática em que vive. Tal vivência escolar deveria prever a possibilidade de os alunos aprimorarem as relações democráticas, o que também seria condição para a vida social real. Assim, a Educação não teria apenas uma função adaptativa, mas seria um processo que possibilitaria, em última instância, o próprio aprimoramento da sociedade democrática, em um ambiente em que se pressupõe que os indivíduos têm as mesmas chances e que a competição, condição social necessária para o progresso dos indivíduos, faz-se por meio de regras socialmente estabelecidas e aceitas. Coerente com a ideologia liberal, esta concepção defende que sejam criadas as condições que garantam a igualdade de chances para todos, mas rejeitam, por princípio, a idéia de que os indivíduos são iguais; isto significa assumir que as desigualdades sociais são vistas, basicamente, como reflexo das diferenças naturais existentes entre os indivíduos.

Obviamente, tais concepções também são, atualmente, bastante criticadas na medida em que continuam a preservar, para a Educação, um caráter conservador, de manutenção do status quo, negando uma possível dimensão inovadora e emancipatória do processo educacional. À escola caberia, primordialmente, a função adaptativa e acrítica do indivíduo à sociedade.

Uma terceira concepção, muito comum nesses tempos de economia globalizada, é a chamada Educação como Investimento ou Economia da Educação, defendida por autores como Gary Becker (1964Becker, G. (1964). Human Capital. New York: National Bureau of Economic Research.), Theodore Schultz (1971Schultz, T. W. (1971). O Capital Humano, Investimentos em Educação e Pesquisa. Rio de Janeiro: Zahar Editores.) e Robert Solow (1963)Solon, R. M. (1963). Capital Theory and the Rate of Return. Amsterdã: North Holland Publishing Company.. Partindo da confirmação empírica demonstrando altas correlações entre crescimento econômico de países capitalistas e o nível educacional dos cidadãos membros dessas sociedades, esses autores defendem a Educação como o terceiro fator da equação, além do capital e trabalho, que explicaria o crescimento excedente dessas economias. Ou seja, apenas capital e trabalho não seriam suficientes para explicar as taxas de crescimento observadas: o fator educacional seria necessário para igualar a equação do crescimento econômico. A partir daí, foi crescente, nos países capitalistas, o investimento na formação de recursos humanos - o chamado capital humano - baseando-se na lógica de que caberia ao Estado investir na formação do indivíduo, pois um profissional qualificado representaria maior produção e, portanto, maior margem de lucro, o qual seria revertido, teoricamente, para o Estado e para o próprio indivíduo - através de salário ou de serviços oferecidos pelo respectivo Estado.

As próprias contradições do sistema capitalista, como apontam vários autores, têm demonstrado a falácia destas concepções: a taxa de retorno - o lucro - na realidade constitui-se a mais valia que, como aponta Marx (2013Marx, K. (2013). O Capital: crítica da economia política. Livro I. São Paulo: Boitempo. (Trabalho original publicado em 1867). ), historicamente, tem beneficiado basicamente a empresa capitalista, que emprega a força de trabalho. As políticas educacionais, centradas na idéia de Educação como Investimento - o que gerou a ênfase no planejamento educacional a curto, médio e longo prazos - na realidade têm criado condições para o crescimento das taxas de lucro das empresas, sendo que a qualificação da mão de obra não prioriza a melhoria das condições de vida do trabalhador. Além disto, para Bárbara Freitag (1986Freitag, B. (1986). Escola, Estado & Sociedade. São Paulo: Editora Moraes.), o planejamento educacional tem sido um instrumento de manipulação do chamado exército de reserva, visando, basicamente, à maximização dos lucros do capital privado e à contenção dos salários dos trabalhadores, bem como ao fornecimento da força de trabalho necessária para cada etapa do processo de crescimento do capitalismo.

Uma quarta concepção sobre as funções da educação pode ser representada por uma aproximação às concepções reprodutivistas, através das idéias de autores como Pierre Bourdieu e Jean Claude Passeron (Bourdieu & Passeron, 1975Bourdieu, P.; Passeron, J. C. (1975). A Reprodução - Elementos para uma Teoria do Sistema de Ensino. Rio de Janeiro: Francisco Alves.). Para esses autores, as funções do sistema educacional relacionam-se principalmente com a manutenção das formas de reprodução das relações sociais de produção. Bourdieu, especificamente, atribui à escola as funções de reprodução cultural e social, na medida em que reproduz a ideologia das classes dominantes e a própria divisão social de classes, através da perpetuação de um sistema de ensino dualista: uma escola para as classes dominantes e outra escola para os setores populares. Deve-se destacar que esses processos sempre se deram de forma aparentemente neutra e, freqüentemente, camuflada. Hoje, o processo de reprodução social ocorreria, por exemplo, por meio de mecanismos de exclusão, extra e intra-escolares, onde, de forma aparentemente natural, a escola promove os que se mostram mais aptos; a exclusão, geralmente, é explicada através de fatores intrínsecos ao próprio aluno, como falta de habilidades, de capacidades, de interesse ou, como mais recentemente citados, problemas da família e da própria pobreza. Deve-se ressaltar que os próprios psicólogos desempenharam, durante o século XX, um papel atualmente muito questionado, na medida em que, baseando-se no Modelo Médico (as causas dos problemas estão sempre subjacentes aos indivíduos), desenvolveram práticas reforçando concepções que, em última instância, colocavam no próprio indivíduo a responsabilidade pelo fracasso escolar. Como exemplo, citam-se as tradicionais práticas profissionais centradas, acriticamente, no uso da psicometria e de um modelo de psicodiagnóstico que acabavam por transformar questões institucionais em problemas individuais. Uma análise mais completa desse processo foi realizada por Patto (1990Patto, M. H. S. (1990). A Produção do Fracasso Escolar. S. Paulo: T.A. Queiroz.).

As críticas apresentadas a esta concepção têm questionado se as funções da escola estariam delimitadas apenas à reprodução social e cultural, o que não explicaria a forma como o Estado capitalista tem crescentemente interferido na esfera educacional, dirigindo a política na área, por exemplo, para a formação de mão de obra, como propõem os defensores da concepção anterior.

A concepção seguinte aprofunda a análise reprodutivista da escola, identificando os mecanismos de desigualdade social nos sistemas capitalistas e explicitando o caráter ideológico subjacente às funções da escola. São as idéias fortemente marcadas pelos referenciais marxistas, defendidas por autores como Louis Althusser (1970Althusser, L. (1970). Ideologia e Aparelhos Ideológicos do Estado. Portugal: Editorial Presença; São Paulo: Livraria Martins Fontes.), Nicos Poulantzas (1973Poulantzas, N. (1973). Escola em questão. Tempo Brasileiro, Rio de Janeiro, 35, pp. 126-137.) e Roger Establet (1973Establet, R. (1973). A escola. In As Instituições e os Discursos. Revista Tempo Brasileiro, Rio de Janeiro, (35): 93-125.). Esses autores extrapolam as funções da escola, chegando a uma análise crítica mais ampla de todo o sistema capitalista, demonstrando as relações existentes entre a esfera educacional e as três instâncias: econômica, social e política. Althusser (1970) é o teórico que caracteriza a escola como um aparelho ideológico do estado, cumprindo as funções de reprodução das relações materiais e sociais de produção: ao mesmo tempo em que prepara a mão de obra necessária para atender as demandas das formas de produção capitalista, realiza com sucesso a inculcação da ideologia liberal, que tem a função de levar os indivíduos a aceitarem e justificarem passivamente as relações sociais de exploração a que estão submetidos. Na realidade, para esses autores, a escola realiza esta tarefa juntamente com outros aparelhos ideológicos, como a família e as diversas instituições sociais, com destaque para as igrejas e os meios de comunicação; mas tais instituições não produzem a divisão social de classes: apenas contribuem para sua ocorrência. A divisão de classes deve-se às formas de produção e distribuição da riqueza, ou seja, encontra sua gênese na esfera da produção econômica. Relembrando Marx (2013Marx, K. (2013). O Capital: crítica da economia política. Livro I. São Paulo: Boitempo. (Trabalho original publicado em 1867). ), a forma de produção capitalista reproduz e perpetua as condições de exploração do trabalhador, com o auxílio dos aparelhos ideológicos, que, por sua vez, reproduzem a ideologia liberal subjacente ao próprio sistema capitalista - condição necessária para a reprodução das condições materiais.

