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Levantamento fitossociológico de plantas daninhas em áreas de produção de cana-de-açúcar

Phyto-sociological survey of weed in sugarcane crop areas

Resumos

O estudo trata da análise fitossociológica de plantas daninhas em áreas cultivadas com cana-de-açúcar em três usinas de açúcar e álcool no município de Campos dos Goytacazes, na região Norte Fluminense do Estado do Rio de Janeiro, considerando-se três relevos: baixada (relevo plano com altitude de no máximo 30 m), tabuleiro (relevo plano com altitude variando de 30 a 50 m) e morro (relevo ondulado, com altitude superior a 50 m), dois tipos de cultivo (cana-planta e cana-soca) e dois períodos (primavera-verão e outono-inverno). O levantamento em cana-planta foi realizado até 30 dias após o plantio e, em cana-soca, no período de 30 a 45 dias após a colheita. Avaliaram-se as freqüências, densidades e dominâncias, absolutas e relativas, e o índice de valor de importância (IVI), o qual expressa, numericamente, a importância de uma determinada espécie em uma comunidade, sendo determinado por meio da soma de seus valores de densidade, freqüência e dominância, expressos em porcentagem. Foram identificadas 95 espécies de plantas daninhas, distribuídas em 74 gêneros e em 30 famílias. A família mais representativa foi a Poaceae, seguida por Asteraceae, Euphorbiaceae, Malvaceae, Papilionoideae e Amaranthaceae. A espécie Cyperus rotundus apresentou o maior índice de valor de importância, seguida por Rottboellia exaltata. No período primavera-verão, em cana-soca, relevo de baixada e tabuleiro, C. rotundus foi a espécie com maior IVI. Por outro lado, em cana-planta e durante o período outono-inverno, a espécie R. exaltata apresentou-se com maior IVI. Considerando o relevo de morro, observou-se que Penisetum purpureum teve maior IVI. A baixa similaridade (grau de semelhança na composição de espécies) entre as áreas e épocas foi relacionada a solos diferentes, distância entre áreas, altitude e, principalmente, às formas de manejo empregadas.

manejo; relevo; fitossociologia; índice de similaridade; Saccharum sp


This study focused on the phyto-sociological analysis of weed in sugar cane cultivated areas located in three sugar and alcohol plants in Campos dos Goytacazes in the northern State of Rio de Janeiro Brazil. Three types of relief were taken intoconsideration: lowland (plain relief with maximum altitude of 30 m), tablelands (plain relief with altitude ranging from 30 to 50 m), and slope (wavy relief, over 50 m). Two types of cultivation (cane-plant and cane rattoon) were investigated over two periods (spring-summer and autumn-winter). The weed cane-plant and cane rattoon surveys were carried out, respectively, 30 days after plantation and 30 to 45 days after harvest. Frequencies, densities and dominances (absolute and relative) were evaluated. The index of value of importance (IVI), which expresses numerically the importance of a particular species in a community, was determined through the addition of its density, frequency and dominance values expressed in percentages. A total of 95 weed species distributed in 74 genera and 30 families were identified. The most representative family was Poaceae, followed by Asteraceae, Euphorbiaceae, Malvaceae, Papilionoideae, and Amaranthaceae. Cyperus rotundus presented the highest IVI, followed by Rottboellia exaltata. In sugarcane rattoon, during spring-summer, for lowland and tablelands, C. rotundus presented the highest IVI. On the other hand, for cane-plant, during autumn-winter,R. exaltata presented the highest IVI. Considering the slope relief, Penisetum purpureum had the highest IVI. Low similarity (degree of similarity in species composition) between the areas and periods was related to different soils, distance among areas, altitude, and mainly to the different forms of management employed.

management; relief; phyto-sociology; similarity index; Saccharum sp


ARTIGOS

Levantamento fitossociológico de plantas daninhas em áreas de produção de cana-de-açúcar

Phyto-sociological survey of weed in sugarcane crop areas

Oliveira, A.R.I; Freitas, S.P.II

IIEngºAgrº, Dr., Produção Vegetal, Pesquisador da Embrapa Semi-Árido <anderson.oliveira@cpatsa.embrapa.br>, BR 428, km 152, Zona Rural, caixa postal 23, 56.302-970, Petrolina - PE

