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Resiliência para uma Velhice Bem-Sucedida: Mecanismos Sociais e Recursos Pessoais de Proteção

Resilience for Successful Old Age: Social Mechanisms and Personal Protection Resources

Resiliencia para una Vejez Exitosa: Mecanismos Sociales y Recursos Personales de Protección

Resumo

O contexto de modificações e de adversidades decorrentes do envelhecimento exige flexibilidade na adaptação e no ajustamento às situações, a fim de proporcionar um desenvolvimento equilibrado e saudável na velhice. Objetivou-se analisar a compreensão de idosos acerca dos fatores de proteção que promovem resiliência, em resposta aos desafios advindos do processo de envelhecimento e da velhice. Participaram de grupos focais 15 idosos (com idades de 63 a 81 anos), que resultaram em três categorias de análise qualitativa: a) Mecanismos sociais de proteção; b) Recursos pessoais; e c) Processos adaptativos para uma velhice bem-sucedida. O apoio social, dado, principalmente, por grupos de convivência, e a percepção de interações positivas entre familiares, permeadas por afeto e reciprocidade, foram essenciais para manter o bem-estar dos idosos. Os recursos pessoais que exprimem estados e processos emocionais, cognitivos e comportamentais positivos permearam os discursos sobre o bem-envelhecer. Ademais, a adaptação às mudanças ocorridas com o avançar do envelhecimento, o amadurecimento, a aceitação e a construção de uma identidade positiva sobre a velhice denotaram processos de resiliência, pautados no equilíbrio entre as perdas e os ganhos ao longo do desenvolvimento. Conclui-se que o enfrentamento das adversidades do envelhecimento atrelado à valorização e à intensificação de qualidades humanas propicia modos de envelhecer com resiliência.

Palavras-chave:
Envelhecimento; Idosos; Resiliência; Fatores de proteção

Abstract

The context of changes and adversities due to aging requires flexibility in adapting and adjusting to situations to allow a balanced and healthy development in old age. This study aimed to analyze the older adults’ understanding of the protective factors which promote resilience in response to the challenges of aging and elderhood. A total of 15 older adults (with ages of 63 to 81 years) participated in the focus groups, resulting in three categories of qualitative analysis: a) Social protection mechanisms; b) Personal resources; c) Adaptive processes for a successful old age. Social support, provided mainly by cohabitation groups, and the perception of positive family interactions, permeated by affection and reciprocity, were essential in maintaining the well-being of the older adults. The personal resources that express positive emotional, cognitive, and behavioral states and processes permeated the discourses on the well-aging. In addition, adapting to the changes that occur with the advancement of aging, the maturation, the acceptance, and the construction of a positive identity about old age denoted processes of resilience, based on the balance between losses and gains throughout the development. We conclude that coping with the adversities of aging linked to the enhancement and intensification of human qualities leads to resilient aging.

Keywords:
Aging; Aged; Resilience; Protection factors

Resumen

El contexto de los cambios y las adversidades resultantes del envejecimiento requiere flexibilidad para adaptarse a las situaciones, con el fin de proporcionar un desarrollo equilibrado y saludable en la vejez. Este estudio tiene por objetivo analizar la comprensión de los ancianos sobre los factores de protección que fomentan la resiliencia como respuesta a los retos resultantes del proceso de envejecimiento y de la vejez. Participaron de grupos focales 15 ancianos (con edades de entre 63 y 81 años), que resultaron en tres categorías de análisis cualitativo: a) Mecanismos sociales de protección; b) Recursos personales; c) Procesos adaptativos para una vejez exitosa. El apoyo social concedido, en gran parte, por grupos de convivencia y la percepción de interacciones positivas entre familiares, con afecto y reciprocidad, fueron esenciales para mantener el bienestar de los ancianos. Los recursos personales que expresan estados y procesos emocionales, cognitivos y comportamientos positivos permearon los discursos acerca del buen envejecer. Además, la adaptación a los cambios sucedidos con el avance del envejecimiento, la madurez, la aceptación y la construcción de una identidad positiva hacia la vejez implicaron procesos de resiliencia, basados en el equilibrio entre las pérdidas y ganancias a lo largo del desarrollo. Se concluye que la lucha contra las adversidades del envejecimiento, junto con la valoración y la intensificación de cualidades humanas, propicia maneras de envejecer con resiliencia.

