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ESCUTANDO OS SUBTERRÂNEOS DA CULTURA: RACISMO E SUSPEIÇÃO EM UMA COMUNIDADE ESCOLAR

ESCUCHAR LO SUBTERRÁNEO DE LA CULTURA: RACISMO Y SOSPECHAEN UNA COMUNIDAD ESCOLAR

RESUMO.

Este artigo pretende abordar alguns desdobramentos de um dispositivo de intervenção clínico-político em uma escola municipal de São Paulo. Utilizando um Grupo de Conversas com adolescentes foi possível observar e escutar uma cena que se repetia à exaustão e a partir dela supor um não dito social sobre os estudantes, suas mães e suas configurações familiares. Seguindo as indicações de Freud, Lacan, Benjamin e Gagnebin, consideramos o não dito que paira sobre elas como um modo de o passado perdurar de maneira não reconciliada no presente, acarretando uma contiguidade social e simbólica da mucama até as mulheres negras de hoje. O imaginário social sobre estas mulheres aponta para uma concepção de servidão e de corpo à disposição que, apesar de tantas mudanças históricas e conquistas femininas, ainda permanece e se transmite nos subterrâneos da nossa cultura. Recolocar tanto as falas e os atos dos estudantes, como os de suas mães, como prenhez de sentido e inscritos numa rede discursiva política e libidinal, nos permite reencontrar a potência e a capacidade de resistir desses sujeitos. Torna-se fundamental discernir o que é o sujeito colocado no lugar de resto no discurso social e o que é uma subjetivação da falta, pois enquanto esta última é o que promove o desejo, a primeira, é o que violenta e silencia o sujeito.

Palavras-chave:
Psicanálise e política; racismo; escola

RESUMEN.

Este artículo se propone abordar algunos desdoblamientos de un dispositivo de intervención psicoanalítica clínica-política en una escuela municipal de São Paulo. En un Grupo de Conversaciones con adolescentes, pudimos escuchar una escena que se repetía y, a partir de la misma, suponer un “no dicho” social sobre los estudiantes, sus madresy sus configuraciones familiares. Siguiendo la huella de Freud, Lacan, Benjamin y Gagnebin con- sideramos lo que no se dijo como un modo en que el pasado perdura de manera no recon- ciliada en el presente, acarreando una contigüidad social y simbólica de la mucama hasta las mujeres negras de hoy. El imaginario social sobre esas mujeres revela una concepción de servidumbre y de cuerpo a disposición que, a pesar de tantos cambios históricos, aún permanece y se transmite en los subterráneos de nuestra cultura.Volver a poner el discurso y las acciones de los estudiantes y de sus madres como llenos de sentido y matriculados en una red política y discursiva de la libido, nos permite redescubrir el poder y la capacidad de soportar de estos sujetos. Es esencial discernir lo que es el objeto colocado en la posición de resto en el discurso social y lo que es una subjetivación de la falta, pues una vez que esta última es lo que promueve el deseo, el primero es lo que violenta y silencia el tema.

Palabras-clave:
Psicoanálisis y política; racismo; escuela

ABSTRACT.

This article addresses some effects of a political-clinical psychoanalytic inter- vention implemented at a public school in Sao Paulo. The focusconversations group held with adolescents enabled us to watch and to listen to a repeatedly returned scene, which al- lowed us to assume a social “unsaid” about students, their mothersand their family settings. Embracing the indications of Freud, Lacan, Benjamin and Gagnebin, we considered that the unsaidthat accompanies these mothers as an enduring pastunreconciled with the present, thereby causing a social and symbolic contiguity of the master’s slave girl to today’s black women. The social imaginary of these women points to a conception of servitude and sex- ually available body, which, despite the many historical changes and female achievements, still remains and istransmitted in the underground of our culture. Replacing both speeches and acts of the students and of their mothers, as laden with meaning and enrolled in a po- litical and libidinal discursive network, allows us to rediscover the power and resilience of these subjects. It is fundamental to discern between a subject placed in the place of rest in the social discourse, and a subjectivation of the lack, since while the latter is what promotes the desire, the former is what violates and silences the subject.

Keywords:
Psychoanalysis and politics; racism; schools

Introdução

Este artigo pretende elucidar alguns dos desdobramentos de uma série de inter- venções clínico-políticas em uma escola pública de São Paulo, por meio de um grupo de trabalho, o Grupo de Estratégias em Educação. Tais intervenções permitiram desvelar algo do mal-estar presente tanto no ambiente escolar, como o que se atualiza no cotidiano de crianças, adolescentes, mulheres e homens pobres e negros (as) no nosso país.

Constituído inicialmente por quatro psicanalistas, o grupo tinha como proposta pro- mover intervenções e construir dispositivos coletivos que pudessem movimentar as ques- tões presentes no cotidiano escolar. Questões que, na maioria das vezes, são esvaziadas e degradadas ao serem maciçamente localizadas em alguns poucos estudantes ― de tal modo, que a invisibilidade das tensões geradas pelo laço social recai sobre alguns sujeitos, individualizando seus impasses e conflitos, patologizando ou criminalizando suas formas de resistências ou suas saídas (Rosa, 201620. Rosa, M. D. (2016). A clínica em face da dimensão sociopolítica do sofrimento. São Paulo: Pulsional.).

A constatação de que se tratava de recolocar e incluir essas conflitivas como enig- mas dentro dos muros da escola ― e não bani-las pelos excessivos encaminhamentos para atendimentos psicológicos ou excluí-las pela expulsão dos “alunos problemas”―, foi apontando a direção de uma intervenção clínico-política frente ao mal-estar. Concordamos com Cristina Vicentin no sentido de que distância, a desimplicação, o julgamento ou a pres- crição moral são decisivos para que situações de desamparo tomem a forma de violências físicas, no caso de adolescentes cujos modos de dizer não estejam encontrando cabida no corpo ou nos seus territórios sociais e existenciais (Vicentin, 2016). Escapar de uma privatização dos conflitos e recolocar essas questões como potenciais disparadores para abordar as questões do corpo, da vida, da morte, do sexual e do pulsional, da intolerância e da segregação, na totalidade dos alunos da escola, tornou-se nosso maior desafio (Braga, Carmo, & Rosa, 20135. Braga, A. P. M., Carmo, V. C. S., & Rosa, M. D. (2013). Entre conversas e descobertas dis- positivos de intervenção diante das urgências de uma escola de São Paulo. Revista da Associação Psicanalítica de Porto Alegre, (41-42), 54-70.).