As críticas feitas a estas ideias, defendidas pelos autores citados, centram exatamente na caracterização dos aparelhos ideológicos, no presente caso, a escola. Não ficam esclarecidas as condições que possibilitaram o surgimento das referidas instituições e como elas atuam no sentido de controlar ideologicamente os cidadãos. Além disto, a partir das idéias althusserianas, a escola, como um mecanismo de transmissão da ideologia dominante, só poderia ver alterada tal função a partir do momento em que o controle do Estado fosse assumido, pela via revolucionária, pelos setores dominados, que passariam a utilizar os aparelhos ideológicos em função dos seus interesses - posição, aliás, coerente com a perspectiva marxista: a classe operária, unida e organizada politicamente, assumiria o poder, pela via revolucionária, instaurando e inaugurando novas relações sociais, políticas e econômicas. No entanto, isto seria superestimar a função da escola como instrumento de produção e perpetuação da falsa consciência, pois sabemos que os mecanismos determinantes dos conflitos sociais e das lutas de classes localizam-se nas esferas de produção econômica e não no interior da escola, embora aí também se manifestem. Assim, segundo Bárbara Freitag (1986Freitag, B. (1986). Escola, Estado & Sociedade. São Paulo: Editora Moraes.), falta no pensamento desses autores uma análise clara sobre essa sobredeterminação no papel da escola: manter e reproduzir a consciência ingênua, além das relações materiais e sociais de produção.

Como consequência, nesta concepção, não se identificam formas de superação dessa situação de sobredeterminação da escola; ou seja, para os educadores comprometidos com o processo de transformação social e de superação das relações de dominação, a escola não se colocaria como um espaço prioritário para o exercício da militância transformadora, dado o seu caráter periférico como instância de superação das contradições sociais. O mesmo pode-se afirmar com relação às classes oprimidas: a escola não se colocaria, prioritariamente, como instância de superação social, de acordo com a visão destes autores, pois é nas esferas política e econômica que o confronto de classes realmente acontece, tornando possível a superação das estruturas socialmente injustas.

Este conflito vai ser melhor analisado na última concepção aqui enfocada, a partir das idéias apresentadas por Antonio Gramsci (Macchiocchi, 1977Macciocchi, M. A. (1977). A Favor de Gramsci. Rio de Janeiro: Paz e Terra 2ª. Ed. Tradução de Angelina Peralva). O autor, revendo o conceito de Estado, propõe sua organização em duas instâncias: a sociedade política, na qual se encontram os poderes, os mecanismos de repressão, os tribunais etc., e a sociedade civil, na qual se concentram as chamadas instituições privadas, como igrejas, sindicatos, mídia etc., além da escola. Talvez a principal característica da sociedade civil, apontada por Gramsci, seja a sua pluralidade ideológica, ou seja, é um espaço onde circulam as ideologias presentes numa sociedade. Neste sentido, a classe dominante, atuando por meio da sociedade política, tenta continuamente difundir na sociedade civil a sua ideologia - a sua visão de mundo - no processo que o autor chama de hegemonia. A função hegemônica estaria construída quando a classe dominante, através da sociedade política, conseguisse anular as contra-ideologias presentes nas instituições da sociedade civil, impondo a sua ideologia, garantindo, por este caminho, o consenso dos setores dominados, que acabariam aceitando as relações de dominação como naturais. Isto significa assumir que, na prática, os conflitos ideológicos entre os setores dominantes e os dominados da sociedade se dão, efetivamente, no interior das instituições da sociedade civil: nesta instância é que ocorreria, de fato, a luta de classes.

Nesta leitura, fica evidente a importância estratégica que assumem as instituições da sociedade civil, em especial a escola, nosso objeto de análise. Se, na concepção anterior, defendida pelos althusserianos, a escola ocuparia papel marginal na superação do conflito social entre os setores dominantes e dominados, na visão gramsciana, a escola, assim como as demais instituições civis, representa um espaço social onde efetivamente ocorrem os conflitos ideológicos, o que significa situá-la como espaço de grande importância para a atuação dos intelectuais orgânicos, citados pelo autor. Parafraseando Bárbara Freitag (1986Freitag, B. (1986). Escola, Estado & Sociedade. São Paulo: Editora Moraes.), nas sociedades capitalistas, a luta política pode e deve ser travada, prioritariamente, nas instâncias da sociedade civil, o que significa, na prática, reconhecer a importância da existência, no interior da escola, de educadores comprometidos com a chamada contra-ideologia, ou seja, comprometidos com concepções de homem e de mundo marcados por valores centrados na justiça, na solidariedade e no respeito humano, contrapondo-se às relações injustas de dominação, que marcam, inevitavelmente, as formas de produção capitalista.

Numa perspectiva de síntese, as diversas concepções sobre as funções da escola na sociedade capitalista, acima apresentadas, permitem algumas conclusões que devem se tornar objetos de reflexão dos profissionais que atuam na área educacional:

a) talvez a conclusão mais importante a ser assumida relacione-se ao reconhecimento de que nenhuma política educacional é neutra, do ponto de vista ideológico; ela sempre está assentada em determinadas concepções de homem e de mundo, em valores e representações; não é possível pensar em formação ou educação do homem, desvinculado de um plano ideológico;

b) no mesmo sentido, toda política educacional é sempre um reflexo do que ocorre nas dimensões econômica, política e social de uma sociedade, em um determinado momento histórico; isto explica porque o Estado, nos diversos tipos de sociedade, tenta ter o máximo de controle sobre as políticas educacionais, através da criação de instâncias de administração, de gestão, de formação e, principalmente, de definição e controle dos conteúdos de ensino a serem ministrados nas escolas;

c) desmistifica-se a idéia da educação institucional como panaceia do homem, solução para todos os seus problemas, ou ainda como o principal ou único fator responsável pelo sucesso ou fracasso do cidadão, concepções essas muito difundidas pela mídia, principalmente nesses tempos de predomínio quase hegemônico das concepções neoliberais e da globalização econômica. Sem negar o papel fundamental da educação na constituição dos sujeitos como cidadãos, não se pode esquecer que, nos sistemas capitalistas como o nosso, as formas de produção e distribuição da riqueza têm um papel crucial na determinação dos mecanismos de desenvolvimento social, com nítidas repercussões nas histórias de vida dos cidadãos; por exemplo, a origem social, fator amplamente pesquisado em várias áreas do conhecimento, tem um indiscutível e importante papel no processo de escolha e desenvolvimento profissional dos sujeitos;

d) a escola, de um lado entendida como uma instituição de transmissão de valores, dado o seu inevitável caráter ideológico, por outro lado também é reconhecida como um espaço de contínuo confronto de idéias e valores; não pode ser vista, portanto, como um mero aparelho manipulado mecanicamente pelo Estado em função, apenas, da ideologia das classes dominantes: se o Estado vai ter, ou não, sucesso na sua tentativa hegemônica com relação à escola, vai depender de existência, ou não, de educadores comprometidos com as contra-ideologias, atuando no seu interior, transformando essa instituição em um espaço de contínuo exercício da reflexão crítica a partir da ação educacional transformadora;

e) nesta perspectiva, assume-se que a escola constitui-se, efetivamente, como um espaço institucional que pode contribuir para o processo de conscientização dos indivíduos - antigo sonho defendido por Paulo Freire (1971Freire, P. (1971). Educação como Prática de Liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra. 3a.ed., 1979Freire, P. (1979). Conscientização - Teoria e Prática da Libertação. Uma introdução ao pensamento de Paulo Freire. São Paulo: Cortez & Moraes, ) - por meio da transformação da consciência ingênua em consciência crítica, ao mesmo tempo em que possibilita aos sujeitos apropriarem-se do conhecimento culturalmente acumulado, que permitirá a cada aluno constituir-se como um sujeito social e historicamente determinado, agente de transformação comprometido com a construção de uma sociedade mais justa e humana;

f) tal poder de conscientização da escola vai depender, basicamente, dos educadores e profissionais que aí atuam: de suas concepções ideológicas - visão de homem, de mundo, de sociedade e da própria escola - e do tipo de compromisso político-ideológico dominante no grupo - se vão atuar no sentido de manter ou de superar as relações marcadas pela injustiça social.