Palabras clave:
Viejez; Ancianos; Resiliencia; Factores de protección

Introdução

O processo de envelhecimento natural do organismo não corresponde obrigatoriamente à aquisição de doenças, que podem ser um agravante significativo conforme o avançar da idade (Tecson, Wilkinson, Smith, & Ko, 2019Tecson, K. M., Wilkinson, L. R., Smith, B., & Ko, J. M. (2019). Association between psychological resilience and subjective well-being in older adults living with chronic illness. Baylor University Medical Center Proceedings, 32(4), 520-524. https://doi.org/10.1080/08998280.2019.1625660
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). Considera-se que o envelhecimento é um processo heterogêneo e multideterminado por domínios do funcionamento físico, social, ambiental, espiritual e psicológico dos indivíduos ao longo da vida (Araújo, Ribeiro, & Paúl, 2016Araújo, L., Ribeiro, O., & Paúl, C. (2016). Envelhecimento bem sucedido e longevidade avançada. Actas de Gerontologia, 2(1), 1-11.; Cosco, Howse, & Brayne, 2017Cosco, T. D., Howse, K., & Brayne, C. (2017). Healthy ageing, resilience and wellbeing. Epidemiology and Psychiatric Sciences, 26(6), 579-583. https://doi.org/10.1017/S2045796017000324
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; Manning, Ferris, Rosario, Prues, & Bouchard, 2019Manning, L., Ferris, M., Rosario, C. N., Prues, M., & Bouchard, L. (2019). Spiritual resilience: Understanding the protection and promotion of well-being in the later life. Journal of Religion, Spirituality & Aging, 31(2), 168-186. https://doi.org/10.1080/15528030.2018.1532859
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). Observa-se que, embora a velhice seja um evento em que há perdas e ameaças de riscos à saúde, existem idosos que conseguem ter um padrão de desenvolvimento adaptativo positivo, manter um nível elevado de autonomia e preservar um bem-estar subjetivo e demonstrar expressiva resiliência (Araújo & Silva, 2017Araújo, L. F., & Silva, R. J. S. (2017). Resilience and aging: A comparative study among elderly people of different social classes. Psicologia em Estudo, 22(2), 141-152. https://doi.org/10.4025/psicolestud.v22i2.32437
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; Bennett, Reyes-Rodriguez, Altamar, & Soulsby, 2016Bennett, K. M., Reyes-Rodriguez, M. F., Altamar, P., & Soulsby, L. K. (2016). Resilience amongst older Colombians living in poverty: An ecological approach. Journal of Cross-cultural Gerontology, 31(4), 385-407. https://doi.org/10.1007/s10823-016-9303-3
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; Fontes & Neri, 2015Fontes, A. P., & Neri, A. L. (2015). Resilience in aging: Literature review. Ciência & Saúde Coletiva, 20(5), 1475-1495. https://doi.org/10.1590/1413-81232015205.00502014
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; Hayman, Kerse, & Consedine, 2017Hayman, K. J., Kerse, N., & Consedine, N. S. (2017). Resilience in context: The special case of advanced age, Aging & Mental Health, 21(6), 577-585. https://doi.org/10.1080/13607863.2016.1196336
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; Silveira, Giacomin, Dias, & Firmo, 2018Silveira, D. R., Giacomin, K. C., Dias, R. C., & Firmo, J. O. A. (2018). A tessitura da resiliência em idosos, a reinvenção de si “apesar de”. Revista Brasileira de Geriatria e Gerontologia, 21(3), 312-319. https://doi.org/10.1590/1981-22562018021.170118
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; Treichler et al., 2020Treichler, E., Glorioso, D., Lee, E. E., Wu, T. C., Tu, X. M., Daly, R., O’Brien, C., Smith, J. L., & Jeste, D. V. (2020). A pragmatic trial of a group intervention in senior housing communities to increase resilience. International Psychogeriatrics, 32(2), 173-182. https://doi.org/10.1017/S1041610219002096
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).

As investigações de processos adaptativos na velhice receberam importantes contributos do paradigma do desenvolvimento ao longo da vida (life-span), que compreende o envelhecimento como um processo multideterminado e heterogêneo e defende a concepção de um envelhecimento bem-sucedido (Baltes, 1997Baltes, P. B. (1997). On the incomplete architecture of human ontogeny: Selection, optimization, and compensation as foundation of developmental theory. American Psychologist, 52(4), 366-380. https://doi.org/10.1037/0003-066X.52.4.366
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), o qual concebe a noção positiva de saúde e acentua o processo de envelhecimento fundamentalmente nas possibilidades de cada indivíduo se adaptar às mudanças advindas do envelhecimento, conforme o reconhecimento e a potencialização de suas competências pessoais e da organização de fatores sociais, ambientais, entre outros determinantes modificadores da saúde e do bem-estar na velhice (Araújo et al., 2016Araújo, L., Ribeiro, O., & Paúl, C. (2016). Envelhecimento bem sucedido e longevidade avançada. Actas de Gerontologia, 2(1), 1-11.; Carpentieri, Elliott, Brett, & Deary, 2017Carpentieri, J. D., Elliott, J., Brett, C. E., & Deary, I. J. (2017). Adapting to aging: Older people talk about their use of selection, optimization, and compensation to maximize well-being in the context of physical decline. The Journals of Gerontology: Series B, Psychological Sciences and Social Sciences, 72(2), 351-361. https://doi.org/10.1093/geronb/gbw132
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).

O envelhecimento bem-sucedido ou adaptativo é consequência de uma ação mútua e sistêmica de mecanismos de seleção, otimização e compensação (teoria SOC) (Araújo et al., 2016Araújo, L., Ribeiro, O., & Paúl, C. (2016). Envelhecimento bem sucedido e longevidade avançada. Actas de Gerontologia, 2(1), 1-11.; Carpentieri et al., 2017Carpentieri, J. D., Elliott, J., Brett, C. E., & Deary, I. J. (2017). Adapting to aging: Older people talk about their use of selection, optimization, and compensation to maximize well-being in the context of physical decline. The Journals of Gerontology: Series B, Psychological Sciences and Social Sciences, 72(2), 351-361. https://doi.org/10.1093/geronb/gbw132
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; Fontes, 2010Fontes, A. P. (2010). Resiliência, segundo o paradigma do desenvolvimento ao longo da vida (life-span). Revista Kairós, 7, 8-20.; Neri, 2013Neri, A. L. (2013). Teorias psicológicas do envelhecimento: Percurso histórico e teorias atuais. In E. V. de Freitas & L. Py (Orgs.), Tratado de geriatria e gerontologia (pp. 102-118). Guanabara Koogan.). A estrutura SOC apresenta uma concepção de êxito que não depende do resultado, mas se concentra essencialmente em fazer o melhor que se pode com o que se tem (Carpentieri et al., 2017Carpentieri, J. D., Elliott, J., Brett, C. E., & Deary, I. J. (2017). Adapting to aging: Older people talk about their use of selection, optimization, and compensation to maximize well-being in the context of physical decline. The Journals of Gerontology: Series B, Psychological Sciences and Social Sciences, 72(2), 351-361. https://doi.org/10.1093/geronb/gbw132
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). Nesse sentido, os processos psicológicos adaptativos auxiliam o idoso a refletir sobre as escolhas necessárias (seleção), a encontrar maneiras de alcançar uma meta (otimização) e a buscar alternativas viáveis dentro de sua realidade (compensação) (Neri, 2013Neri, A. L. (2013). Teorias psicológicas do envelhecimento: Percurso histórico e teorias atuais. In E. V. de Freitas & L. Py (Orgs.), Tratado de geriatria e gerontologia (pp. 102-118). Guanabara Koogan.; Sousa & Rodriguez-Miranda, 2015Sousa, C. S., & Rodríguez-Miranda, F. P. (2015). Envelhecimento e educação para resiliência no idoso. Educação & Realidade, 40(1), 33-51. https://doi.org/10.1590/2175-623645562
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). O paradigma do life-span discute também sobre a plasticidade e a capacidade que o organismo tem de fazer reservas como fatores cruciais para a ocorrência de processos de resiliência.