IIEngºAgrº, Dr., Fitotecnia, Prof. Laboratório de Fitotecnia/CCTA da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro UENF <silverio@uenf.br>

RESUMO

O estudo trata da análise fitossociológica de plantas daninhas em áreas cultivadas com cana-de-açúcar em três usinas de açúcar e álcool no município de Campos dos Goytacazes, na região Norte Fluminense do Estado do Rio de Janeiro, considerando-se três relevos: baixada (relevo plano com altitude de no máximo 30 m), tabuleiro (relevo plano com altitude variando de 30 a 50 m) e morro (relevo ondulado, com altitude superior a 50 m), dois tipos de cultivo (cana-planta e cana-soca) e dois períodos (primavera-verão e outono-inverno). O levantamento em cana-planta foi realizado até 30 dias após o plantio e, em cana-soca, no período de 30 a 45 dias após a colheita. Avaliaram-se as freqüências, densidades e dominâncias, absolutas e relativas, e o índice de valor de importância (IVI), o qual expressa, numericamente, a importância de uma determinada espécie em uma comunidade, sendo determinado por meio da soma de seus valores de densidade, freqüência e dominância, expressos em porcentagem. Foram identificadas 95 espécies de plantas daninhas, distribuídas em 74 gêneros e em 30 famílias. A família mais representativa foi a Poaceae, seguida por Asteraceae, Euphorbiaceae, Malvaceae, Papilionoideae e Amaranthaceae. A espécie Cyperus rotundus apresentou o maior índice de valor de importância, seguida por Rottboellia exaltata. No período primavera-verão, em cana-soca, relevo de baixada e tabuleiro, C. rotundus foi a espécie com maior IVI. Por outro lado, em cana-planta e durante o período outono-inverno, a espécie R. exaltata apresentou-se com maior IVI. Considerando o relevo de morro, observou-se que Penisetum purpureum teve maior IVI. A baixa similaridade (grau de semelhança na composição de espécies) entre as áreas e épocas foi relacionada a solos diferentes, distância entre áreas, altitude e, principalmente, às formas de manejo empregadas.

Palavras-chave: manejo, relevo, fitossociologia, índice de similaridade, Saccharum sp.

ABSTRACT

This study focused on the phyto-sociological analysis of weed in sugar cane cultivated areas located in three sugar and alcohol plants in Campos dos Goytacazes in the northern State of Rio de Janeiro Brazil. Three types of relief were taken intoconsideration: lowland (plain relief with maximum altitude of 30 m), tablelands (plain relief with altitude ranging from 30 to 50 m), and slope (wavy relief, over 50 m). Two types of cultivation (cane-plant and cane rattoon) were investigated over two periods (spring-summer and autumn-winter). The weed cane-plant and cane rattoon surveys were carried out, respectively, 30 days after plantation and 30 to 45 days after harvest. Frequencies, densities and dominances (absolute and relative) were evaluated. The index of value of importance (IVI), which expresses numerically the importance of a particular species in a community, was determined through the addition of its density, frequency and dominance values expressed in percentages. A total of 95 weed species distributed in 74 genera and 30 families were identified. The most representative family was Poaceae, followed by Asteraceae, Euphorbiaceae, Malvaceae, Papilionoideae, and Amaranthaceae. Cyperus rotundus presented the highest IVI, followed by Rottboellia exaltata. In sugarcane rattoon, during spring-summer, for lowland and tablelands, C. rotundus presented the highest IVI. On the other hand, for cane-plant, during autumn-winter,R. exaltata presented the highest IVI. Considering the slope relief, Penisetum purpureum had the highest IVI. Low similarity (degree of similarity in species composition) between the areas and periods was related to different soils, distance among areas, altitude, and mainly to the different forms of management employed.

Keywords: management, relief, phyto-sociology, similarity index, Saccharum sp.

INTRODUÇÃO

A fitossociologia é o estudo das comunidades vegetais do ponto de vista florístico e estrutural (Braun-Blanquet, 1979). A cobertura vegetal de determinada área resulta de causas atuais, como clima, solo e ação da fauna. Os indivíduos da mesma espécie (que podem reagir diferentemente a essas causas) compõem uma população, e grupos de populações que ocorrem juntas caracterizam uma comunidade. As comunidades podem diferenciar-se, dependendo das interações das espécies com o meio abiótico (Martins & Santos, 1999). As populações variam em termos de fluxos de emergência, índice de mortalidade, taxas de crescimento absoluto e duração do ciclo de desenvolvimento.