NOTAS SOBRE A POLÍTICA EDUCACIONAL BRASILEIRA

Quando se analisa a literatura sobre a história da política educacional do Brasil, país de sistema capitalista considerado emergente, observa-se que as questões acima discutidas colocam-se de forma semelhante. Porém, destacam-se alguns aspectos, considerados agravantes, que marcam, historicamente, sua singularidade (Leite, 1995Leite, S. A. da S. (1995). Instituições Escolares. In B. P. Range, B. P. (Ed.), Psicoterapia Comportamental e Cognitiva: pesquisa, prática, aplicações e problemas (pp. 245-255). Campinas: Editorial Psy.; Romanelli, 1978Romanelli, O. O. (1978). História da Educação no Brasil - 1930/1973. Petrópolis: Editora Vozes). Dois deles merecem nossa atenção: o primeiro refere-se ao fato de que nosso sistema sempre foi marcado pela dualidade educacional - de um lado, uma escola de boa qualidade, direcionada para alunos oriundos das classes economicamente dominantes e, de outro, uma escola para os setores mais pobres, de pior qualidade, que hoje é representada pelo ensino público. Um segundo aspecto a ser aqui destacado refere-se ao quase secular conflito observado na área educacional entre os defensores do ensino público (publicistas) e os defensores do ensino particular (privativistas). Vale identificar e discutir um pouco mais essas questões, numa breve síntese histórica da política educacional brasileira.

Os anos 30 do século passado, em nosso país, são caracterizados como o período de predomínio do modelo desenvolvimentista, marcado, na economia, pelo processo de substituição das importações e implementação da produção industrial; nas dimensões política e social, o poder estava dividido entre o latifúndio agrícola e a burguesia industrial ascendente, mas já com o surgimento da burguesia financeira e o início da constituição da classe operária, formada por trabalhadores urbanos e rurais. A política educacional, por sua vez, é marcada por um processo de crescente intervenção do Estado, destacando-se, como exemplo, a criação, em 1930, do Ministério dos Negócios da Educação e Saúde Pública - importante decisão do Estado no sentido de orientar a política educacional para atender às demandas da modernização industrial. Destaca-se, neste período, o Plano Nacional de Educação, organizando os ensinos superior e secundário, definindo o ensino primário como gratuito e obrigatório e o ensino religioso como facultativo - previstos na Constituição de 1934. Por outro lado, a Constituição de 1937, durante o Estado Novo, previa o ensino profissional e a educação moral e política, demonstrando a preocupação de se fortalecer o direcionamento do sistema educacional para a formação de mão de obra e para o controle ideológico.

O momento seguinte, envolvendo as décadas de 40 a 60, é caracterizado na literatura como o período do Estado populista / desenvolvimentista. Na economia, observou-se o crescimento da produção de bens de consumo e da indústria nacional, alavancado, em parte, pela II Guerra Mundial, além do surgimento significativo do capital estrangeiro. Na sociedade civil, destaca-se a criação dos grandes partidos políticos, representando os principais setores da sociedade, enquanto que a dimensão política foi marcada pela aliança entre o empresariado nacional com os setores populares, durante grande parte do período, até a fragmentação desse pacto, com a criação de uma nova aliança, agora entre a burguesia nacional e os interesses do capital estrangeiro.

Na área educacional, observa-se a continuação do processo de intervenção do Estado na política educacional: é instituído o ensino industrial - com os sistemas Senai e Senac - além da elaboração da lei orgânica dos ensinos secundário, comercial, primário, normal e agrícola. No entanto, persiste e acentua-se a chamada dualidade do sistema educacional durante todo o período: metade da população simplesmente não tinha acesso à escola (o país apresentava uma taxa de 50% de analfabetos) e o ensino público demonstrava um caráter marcadamente eletivo, atendendo, basicamente, alunos oriundos das classes média e superior. Por sua vez, o conflito entre os publicistas versus privatistas vai se desenvolver em torno da luta pela elaboração da Lei de Diretrizes e Bases da Educação - processo que durou de 1946 a 1961. No texto final da Lei, interesses de ambos setores são atendidos, mas é marcante o seu caráter conservador, do ponto de vista dos setores marginalizados da população: de um lado, a Lei previa a participação do capital privado na educação, a ajuda financeira do Estado à rede privada e omitia a gratuidade do ensino; por outro, garantia a equiparação dos níveis, antiga aspiração popular. Na realidade, a LDB de 1961 (Lei 4024Lei 4.024 de 20 de dezembro de 1961. Fixa as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da União (20/12/1961). Recuperado de: https://legislacao.presidencia.gov.br/atos/?tipo=LEI№=4024&ano=1961&ato=339o3YU5keVRVT7a7
https://legislacao.presidencia.gov.br/at...
): colaborou para reforçar a seletividade do sistema escolar, diminuindo a participação dos setores de baixa renda e facilitando os de classe superior; criou condições para o aumento da privatização do ensino, facilitando a infiltração do setor privado em todos os níveis educacionais; desvirtuou a proposta de profissionalização, na medida em que essa instância constituiu-se, de fato, como um ensino propedêutico disfarçado. Assim, não é casual que o período em questão termine com sérios problemas: de um lado, a inadequação do ensino profissional, cuja política não vingou por incompetência e falta de vontade política; de outro, uma forte pressão da classe média em direção ao então restrito ensino universitário, o que vai ser resolvido, nas etapas seguintes, com a participação massiva do capital privado no ensino superior.

Como já apontado, com o fim do período desenvolvimentista e a fragmentação do pacto social empresário x trabalhadores, aumenta a radicalização política no país, com a consequente crise econômica, criando-se as condições para o golpe militar de 64, fortemente influenciado pelos interesses do capital estrangeiro. A partir daí, implanta-se uma política econômica francamente favorável aos interesses do capital internacional e dos setores economicamente dominantes do país. Tal política reorganiza o sistema de produção (através da aristocratização do consumo e expansão das exportações), enfatiza o desenvolvimento tecnológico (em detrimento de uma política econômica voltada também para os setores populares), cria um novo mercado consumidor elitista (nova classe de intelectuais, tecnocratas, burguesia nacional em detrimento de uma política de democratização do consumo), fortalece a exportação (em detrimento do mercado interno), amplia a dependência ao know-how externo e implanta uma política de congelamento de salários, através de criação de um exército de reserva de mão de obra, praticamente em todos os setores da economia. Assim, o chamado período do milagre brasileiro, na realidade, foi uma etapa caracterizada pela monopolização da economia, exploração dos trabalhadores e um forte esquema de repressão tentando bloquear as iniciativas de organização popular e de oposição política. As conseqüências de todo esse processo tornaram-se visíveis até os dias atuais: temos uma economia marcada por um dos maiores processos de concentração de renda do mundo, em um país que vivenciou, no período em questão, um forte crescimento econômico (aumento da riqueza), mas um pífio processo de desenvolvimento econômico (distribuição social da riqueza produzida).