Compreende-se a resiliência como a capacidade humana de enfrentar as adversidades da vida para superá-las, conforme a ação de processos adaptativos pessoais e externos aos indivíduos (Araújo, Teva, & Bermúdez, 2015Araújo, L. F., Teva, I., & Bermúdez, M. D. L. P. (2015). Resiliencia en adultos: Una revisión teórica. Terapia Psicológica, 33(3), 257-276. https://doi.org/10.4067/S0718-48082015000300009
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; Pesce et al., 2005Pesce, R. P., Assis, S. G., Avanci, J. Q., Santos, N. C., Malaquias, J. V., & Carvalhaes, R. (2005). Adaptação transcultural, confiabilidade e validade da escala de resiliência. Cadernos de Saúde Pública, 21(2), 436-448. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2005000200010
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; Treichler et al., 2020Treichler, E., Glorioso, D., Lee, E. E., Wu, T. C., Tu, X. M., Daly, R., O’Brien, C., Smith, J. L., & Jeste, D. V. (2020). A pragmatic trial of a group intervention in senior housing communities to increase resilience. International Psychogeriatrics, 32(2), 173-182. https://doi.org/10.1017/S1041610219002096
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; Wister, Cosco, Mitchell, & Fyffe, 2020Wister, A., Cosco, T., Mitchell, B., & Fyffe, I. (2020). Health behaviors and multimorbidity resilience among older adults using the Canadian Longitudinal Study on Aging. International psychogeriatrics, 32(1), 119-133. https://doi.org/10.1017/S1041610219000486
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). Nesse contexto, a superação não significa que o sujeito seja invulnerável diante das dificuldades com que se depara na velhice (Cyrulnik, 2003Cyrulnik, B. (2003). Resiliência: Essa inaudita capacidade de construção humana. Instituto Piaget.), mas diz respeito a ultrapassar as adversidades, sem sucumbir a elas, e resistir aos riscos psicossociais (Araújo & Silva, 2017Araújo, L. F., & Silva, R. J. S. (2017). Resilience and aging: A comparative study among elderly people of different social classes. Psicologia em Estudo, 22(2), 141-152. https://doi.org/10.4025/psicolestud.v22i2.32437
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; Fontes & Neri, 2015Fontes, A. P., & Neri, A. L. (2015). Resilience in aging: Literature review. Ciência & Saúde Coletiva, 20(5), 1475-1495. https://doi.org/10.1590/1413-81232015205.00502014
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). Vista sob uma estrutura ecológica, a resiliência opera interativamente no nível dos indivíduos, da comunidade e da sociedade (Bennet et al., 2016Bennett, K. M., Reyes-Rodriguez, M. F., Altamar, P., & Soulsby, L. K. (2016). Resilience amongst older Colombians living in poverty: An ecological approach. Journal of Cross-cultural Gerontology, 31(4), 385-407. https://doi.org/10.1007/s10823-016-9303-3
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; Schuck & De Antoni, 2018Schuck, L. M., & De Antoni, C. (2018). Resiliência e vulnerabilidade nos sistemas ecológicos: Envelhecimento e políticas públicas. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 34, 1-9. https://doi.org/10.1590/0102.3772e3442
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).

A resiliência também não é um traço psicológico exclusivamente atribuído às características individuais dos sujeitos, porquanto se expressa, principalmente, nas mudanças que ocorrem no meio relacional, incluindo as condições familiares, socioeconômicas e culturais em que o indivíduo está inserido, e estabelece trocas socioafetivas (Araújo & Silva, 2017Araújo, L. F., & Silva, R. J. S. (2017). Resilience and aging: A comparative study among elderly people of different social classes. Psicologia em Estudo, 22(2), 141-152. https://doi.org/10.4025/psicolestud.v22i2.32437
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; Bennet et al., 2016Bennett, K. M., Reyes-Rodriguez, M. F., Altamar, P., & Soulsby, L. K. (2016). Resilience amongst older Colombians living in poverty: An ecological approach. Journal of Cross-cultural Gerontology, 31(4), 385-407. https://doi.org/10.1007/s10823-016-9303-3
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; Juliano & Yunes, 2014Juliano, M. C. C., & Yunes, M. A. M. (2014). Reflections on the social support network as a mechanism for the protection and promotion of resilience. Ambiente & Sociedade, 17(3), 135-54. https://doi.org/10.1590/S1414-753X2014000300009
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). Cyrulnik e Cabral (2015Cyrulnik, B., & Cabral, S. (2015). Resiliência: Ações pela reinstauração de um futuro. In R. M. Coimbra & N. A. Morais, A resiliência em questão: Perspectivas teóricas, pesquisa e intervenção (pp. 19-35). Artmed.) assinalam que a resiliência age em meio a uma complexidade de fatores que atuam conjuntamente para a continuidade do processo de adaptação às mudanças e às situações críticas e traumáticas que marcam o contexto de vida dos indivíduos.