Um desses dispositivos, os Grupos de Conversa, configurou-se como um encontro semanal, com participação totalmente voluntária, durante o horário de aula, com adoles- centes entre 14 e 16 anos. Longe de se sustentar numa identidade tida como única e homo- gênea, esse dispositivo partia de algo comum que se apresentava como contingência ― os adolescentes dos dois últimos anos dessa escola pública paulista ― que os fazia comparti- lhar de lugares próximos na rede discursiva. O grupo visou apontar tanto a singularidade do que construíam nessa rede e o lugar que ocupavam, quanto lançar alguma luz sobre esse campo social. Tinha como proposta constituir-se como um espaço de circulação da palavra, permitindo que, no lugar das certezas absolutas e de significantes fortemente aderidos a determinados estudantes, surgisse um momento de indagações e questionamentos que abrisse brechas na rede discursiva. Dessa forma, os adolescentes poderiam se realocar nessa rede de poder que atribui, a cada um, lugares e posições extremamente desiguais de visibilidade e invisibilidade, de valor e desvalor, de condenação ou exaltação, de proibições e de acesso não só aos bens, mas à subjetividade, ao afeto, ao questionamento, ao prazer e ao gozo.

Durante os dois primeiros meses de intervenção com um desses grupos, uma cena foi tomando conta dos nossos encontros. Esta se repetia com tamanha intensidade e com tão poucas variações que nos fez supor que algo ali insistia em se fazer ouvir. Era um grupo de estudantes que se constituiu, a pedido deles mesmos, somente por rapazes, os quais, ainda que fossem considerados pelos educadores como indisciplinados, violentos e des- compromissados, sustentaram o compromisso desses encontros semanais durante um ano e meio, até concluírem o ensino fundamental II nessa escola.

O enredo da cena era basicamente o mesmo: iniciava-se com a alusão ao nome da mãe de algum dos adolescentes presentes, mas isso se dava de uma maneira tão indireta, que as coordenadoras do grupo não conseguiam nem mesmo reconhecer a quem aquela fala se referia. Podia ser um fragmento ou a sílaba inicial de um nome, um apelido ou mes- mo o silêncio acompanhado de um olhar tomado como provocativo. Inevitavelmente, essas supostas referências à mãe de algum dos componentes do grupo eram tomadas como uma contravenção gravíssima, que legitimava que o aluno que havia se sentido ofendido agre- disse implacavelmente o outro. Quando indagados sobre essas investidas, eles afirmavam, apenas que: “ele está falando da minha mãe” ou “ele está chamando minha mãe de puta”. O revezamento de quem ficava na posição de agredido ou agressor mostrava uma cena que se referia a todos e a cada um.

Sabemos que o comportamento que pudemos observar com os adolescentes dessa escola não poderia ser considerado algo restrito e específico desse grupo, nem dessa instituição. Entre outros exemplos no universo escolar ou em instituições com adolescentes, Noguchi (201117. Noguchi, N.F.C. (2011). Seguro na Febem SP: um olhar para as relações de poder em Unidades de Privação de Liberdade. Rev. Bras. Adolescências e Conflitualidade, (5) 88-111.) apresenta entrevistas na Fundação Casa, em que os próprios internos afirmam que em todas as suas unidades, “xingar a mãe” de alguém é algo proibido e regulado pelo Sistema, código interno de condutas por eles estipulado, sendo um ato severamente punido. O rigor das punições descritas nesta e em outras pesquisas, ecoando com aquelas observadas nos adolescentes acompanhados por nós, foi o que nos permitiu supor, seguindo as trilhas da psicanálise, que esses jovens nos diziam mais do que pretendiam dizer, e sabiam mais do que pensavam saber, pois se tratava de um saber outro, um saber inconsciente (Musatti-Braga, 201516. Musatti-Braga, A.P. (2015). Os muitos nomes de Silvana: contribuições clínico-políticas da psicanálise sobre mulheres negras (Tese de Doutorado). Instituto de Psicologia, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil.).

A repetição como consequência do que não foi elaborado pelo sujeito já foi abor- dado por Freud (1914/2015) 10. Freud, S. (2015). Recordar, repetir e elaborar. In P. C. de Souza (Coord. e Trad.). Obras Completas (Vol.10, pp.193-209). São Paulo: Companhia das Letras.(Obra original publicada em 1914).há mais de 100 anos, ao afirmar que o analisando que não consegue recordar o que foi esquecido, repete, atua. “Ele não o reproduz como lembrança, mas como ato, ele o repete, naturalmente sem saber que o faz” (Freud, 1914/2015, p. 199- 200). No entanto, aquilo à que estamos nos propondo articular aqui não se restringe a uma relação entre o que foi recalcado e o seu retorno, seja por meio de seu sintoma ou de seu ato, o que se restringiria ao sujeito. Estamos adentrando à formulação de uma repetição de um não dito que não pertence ao sujeito individualmente e que opera como efeito de uma transmissão que atravessa sujeitos e gerações. Foi a clínica com crianças, pela percepção de que o sintoma do filho é atravessado pelo não dito de seus pais, que abriu um cami- nho possível para adentrar essa questão: se concebêssemos a criança como um sujeito individual, como explicar uma transmissão quase literal, no seu corpo, do que não é dito por eles? (Rosa, 201620. Rosa, M. D. (2016). A clínica em face da dimensão sociopolítica do sofrimento. São Paulo: Pulsional.). Propor que há uma transmissão entre gerações que não é só de valores e tradições, que não é só conhecida e consciente, mas que é também do desejo, do gozo e do sintoma, exige cautela e convoca a retomar nossa concepção de sujeito, de laço social e de significante.

Para nós, a concepção de inconsciente freudiano não é compatível com a ilusão da autonomia ou do individual, uma vez que o sujeito se funda na relação com o Outro, em re- lação ao desejo do Outro. Ou seja, estamos afirmando que não concebemos o sujeito como indivíduo por duas razões fundamentais: o sujeito não pode ser entendido fora do laço com o Outro, como se fosse independente, definido individualmente e não pode ser concebido como um sujeito total, indiviso e uno. “Já encontraram, vocês, seres totais? Talvez seja um ideal. Eu nunca vi nenhum. Eu não sou total, não. Nem vocês. Se fosse total, estaria cada um no seu canto, total, não estaríamos aqui juntos, tentando organizar-nos, como se diz” (Lacan, 1954-55/1985, p. 30713. Lacan, J. (1985). O seminário: Livro 2. O Eu na teoria de Freud e na técnica da Psicanálise. (M. D, Magno. Trad.). Rio de Janeiro: Jorge Zahar. (Seminário proferido em 1954- 55).). Assim, seguindo a trilha de Lacan, concebemos o sujeito sempre no laço social, o que diz de sua relação com o outro e com sua verdade incons- ciente, com aquilo que toca sua relação com o desejo, com o gozo e com o saber (Lacan, 1969-70/199414. Lacan, J. (1994). O seminário: Livro 17: O avesso da psicanálise. (M.D., Magno, Trad.). Rio de Janeiro: Jorge Zahar . (Seminário proferido em 1969-70).). Disso decorre que consideremos o sujeito na sua singularidade e não na sua individualidade.