Neste processo, a política educacional desempenhou um papel fundamental, manipulada por um Estado ditatorial que tentou assumir, de todas as formas, o controle ideológico das instituições da sociedade civil. Destaca-se, no período, o famoso acordo MEC USAID4 4 United States Agency for International Development. , significando a tentativa de submissão da Educação aos interesses do capital estrangeiro, com duas principais características a serem destacadas: o direcionamento da política educacional para atender aos interesses do crescimento econômico e o esforço de se utilizar a escola como mecanismo de controle ideológico. Não foi casual que o controle da política educacional do país passou a ser determinado, em última instância, por economistas. Os dois grandes objetivos inicialmente propostos foram: a) ampliação da oferta do Ensino Fundamental, para garantir a mínima formação e qualificação da população, b) a formação de mão de obra qualificada, através da ampliação do sistema de ensino superior, o que ocorreu com a presença do capital privado. Como consequência, observa-se uma crescente e gradual diminuição dos investimentos públicos, acentuando o processo de descomprometimento do Estado com relação à Educação. Tal situação perdura durante os anos 70, até meados dos anos 80, sendo esta apontada como a década perdida para a educação. Como exemplos que revelam o quadro trágico da educação, seguem-se alguns dados do final do período: o país apresentava 30% de analfabetos, 23% de professores eram leigos, 30% de crianças estavam sem escola e 50% dos alunos da rede pública apresentavam uma história de repetência. Entretanto, mesmo após a época do regime militar, a política educacional manteve-se semelhante ao modelo herdado. A Constituição de 1988, bem como a LDB de 1996, não alterou essencialmente o quadro da educação brasileira, embora tenha fornecido o que alguns autores consideram como arcabouço institucional para as mudanças. No caso da nova LDB, ela não impede nem obriga o Estado a assumir a sua responsabilidade na manutenção e financiamento do sistema educacional, mantendo, assim, inalteradas as condições do conflito entre os privativistas e os defensores do ensino público.

No entanto, deve-se ressaltar, por uma questão de justiça histórica, que, durante todo o período citado, várias instituições da sociedade civil - como a SBPC, ANPED, ANDES, CNTE, CBE5 5 SBPC - Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência; ANPEP - Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Educação; ANDES - Associação Nacional de Docentes do Ensino Superior; CNTE - Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação; CBE - Conferências Brasileiras de Educação. etc. - posicionaram-se criticamente contrárias à política educacional adotada, defendendo bandeiras como melhoria da qualidade de ensino, qualificação e valorização docente, democratização da gestão, financiamento da educação pelo Estado, ampliação da escolaridade obrigatória, entre outras.

OS ANOS 90: O NEOLIBERALISMO, A GLOBALIZAÇÃO E A EDUCAÇÃO

Na década de 1990, é importada da Inglaterra uma série de idéias frontalmente contrárias aos valores que lá prevaleciam desde o pós-guerra. Concepções como bem-estar social, educacional, de saúde, até então mantidas pelo Estado, vão sucumbir a uma série de concepções, inspiradas nas idéias de Friedrich von Hayek, defendendo o Estado mínimo, a descentralização, a descentração, a privatização, a desregulamentação, a privatização e a economia global - enfim, esse conjunto de questões nem sempre claras, mas de grande impacto, que ficaram conhecidas ideologicamente como neoliberalismo. Reginaldo Moraes (Moraes, 2001Moraes, R. (2001). Neoliberalismo. De onde vem, para onde vai? São Paulo: Editora SENAC.) nos ensina que este conceito constitui-se como uma ideologia, uma forma de ver o mundo, uma corrente de pensamento, centrada na valorização de concepções como concorrência, mercado, desemprego estrutural, que caracterizam a economia moderna, contra as quais seria inútil tentar se contrapor. Os neoliberais defendem arduamente a idéia de uma sociedade aberta, sendo que a presença do Estado, principalmente nas esferas econômicas, é sempre entendida como uma ameaça à liberdade do indivíduo e da competição, condições responsáveis diretas pelo progresso humano. Da mesma forma, combatem as ideologias nacionalistas, desenvolvimentistas e populistas, muito comuns nos países do terceiro mundo ou em desenvolvimento. Como analisa Moraes, a partir de um diagnóstico sombrio, o neoliberalismo defende uma forte ação do Estado contra os sindicatos e instituições corporativas, priorizando uma política antiinflacionária monetarista e reformas orientadas para a realidade do mercado.

Curiosamente, os neoliberais vão imputar à educação um papel fundamental e determinante na formação das condições de competição entre os países. Acreditam que a educação é um dos principais instrumentos para conter a pobreza, desde que seja direcionada para e pelo mercado.

Neste sentido, várias e importantes reuniões internacionais, sobre a questão educacional, foram realizadas na década de 90, sob o patrocínio de reconhecidas instituições vinculadas ao sistema capitalista internacional. Dentre os eventos, vale destacar a Conferência Mundial de Educação para Todos, em Jomtien (Tailândia), em 1990, da qual Brasil participou, sendo um dos 155 governos que subscreveram a declaração aprovada. Duas grandes decisões foram assumidas na Conferência, como compromissos a serem atingidos pelos países signatários: a) assegurar educação básica de qualidade para todos, b) atender as Necessidades Especiais de Aprendizagem (NEBA) de crianças, jovens e adultos. Rosa Maria Torres (Torres, 1995Torres, R. M. (1995). Que (e como) é necessário aprender? Necessidades básicas de aprendizagem e conteúdos curriculares. Campinas: Papirus.) define as NEBA como aqueles conhecimentos teóricos e práticos, capacidades, valores e atitudes fundamentais para o sujeito enfrentar suas necessidades básicas em sete situações: sobrevivência, desenvolvimento pleno de suas capacidades, vida e trabalho dignos, participação plena no desenvolvimento, melhoria da qualidade de vida, tomada de decisões informada e a possibilidade de continuar aprendendo. A principal conseqüência para a política educacional brasileira foi o esforço no sentido da universalização do Ensino Fundamental, ou seja, educação para todos foi entendida como a possibilidade de amplo acesso ao ensino fundamental. Deve-se reconhecer, no entanto, que esse conceito de educação para todos não foi consensual entre os países presentes na Conferência, o que levou a diferentes ênfases nas políticas educacionais desenvolvidas.

Na mesma época - 1990 - documento da CEPAL - Comissão Econômica para a América Latina e Caribe - alertava para a necessidade de mudanças educacionais para atender à reestruturação do sistema produtivo dos países da região. Adequar o sistema educacional significa rever os conhecimentos e habilidades específicas requeridas pelo sistema produtivo, a serem assumidos como tarefa da escola.

Uma das instituições internacionais que assumiram uma posição de destaque no cenário neoliberal foi o Banco Mundial, que se transformou numa das principais agências internacionais de financiamento de projetos. Criado após a II Guerra, é um organismo que contava, na época, com 176 países mutuários, inclusive o Brasil. No entanto, somente cinco países determinavam suas políticas, por participarem com 38% dos recursos do Banco: EUA (20%), Japão, Alemanha, França e Reino Unido. O Brasil participava com 1,7% aproximadamente. Na realidade, em função desse desequilíbrio, o Banco Mundial acabou constituindo-se como um instrumento da política externa norte-americana, porém com muita força internacional, pois se tornou o maior captador mundial de recursos, movimentando anualmente cerca de 20 bilhões de dólares.