Pesquisas apontam que a operacionalização do conceito de resiliência reflete a superação do modelo centrado nas doenças, o que resulta na investigação dos fatores implicados fundamentalmente nos processos positivos desencadeados em condições que oferecem risco para a saúde física e mental do ser humano (Cosco et al., 2017Cosco, T. D., Howse, K., & Brayne, C. (2017). Healthy ageing, resilience and wellbeing. Epidemiology and Psychiatric Sciences, 26(6), 579-583. https://doi.org/10.1017/S2045796017000324
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; Cosco, Hardy, Howe, & Richards, 2019Cosco, T., Hardy, R., Howe, L., & Richards, M. (2019). Early-life adversity, later-life mental health, and resilience resources: A longitudinal population-based birth cohort analysis. International Psychogeriatrics, 31(9), 1249-1258, https://doi.org/10.1017/S1041610218001795
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; Kok, Nes, Deeg, Widdershoven, & Huisman, 2018Kok, A. A. L., Nes, F. V., Deeg, J. H. D., Widdershoven, G., & Huisman, M. (2018). “Tough times have become good times”: Resilience in older adults with a low socioeconomic position. The Gerontologist, 58(5), 843-852. https://doi.org/10.1093/geront/gny007
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; Wister et al., 2020Wister, A., Cosco, T., Mitchell, B., & Fyffe, I. (2020). Health behaviors and multimorbidity resilience among older adults using the Canadian Longitudinal Study on Aging. International psychogeriatrics, 32(1), 119-133. https://doi.org/10.1017/S1041610219000486
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). Os estudos sobre a resiliência têm avançado nos campos da prevenção psicossocial e da promoção da saúde, em que é dada relevância às investigações acerca dos processos criativos, saudáveis e resilientes presentes nas pessoas, famílias, na escola e na comunidade (Carpentieri et al., 2017Carpentieri, J. D., Elliott, J., Brett, C. E., & Deary, I. J. (2017). Adapting to aging: Older people talk about their use of selection, optimization, and compensation to maximize well-being in the context of physical decline. The Journals of Gerontology: Series B, Psychological Sciences and Social Sciences, 72(2), 351-361. https://doi.org/10.1093/geronb/gbw132
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; Hayman et al., 2017Hayman, K. J., Kerse, N., & Consedine, N. S. (2017). Resilience in context: The special case of advanced age, Aging & Mental Health, 21(6), 577-585. https://doi.org/10.1080/13607863.2016.1196336
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; Huijg et al., 2017Huijg, J. M., van Delden, A. L., van der Ouderaa, F. J., Westendorp, R. G., Slaets, J. P., & Lindenberg, J. (2017). Being active, engaged, and healthy: Older Persons’ plans and wishes to age successfully. The Journals of Gerontology: Series B, Psychological Sciences and Social Sciences, 72(2), 228-236. https://doi.org/10.1093/geronb/gbw107
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).

A literatura concebe os fatores ou mecanismos de proteção como elementos que favorecem os processos de resiliência. Os fatores de proteção agem minimizando os efeitos traumáticos e disfuncionais causados por fatores de risco (Musich, Wang, Slindee, Kraemer, & Yeh, 2019Musich, S., Wang, S. S., Slindee, L., Kraemer, S., & Yeh, C. S. (2019). Association of resilience and social networks with pain outcomes among older adults. Population Health Management, 22(6), 511-521. https://doi.org/10.1089/pop.2018.0199
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; Pesce et al., 2005Pesce, R. P., Assis, S. G., Avanci, J. Q., Santos, N. C., Malaquias, J. V., & Carvalhaes, R. (2005). Adaptação transcultural, confiabilidade e validade da escala de resiliência. Cadernos de Saúde Pública, 21(2), 436-448. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2005000200010
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; Sousa & Rodríguez-Miranda, 2015Sousa, C. S., & Rodríguez-Miranda, F. P. (2015). Envelhecimento e educação para resiliência no idoso. Educação & Realidade, 40(1), 33-51. https://doi.org/10.1590/2175-623645562
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). Eles podem ser recursos individuais ou sociais que os auxiliam a enfrentar adversidades.