O sujeito é nomeado por um repertório de possibilidades significantes, próprio daquele que o nomeou, atravessado pelo contexto onde vive e onde estão inscritos, tanto ele como seu grupo social e familiar, que marca possibilidades e proibições, aponta o que lhes é admitido e o que lhes é impedido. Estamos tomando a rede discursiva como uma rede de saber e de poder; portanto, os significantes com os quais o sujeito foi e é marcado estão articulados não só ao campo pulsional, mas estão atravessados histórica e socialmente. Além disso, defendemos que o sujeito e aqueles que o banharam no campo do desejo e no mundo das palavras também devem ser considerados, levando em conta o que Castoriadis (19987. Castoriadis, C. (1998). Lo imaginario: la creación en el dominio historicosocial. In C, Castoriadis (Org.), Los dominios del hombre: las encrucijadas del laberinto (pp.64-67). Barcelona: Gedisa.) nome ou de significações imaginárias sociais, já que cada sociedade constitui um sistema de interpretação do mundo com suas concepções de virtude, tabu, pecado, família, entre outras.

A compreensão de um sujeito singular, mas não individual, também fica explícita na concepção de significante que encontramos na obra lacaniana. O significante circula, uma vez que não está dentro de um sujeito: sua articulação com outros significantes não está circunscrita a alguém; acontece no encontro e na ligação de um sujeito com outro. O significante nos atravessa e também atravessa gerações.

O que estaria sendo enunciado pelos adolescentes com os quais trabalhamos, por meio de suas reações excessivas e insistentes à suposta menção ao nome de suas mães? Suas falas pareciam apontar o quanto se sentiam considerados como os filhos dessas mães mal-faladas, os filhos da puta, como se recaísse sobre si e sobre elas uma suspeita constante e a reputação delas estivesse sempre em perigo. Foi isso que nos fez supor um não dito referido às significações imaginárias do que poderia ser mãe e mulher nessa comunidade escolar que se transmitia por meio dos significantes portados por esses filhos de mães mal-ditas.

Articulada a essa suposição, somava-se uma impressão, fruto de inúmeras conver- sas e intervenções junto às educadoras, ao longo dos nossos sete anos de trabalho nessa instituição, que parecia reforçá-la. Embora de início fosse uma sensação um tanto impre- cisa e obscura, parecia-nos que algumas educadoras convocavam certas mães para uma posição que nos soava excessivamente materna, como se devessem ser exclusivamente mães. Essa convocação não se fazia aleatoriamente; tratava-se de uma seletividade que, embora não fosse intencional, obedecia a uma gramática e uma lógica ditada pelo lugar que essas mulheres ocupam na rede discursiva. Era notável que, em relação a todo um grupo de pais que circulavam nessa escola, universitários e com poder aquisitivo mais fa- vorável, esse chamado ocorria de maneira muito mais amena.

Não havia dúvida de que lá, as mulheres que não estavam como educadoras deveriam realmente ser convocadas como mães, uma vez que era esse o lugar de seu reconhecimento social no espaço escolar. Mas o que se ia fazendo ouvir era um empuxo, um imperativo à posição materna como única maneira de existir dignamente e de se fazer respeitar, que incidia fortemente sobre determinadas mulheres (Musatti-Braga, 201516. Musatti-Braga, A.P. (2015). Os muitos nomes de Silvana: contribuições clínico-políticas da psicanálise sobre mulheres negras (Tese de Doutorado). Instituto de Psicologia, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil.). Com variações de detalhes ou de justificativas, o que se repetia em relação a elas eram comentários, cuja espinha dorsal consistia num ataque a tudo que extrapolasse o que era considerado e estabelecido como obrigações maternas: “Para se arrumar ela tem tempo, mas para vir à reunião da escola...” ou “de sair ela gosta, mas para acompanhar as lições...”.

Quando aparecia nas falas dessas mulheres, o desejo de ter um tempo só delas ou só com seus companheiros, ou alguma situação em que ficavam explícitos vaidade, erotismo, suas vontades e seus prazeres para além de ter um filho ou de ser mãe, o que aparecia era uma crítica dissimulada pelas reticências acompanhadas de um semblante de reprovação.

Novamente, é preciso afirmar que não consideramos essas falas como inusitadas ou restritas a essa comunidade escolar. Sabemos que a valorização sobre a posição materna encontra raízes longínquas, em que se articulam o campo pulsional e o político, e que o nome mãe é muitas vezes evocado pela própria impossibilidade de encontrar uma nomeação do que seria próprio dA mulher (Lacan, 1972-73/198515. Lacan, J. (1985). O seminário: Livro 20: Mais ainda (2ª ed.). (M.D. Magno, Trad.). Rio de Janeiro: Jorge Zahar . (Seminário proferido em 1972-73).). No entanto, o que nos fez supor que ali havia algo sendo dito sobre essas mães da escola, para além de comentários irrelevantes, é que havia uma recriminação sobre algumas aspirações e atitudes que, se referidas a mulheres pertencentes a outros estratos sociais, poderiam ser celebradas ou valorizadas como fruto de lutas e conquistas femininas, mas a elas parecia todo o contrário.

A valorização do lugar materno é bastante discutida pela historiadora Mary del Priori, lembrando que, desde os primeiros séculos de nossa colonização, a igreja impôs um adestramento das mulheres na figura de “boa-e-santa-mãezinha”. A intenção era fugir “da tradição de amasiamento legada pelas relações entre brancos e índias, bem como da tradição do concubinato, trazida pelos portugueses e amplamente difundida entre as classes subalternas” (Del Priori, 2009, p. 938. Del Priore, Mary (2009). Ao sul do corpo: condição feminina, maternidades e mentalidades no Brasil Colônia. São Paulo: Unesp). As práticas sexuais comuns nessas classes eram caricaturadas, como parte de um projeto normatizador da igreja e do Estado, cunhando o estigma de puta para mulheres não enquadradas nesse padrão.