Em 1995, o Banco Mundial propôs diretrizes políticas para área educacional, no documento Prioridades e Estratégias para a Educação. Nele, destacam-se orientações que já se tornaram comuns na recente política educacional brasileira: implantação de sistemas de avaliação da aprendizagem, investimento no capital humano, descentralização da administração, eficiência no gasto social e articulação com o setor privado. Na realidade, os estudiosos da área interpretaram que a intenção real foi adequar os objetivos educacionais às novas exigências dos mercados internacional e interno, além de consolidar os processos de produção, formando trabalhadores adaptáveis, capazes de adquirir novos conhecimentos, atendendo às demandas econômicas e mudanças do mercado.

São evidentes os efeitos das propostas do Banco Mundial na política educacional brasileira. Tal processo tem sido crescente a partir dos anos 90 e são detectados em vários aspectos: no financiamento (através de programas como o Fundef, Fundescola6 6 FUNDEF - Fundo para o Desenvolvimento e Valorização do Magistério; FUNDESCOLA - Fundo de Fortalecimento da Escola. etc.), na avaliação (Censo, Saeb, Enem, Provão7 7 SAEB - Sistema Avaliação da Educação Básica; ENEM - Exame Nacional do Ensino Médio. etc.), na gestão (programas de municipalização, programas de capacitação etc.). Ou seja, podemos afirmar, seguramente, que quase toda a política educacional do país encontra-se atrelada às diretrizes do Banco Mundial e do FMI (Neves, 2000Neves, L. M. W. (Org.) (2000). Educação e Política no Limiar do Século XXI. Campinas: Editora Autores Associados; Shiroma, Moraes, & Evangelista, 2004Shiroma, E. O.; Moraes, M. C. M. de; Evangelista, O. (Orgs.) (2004). Política Educacional. 3a. edição. Rio de Janeiro: DP&A.).

AS CONTRADIÇÕES DA POLÍTICA EDUCACIONAL BRASILEIRA

É inegável que houve avanços, nas últimas décadas, no quadro da política educacional brasileira: o sistema cresceu, atendendo quase que universalmente as crianças na faixa de 7 a 14 anos, a educação infantil é reconhecida como uma instância importante, investe-se na formação docente, houve redução nos índices percentuais de analfabetismo etc. Mas, se houve investimento no crescimento quantitativo do sistema educacional, sem dúvida estamos muito aquém de um sistema democrático quando a avaliação envolve os aspectos qualitativos. Apesar do esforço governamental, predomina a crítica da maioria dos educadores com os rumos da política educacional, pois o sistema ainda apresenta enormes problemas que se colocam como imensos desafios aos educadores e à sociedade em geral:

- apesar de os dados oficiais indicarem um índice geral de analfabetismo no Brasil em torno de 7% (cerca de 11 milhões de analfabetos, segundo o PNAD de 2019), dados da ONG Instituto Paulo Montenegro / IBOPE indicam que apenas 26% da população brasileira é plenamente alfabetizada, capaz de ler textos com mais de uma informação, sugerindo que – da população pode ser considerada analfabeta funcional8 8 O conceito de Analfabeto Funcional refere-se a indivíduos que não utilizam, funcionalmente, a leitura e a escrita nas suas práticas sociais, apesar de dominarem os códigos lingüísticos. ;

  • - ainda segundo a mesma fonte, somente 23% de nossa população consegue resolver problemas que envolvem mais de uma operação matemática;

  • - de acordo com a Unesco, 23% de nossas crianças de 1a série e 20% das de 2a série é repetente;

  • - segundo o Saeb, 55% dos alunos da 4a. série situam-se no nível crítico na área de leitura; só 5% dessas crianças demonstraram desempenho adequado em leitura;

  • - desde a primeira edição do Saeb em 1995, os resultados médios dos alunos em Língua Portuguesa e Matemática são crescentemente negativos, não apontando sinais de recuperação em nenhum ano, nesse período;

  • - 2/3 dos nossos alunos, com 14 anos, encontram-se defasados na sua escolaridade, segundo dados do MEC;

  • - dos quase 6 milhões de alunos que entram na 1a série do ensino fundamental, apenas 2,5 milhões chegam à 1a série do ensino médio, segundo dados do INEP;

  • - no ensino superior, segundo o MEC, o quadro não é menos trágico: nossa taxa de matrícula é de 20% dos jovens dessa faixa etária, enquanto que na Argentina é de 61%, no Chile é de 43%, na Venezuela é de 39% e no Peru, 32%.

Diante dessa realidade, com tais indicadores, podemos concluir que há um quadro de falência - ou pré-falência - na educação brasileira, apesar do que é apresentado pela propaganda oficial. Essa realidade nos dá a impressão de que o futuro de nosso país está literalmente penhorado, uma vez que não estamos sendo capazes de cuidar do maior patrimônio que uma nação pode ter: a educação de seu povo e dos jovens em particular. Essa realidade merece ser contrastada com as propostas neoliberais subjacentes às políticas atuais.

É indiscutível que não há consenso com relação ao diagnóstico dessa crise, principalmente quando se comparam as diretrizes e orientações do Banco Mundial / FMI com as análises dos educadores que estudam essa realidade. Não se pode aceitar que o quadro de deterioração da Educação deva-se basicamente à falta de recursos, mas certamente relaciona-se com a ineficiência de sua gestão, situação, aliás, histórica e persistente na realidade político-educacional em nosso país. Da mesma forma, é inaceitável o pressuposto do FMI que situa a educação como a panacéia universal, único instrumento que poderá melhorar a vida dos indivíduos. O que os documentos não explicitam é que o neoliberalismo tem se constituído como um modelo econômico de natureza excludente para grande parcela da população e que vem crescentemente aprofundando o processo de concentração de renda. É uma falácia argumentar sobre a eficiência da educação como se esta fosse, por si só, capaz de promover o desenvolvimento da economia e o bem-estar dos indivíduos. Ao afirmar isso, não estamos negando a importância de um sistema educacional democrático e eficiente para o país e seu povo; ao contrário. Mas estamos reconhecendo que os mecanismos de desenvolvimento social passam, primariamente, pelas formas de produção e distribuição da riqueza, expressa nas dimensões econômica e política dos países capitalistas. Como exemplo, pode-se situar o caso de países próximos, como a Argentina e o Uruguai, nesses tempos de neoliberalismo: nunca investiram tanto em educação, mas, simultaneamente, nunca tiveram tantos cidadãos abaixo da linha da pobreza.

A contradição não se restringe somente à instância das ideias. Se a educação fosse realmente área prioritária, como apresenta a propaganda oficial em nosso país, isso certamente se expressaria na dotação orçamentária maior para o setor. No caso do Brasil, de acordo com o Plano Decenal (Lei 10.727), o Estado deveria investir até 7% do PIB em Educação. O que, no entanto, se observa é uma redução progressiva nos últimos governos, estando esse investimento em torno de 4%. Apesar de o Estado alegar preocupação com a qualidade do ensino, paga salários baixos para os professores; reclama da competência destes, mas recomenda mais alunos por classe. E assim permanecem as contradições.

OS DESAFIOS QUE SE COLOCAM PARA A CONSTRUÇÃO DE UMA ESCOLA DEMOCRÁTICA

A análise da literatura dos dados oficiais sobre o sistema educacional brasileiro demonstra que ainda há um longo caminho a ser percorrido na construção de uma escola democrática. Mas, o que seria uma escola democrática? Quais suas características?

Neste sentido, serão abordadas três dimensões consideradas relevantes para uma escola democrática, sem, obviamente, a intenção de esgotar o assunto.