Os recursos pessoais reúnem virtudes humanas como autoeficácia, autoestima, regulação emocional, coping, felicidade, bem-estar, satisfação com a vida, otimismo, perseverança, esperança, gratidão e espiritualidade (Araújo et al., 2015Araújo, L. F., Teva, I., & Bermúdez, M. D. L. P. (2015). Resiliencia en adultos: Una revisión teórica. Terapia Psicológica, 33(3), 257-276. https://doi.org/10.4067/S0718-48082015000300009
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; Cosco et al., 2019Cosco, T., Hardy, R., Howe, L., & Richards, M. (2019). Early-life adversity, later-life mental health, and resilience resources: A longitudinal population-based birth cohort analysis. International Psychogeriatrics, 31(9), 1249-1258, https://doi.org/10.1017/S1041610218001795
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; Fernandes & Andrade, 2016Fernandes, J. S. G., & Andrade, M. S. (2016). Representações sociais de idosos sobre velhice. Arquivos Brasileiros de Psicologia, 68(2), 48-59.; Fontes, 2010Fontes, A. P. (2010). Resiliência, segundo o paradigma do desenvolvimento ao longo da vida (life-span). Revista Kairós, 7, 8-20.; Fontes & Neri, 2015Fontes, A. P., & Neri, A. L. (2015). Resilience in aging: Literature review. Ciência & Saúde Coletiva, 20(5), 1475-1495. https://doi.org/10.1590/1413-81232015205.00502014
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; Pesce et al., 2005Pesce, R. P., Assis, S. G., Avanci, J. Q., Santos, N. C., Malaquias, J. V., & Carvalhaes, R. (2005). Adaptação transcultural, confiabilidade e validade da escala de resiliência. Cadernos de Saúde Pública, 21(2), 436-448. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2005000200010
https://doi.org/10.1590/S0102-311X200500...
; Reis & Menezes, 2017Reis, L. A., & Menezes, T. M. O. (2017). Religiosity and spirituality as resilience strategies among long-living older adults in their daily lives. Revista Brasileira de Enfermagem, 70(4), 794-799. https://doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0630
https://doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0...
; Schuck & De Antoni, 2018Schuck, L. M., & De Antoni, C. (2018). Resiliência e vulnerabilidade nos sistemas ecológicos: Envelhecimento e políticas públicas. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 34, 1-9. https://doi.org/10.1590/0102.3772e3442
https://doi.org/10.1590/0102.3772e3442...
; Tecson et al., 2019Tecson, K. M., Wilkinson, L. R., Smith, B., & Ko, J. M. (2019). Association between psychological resilience and subjective well-being in older adults living with chronic illness. Baylor University Medical Center Proceedings, 32(4), 520-524. https://doi.org/10.1080/08998280.2019.1625660
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). Os mecanismos sociais de proteção abarcam aspectos da relação familiar, da rede de apoio social e de elementos do meio ambiente que contribuem para a vida afetiva dos sujeitos, com a convivência construída ao longo da vida (Juliano & Yunes, 2014Juliano, M. C. C., & Yunes, M. A. M. (2014). Reflections on the social support network as a mechanism for the protection and promotion of resilience. Ambiente & Sociedade, 17(3), 135-54. https://doi.org/10.1590/S1414-753X2014000300009
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; Musich et al., 2019Musich, S., Wang, S. S., Slindee, L., Kraemer, S., & Yeh, C. S. (2019). Association of resilience and social networks with pain outcomes among older adults. Population Health Management, 22(6), 511-521. https://doi.org/10.1089/pop.2018.0199
https://doi.org/10.1089/pop.2018.0199...
; Schuck & De Antoni, 2018Schuck, L. M., & De Antoni, C. (2018). Resiliência e vulnerabilidade nos sistemas ecológicos: Envelhecimento e políticas públicas. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 34, 1-9. https://doi.org/10.1590/0102.3772e3442
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).

Apesar dos avanços no campo do envelhecimento, com o advento do paradigma do life-span, os estudos sobre os recursos que favorecem o enfrentamento das situações adversas e que expressam processos de resiliência na velhice ainda carecem de mais atenção (Carpentieri et al., 2017Carpentieri, J. D., Elliott, J., Brett, C. E., & Deary, I. J. (2017). Adapting to aging: Older people talk about their use of selection, optimization, and compensation to maximize well-being in the context of physical decline. The Journals of Gerontology: Series B, Psychological Sciences and Social Sciences, 72(2), 351-361. https://doi.org/10.1093/geronb/gbw132
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; Fontes & Neri, 2015Fontes, A. P., & Neri, A. L. (2015). Resilience in aging: Literature review. Ciência & Saúde Coletiva, 20(5), 1475-1495. https://doi.org/10.1590/1413-81232015205.00502014
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). Em vista disso, objetivou-se analisar como os idosos compreendem os fatores de proteção que promovem resiliência em resposta aos desafios advindos do processo de envelhecimento e da velhice.

Método

Este estudo tem caráter qualitativo e descritivo e foi desenvolvido com 15 idosos participantes de um primeiro estudo quantitativo de grande porte, cujo delineamento previa a utilização de multimétodos de produção de dados. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) e foram respeitadas as orientações da Resolução n. 466/12 do Conselho Nacional de Saúde para pesquisa com seres humanos.

A amostra selecionada para este estudo derivou de um banco de 508 idosos, que eram usuários adscritos nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) de um município de grande porte do interior da Paraíba, - Brasil. Foram incluídos idosos participantes do primeiro estudo (quantitativo), de ambos os sexos, com idades a partir de 60 anos. A seleção dos participantes para o estudo qualitativo seguiu a pontuação da Escala de Resiliência (ER). Os idosos com as maiores pontuações foram selecionados para participar dos grupos focais.

Assim, participaram do estudo 10 (66,7%) mulheres e 5 (33,3%) homens, com idade mínima de 63 anos e máxima de 81 (M=71,47; DP=5,98). No tocante ao estado civil, 10 (66,7%) são casados(as) ou vivem com companheiro(a), 1 (6,7%) é solteira, 2 (13,3%) são divorciados e 2 (13,3%), viúvas. Grande parte dos participantes cursaram apenas as séries iniciais (n=7; 46,6%); 1 (6,7%) não era alfabetizada; 4 (26,6%) concluíram o ensino básico e 3 (20%) tinham curso superior. Quanto à renda familiar, concentrou-se em até 2 salários mínimos (n=7; 46,6%%), seguidos de 3 salários mínimos ou mais (n=6, 40,1%) e até 1 salário mínimo (n=2; 13,3%). Todos afirmaram que têm uma religião; 13 (86,7%) se declararam católicos; e dois (13,3%), evangélicos. Dez dos participantes (66,7%) frequentam grupos de convivência para idosos. A pontuação mínima na ER foi de 125 pontos e a máxima, de 164, portanto, resiliência elevada (Pesce et al., 2005Pesce, R. P., Assis, S. G., Avanci, J. Q., Santos, N. C., Malaquias, J. V., & Carvalhaes, R. (2005). Adaptação transcultural, confiabilidade e validade da escala de resiliência. Cadernos de Saúde Pública, 21(2), 436-448. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2005000200010
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).