Os estudos fitossociológicos comparam as populações de plantas daninhas num determinado momento. Repetições programadas dos estudos fitossociológicos podem indicar tendências de variação da importância de uma ou mais populações, e essas variações podem estar associadas às práticas agrícolas adotadas. A análise estrutural ou levantamento fitossociológico de uma determinada lavoura é muito importante para que se possa ter parâmetros confiáveis acerca da florística das plantas daninhas de um determinado nicho.

A composição florística das espécies e a estrutura da vegetação são características qualitativas e quantitativas da comunidade vegetal. No caso das características quantitativas, usualmente busca-se descrever a estrutura através de descritores como o número de indivíduos e a densidade por unidade de área amostrada por espécie encontrada. Quanto às características qualitativas, os resultados dos levantamentos podem ser apresentados por meio da relação das espécies ocorrentes na área estudada (Causton, 1988).

A primeira etapa de um manejo adequado de plantas daninhas em uma lavoura envolve a identificação das espécies presentes na área e também daquelas que têm maior importância, levando-se em consideração os parâmetros de freqüência, densidade e dominância. Após essa fase, pode-se decidir qual o melhor manejo a ser adotado, seja ele cultural, mecânico, físico, biológico, químico ou integrado.

Durante o manejo de plantas daninhas em uma lavoura o levantamento fitossociológico é fundamental, pois a partir dele é que se pode definir o que será feito, como e quando no que se refere ao manejo das plantas daninhas, pois as condições de infestação são muitíssimo variadas e as possibilidades de manejo, diversas.

As áreas de produção de cana-de-açúcar no Norte Fluminense estabelecem-se em relevos de baixada, tabuleiro e morro, e nessas áreas ocorrem dois tipos de cultivo da cana-de-açúcar: cana-planta (novo plantio) e cana-soca (brotação da soqueira). Essas condições, aliadas à época de plantio, podem modificar a composição fitossociológica de plantas daninhas nas áreas de produção.

Objetivou-se com este trabalho identificar e quantificar a composição florística de plantas daninhas em áreas de produção de cana-de-açúcar no município de Campos dos Goytacazes, em resposta ao relevo da área, ao tipo de cultivo e ao período do ano.

MATERIAL E MÉTODOS

O levantamento fitossociológico foi desenvolvido em áreas de produção de cana-de-açúcar de três usinas de açúcar e álcool Santa Cruz, Sapucaia e Barcelos do município de Campos dos Goytacazes, na região Norte Fluminense do Estado do Rio de Janeiro, em três relevos: baixada (relevo plano com altitude de no máximo 30 m), tabuleiro (relevo plano com altitude variando de 30 a 50 m) e morro (relevo ondulado, com altitude superior a 50 m). Foram selecionadas duas áreas de produção, uma delas com cana-planta (área recém plantada) e outra com cana-soca (área com brotação de soqueira), e duas épocas do ano: novembromarço (primavera-verão) e maiosetembro (outono-inverno). O levantamento em cana-planta foi realizado até 30 dias após o plantio, e em cana-soca, no período de 30 a 45 dias depois da colheita.

Segundo o sistema Köppen, o clima da região é classificado como Aw, isto é, clima quente e úmido, com temperatura do mês mais frio superior a 18 ºC e temperatura média anual em torno de 24 ºC, sendo a amplitude térmica anual muito pequena, com temperatura média do mês mais frio em torno de 21 ºC e a do mais quente em torno de 27 ºC. A precipitação anual média está em torno de 1.023 mm, concentrando-se nos meses de outubro a janeiro.

O manejo de plantas daninhas nas áreas é feito, normalmente, utilizando-se herbicidas pré-emergentes e pós-emergentes seletivos à cana-de-açúcar. Em cana-planta, o preparo do solo com aração e sulcamento para o plantio já se constitui numa forma de controle de plantas daninhas, e até 30 dias após o plantio é feita a aplicação de herbicidas. Em cana-soca, a deposição da palhada (folhas e ponteiros) que sobra da colheita constitui-se em uma forma de controle das plantas daninhas; após um período de 45 dias, aproximadamente, é feita a aplicação dos herbicidas.