1. Dimensão quantitativa. Um sistema educacional democrático deve atender, pelo menos, duas condições: a) o Estado deve fornecer escola pública e gratuita para toda a população, independente da existência do ensino particular; b) o sistema educacional deve ser planejado de forma a garantir as condições para que todos os alunos efetivamente permaneçam na escola até o final do Ensino Médio. Porém, quando se analisa a situação do ensino público brasileiro sob esta dimensão, depara-se com um quadro pouco animador. Nosso sistema ainda apresenta o conhecido “funil educacional”: segundo o PNAD, mais da metade das pessoas com 25 anos ou mais não terminaram o Ensino Fundamental; ainda existem os famosos “gargalos”, principalmente entre os diversos níveis de ensino; em 2012, a escolaridade média do brasileiro era de 11,8 anos, abaixo de vários países latino-americanos. Deve-se relembrar que, embora a exclusão escolar seja um subproduto das condições sociais e econômicas, há inúmeros estudos que identificam os chamados fatores intraescolares como determinantes do processo.

2. Dimensão qualitativa. Por outro lado, não basta existir a escola; é necessário que ela cumpra uma função realmente relevante: que conhecimentos e experiências devem ser privilegiados aos estudantes para que se possibilite o pleno exercício da cidadania, numa perspectiva crítica e transformadora? Embora isto possa parecer óbvio, uma análise mais cuidadosa dos conteúdos abordados pela escola demonstra que existem problemas históricos com relação a esta questão: o sistema educacional tem sido direcionado para atender aos interesses das minorias privilegiadas e, recentemente, os do grande capital. Há décadas, a política educacional tem priorizado a formação para o mercado de trabalho, em uma perspectiva ideológica, segunda a qual o ser humano é visto basicamente como um ser que produz e consome, em detrimento de outras dimensões humanas.9 9 Vale lembrar que Vigotski (1987) já propunha que uma das principais funções da escola seria o acesso aos conceitos científicos. Para ele “Conceitos científicos parecem constituir o meio no qual a consciência e o domínio se desenvolvem, sendo mais tarde transferida a outros conceitos e por outras áreas do pensamento. A consciência reflexa chega à criança através dos portais do conhecimento científico” (p.79). Fica evidente, para o autor, a relação entre aprendizado escolar e o desenvolvimento mental das crianças, conteúdos e experiências que dificilmente a família consegue mobilizar. Neste trabalho, defende-se a ideia de que a escola democrática deve desenvolver um saber sistematizado relevante e funcional para a vida de todo os cidadãos de nossa sociedade, para que atuem de forma crítica e consciente, constituindo-se como agentes de transformação, visando a uma sociedade mais justa e humana. Citando Saviani (1991Saviani, D. (1991). Pedagogia histórico-crítica: primeiras aproximações. São Paulo: Cortez e Autores Associados., p. 21), “o objeto da Educação diz respeito, de um lado, à identificação dos elementos culturais que precisam ser assimilados pelos indivíduos da espécie humana, para que eles se tornem humanos e, de outro lado e concomitante, à descoberta das formas mais adequadas para atingir esse objetivo”. Portanto, “a escola é uma instituição cujo papel consiste na socialização do saber sistematizado” (p. 22) e não qualquer saber; trata-se do saber elaborado e não simplesmente do saber espontâneo e fragmentado.

3. Dimensão das relações internas democráticas. Diz respeito à estrutura e ao funcionamento da escola, envolvendo as relações internas. Quando se observa, atualmente, uma escola pública ou particular funcionando, geralmente uma das características que se destacam é o trabalho solitário e individual dos docentes. Por inúmeras razões, a sala de aula transformou-se em um feudo particular onde o professor trabalha isolado e sem considerar o processo geral a que o aluno está submetido, dentro e fora da escola. Obviamente, tal modelo de organização não é casual ou aleatório. Na realidade, inspirou-se nas formas de organização que caracterizaram a indústria capitalista, na primeira metade do século passado, de acordo com as ideias de Ford e Taylor - processos de organização conhecidos como fordismo e taylorismo - e que deram origem à linha de produção nas fábricas. O princípio é bastante conhecido: se cada trabalhador cumprir bem a sua função parcial, do processo de produção - o qual é planejado por um grupo de especialistas para tal função - então o produto final será de boa qualidade. Ou seja, o todo é igual à soma das partes. No entanto, tal modelo acabou gerando um alto grau de alienação nos trabalhadores, com funestas consequências para o próprio processo de produção, entre outros problemas, na medida em que o trabalhador perde a noção da função do seu papel, pois não tem visão do processo global - em outras palavras, o trabalhador perde a consciência sobre seu próprio trabalho. Por outro lado, o modelo fordista aplicado nas escolas produziu notórias consequências negativas: criou enormes dificuldades para o desenvolvimento de propostas pedagógicas, na medida em que levou os educadores a perderem a visão de que Educação implica em uma ação coletiva e, como tal, deve ser planejada e desenvolvida.

Reconhece-se que, atualmente, um dos maiores desafios que se colocam para a construção de uma escola democrática é o resgate do trabalho coletivo na organização escolar, condição fundamental para o desenvolvimento de qualquer projeto ou proposta pedagógica. Uma reorganização nesse nível implica uma efetiva e necessária revisão das relações de poder dentro da instituição. O princípio subjacente é conhecido: todos os educadores têm o direito e o dever de participar dos níveis de decisão que afetam o seu trabalho pedagógico. Isto é condição para o estabelecimento de compromisso entre os educadores e as propostas pedagógicas desenvolvidas.

Urge, portanto, que os educadores que atuam na escola assumam esse desafio como a grande utopia que deve dirigir as suas ações nos tempos atuais: a construção de coletivos dos educadores na escola para planejar, desenvolver e acompanhar os projetos pedagógicos que devem marcar o funcionamento de uma escola democrática, nos termos aqui delineados.

Vale abordar alguns exemplos relacionados à ausência do trabalho coletivo: como a questão da alfabetização escolar é, geralmente, desenvolvida nas escolas? Via de regra, a questão fica reduzida à discussão - geralmente inócua - sobre a metodologia a ser seguida e da cartilha a ser adotada, relembrando que cada docente tem autonomia de escolha. Obviamente, tal postura pode ser considerada totalmente reducionista em relação à questão, na medida em que limita o processo de alfabetização a um curto período da escolaridade em que o objetivo centra-se no domínio do sistema simbólico da escrita. No entanto, se o processo de alfabetização for pensado na perspectiva da constituição do aluno como leitor e produtor autônomo de textos, a questão muda totalmente de perspectiva, exigindo um projeto pedagógico que aborde desde a pré-escola até o Ensino Médio , o que exige uma ação coletiva dos docentes, em torno de diretrizes pedagógicas comuns, que envolve desde a concepção de leitura e escrita, compreensão sobre seu processo, diretrizes metodológicas, metas e objetivos a serem alcançados - enfim, um projeto de alfabetização centrado na escrita como condição para o exercício da cidadania, pelos alunos.

Igualmente, mantidas as diferenças de conteúdo, problema semelhante pode ser pensado com relação ao desenvolvimento do pensamento matemático nos alunos, ou do pensamento científico, ou a formação do senso estético, independente do conceito de currículo que se utiliza. Isto exige a formação de coletivos de professores que planejem suas práticas em torno de diretrizes comuns assumidas pelo grupo - coloca-se, portanto, como condição para a construção da escola democrática, como aqui delineada.

Deve-se ressaltar que o papel da gestão neste quadro é fundamental, dado que organização não é um processo espontâneo, mas deve também ser planejado de acordo com as condições concretas identificadas nas instituições. Diretor/a e coordenador/a situam-se como profissionais determinantes para a organização dos docentes em coletivos.

AS CONTRIBUIÇÕES DA PSICOLOGIA PARA A CONSTRUÇÃO DA ESCOLA DEMOCRÁTICA

Observando-se os dados sobre a atuação profissional nas diversas áreas, poder-se-ia supor que a Educação já seria um campo bem estruturado para os psicólogos brasileiros. Certamente ocorreram grandes progressos nesta área, como atestam as publicações eos CONPE promovidos pela ABRAPEE.