Esse padrão de “boa-e-santa-mãe” mantém alguns ecos até os dias de hoje, ainda que incida de maneira bastante diferente nos vários contextos e estratos sociais e que se articule a muitos outros novos padrões e representações. Entre estes, vale ressaltar que, nas classes populares desde a década de 1990, unidas pelo desejo de justiça frente aos seus filhos assassinados violentamente pela polícia, diversas mulheres passaram a ser reconhecidas como “mães de luta”. Mulheres negras e pobres, com pouca instrução formal e moradoras de favelas, foram as protagonistas de uma multiplicidade dessas organiza- ções: Mães de Acari, Mães de Maio, Mães da Candelária, Mães de Vigário Geral, Mães da Baixada Fluminense, entre outras. Estas parecem corroborar a hipótese de que desde o lugar de mães, essas mulheres gozam de legitimidade e respeito (Brites & Fonseca, 20136. Brites, J., & Fonseca, C. (2013). As metamorfoses de um movimento social: Mães de vítimas de violêncianoBrasil.AnáliseSocial,(209),858-877. Recuperadodehttp://www.scielo.mec. pt/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0003-25732013000400005&lng=pt&tlng=pt). A credibilidade e o reconhecimento social atribuído às mães, sem dúvida, são uma grande conquista: basta ver os programas sociais do governo que, dirigido a elas como responsá- veis por gerir os benefícios, conferem-lhes e afirmam confiabilidade e competência (Rego & Pinzani, 201319. Rego, W. L., & Pinzani, A. (2013).Vozes do Bolsa Família: autonomia, dinheiro e cidadania. São Paulo: Unesp .).

Em ambos os casos, no entanto, é preciso notar que a participação dessas mulheres na vida pública acontece por um lugar entendido como pertencente ao campo da vida pri- vada, o da maternidade. Na mesma vertente caminha a pesquisa realizada há vários anos pela antropóloga social Cynthia Sarti (198521. Sarti, C. (1985). É sina que a gente traz (ser mulher na periferia urbana) (Dissertação de Mestrado).Departamento de Ciências Sociais, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciên- cias Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil.). Ao descrever os moradores de um bairro da periferia de São Paulo, observa que as mulheres atuam politicamente em nome de seu pa- pel de mãe e é este que dá “legitimidade à sua participação na esfera pública no trabalho ou na política. ‘Ser mãe’ é a categoria que permite articular todas as esferas de sua existência” (Sarti, 1985, p. 277).

O que consideramos fundamental observar é que, nesses estratos sociais, essa legitimidade oriunda do papel de mãe não encontra paralelo, nem se estende para o campo de reconhecimento da mulher.

A insistência das educadoras em convocar determinadas mulheres como completamente mães e dos seus filhos reafirmarem obstinadamente que elas não seriam putas não nos permite ignorar essa disparidade quanto ao valor e legitimidade entre as posições de mãe e de mulher nesse estrato social. Fomos percebendo que eram as mesmas mulheres as que seus filhos denunciavam como sendo ofendidas no espaço escolar e aquelas que as educadoras insistiam em tentar moldar como “boa-e-santa-mãezinha”. Isso só foi possível escutando tanto os estudantes quanto essas mulheres em diversas situações dentro dessa escola e, posteriormente, em seus lares1 2 Para a nossa pesquisa de doutorado realizamos uma série de entrevistas com mães de estudantes dessa escola em suas respectivas casas (Musatti-Braga, 2015). . Partindo do deslocamento e da repetição desses significantes que atravessavam os adolescentes e suas mães, o que se foi evidenciando é que aquilo que desaparecia na passagem entre a mãe e a puta era justamente o significante mulher que, no caso delas, era mais do que silenciado: era omitido ou apagado.

Com isso, atos ou falas aparentemente sem sentido e desmedidos dos estudantes ou de suas mães encontravam possibilidade de uma significação, na medida em que se apostava que ali havia uma transmissão insidiosa, um dito impossível de pronunciar e de se inscrever. Aos poucos foi sendo possível escutar que muitos destes eram respostas a uma situação de violência ou submissão, ouvida concretamente ou escutada nas entrelinhas. Esta cena no Grupo de adolescentes tornou-se um exemplo paradigmático da reação à suposta acusação a esses estudantes e às suas mães que, pronunciada ou não, era sempre escutada; mas ainda que fosse exemplar, não se tratava de um caso isolado.

Imaginário social sobre mulheres pobres: mãe solteira ou mulher independente?

Eu me sinto uma grande mulher, guerreira, trabalhadeira. Praticamente criei meus cinco filhos sozinha, nunca precisei pedir nada pra ninguém ENT#091;...ENT#093; nunca precisei de pedir nada pro pai. (Cleide)

O que primeiro escutamos ao entrevistar Cleide foi o orgulho que ela afirmou sentir por ter criado seus filhos, ainda que em situações tão adversas. Essa fala ressoou e encontrou eco na fala de outras entrevistadas nossas por meio do uso de adjetivos que enfatizavam o valor dessa empreitada ― grande mulher, guerreira, muito mulher ―, ainda que não estivessem juntas no momento das entrevistas.

Sou muito mulher em dar continuidade de criar meus filhos (Silvana)

Sempre fui lutadora, guerreira. (Neide)

Durante tantos anos escutando essas e outras diversas mães dentro do espaço escolar, essa fala jamais aparecera. O contraste entre os enunciados que se faziam presentes dentro e fora dos muros da escola parecera nos indicar a distância entre a maneira que essas mulheres se imaginam vistas e reconhecidas pelos educadores e gestores escolares- como representantes do discurso hegemônico que paira sobre si ―, e como se veem e se reconhecem dentro de sua rede comunitária, entre seus pares. É provável que, dentro do espaço escolar, estivessem muito ameaçadas por toda uma concepção do que seria esperado da maternidade e de uma mãe cuidadosa. Seria aquela que compareceria a todas as reuniões e acompanharia as lições de seus filhos, ainda que isso fosse completamente incompatível com sua jornada de trabalho? Aquela que reservaria um “lugar apropriado” para seus filhos realizarem as lições de casa, ignorando o fato de morarem num cômodo só, completamente tomado pelas camas, fogão, televisão, geladeira e guarda-roupa? Seria aquela que leria histórias para eles dormirem com o intuito de incentivar a leitura, mesmo que seu horário e local de trabalho tornassem seu período em casa insuficiente até mesmo para repor o seu sono?