Os solos da região de baixada são do tipo Cambissolo, Aluvial, Glei-húmico e Glei-sub-húmico; nas regiões de tabuleiro e morro predominam os Latossolos e Argissolos (Orlando Filho & Zambelo Júnior, 1983; e Ravelli Neto, 1989).

Para o levantamento, utilizou-se uma armação metálica com área de 1 m2, que foi lançada 30 vezes em cada área estudada (5 ha). Esse procedimento foi feito a esmo, isto é, procurou-se ser aleatório, sem o uso, no entanto, de mecanismos de sorteio. As espécies presentes em cada área amostrada foram cortadas rente ao solo, acondicionadas em sacos plásticos e levadas para o laboratório, onde foram identificadas por meio de literatura especializada, comparações com material de herbário e, quando necessário, remetidas a especialistas. Após identificação, as plantas foram quantificadas, obtendo-se a massa total e a massa por espécie, e colocadas em estufa regulada à temperatura de 70 ºC por 72 horas, para obtenção da biomassa seca.

Avaliaram-se as freqüências, densidades e dominâncias, absolutas e relativas, das plantas daninhas e o índice de valor de importância (IVI), o qual expressa numericamente a importância de uma determinada espécie em uma comunidade, sendo determinado através da soma de seus valores de densidade, freqüência e dominância, expressos em porcentagem (Curtis & McInstosh, 1950; Müeller-Dombois & Ellenberg, 1974). Na avaliação da similaridade (estimativa do grau de semelhança na composição de espécies) entre as populações botânicas foi utilizado o Índice de Similaridade (IS) de Sorensen, IS = (2a/ b + c) x 100, em que a = número de espécies comuns às duas áreas; e b e c = número total de espécies nas duas áreas comparadas. O IS varia de 0 a 100, sendo máximo quando todas as espécies são comuns às duas áreas e mínimo quando não existem espécies em comum.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Foram identificadas 95 espécies de plantas daninhas infestando a cultura da cana-de-açúcar, distribuídas em 74 gêneros e em 30 famílias (Tabela 1). A família mais representativa de todo o levantamento fitossociológico, no que se refere a número de espécies, foi a Poaceae, com um total de 23, seguida por Asteraceae (17), Euphorbiaceae (8), Malvaceae (6), Papilionoideae (6) e Amaranthaceae (5). As famílias e espécies encontradas assemelham-se às identificadas por outros autores (Brandão et al., 1995) no Estado do Rio de Janeiro.

Na cultura da cana-de-açúcar, de modo geral, a espécie Cyperus rotundus (tiririca) apresentou o maior índice de valor de importância (230,08) em relação à comunidade infestante (Figura 1A). Este resultado corrobora com Kuva et al. (2007) que, ao estudarem a fitossociologia de comunidades de plantas daninhas em áreas de cana-crua, observaram que C. rotundus foi a principal espécie, destacando-se quanto aos valores de importância relativa. C. rotundus possui o ciclo C4 de fixação de carbono, o que lhe confere altas taxas fotossintéticas em condições de altas temperatura e luminosidade (Meirong, 1993), tal como ocorre na região Norte Fluminense, onde a temperatura média anual é de 24 ºC. O índice de valor de importância representado pelo somatório da densidade relativa, da freqüência relativa e da dominância relativa indica qual espécie tem maior influência dentro de uma comunidade. Assim, C. rotundus pode ser considerada a espécie daninha com maior potencial para causar prejuízos à cultura da cana-de-açúcar. Salienta-se que os parâmetros utilizados no levantamento fitossociológico levam em consideração o número de manifestações epígeas e o peso da biomassa seca da parte aérea, desconsiderando a parte radicular. Por isso, C. rotundus pode ter valor de importância maior dentro da comunidade infestante, posto que, em condições favoráveis, ela pode produzir até 8.700 tubérculos m-2, que liberam substâncias alelopáticas (ácidos dicarboxílicos, fenólicos e graxos) no solo, na maioria das vezes por exsudação radicular, afetando negativamente o desenvolvimento das plantas circunvizinhas, incluindo a cultura (Durigan, 1991). A espécie C. rotundus inibe a brotação de gemas e o perfilhamento da cana, o que resulta em estandes menores, nas áreas infestadas. Para maior controle desta planta invasora, são necessárias medidas preventivas, como a limpeza de equipamentos e implementos, evitando que propágulos sejam transferidos de uma área infestada para outra não infestada. Além do manejo preventivo, adota-se o controle químico, para reduzir a população desta espécie, o que permite que as plantas de cana-de-açúcar se estabeleçam na área e consigam vencer a competição.