No entanto, sempre é importante relembrar que a situação nem sempre foi favorável para os psicólogos escolares e educacionais. Em 1988, a primeira pesquisa sobre o perfil do psicólogo brasileiro, promovida pelo Conselho Federal de Psicologia, apontava a Educação como a quarta área de escolha, atrás da Clínica, Docência e Organização. Entre os psicólogos que atuavam na área educacional, a pesquisa identificou cerca de 16 diferentes atividades profissionais, dentre as quais 10 poderiam ser caracterizadas como práticas da área Clínica, como atendimento de distúrbios de aprendizagem, aconselhamento psicológico, aplicação de testes, psicodiagnóstico, etc. Dentre as restantes, destacaram-se planejamento de projetos, acompanhamento de pessoal, avaliação curricular, treinamento de para profissionais.

Para se entender esse quadro, deve-se considerar que, historicamente, a atuação do psicólogo na área da Educação surge na esteira da implantação da moderna sociedade industrial capitalista, quando as mudanças nas formas de produção passam a exigir dos trabalhadores determinadas “aptidões e traços de personalidade”, como condição de eficiência no trabalho. Neste sentido, o laboratório de psicometria de Galton, no final do século XIX, tem sido apontado como um marco inicial da atual Psicologia Escolar. Ali eram estudadas questões relacionadas com as chamadas diferenças individuais e o desenvolvimento da inteligência e da personalidade. No mesmo sentido, Binet e Simon, no início do século XX, desenvolveram seu famoso teste, visando detectar, na população em idade escolar, por solicitação do governo francês, as crianças que deveriam receber tratamento diferenciado devido a algum problema psicológico identificado.

Patto (1984Patto, M. H. S. (1984). Psicologia e Ideologia - uma introdução crítica à psicologia escolar. São Paulo: T. A. Queiroz. ) afirma que a Psicologia

nasce com a marca de uma demanda: a de prover conceitos e instrumentos científicos de medida que garantam a adaptação dos indivíduos à nova ordem social. Assentada sobre nova ênfase dos psicólogos experimentais sobre o fenômeno psíquico, a ciência recém inaugurada deixa clara sua finalidade de adaptação levada a cabo através da seleção e orientação no trabalho e na escola. (p. 96).

Sobre o trabalho de Binet, a autora aponta que o referido cientista

não podia supor que estava lançando as bases de um procedimento que seria a principal atividade dos psicólogos durante todo o século: classificar os indivíduos, sobretudo crianças em idade pré-escolar e escolar primária, num outro sentido do termo classificação: para justificar sua distribuição em classes sociais. (p. 97).

Foi assim, portanto, que a Psicologia Escolar nasceu: de mãos dadas com a psicometria, desenvolvendo um conjunto de atividades em que se destacam a avaliação da prontidão, organização dos alunos em classes, diagnóstico e acompanhamento de crianças com problemas de aprendizagem. Porém, subjacentes a essas práticas, identifica-se a verdadeira finalidade do trabalho: adaptação do aluno à escola que, por princípio, é assumida como adequada.

Além disso, deve-se ressaltar que todo esse processo se desenvolveu fortemente impregnado pelo chamado Modelo Médico, ou seja, um conjunto de concepções teóricas que priorizam os fatores internos ou subjacentes como os principais determinantes do comportamento, minimizando o papel dos fatores ambientais, principalmente os mediatos, de natureza sócio-econômico-cultural. Pelas suas caraterísticas, as práticas baseadas no Modelo Médico voltaram-se para as chamadas patologias, considerando-se como tais os desvios comportamentais, a partir de um conceito de normalidade filogeneticamente determinado. Como consequência, tais concepções muito contribuíram para a atuação profissional dos psicólogos em termos remediativos, buscando, prioritariamente, no indivíduo as causas dos chamadas problemas psicológicos.

Neste ponto, devem-se questionar os motivos pelos quais esse modelo tradicional, hoje tão duramente criticado, ainda tem dominado as práticas de pequena parcela dos psicólogos brasileiros que atuam na área educacional. Entendo que a questão é de natureza basicamente ideológica. O Modelo Médico teve grande sucesso provavelmente por estar muito próximo da ideologia liberal, subjacente ao sistema capitalista de produção, cujo núcleo central é o conceito de individualismo - os homens nascem com potencial diferente o que leva a supor que uns apresentam melhores condições de aprendizagem e de desenvolvimento do que outros, tratando-se, portanto, de um processo natural. Nesta perspectiva, as instituições são poupadas, sendo que a origem dos problemas passa a ser buscada essencialmente nos indivíduos, seja por meio de fatores intrínsecos (emocionais, motivacionais...), seja por razões de relação inadequada com seu ambiente (inadaptação, falta de repertório...).

Obviamente, tais concepções liberais já foram amplamente criticadas nas suas características básicas (visão de homem, de mundo, papel do estado etc.) por diversas áreas do conhecimento, tornando-se mais clara, por exemplo, a concepção de que, numa sociedade de classes, como a nossa, o processo de ascensão social (e por que não dizer, de sucesso escolar) é muito mais determinado pela origem socioeconômica do indivíduo do que por fatores intrínsecos (inteligência, potencial etc...). Da mesma forma, a própria ciência psicológica tem desmistificado grande parte das crenças do Modelo Médico, por meio de pesquisas e teorias demonstrando que o ambiente (condições concretas de vida) tem um papel muito mais importante do que se supunha, na gênese e desenvolvimento dos chamados problemas psicológicos.

No caso da Psicologia Escolar, a crítica tem sido semelhante: não é mais possível explicar, por exemplo, as dificuldades de aprendizagem por meio, basicamente, dos fatores intrínsecos às crianças. Inúmeros estudos, realizados a partir da segunda metade do século passado, têm demonstrado que tais dificuldades, na sua grande maioria, relaciona-se com problemas de planejamento e organização escolar, práticas pedagógicas inadequadas, processos de discriminação de crianças oriundas de setores socialmente marginalizados, problemas na relação professor/aluno, currículos inadequados, condições de trabalho inadequadas, excessiva burocracia, falta de recursos etc... e um Estado que, historicamente, não tem considerado o ensino público como prioridade.

Diante do exposto, pode-se afirmar que a atuação do psicólogo na área educacional, coerente com o processo de democratização da escola, implica no seu engajamento junto aos demais profissionais da área, no sentido de garantir que a instituição cumpra a sua função prevista. Concretamente, defendo - aliás, há muito tempo - a ideia de que o grande desafio que se coloca para os profissionais que atuam na Educação é a democratização da escola, nas suas dimensões quantitativa, qualitativa e das relações internas. O mesmo desafio coloca-se para os psicólogos: somente o engajamento nesse esforço coletivo poderá justificar a sua presença na área educacional.

Além disto, é importante assinalar que, para a escola desempenhar adequadamente a sua função, é necessária a participação de diversas áreas do conhecimento, inclusive a Psicologia. Delineia-se, assim, a grande perspectiva para o psicólogo: a democratização /socialização do saber psicológico, ou seja, possibilitar aos educadores, principalmente professores, acesso ao conhecimento psicológico acumulado, considerado necessário para a tarefa maior da escola: o acesso ao conhecimento sistematizado, fundamental para o exercício da cidadania em uma perspectiva crítica e transformadora.