Creditamos a ausência dentro da escola dessa fala de Cleide e da de tantas outras mães sobre suas conquistas ao exercerem o seu papel materno ao imaginário social que recai sobre si no espaço escolar.

Assim como observado por Bourdieu e Passeron (19754. Bourdieu, P., & Passeron, J. C. (1975). A reprodução: elementos para uma teoria do sistema de ensino (R, Bairão, Trad.). Rio de Janeiro: Francisco Alves.) em relação às escolas francesas, estamos defendendo que essa escola paulista, como as escolas públicas brasileiras de maneira geral, não só reproduzem, mas reforçam as desigualdades sociais, uma vez que a criança ou adolescente é recebido num ambiente fortemente marcado pelo caráter de classe que atravessa todo o processo pedagógico. Apesar de os estudantes das escolas públicas não pertencerem às classes mais abastadas, ficariam submetidos aos seus habitus de classe e ao seu imaginário social.

Essa afirmação vai ao encontro da análise de Azanha(19952. Azanha, J. (1995).Educação: temas polêmicos. São Paulo: Martins Fontes.) a respeito da estigmatização do ensino público no Brasil. Até a maciça expansão de vagas que ocorreu a partir de 1967, a escola pública brasileira era considerada de qualidade, muitas vezes esquecendo-se ou omitindo que atendia apenas uma parcela extremamente restrita da população. O processo de universalização pelo qual passou a rede de ensino no nosso país, longe de ser visto como uma extensão do direito à educação àqueles até então excluídos do ensino, foi visto com ressentimento social pelos segmentos da classe média, cujas crianças frequentavam com exclusividade as escolas públicas até então. Foi uma resistência que encontrou ressonância nos meios de comunicação e nos interesses privados e empresariais e também, o que é fundamental salientar, nos próprios educadores, identificados com esses dois grupos. Ainda que José Mario Azanha reconheça diversos fatores que contribuem para a concepção e condenação da escola pública brasileira como necessariamente fadada ao fracasso, aponta a participação dos educadores que, de maneira geral, ao invés de se ajustarem a uma mudança de mentalidade necessária face à nova realidade, aturdidos e identificados com os interesses da classe dominante, resistiram em ajustar sua mentalidade profissional à nova realidade escolar.

Retomando a fala de Cleide, ponto a ponto fomos encontrando pistas sobre a concepção de maternidade hegemônica no nosso discurso social. A afirmação que seria muito mulher não nos parece somente uma exaltação pelo seu feito, mas a necessidade de se precaver, reafirmando o valor de um ato que poderia, em princípio, ser criticado. Essa suposta crítica se faz ouvir em seguida, ao dizer que criou seus filhos praticamente sozinha. Pode parecer contraditório ela afirmar ter criado os filhos sozinha ao mesmo tempo em que reconhece a ajuda fundamental que recebeu da sua própria mãe, o que nos faz pensar que ela se refere a outro tipo de ausência. O sozinha, ao invés de reforçar a ideia do esforço que foi necessário para cuidar deles sem uma estrutura do Estado que lhe desse suporte para exercer essa função, é o termo que parece colocá-la numa posição desvalorizada e de suspeição. Pelo lugar na rede discursiva em que essas mulheres estão inscritas, o termo sozinha aponta para uma concepção de algo que supostamente faltaria - a presença paterna ―, mais do que para aquilo que tiveram: o desejo e a capacidade de cuidar. Segundo o discurso social, seria essa carência que teria como consequência uma desorganização familiar e que seria tomada tão frequentemente como a explicação para as dificuldades afetivas e de aprendizagem oupar a comportamentos nomeados como agressivos (Musatti-Braga, 201516. Musatti-Braga, A.P. (2015). Os muitos nomes de Silvana: contribuições clínico-políticas da psicanálise sobre mulheres negras (Tese de Doutorado). Instituto de Psicologia, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil.).

As conquistas oriundas dos novos parâmetros da “família pós-moderna”, que in- cluem as “produções independentes”, os “recasamentos”, e as “famílias de escolhas” não parecem ser usufruídas de maneira equânime e homogênea por todos os grupos sociais. A antropóloga urbana, Claudia Fonseca (20009. Fonseca, C. (2000). Mãe é uma só? Reflexões em torno de alguns casos brasileiros. Revista Psicologia USP,13(2), 49-68.), aponta que esses novos parâmetros pa- recem ser muito bem aceitos quando referidos às famílias de classe média ou média alta, mas o mesmo não aconteceria em relação às famílias mais pobres. Nestas, perdurariam os rótulos mais antigos carregados de conotações pejorativas, como “mães solteiras”, “filhos largados ou abandonados”, “famílias desestruturadas”, termos que revelam um suposto fracasso na realização do ideal de família nuclear, tomada como norma.

A tal ponto paira na escola um parâmetro de normalidade familiar que, numa reunião em que acompanhávamos a professora do quarto ano, a mãe de uma aluna de nove anos, ao ser indagada sobre o cotidiano de sua filha, nos diz:

Ela vê o pai, a gente não está mais junto, mas ele mora perto e vai visitar. Como é essa visita? Como numa família normal. (Marta)

A ferocidade com que o discurso hegemônico patologiza o que escapa à suposta normalidade e ao ideário da cultura foi nos exposta de maneira emblemática por um ado- lescente integrante de outro Grupo de Conversas, com o qual trabalhávamos nessa mesma escola. Ao observar que apenas dois colegas que integravam este grupo moravam ao mes- mo tempo com o pai e com a mãe, ele nos diz:

O resto é tudo “des-familiado”!

Indagado do sentido desse neologismo, ele completa:

“Des-familiada” é uma família que não é muito junta, ao mesmo tempo é muito uni- da.

O prefixo des pode ser entendido como aquilo que assinala na sua fala a distância entre o que supostamente seria esperado e a família que ele tem, a hiância entre o discurso social com seus significantes precedidos do des ― família disfuncional, que o desqualifica e o desfavorece ― e a experiência familiar dele e da maioria dos seus amigos. O muito unida é o que aponta o movimento de resistência a esse discurso social que busca enredá-lo e a sua capacidade de encontrar reconhecimento em uma rede de pertencimento baseada nos laços horizontais, nos laços familiares e de vizinhança, que permite fazer frente a essa captura.

Isso é o que fica explicitado na fala de outra entrevistada nossa, Neide, ao deixar evidente a distância entre o que poderia ser visto como digno de exaltação dentro desses novos parâmetros familiares: a mulher independente, mas que recebe o nome de uma qual- quer, pelo lugar que ela ocupa na rede discursiva.