Outra espécie daninha que merece destaque é o capim-camalote (Rottboellia exaltata), com índice de valor de importância de 201, que nos últimos anos tem causado muitos prejuízos à lavoura canavieira (Figura 1). R. exaltata está se tornando a espécie mais prejudicial à atividade canavieira, pois é muito vigorosa e prolífica, disseminando-se com facilidade; muito provavelmente, apresentará maior importância que C. rotundus. De acordo com Sharma & Zelaya (1986), uma única planta é capaz de emitir até 100 perfilhos e produzir 15.000 sementes, que ficam dormentes no solo por até quatro anos. O prejuízo causado por R. exaltata pode atingir 100% em cana-planta e 80% em cana-soca (Arévalo & Bertoncini, 1994).

As espécies C. rotundus e R.exaltata são seguidas, de acordo com o índice de valor de importância, por Pennisetum purpureum (125), Ipomoea grandifolia (63), Brachiaria mutica (60), Panicum maximum (47), Cynodon dactylon (39), Paspalum paniculatum (34), Macroptilium atropurpureu (34) e Brachiaria decumbens (29). Todas as espécies extraem grandes quantidades de nutrientes do solo, competindo com a cultura; contudo, C. rotundus e R. exaltata são as que mais oneram a atividade canavieira, uma vez que, devido à sua importância, aumentam os custos de controle. M. atropurpureu e I. grandifolia dificultam os tratos culturais devido ao hábito de crescimento. Nota-se que, dentre as dez espécies de maior importância, oito são monocotiledôneas e duas dicotiledôneas. Esse fato pode ser explicado pelo manejo adotado na cultura, em particular o uso de herbicidas, que, enquanto seletivos à cana-de-açúcar (monocotiledônea), podem ser seletivos às demais monocotiledôneas; além disso, deve-se levar em consideração o período do ano, que favorece o desenvolvimento de algumas espécies monocotiledôneas.

Em cana-soca (Figura 1B), C. rotundus é a espécie com maior IVI, seguida por R. exaltata, enquanto em cana-planta (Figura 1C) ocorre uma inversão e R. exaltata passa a deter o maior IVI, superando C. rotundus, pois em solo coberto com camadas de palha da cultura, como ocorre em cana-soca, a germinação das sementes de R. exaltata é reduzida; já em cana-planta o revolvimento do solo facilita a germinação das sementes.

Considerando apenas o relevo de baixada, destacam-se, em termos de IVI, C. rotundus e R. exaltata (Figura 2A). Em tabuleiro (Figura 2B), R. exaltata (51) apresenta menor valor de importância em relação à corda-de-viola I. grandifolia (63). Entretanto, C. rotundus mantém-se com o maior IVI (211). Nos morros (Figura 2C), a espécie P. purpureum tem o maior IVI, seguida por R. exaltata e C. rotundus.




Durante os meses de outono-inverno, R.exaltata apresenta-se com alto IVI (200) (Figura 3). Já no período de primavera-verão, destaca-se C. rotundus , em função, principalmente, de sua alta densidade relativa e dominância relativa (Figura 3B). Entre as espécies de maior IVI, algumas são comuns às duas épocas do ano. No entanto, espécies como B. pilosa, C. dactylon e P. maximum têm maior importância no período de outono-inverno, enquanto P. purpureum, B. mutica e P. paniculatum sobressaem no período de primavera-verão. Todas as espécies mencionadas se desenvolvem bem em condições de temperaturas elevadas e disponibilidade de água; contudo, B. pilosa se desenvolveu melhor no período de outono-inverno, provavelmente devido a menor competição com outras espécies, como B. mutica. A espécie C. dactylon suporta períodos de estiagem como os que ocorrem no período de outono-inverno.