É inegável que a Psicologia apresenta um acúmulo de conhecimentos importantes para que a escola cumpra a sua função social. Embora reconheça que não cabe à Psicologia determinar os objetivos de ensino - pois trata-se de decisões de outra natureza - a área tem muito a contribuir com relação ao processo de ensino e aprendizagem. Afinal, nós pesquisamos Desenvolvimento Humano e Aprendizagem, construímos teorias que nos permitem contribuir com o processo educacional vivenciado pelos alunos nas escolas. Da mesma forma, temos acumulado um grande conhecimento sobre processos grupais, fundamental para a construção dos coletivos de educadores nas escolas. Temos um considerável arsenal de metodologias de pesquisa, quantitativa e qualitativa, fundamental para as intervenções dos profissionais na área.

Mas, esse processo de intervenção do psicólogo na escola, diante das questões aqui expostas, sugere algumas importantes implicações. Em primeiro lugar, o reconhecimento de que essa atuação somente será relevante se for, prioritariamente, desenvolvida em termos interdisciplinares, atuando com outros profissionais da área, com destaque o professor. Uma segunda questão é reconhecer que o conhecimento psicológico deve ser direcionado, primariamente, para subsidiar as ações de planejamento educacional, como estratégia para a construção de uma escola democrática como aqui delineada; isto envolve a contínua revisão crítica dos objetivos, conteúdos e práticas educacionais, além da estrutura e funcionamento da instituição. Uma terceira implicação, não menos importante, é a superação de modelos teóricos inadequados, como o Modelo Médico, já aqui discutido. No mesmo sentido, tal atuação requer dos profissionais da Psicologia uma formação educacional, com uma visão crítica sobre a política educacional desenvolvida em nosso país, além do conhecimento pedagógico observado nas escolas, o que possibilitará uma visão clara sobre o processo de educação.

Restaria, finalmente, discutir se a formação que os profissionais da Psicologia recebem nos seus respectivos cursos de graduação e de Formação de Psicólogos tem possibilitado a sua inserção na área educacional, visando à construção de uma escola democrática. Embora tal aspecto não se enquadre no escopo deste trabalho, deve-se lembrar que, atualmente, existem em nosso país cerca de 1071 cursos de Psicologia10 10 Informação da Associação Brasileira do Ensino de Psicologia - ABEP. , dos quais 85% são mantidos pelo ensino privado. Por mais otimista que seja, é evidente que um dos problemas centrais refere-se ao processo de formação contínua dos psicólogos, área em que as instituições científicas e profissionais têm um papel fundamental.

EM SÍNTESE

As mudanças observadas na área educacional, principalmente a partir dos anos 90, parecem ter envolvido ideologicamente quase toda a população, incluindo grande parte dos educadores, de forma gradual, pela utilização exemplar da propaganda oficial através dos meios de comunicação. No entanto, uma análise mais atenta demonstra claramente que as mudanças tiveram um caráter fundamentalmente privativista, através da imposição da lógica do mercado, como se o homem fosse apenas um ser que produz e consome. O Estado tem justificado a enorme participação do setor privado com a tese de que a Educação é questão pública, mas não necessariamente estatal; e com essa lógica, vem gradualmente descomprometendo-se de sua histórica obrigação de criação e manutenção de um sistema educacional democrático para toda a população.

Resta recolocar as dúvidas apresentadas no início deste texto: nessa situação analisada, haverá ainda possibilidade de se pensar o sistema educacional como um espaço de formação de indivíduos críticos e transformadores? Como devem atuar, no interior da escola, os educadores comprometidos com a construção de uma sociedade mais justa e inclusiva? No caso dos psicólogos, quais as alternativas para atuar na interseção com a Educação, de forma emancipatória?

Sem pretender respostas definitivas, defendemos que, quaisquer que sejam as alternativas propostas, devem ser frutos de um processo de profunda reflexão e de enfrentamento de valores, principalmente aqueles subjacentes ao neoliberalismo. Um processo que possibilite a revisão crítica das representações e concepções que temos sobre o próprio homem, sobre a sociedade que queremos transformar e construir, sobre o papel do Estado e da escola, sobre o processo de produção de conhecimento e sua função, sobre a relação família / escola, sobre os valores que a escola não pode se eximir de trabalhar com seus alunos, enfim, um processo que possibilite uma ampla oxigenação de nossos referenciais políticos e ideológicos. E que esse processo reflexivo ocorra em uma dimensão coletiva, de preferência no interior da própria escola, envolvendo a comunidade e os educadores comprometidos com a educação e que sonham com a possibilidade de transformar o mundo através de sua ação educacional.

Se os psicólogos pretendem constituir-se como uma categoria socialmente importante, no quadro da atual realidade educacional brasileira, devem assumir, organizadamente, o desafio histórico de (re)construção do sistema educacional como um espaço de formação da consciência crítica e da cidadania transformadora. Tal inserção não pode se dar forma isolada, mas em parceria com outros educadores de boa vontade, comprometidos com a escola democrática - destacando-se as figuras do professor e do gestor escolar. Em termos mais específicos, cabe à categoria dos psicólogos identificar os conhecimentos e práticas psicológicas consideradas relevantes, para que possam ser colocadas a serviço desse grande empreendimento histórico que é a luta pela construção de uma escola democrática, inclusiva e de boa qualidade - marcando, enfim, o nosso caminho de participação no processo de construção de uma sociedade mais justa, solidária e humana.

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  • 2
    Conferência de abertura realizada pelo autor no XV CONPE - Congresso Nacional de Psicologia Escolar e Educacional, promovido pela ABRAPEE, em julho de 2022.
  • 3
    Segundo Werneck (1982Werneck, V. R. (1982). A Ideologia na Educação. Um estudo sobre a interferência da ideologia no processo educativo. Petrópolis: Editora Vozes., p. 60), “Ideologia aqui será considerada como um fenômeno característico da estrutura do pensamento que expressa o modo pelo qual se entende o relacionamento vivido pelos homens e que, portanto, se manifesta em todo relacionamento social, em toda comunicação dos homens entre si... Poderia tornar-se consciente...e seria, em suma, a característica do relacionamento social comum, que faz com que toda a interpretação dos fatos seja feita segundo um ponto de vista”. Sendo entendida como o conjunto de representações e valores introjetados a partir das relações sociais - fenômeno tipicamente humano - situa-se, portanto, como um dos determinantes do comportamento. Além disto, pode dissimular e ocultar as reais condições da situação social, o que pode ser superado pelo desenvolvimento e exercício da consciência crítica.
  • 4
    United States Agency for International Development.
  • 5
    SBPC - Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência; ANPEP - Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Educação; ANDES - Associação Nacional de Docentes do Ensino Superior; CNTE - Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação; CBE - Conferências Brasileiras de Educação.
  • 6
    FUNDEF - Fundo para o Desenvolvimento e Valorização do Magistério; FUNDESCOLA - Fundo de Fortalecimento da Escola.
  • 7
    SAEB - Sistema Avaliação da Educação Básica; ENEM - Exame Nacional do Ensino Médio.
  • 8
    O conceito de Analfabeto Funcional refere-se a indivíduos que não utilizam, funcionalmente, a leitura e a escrita nas suas práticas sociais, apesar de dominarem os códigos lingüísticos.
  • 9
    Vale lembrar que Vigotski (1987)Vygotsky, L. S. (1987). Pensamento e Linguagem. São Paulo: Martins Fontes. já propunha que uma das principais funções da escola seria o acesso aos conceitos científicos. Para ele “Conceitos científicos parecem constituir o meio no qual a consciência e o domínio se desenvolvem, sendo mais tarde transferida a outros conceitos e por outras áreas do pensamento. A consciência reflexa chega à criança através dos portais do conhecimento científico” (p.79). Fica evidente, para o autor, a relação entre aprendizado escolar e o desenvolvimento mental das crianças, conteúdos e experiências que dificilmente a família consegue mobilizar.
  • 10
    Informação da Associação Brasileira do Ensino de Psicologia - ABEP.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Nov 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    23 Jun 2022
  • Aceito
    27 Set 2022
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