Mulher que mora sozinha é mais cobiçada. Acham que é uma qualquer, não respei- tam, qualquer um quer chegar, dar uma mexida. Quando uma mulher mora com ho- mem é mais respeitada. No sentido de responsabilidade uma mulher consegue se responsabilizar às vezes até melhor. Às vezes, a mulher tem um homem que mora com ela, mas não serve, é só pra dizer que tem um homem, para outros homens não ficarem mexendo. (...) Às vezes vejo: “Olha a fulana”. “Não fala isso, cuidado com o fulano! Ela tem marido!”, “Ela tem homem”. (Neide)

A presença de um homem como necessária para “botar respeito” na casa, ou seja, como estratégia de atestar a integridade moral das mulheres e como proteção diante da insuficiência da polícia (Fonseca, 20009. Fonseca, C. (2000). Mãe é uma só? Reflexões em torno de alguns casos brasileiros. Revista Psicologia USP,13(2), 49-68.) é algo que, vindo de décadas atrás e tendo sido modificado em diversos outros grupos sociais, ainda permanece vivo e explícito nesse de- poimento. O que Neide nos diz ajuda a mapear como se sente reconhecida, considerando o imaginário social: ela dependeria de um homem/marido para fazer anteparo a esse corpo supostamente acessível, que poderia ser mexido ou falado. Não se trata de algo individual, mas de uma permissividade social que autorizaria o livre acesso a esse corpo e nos con- voca a perguntar: quem seriam aqueles que portariam corpos supostamente acessíveis e permitidos, que dispensariam a autorização pelo desejo ou vontade do próprio sujeito?

As mães, mulheres, negras e pobres: a violência da posição servil

Dalva, a mãe de um aluno do segundo ano, foi uma das que nos ajudou a contornar essa resposta, em uma situação de confraternização na escola, com lanche coletivo e jogo de futebol, organizados por algumas famílias, sem a presença de educadores. Em certo momento, um grupo de crianças e seus familiares nos convocaram amedrontados pela atitude de uma mãe que, segundo eles, estaria louca ou bêbada, pois, dirigindo-se a um menino de dez anos, esbravejava.

Você acha que é sangue azul? Saiba que você também saiu da buceta da sua mãe,

como ele saiu. (Dalva)

O fato de que Dalva estivesse muito exaltada, ao invés de fazer supor que algo muito grave poderia ter ocorrido, fazia recair sobre si a suspeita, desqualificando seu dito pela forma com que ela se apresentava. Ao indagarmos à que aquela frase se referia, Dalva nos explica que, acompanhando o jogo de futebol dos alunos, vira o menino que ela posteriormente interpelou, falando ao seu filho: Passa a bola, neguinho!

Acreditamos fundamental reencontrar a potência desse mal-dito de Dalva, na força dessas situações: o vigor ou o excesso que acompanham essas falas e esses atos podem muito mais nos revelar, em alguma medida, a hostilidade presente no laço social, a violência insidiosa à qual o sujeito se sente submetido e sua capacidade de resistir, do que algo que apontaria para uma patologia ou agressividade inerente a esse sujeito. Dalva dirigia-se a esse menino branco, classe média, com pais universitários, para afirmar que seu filho era tão humano quanto ele e, a intensidade e fervor da sua fala davam a medida da violência e da humilhação social que sentira expressa ali. Sua indignação e seu inconformismo nos exigia escutar esse episódio recolocando-o como um conflito de dominação que atravessa gerações. Como nos lembra José Moura Gonçalves Filho, é preciso estar advertido pela relevância e necessidade de ligar acontecimentos que, se ficam desconectados da longa duração, parecem gerar-se no indivíduo (Gonçalves Filho, Sader, & Koltai, 2012).

O que nos foi ficando evidente era que diversas situações na escola ocorriam porque os estudantes ou suas famílias denunciavam que estavam sendo colocados numa relação de dominação, ocupando um lugar de submissão. Dalva nos convocava a ver que seu filho e ela mesma portavam uma segunda pele que constrói realidades e que estabelece uma série de relações (Schwarcz, 201423. Schwarcz, L.M. (2014). Nem preto, nem branco, muito pelo contrário: cor e raça na socie- dade brasileira. São Paulo: Claro Enigma.). Ser negro, no Brasil, não significa necessariamente descender de ancestrais que teriam sido escravizados, mas ter marcas que lembram o passado escravista, ou seja, ter alguns traços faciais, como cor de pele ou tipo de cabelo, que remetem a um processo de escravização e de submissão (Segato, 200524. Segato, R.L. (2005). Raça é signo. Brasília: Departamento de Antropologia, Universidade de Brasília.).

O significante puta que havíamos escutado insistentemente dos adolescentes deixava essa relação de dominação evidente. A mãe deles, continuamente lembrada como aquela que serviria ao prazer de outro e seria seu objeto, apontava relações de contiguidade simbólica com aquelas que foram literalmente propriedade de um outro, mulheres escravizadas. Suas mães não estavam sendo assim nomeadas por serem reconhecidas somente como mulheres, mães e pobres; tratava-se de perceber que, além disso, tinham outro traço identificatório em comum que era extremamente relevante: mulheres, mães, pobres e negras. Esse é um traço identificatório da maior relevância no imaginário social brasileiro, com uma influência concreta e absolutamente fundamental no modo de inscrição na rede discursiva, no pertencimento, no modo de se reconhecer e ser reconhecido tanto dos sujeitos brancos, como dos sujeitos negros (Segato, 200524. Segato, R.L. (2005). Raça é signo. Brasília: Departamento de Antropologia, Universidade de Brasília.; Schwarcz, 201423. Schwarcz, L.M. (2014). Nem preto, nem branco, muito pelo contrário: cor e raça na socie- dade brasileira. São Paulo: Claro Enigma.). São representações sociais e políticas, que consideramos traços identificatórios e não categorias ou identidades fixas e homogêneas, pois o processo de identificação está sempre articulado à desidentificação, de modo que nenhum sujeito é igual a outro e, o que parece muito mais estranho, nem a si mesmo.

