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Indisciplina escolar: a queixa da atualidade

RESENHAS

Indisciplina escolar: a queixa da atualidade1 1 Boarini, M. L. (1998). Indisciplina escolar: a queixa da atualidade. Série Apontamentos, Maringá: Eduem, 69, 1 - 18.

Juliano Correa da Silva

Acadêmico quintanista do curso de Graduação em Psicologia, na Universidade Estadual de Maringá

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Rua Líbero Badaró, 139 ap. 901, zona 7 Maringá-PR CEP - 87030-080 Fone: (44) 226-0765 E-mail: joox@bol.com.br

Boarini (1998) inicia sua análise indicando, com excertos de pesquisas realizadas no país e mesmo fora, que a principal queixa de educadores nos dias de hoje é a indisciplina de seus alunos. São inúmeros os indícios de que o discurso sobre a indisciplina alcança dimensões mundiais. É uma postura interessante, uma vez que permite ao leitor visualizar o fenômeno em questão, além de ser uma boa justificativa para o estudo a que se propõe.

Sobre a indisciplina, a autora aponta que este é um fenômeno que não pode ser explicado por diferenças de classes sociais, uma vez que mesmo nas escolas que atendem aos alunos provenientes das chamadas classes A e B as queixas de indisciplina envolvendo tais alunos são freqüentes. Além disso, em países industrializados há uma enorme mobilização dos órgãos do governo, no sentido de tentar solucionar o problema. São citadas obras de vários autores, que apontam para a gravidade do problema em questão.

Depois desta breve exposição das dimensões que o problema da indisciplina atinge na sociedade contemporânea, Boarini (1998) faz outro levantamento bibliográfico, com o objetivo de trazer à luz os discursos da população diretamente envolvida com o problema em questão: professores, alunos e familiares. Aponta que, de acordo com pesquisas, as pessoas tendem a pensar que a escola necessita ou de regras rígidas ou de melhorias nos métodos pedagógicos, a fim de que o aluno se interesse pelo que está aprendendo. É uma estratégia interessante da autora, para mostrar o quanto a sociedade se perde em explicações falsas ou, no mínimo, parciais. Talvez por isso fique fácil, para o leitor desatento, confundir-se com os dados apresentados na obra.

A seguir a autora aponta a linha de pensamento que orienta sua análise. Ressalta que, apesar de parecem explicações lógicas, nem a família nem a escola devem ser tidas como culpadas pelo fracasso escolar generalizado, demonstrado pelo problema de indisciplina apresentado pelos alunos de escolas tanto públicas quanto privadas. Assim, ela tenta desmistificar a questão da indisciplina, trazendo uma visão mais integrada, menos linear do problema.

Mas, afinal, o que precisamos saber para termos uma idéia não fragmentada do problema da indisciplina? Segundo Boarini (1998), precisamos compreender o movimento histórico-social em que estamos (alunos, professores, pais de alunos, psicólogos etc.), para que possamos visualizar melhor o problema. Assim, percebemos na escola as mesmas características apontadas por uma determinada pesquisa de mercado na obra em questão: o ser humano caminha para um extremo individualismo, no qual não cabe a noção de coletividade e respeito ao outro; assim, a pesquisa mencionada aponta que "... a defesa de interesses coletivos e questões ideológicas não estão entre as prioridades desta geração".

Este extremo individualismo tem seu preço. Boarini (1998) traz trechos de pesquisas que indicam que a solidão é um dos frutos mais amargos deste movimento social de se viver "cada um por si, Deus por todos".

O que a autora quer dizer com toda esta análise? Novamente, para quem lê com pouca atenção pode ficar confuso compreender o objetivo do texto resenhado. Entretanto, a seguir esclarece o ponto onde quer chegar: tanto a escola, como uma instituição para o público (sendo ela privada ou não), quanto o professor, enquanto um profissional que trabalha em benefício do desenvolvimento do coletivo, passam por uma grande desvalorização, numa sociedade onde o individual prevalece em detrimento da coletividade. Assim, quando se diz que um aluno está desmotivado, a autora entende que suas necessidades individuais não foram atendidas como gostaria, e a desobediência às regras (indisciplina) é justificada pela falta de atenção do aluno ou como uma dificuldade somente dele. Por outro lado, a ausência de limites surge como reflexo da idéia vigente de que não se pode cercear o aluno em sua criatividade, nem podá-lo em sua individualidade. No meio de tudo isso, surge como papel do professor o de motivar o aluno a continuar prestando atenção, criando um ambiente "estimulante" em sala de aula.

Aqui, Boarini (1998) inicia uma discussão do conceito de disciplina, para que se possa compreender a linha de pensamento que ela tenta expor em seu artigo. Para ela, a disciplina é algo que não pode ser universalizado, uma vez que em cada situação existe uma noção diferente do que é trabalhar disciplinadamente. Assim, a disciplina é a ordem necessária para a realização de algum trabalho, não necessariamente identificável com "estar quieto" ou "ficar no lugar".

Assim, a autora aponta o que entende por disciplina: organização para o trabalho, com a responsabilidade de elaborar as próprias regras a serem seguidas. Claro, esta conceituação não é óbvia, nem absoluta, mas é o que se pode apreender após uma leitura atenta do texto.

Por fim, Boarini (1998) aponta para as mudanças necessárias para o desenvolvimento da escola. E define seu objetivo ao entrar nesta discussão: chamar "... a atenção para a necessidade de a escola acompanhar o seu tempo histórico" (Boarini, 1998, p. 14). Para ela, a educação tem por objetivo introduzir o aluno na prática de pensar sobre o ensinamento que lhe é passado em sala de aula e como ele é passado, além de dotá-lo de uma visão crítica dos conteúdos que aprende. Para isso, a rigidez metodológica cai por terra, uma vez que o aluno adquire o hábito de sempre refletir sobre o que é instituído, sem seguir cegamente o que lhe ensinam, mas sem ferir os objetivos comuns da educação. Neste sentido, a disciplina se torna relativa e o aluno tem a responsabilidade de eleger para si as regras que precisa seguir e de questionar porque se deve ser "disciplinado". Resumindo, quando uma regra não faz sentido corre-se o risco de o sujeito não a seguir, o que acarreta para o indivíduo o rótulo de "indisciplinado".

Recebido em 17/05/2001

Revisado em 24/05/2001

Aceito em 30/05/2001

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    Boarini, M. L. (1998). Indisciplina escolar: a queixa da atualidade. Série Apontamentos, Maringá: Eduem, 69, 1 - 18.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      07 Fev 2011
    • Data do Fascículo
      Jun 2001
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