Para caracterizar os idosos, foram utilizados um questionário sociodemográfico e a escala de resiliência desenvolvida por Wagnild e Young (1993Wagnild, G. M., & Young, H. M. (1993). Development and psychometric evaluation of resilience scale. Journal of Nursing Measurement, 1(2), 165-178.), validada para a população brasileira para medir os níveis de resiliência individual e considerada como a adaptação psicossocial positiva em face de eventos da vida. O escore na escala varia de 25 a 175 pontos. Maiores pontuações sugerem elevado índice de resiliência (Pesce et al., 2005Pesce, R. P., Assis, S. G., Avanci, J. Q., Santos, N. C., Malaquias, J. V., & Carvalhaes, R. (2005). Adaptação transcultural, confiabilidade e validade da escala de resiliência. Cadernos de Saúde Pública, 21(2), 436-448. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2005000200010
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). Os dados qualitativos foram produzidos por meio da técnica de grupo focal, uma estratégia pautada na interação entre os participantes e o pesquisador. Segundo essa técnica, os dados são produzidos a partir da discussão proveniente de temas geradores problematizados com os participantes (Sehnem, Alves, Wilhem, & Ressel, 2015Sehnem, G. D., Alves, C. N., Wilhelm, L. A., & Ressel, L. B. (2015). Focal group utilization as data gathering technic to researches: Experience report. Ciência, Cuidado & Saúde, 14(2), 1194-1200. https://doi.org/10.4025/cienccuidsaude.v14i2.21960
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).

O recrutamento dos idosos foi baseado em sua seleção no banco de dados. Foram feitos contatos pelos telefones que os participantes indicaram no período da pesquisa quantitativa. O convite foi feito até se alcançar a confirmação de 15 idosos para cada grupo focal, supondo-se possíveis faltas e desistências, devido às dificuldades que os idosos enfrentavam para se deslocar até o lugar onde ocorriam os encontros. Realizaram-se dois grupos focais, com uma sessão para cada grupo, entre os meses de novembro e dezembro de 2017. Do primeiro grupo participaram nove idosos e do segundo, seis. Os encontros aconteceram em uma sala de dinâmica de grupo localizada no Departamento de Psicologia da Universidade Estadual da Paraíba. Os idosos foram orientados quanto aos objetivos da pesquisa e esclarecidos sobre os procedimentos éticos que a nortearam e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Também foram informados sobre a dinâmica que seria seguida para a realização dos encontros.

Para operacionalizar a sessão de grupo focal, foi utilizado um roteiro previamente elaborado pelos pesquisadores, cujo tema foi “Resiliência e fatores de proteção na velhice”. As perguntas que nortearam as discussões nos grupos focais foram as seguintes: Como está sendo envelhecer, e ser idoso? O que é ter capacidade de superar as dificuldades na vida (resiliência)? O que indica que o idoso pode superar as dificuldades que surgem ao longo da vida? Que características possuem o idoso que supera as dificuldades da vida? Que fatores (externos) te ajudam a enfrentar os problemas que surgem diante do processo de envelhecimento?

Cada sessão do grupo focal durou 2h e 30min. No final de cada encontro, foi estabelecido um momento de socialização, com um lanche coletivo, em que todos se confraternizaram. Os grupos foram conduzidos por um moderador e um observador, com o apoio de três estudantes do curso de Psicologia, que recebiam os idosos no espaço externo do departamento, conduziam-nos para a sala cedida para o grupo, auxiliavam a preparar o lanche e levavam os participantes ao banheiro, quando necessário. As sessões foram gravadas com o consentimento dos idosos e, posteriormente, transcritas. Para preservar o anonimato dos participantes, eles foram identificados na pesquisa por um pseudônimo, conforme acordado na assinatura do TCLE.

Os dados foram analisados por meio da técnica de Análise Categorial Temática proposta por Bardin (2011Bardin L. (2011). Análise de conteúdo. Edições 70.), a fim de obter os procedimentos sistemáticos da organização e da descrição do conteúdo. Segundo a autora, esse tipo de análise consiste em desmembrar o texto em unidades e categorias segundo reagrupamentos analógicos. Utilizou-se o critério de aproximação semântica, que resultou em categorias e subcategorias definidas a posteriori. O corpus de análise foi enviado a dois juízes independentes (uma enfermeira em saúde coletiva e uma pedagoga com experiência em gerontologia) que contribuíram na organização das categorias e posteriormente na validação das categorias finais de análise.

Resultados e discussão

Depois de feita a análise do corpus produzido nos dois grupos focais, obteve-se 3 categorias, com 15 subcategorias, exibidas no Quadro 1 e discutidas no texto a seguir.

Quadro 1
Categorias e subcategorias.

Mecanismos sociais de proteção na velhice

Essa categoria reúne os recursos do meio de que os idosos dispõem e a que recorrem em eventos e situações estressantes que foram citados durante a entrevista do grupo focal. Nos estudos sobre resiliência, é essencial que os elementos do meio facilitem o ajuste e o bom desenvolvimento das situações adversas. Nessa perspectiva, destacam-se a família e a rede de apoio - os amigos, as instituições pró-sociais (escolas, grupos, clubes), as políticas públicas e os serviços de assistência à saúde (Silveira et al., 2018Silveira, D. R., Giacomin, K. C., Dias, R. C., & Firmo, J. O. A. (2018). A tessitura da resiliência em idosos, a reinvenção de si “apesar de”. Revista Brasileira de Geriatria e Gerontologia, 21(3), 312-319. https://doi.org/10.1590/1981-22562018021.170118
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; Schuck & De Antoni, 2018Schuck, L. M., & De Antoni, C. (2018). Resiliência e vulnerabilidade nos sistemas ecológicos: Envelhecimento e políticas públicas. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 34, 1-9. https://doi.org/10.1590/0102.3772e3442
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; Snyder & Lopez, 2009Snyder, C. R., & Lopez, S. J. (2009). Psicologia positiva: Uma abordagem científica e prática das qualidades humanas. Artmed.).