Há maior diversidade de espécies de plantas daninhas em cana-planta, se comparada com cana-soca (Tabela 2); verifica-se ainda que o número de espécies no período de primavera-verão é maior se comparado ao período de outono-inverno, provavelmente devido a mecanismos de sobrevivência das espécies, já que muitas delas possuem sementes ou tubérculos que ficam dormentes durante períodos desfavoráveis à germinação e ao desenvolvimento (Carvalho & Nakagawa, 2000). A área de tabuleiro apresenta maior diversidade de espécies 27 espécies em cana-soca e 48 em cana-planta se comparado às áreas de baixada e morro. Os morros em cana-soca apresentam menor diversidade (21 espécies).

Em cana-soca, no relevo de baixada e período de outono-inverno (CSBOI), C. rotundus apresentou maior densidade relativa (95,28%), seguida por B. sulphurea (2,26%) (Figura 4A). As demais espécies encontradas tiveram densidades relativas inferiores a 0,5%. A baixa densidade populacional de espécies pode ser atribuída à competição interespecífica exercida por uma espécie dominante, inibindo o desenvolvimento de outras (Jakelaitis et al., 2003). Essa tendência pode ser observada ainda em cana-soca, no relevo de tabuleiro, no outono-inverno, e em cana-soca, no relevo de tabuleiro na primavera-verão.




Em cana-soca, relevo de baixada na primavera-verão, R. exaltata é a espécie que exerceu maior influência dentro da comunidade, com densidade relativa de 82,58% freqüência relativa de 38,16% e dominância relativa de 80,36%. Esses resultados permitem inferir que R. exaltata deve ser controladas nesse período, pois, caso contrário, poderá causar perdas de até 80% na lavoura canavieira (Arévalo & Bertoncini, 1994).

Nos sistemas de cana-soca, no relevo de tabuleiro, nos períodos de outono-inverno e primavera-verão (Figura 4C, D), a espécie I. grandifolia (corda-de-viola) mereceu destaque devido à sua elevada freqüência relativa (34,43 e 15,48%) e dominância relativa (25,63 e 10,42%); essa planta daninha, além de competir com a planta cultivada, pode interferir nas práticas culturais e prejudicar o desenvolvimento da cultura, em razão de seu hábito de crescimento volúvel, e causar problemas durante a colheita, provocando embuchamento da máquina.

Em cana-soca, relevo de morro na primavera-verão, a espécie B. pilosa (picão-preto), família Asteraceae, destacou-se devido à sua alta densidade relativa (28,85%). Tem sido observado caso de resistência da planta daninha picão-preto a herbicidas inibidores da enzima acetolactato sintase (ALS), entre eles as sulfoniluréias e imidazolinonas. Muitos destes herbicidas são utilizados na cultura da cana-de-açúcar, entre eles o flazasulfuron, halosulfuron, imazapyr e imazapic; assim, para evitar que Bidens pilosa se torne uma planta resistente na cultura da cana-de-açúcar, é necessária a adoção de práticas preventivas (Gressel & Segel, 1990; e Lopez-Ovejero & Christoffoleti, 2004). Outra espécie que merece destaque é B. decumbens (Figura 4F), cujo período crítico de prevenção da interferência em área infestada por esta espécie em cana-planta está compreendido entre 74 e 138 dias (Kuva et al., 2003).

C. rotundus, R. exaltata e I. grandifolia destacam-se tanto no período de outono-inverno quanto no período de primavera-verão (Figura 5A, B). Além dessas espécies, a presença de B. mutica e D. horizontalis é relevante no ambiente de cana-planta, baixada no período de outono-inverno, devido aos altos valores de dominância relativa. Em CPBPV, as espécies Amaranthus retroflexus e Portulaca oleracea são preocupantes, devido à freqüência relativa, que contribuiu para o aumento do IVI destas espécies. O preparo do solo antes do plantio pode ter estimulado a germinação dessas espécies. Segundo Blanco & Blanco (1991), a movimentação do solo estimula a emergência de Amaranthus sp. e P. oleracea.