Esse é um ponto fundamental: se o sujeito é sempre multifacetado e contraditório, discordante de si mesmo, o empuxo que tão frequentemente buscaria engessar algumas mães dessa comunidade escolar como putas e alguns adolescentes como filhos da puta evidencia uma das modalidades da violência e da dominação. Os dominados são nivela- dos de modo que sua pluralidade desaparece, restando somente o traço de inferiorização (Gonçalves Filho, Sader, & Koltai, 201227. Vicentin, M. C.(2016). Criançar o descriançável. In São Paulo, SP, Secretaria Municipal de Educação, Coordenadoria Pedagógica. Núcleo de Apoio e Acompanhamento da Aprendizagem Caderno de debates do NAAPA: questões do cotidiano escolar. São Paulo: SME/COPED.). E isso, por duas vertentes: tanto a da multiplici- dade de identificações de cada sujeito que o colocam como se ele fosse sempre idêntico a si mesmo, uno e indivisível, quanto à da diversidade dos sujeitos que, contingencialmente compartilhariam de um lugar comum na rede discursiva, que são tomados única e univer- salmente pelo traço da submissão e servidão.

Foi o que Silvana, outra entrevistada nossa, pôde nos transmitir explicitamente. Re- latou-nos uma cena em que estava num espaço público com seu filho mais velho, cuja pele é mais clara que a sua. Ao ser vista por uma desconhecida, é imediatamente enxergada como a babá, e não a mãe desse menino. Percebendo esse equívoco, Silvana esclarece que se trata de seu filho e, então, a desconhecida lhe indaga se ele seria fruto de uma vio- lência de seu patrão.

Não podemos deixar de sentir, como diria Walter Benjamin (1940/20143. Benjamin, W. (2014). Sobre o conceito de história: magia e técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da cultura (S.P.Rouanet, Trad.). In W. Benjamin, Obras Escolhidas I (pp.241-271). São Paulo: Brasiliense. (Obra original publicada em 1940).), o sopro do ar que envolveu seus antepassados e os ecos de vozes de tantas mulheres que, antes dela, emudeceram. É a posição de servidão que o olhar do semelhante com frequência devolve a ela, uma mulher negra e pobre, o que exige que nos lembremos do Brasil colonial com uma partilha entre a mulher, esposa do senhor de escravos, estereótipo da santa-mãezinha e as mulheres que não atendiam a esses requisitos e carregavam o estigma da mulher “sem qualidades” ― lembrando que o lugar de uma não pode ser pensado sem o da outra. A fala da interlocutora de Silvana encontra-se replicada nos depoimentos de várias outras mulhe- res negras de nosso país, denunciando uma colagem entre aquela que presta um serviço doméstico e a que seria vista como tendo um corpo supostamente à disposição. Ainda que tenha havido inúmeras mudanças históricas, haveria relações de contiguidade sociais e simbólicas das “criadas de servir” até o trabalho doméstico regulamentado (Souza, 201226. Souza, F.F.de (2012). Escravas do lar: as mulheres negras e o trabalho doméstico na corte imperial. In G. Xavier, J.B. Farias, & F. Gomes (Orgs.), Mulheres negras no Brasil escravista e do pós-emancipação (pp.244-259). São Paulo: Selo Negro/Summus.), fazendo com que Silvana seja vista em uma posição discursiva que tem traços equivalentes à ama de leite, mãe preta ou a da mucama.

Tais relações de contiguidade apontam para um impedimento à memória e à produ- ção de um esquecimento em relação a esse passado escravista que insiste em se atuali- zar. A tentativa de calar e silenciar provoca um retorno, uma repetição e a permanência da violência não admitida ou lembrada. O mito da democracia racial, com a suposta harmonia na mistura das raças, cumpre exatamente a função de silenciar, impondo-se como uma ficção que omite o quanto essa mistura foi fruto da opressão e violência sobre as mulheres negras. É nesse sentido que nos lembrarmos dos “esquecidos” da história oficial é uma exigência tão histórica quanto ética (Gagnebin, 201511. Gagnebin, J. M. (2015). Entrevista. Ipseitas: Revista da Pós-Graduação da UFSCar,1(1) 8-20.).

Estamos afirmando que, ainda que as possibilidades de reconhecimento e inscrição de uma mulher na rede discursiva seriam infindáveis, a mulher negra e pobre é, inúmeras vezes, enxergada unicamente na posição servil. Um dos efeitos do discurso social, visando à manutenção e concentração do poder, é o empobrecimento e desertificação no campo discursivo e pulsional, promovendo uma aridez de significantes dignos possíveis com que o sujeito possa se identificar, nomear e ter nomeada suas experiências. Para além de um desamparo social, trata-se de um desamparo discursivo (Rosa, 201620. Rosa, M. D. (2016). A clínica em face da dimensão sociopolítica do sofrimento. São Paulo: Pulsional.; Pujó, 200018. Pujó, M.E. (2000). Trauma y desamparo. El Psicoanálisis y el Hospital, (17) 20-29. Recupe-rado de http://www.vivilibros.com/excesos/06-a-06.htm.).

Com isso estamos reafirmando que há uma distribuição desigual e desleal de como são vistas as escolhas e decisões de questões fundamentais da vida. A alguns e somente a estes, haveria o direito a terem as situações de nascimento e de luto, de vida e de mor- te, entendidas como incluídas no campo subjetivo e do desejo. Aos outros, suas escolhas pareceriam apartadas das experiências humanas, como se estivessem articuladas a um campo de pura necessidade, retiradas e afastadas do campo pulsional.

Silvana denuncia com precisão quanto percebe esse esvaziamento da dimensão pulsional no olhar que o outro lhe dirige, ao ser interpelada sobre a sua experiência da maternidade e do nascimento de cada um dos seus filhos. Os questionamentos que escuta nessas situações lhe evidenciam que o outro não supõe ali um ato amoroso ou desejante, mas um ato de dominação. A cena com seu filho mais velho não foi uma situação isolada, pois sente que se repete cada vez que alguém toma conhecimento de que ela tem vários filhos.

Quando as pessoas perguntam quantos filhos eu tenho, dizem “Nossa! Nove filhos!”

Eu já vou logo cortando: “mas sabe porquê?”. (Silvana)

Silvana pronuncia a pergunta que imagina que o outro não lhe faria, pois é somente com essa pergunta que ela poderia inscrever o nascimento dos seus filhos como inserido numa trama pulsional. Ela nos diz que essa trama tem fios e marcas muito antigas, que remontam a sua infância.