O apoio social (subcategoria A.1) envolve aspectos da rede de relações sociais extrafamiliares de que os participantes dispõem, que se caracterizam, frequentemente, como suporte, apoio e assistência para enfrentar situações adversas. Estudos com acadêmicos e profissionais que atuam diretamente no cuidado de idosos apontam que o apoio social, a rede social e o sistema de relações recíprocas têm sido frequentemente associados à promoção da resiliência no contexto do envelhecimento (Angevaare et al., 2020Angevaare, M. J., Monnier, A. A., Joling, K. J., Smalbrugge, M., Schellevis, F. G., Hertogh, C., & Huisman, M. (2020). The application of the concept of resilience in aging research and older adult care: A focus group study. Frontiers in Medicine, 7, 365. https://doi.org/10.3389/fmed.2020.00365
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); por outro lado, a ausência de apoio social formal e informal compreende um fator de risco relevante na avaliação da resiliência (Schuck & De Antoni, 2018Schuck, L. M., & De Antoni, C. (2018). Resiliência e vulnerabilidade nos sistemas ecológicos: Envelhecimento e políticas públicas. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 34, 1-9. https://doi.org/10.1590/0102.3772e3442
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).

Marques Sánchez e Vicario (2014Marques, E. M. B. G., Sánchez, C. S., & Vicario, B. P. (2014). O apoio como fator promotor da qualidade de vida do idoso. Revista Interuniversitaria, (23), 253-271. https://doi.org/10.7179/PSRI_2014.23.11
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) chamam a atenção para a importância do apoio, seja ele formal ou informal, na ultrapassagem dos conflitos e das dificuldades que acometem os idosos. Esse recurso foi citado com frequência pelos participantes dos dois grupos focais, que enfatizaram os efeitos positivos de manter aberta uma rede de relações sociais. Os idosos discutiram sobre a necessidade de assegurar o vínculo e a comunicação com o outro, para manter o equilíbrio na velhice: “Eu acredito mesmo que nenhum da gente pode envelhecer com paciência, com alegria, sem comunicação. A comunicação é um objeto concreto na vida de cada um. Para estar alegre é preciso ter família, ter comunidade” (Sérgio, 67 anos). Percebe-se que o vínculo advindo das relações estabelecidas e o sentido elaborado a partir de modos de comunicação entre os sujeitos propiciam um contexto relacional para a construção da resiliência (Cyrulnik, 2005Cyrulnik, B. (2005). O murmúrio dos fantasmas. Martins Fontes.). Estudos de coortes com desenvolvimento longitudinal têm revelado que os recursos sociais advindos da rede de vínculos estabelecidos com idosos são importantes contribuintes para a resiliência na velhice, uma vez que colaboram na saúde mental e compensam as adversidades psicossociais presentes desde a infância dos idosos (Cosco et al., 2019Cosco, T., Hardy, R., Howe, L., & Richards, M. (2019). Early-life adversity, later-life mental health, and resilience resources: A longitudinal population-based birth cohort analysis. International Psychogeriatrics, 31(9), 1249-1258, https://doi.org/10.1017/S1041610218001795
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).

Cyrulnik e Cabral (2015Cyrulnik, B., & Cabral, S. (2015). Resiliência: Ações pela reinstauração de um futuro. In R. M. Coimbra & N. A. Morais, A resiliência em questão: Perspectivas teóricas, pesquisa e intervenção (pp. 19-35). Artmed.) asseveram que, em períodos sensíveis da vida, como a adolescência e a terceira idade, os elementos do meio, o ambiente afetivo e o contexto cultural estruturam o mundo interno dos sujeitos; por isso é necessário identificar os fatores de vulnerabilidade ou de resiliência atrelados ao desenvolvimento de cada sujeito ou que compõem a realidade de certa comunidade e agir em relação a eles.

As amizades foram citadas como importantes fontes de apoio - principalmente a dimensão afetiva, proveniente de apoio emocional e afetivo, que foi valorizada como motivação para o estabelecimento desse tipo de vínculo - e como suporte para o enfrentamento de perdas de entes queridos. Essas também são importantes fontes de apoio que auxiliam o sujeito idoso a atribuir sentido à vida (Silveira et al., 2018Silveira, D. R., Giacomin, K. C., Dias, R. C., & Firmo, J. O. A. (2018). A tessitura da resiliência em idosos, a reinvenção de si “apesar de”. Revista Brasileira de Geriatria e Gerontologia, 21(3), 312-319. https://doi.org/10.1590/1981-22562018021.170118
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).

A participação em grupos de convivência (clube de mães, clube de bairros, academia, universidade para a terceira idade) foi destaque no tocante à percepção do suporte social. Grande parte dos participantes dos dois grupos focais frequentam grupos para idosos e debateram sobre os diferentes tipos de apoio social que recebem por meio das interações propostas nesses espaços.