Ao observar as Figuras 5C, D, verifica-se que o maior IVI encontrado é da espécie C. rotundus. Nota-se que R. exaltata também tem alto IVI nos períodos de inverno e verão. Outras espécies como P. maximum em cana-planta, relevo de tabuleiro no período de primavera verão, e D. insularis, no período de outono-inverno ganham importância em razão de apresentarem maiores valores de dominância relativa. Em trabalho desenvolvido na Venezuela por Valle et al. (2000), foi observado que as principais espécies que infestam a lavoura da cana-de-açúcar são R. exaltata e P. maximum, as quais devido aos valores de freqüência, comprometem seriamente o cultivo da cultura. A cultura da cana-de-açúcar é muito prejudicada com a presença de P. maximum, cuja parte subterrânea pode resistirà queima dos canaviais, ocorrendo, logo após, rápida rebrota e reinfestação da área.

Em cana-planta, relevo de morro e nos períodos de outono-inverno e primavera-verão, merece destaque a presença de M. atropurpureum (siratro) entre as cinco espécies de maior IVI nos períodos de outono-inverno e primavera-verão, com significativos valores de densidade relativa. Essa espécie é utilizada, comumente, como adubo-verde em diversas culturas; no entanto, a presença de siratro em cana-de-açúcar pode ser problemática. De acordo com Brito (2003), o siratro em aproximadamente 70 dias promove cobertura total do solo. Sabendo que o período total de prevenção da interferência em cana-planta é de, aproximadamente, 90 dias (Rolim & Christoffoleti, 1982), deduz-se que a presença de siratro competirá com a cana-de-açúcar e poderá causar reduções significativas na produtividade.

Importante salientar que, nos seis gráficos analisados na Figura 5, C. rotundus apresentou o maior valor de densidade relativa; isso se deve ao fato de que em cana-planta o preparo do solo para o plantio propicia maior germinação e desenvolvimento desta espécie. A aração e a gradagem favorecem a propagação e o estabelecimento dessa espécie, devido à quebra de dormência causada pela divisão da seqüência de tubérculos e pela eliminação da dominância apical exercida pelo tubérculo distal (Freitas et al., 2001).

O índice de similaridade entre os fatores analisados demonstra semelhanças na flora infestante dos diferentes relevos, tipos de plantio e épocas do ano (Tabela 3). Valores acima de 25% indicam similaridade entre os fatores comparados por este índice (Matteucci & Colma, 1982). Apenas o índice no período de outono-inverno e primavera-verão foi superior a 50%.

A dissimilaridade entre as áreas e épocas pode ser explicada pelas diferenças entre os solos, pelo manejo adotado na condução da lavoura de cana-de-açúcar (adubação, irrigação, controle de pragas e doenças) e pelas medidas de controle das próprias plantas daninhas (mecânico, cultural e químico) principalmente a utilização de herbicidas com diferentes mecanismos de ação, que contribuem para selecionar flora diversificada. O índice de similaridade obtido para cana-soca x cana-planta foi inferior a 50%, o que pode ser explicado pelo não-revolvimento do solo em cana-soca, o que pode dificultar a germinação de sementes fotoblásticas positivas ou negativas ou daquelas que precisam de escarificação mecânica para quebrar o mecanismo de dormência. Por outro lado, a cana-planta passa por todo o processo de preparo do solo, com aração e gradagem, os quais contribuem para aparecimento de plantas daninhas. Diferentes sistemas de manejo do solo condicionam as sementes a microambientes do solo, devido a alterações em suas propriedades físico-químicas e nas condições da superfície do solo (Mulugueta & Stoltenberg, 1997). De acordo com Carvalho & Pitelli (1992), os índices de similaridade não estão relacionados apenas aos solos ou à distância entre áreas, mas podem estar ligados às formas de manejo empregadas nessas áreas. Essas mudanças podem influenciar a germinação e o desenvolvimento de plantas daninhas.

Cyperus rotundus apresentou o maior índice de valor de importância em cana-soca, relevo de baixada e tabuleiro e no período primavera-verão, enquanto em cana-planta e durante o período outono-inverno a espécie R. exaltata apresentou-se com maior IVI. Em morros, Penisetum purpureum tem maior IVI. A dissimilaridade entre as espécies encontradas nos diferentes relevos, tipos de cultivo e épocas do ano está relacionada às condições edafoclimáticas, à distância entre áreas e às formas de manejo empregadas.

LITERATURA CITADA

Recebido para publicação em 12.12.2006 e na forma revisada em 4.1.2008.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Abr 2008
  • Data do Fascículo
    Mar 2008

Histórico

  • Recebido
    12 Dez 2006
  • Revisado
    01 Abr 2008
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