Via meus tios, primas, entrando e saindo, e pensava: “Quero uma casa com muita gente”. Desde os nove anos sempre quis família grande. (Silvana)

Mal não faz. Se fizesse, as outras mulheres da família não tinham tido tantos ENT#091;filhosENT#093;. Todas as tias do lado do meu pai têm vários. Só uma teve seis e uma, quatro, o resto nove, oito, sete. (Silvana)

A reprovação que parece escutar do outro, ainda que não seja explicitamente pro- nunciada, parece ser a justificativa para começar dizendo que mal não faz. Ela vai salien- tando a desproporção entre os termos com os quais se percebe nomeada e o que lhe foi transmitido no seu grupo familiar. O que ela demarca é a importância de recuperar a legi- timidade e o valor de determinadas dinâmicas familiares no seu grupo de pertença, entre os pares, na vizinhança, na comunidade, na família, fazendo uma separação entre o que seria o discurso do Outro e a desqualificação do discurso social hegemônico. Ela parece poder discernir que o discurso social e político não reveste o campo da linguagem ainda que, visando manter seu poder, se mascare de discurso do Outro para enredar e aprisionar o sujeito em suas malhas (Rosa, 201620. Rosa, M. D. (2016). A clínica em face da dimensão sociopolítica do sofrimento. São Paulo: Pulsional.).O que fica ainda mais acentuado quando nos conta que frequentemente escuta a pergunta sobre se todos os seus filhos teriam um mesmo pai e que a forma como essa questão lhe é dirigida lhe faz pensar que ali há algo subentendido, que procura lhe desvalorizar.

“Se teve nove filhos... será que foi mulher de programa, será que deu para qualquer

um?”. (Silvana, 2014)

Silvana nos faz atentar para um encontro secreto marcado entre gerações (Benjamin, 1940/2014), encontro em que se transmitiria, de uma geração à seguinte, essa suposta permissividade sobre o corpo dessas mulheres, negras e pobres e o nascimento dos filhos como um processo referido meramente à reprodução. Vale lembrar que, mesmo entre os historiadores brasileiros, foi somente a partir de 1970, com a influência de uma virada nos paradigmas da história social norte-americana e europeia, que começaram a rever e propor novas formulações sobre a família escrava no Brasil. Até então, as representações do que seria a vida nas senzalas resumia-se basicamente a cenas de promiscuidade sexual, reforçando uma visão estereotipada de ausência de laços de solidariedade e responsabilidade, em que aparecia de forma recorrente a visão de uniões instáveis e de pais ausentes (Slenes, 201325. Slenes, R. W. (2013) Na senzala uma flor: esperanças e recordações na formação da famí- lia escrava(2ª ed.). Campinas: Unicamp.).

Uma das formas de dominação é obturar a possibilidade de equivocação própria do significante, aderido ao sujeito como algo que o identificaria e diria completamente quem ele é. Os filhos de Silvana perante o discurso social facilmente são falados como fruto de uma relação de dominação e não de desejo de um casal, passando a ser reconhecidos não como filhos de uma mulher desejante, cujo desejo não se encerraria neles e estaria para além deles, mas de um relacionamento inerente a uma relação de servidão. Para além da mãe, a mulher, a dimensão feminina e desejante, indica a separação necessária para dar ao filho um lugar para além de seu desejo, na polis. Indica também, ao filho, uma direção e esperança em conquistar um lugar na polis, marcado por uma posição desejante a ser conquistada. A contínua tentativa de degradação do lugar da mãe, do pai e do filho, na no- meação filho da mãe / filho da puta, implica uma dificuldade no que se refere à filiação, não especificamente na trama familiar, mas na rede social.

Considerações finais

Retomando nosso Grupo de Conversa, os adolescentes vistos como indisciplinados ou com dificuldade de aprendizagem eram aqueles que insistiam em nos denunciar esse lugar de resto em que se sentiam colocados no discurso social. O sujeito submetido ao desamparo discursivo pode apresentar modalidades de fala bastante diversas daquele que tem garantido um campo mínimo de significantes para articular sua ficção fantasmática. “Sem endereçamento possível ao Outro, o sujeito silencia, sendo lançado ao não senso e à dificuldade de reconhecer, ele mesmo, seu sofrimento, sua verdade, seu lugar no laço social e no discurso.” (Rosa, 201620. Rosa, M. D. (2016). A clínica em face da dimensão sociopolítica do sofrimento. São Paulo: Pulsional., p. 47).

A desigualdade racial e social implica diferenças de oportunidades que não se res- tringem somente ao acesso aos bens; é preciso atentar para efeitos subjetivos das diferen- ças relativas ao que se supõe próprio ao campo pulsional. Quando, seja no espaço escolar ou de tratamento, se supõe a alguns, mas não a todos, a intenção de comunicar algo que os atravessa, para além dos seus discursos racionais ou conscientes, produz-se o reco- nhecimento desses sujeitos como tendo direito a uma existência humana digna e singular, inseridos num campo político e libidinal. Quando, pelo contrário, o que se oferece é a de- gradação da fala e do ato dos sujeitos, como se ali não houvesse nenhuma comunicação atravessada pelas coordenadas do prazer e do gozo, o campo do desejo fica transformado em instinto ou necessidade. Tomar o sujeito numa relação objetivante é uma das modali- dades de violência, a que tenta retirar a humanidade do sujeito: ao inferiorizá-lo afirmando que estaria no campo animalesco, desconsideram-se seus atos como próprios do campo pulsional, deslegitimando sua fala, seu afeto, seu grito e sua luta.

E é nessa medida que, para fazer frente a esse desamparo, seria necessário re- colocar essas situações no campo humano de experiências compartilhadas, restituindo e compondo um campo discursivo em que as experiências do sujeito possam receber outras nomeações. Trata-se de ampará-lo discursivamente, questionando os significantes des que lhe são ofertados cotidianamente pelo discurso social, da desordem à desqualificação, para que possam se evidenciar outras formas de reconhecimento que não as predominantes no discurso hegemônico e para que o sujeito possa, aí sim, se perguntar sobre o vazio que o acomete e nos é comum (Alemán, 20131. Alemán, J. (2013). Conjeturas sobre una izquierda lacaniana. Buenos Aires: Grama.). É fundamental, nesse sentido, discernir o que é o lugar de resto no discurso social e o que é uma subjetivação da falta, pois esta última é o que promove o desejo, enquanto o primeiro é o que violenta e silencia o sujeito.

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    Para a nossa pesquisa de doutorado realizamos uma série de entrevistas com mães de estudantes dessa escola em suas respectivas casas (Musatti-Braga, 2015).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Mar 2020
  • Data do Fascículo
    2018

Histórico

  • Recebido
    07 Jun 2017
  • Aceito
    17 Nov 2017
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