Os grupos de convivência exercem um papel fundamental no que diz respeito à amenização do estresse, ao apoio que proporcionam a seus participantes, ao fortalecimento de vínculos sociais e à conquista de novas amizades. Também auxiliam o processo de autoconceito e de autoestima, porque valorizam as pessoas idosas, proporcionam-lhes um aprendizado de comportamentos saudáveis e os estimulam a ser mais autônomos. Portanto, esses grupos são responsáveis por melhorar a qualidade de sua vida (Marques et al., 2014Marques, E. M. B. G., Sánchez, C. S., & Vicario, B. P. (2014). O apoio como fator promotor da qualidade de vida do idoso. Revista Interuniversitaria, (23), 253-271. https://doi.org/10.7179/PSRI_2014.23.11
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; Rabelo & Neri, 2014Rabelo, D. F., & Neri, A. L. (2014). A complexidade emocional dos relacionamentos intergeracional e a saúde mental dos idosos. Pensando Famílias, 18(1), 138-53.; Valer, Bierhals, Aires, & Pskulin, 2015Valer, D. B., Bierhals, C. C. B. K., Aires, M., & Paskulin, L. M. G. (2015). The significance of healthy aging for older persons who participated in health education groups. Revista Brasileira de Geriatria e Gerontologia, 18(4), 809-819. https://doi.org/10.1590/1809-9823.2015.14042
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). O depoimento abaixo confirma essa assertiva:

A Uama [Universidade Aberta a Maturidade] não cuida do idoso, a Uama ensina o idoso a superar os problemas de vida, né? Acho que com essa amizade que eu fiz com essa turma toda, essa turma que tinha é o que faz você ficar mais feliz pra viver, né? E ajudar a você a recuperar todos os problemas que tem. Eu chegava aqui com a cabeça cheia de problema pra resolver, mas quando chega aqui [na universidade] isso ia embora (Paulo, 65 anos).

O estudo mostrou que a participação dos idosos em grupos de convivência facilitou sua adesão aos grupos focais propostos para esta pesquisa. Eles demonstraram facilidade na interação interpessoal, ressaltaram os grupos como ferramentas de empoderamento sobre os assuntos que permeiam os campos da saúde e os direitos sociais do idoso e atribuíram ao grupo um potencial para melhorar a vida dessas pessoas no processo de envelhecimento. Esse fato, segundo Sousa e Rodríguez-Miranda (2015Sousa, C. S., & Rodríguez-Miranda, F. P. (2015). Envelhecimento e educação para resiliência no idoso. Educação & Realidade, 40(1), 33-51. https://doi.org/10.1590/2175-623645562
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), reforça o papel da integração social e do bem-estar promovidos pelos grupos de convivência, cujas ações despertam e maximizam a autoconfiança, a maturidade, as habilidades, as competências e a resiliência e proporcionam uma vida participativa na velhice. Assim, é possível afirmar que esses grupos são importantes fontes de apoio social no envelhecimento, cujo trabalho com foco em demandas psicossociais e de saúde pode resultar em espaços de expressão de sentimentos e de criação de estratégias para enfrentar as dificuldades próprias dessa fase da vida e estimular hábitos de vida saudáveis (Andrade, Eulálio, & Melo, 2013Andrade, D. A., Eulálio, M. C., & Melo, R. L. P. (2013). Fontes de apoio social a idosos portadores de doença pulmonar obstrutiva crônica. Psicologia em Estudo, 18(1), 115-123. https://doi.org/10.1590/S1413-73722013000100012
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; Hayman et al., 2017Hayman, K. J., Kerse, N., & Consedine, N. S. (2017). Resilience in context: The special case of advanced age, Aging & Mental Health, 21(6), 577-585. https://doi.org/10.1080/13607863.2016.1196336
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).

Conviver em meio a relações familiares positivas (subcategoria A.2) foi um fator protetor da vulnerabilidade no envelhecimento. Alguns participantes mencionaram a dimensão afetiva e de apoio mútuo que ocorre em seu meio familiar e o suporte advindo do cônjuge e dos filhos como as principais fontes de suporte familiar recebida, que são essenciais nesse processo (Silva & Rabelo, 2017Silva, L. L. N. B., & Rabelo, D. F. (2017). Afetividade e conflito nas díades familiares, capacidade funcional e expectativa de cuidado de idosos. Pensando Famílias, 21(1), 80-91.; Silveira et al., 2018Silveira, D. R., Giacomin, K. C., Dias, R. C., & Firmo, J. O. A. (2018). A tessitura da resiliência em idosos, a reinvenção de si “apesar de”. Revista Brasileira de Geriatria e Gerontologia, 21(3), 312-319. https://doi.org/10.1590/1981-22562018021.170118
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). Rabelo e Neri (2014Rabelo, D. F., & Neri, A. L. (2014). A complexidade emocional dos relacionamentos intergeracional e a saúde mental dos idosos. Pensando Famílias, 18(1), 138-53.) enfatizam que, nas famílias em que ocorrem interações positivas, a cooperação entre familiares é uma prioridade entre outras fontes de apoio existentes para o enfrentamento de problemas. Segundo as autoras, na velhice, as relações familiares tendem a passar por um processo de reorganização orientado por mecanismos psicológicos, entre os quais se destaca a proximidade emocional, que confere continuidade, confiabilidade e estabilidade aos relacionamentos, com o estreitamento das relações entre os parentes, visando ao conforto e ao companheirismo.

O apoio de familiares varia de acordo com o arranjo entre os diferentes membros e o nível e a qualidade das interações que ocorrem na organização da família (Rabelo & Neri, 2014Rabelo, D. F., & Neri, A. L. (2014). A complexidade emocional dos relacionamentos intergeracional e a saúde mental dos idosos. Pensando Famílias, 18(1), 138-53.; Silva & Rabelo, 2017Silva, L. L. N. B., & Rabelo, D. F. (2017). Afetividade e conflito nas díades familiares, capacidade funcional e expectativa de cuidado de idosos. Pensando Famílias, 21(1), 80-91.). Quando a pessoa idosa recebe da família suporte emocional e afetivo, sua saúde mental é beneficiada e ela pode crescer como pessoa, sentir-se segura e ter autonomia (Silva & Rabelo, 2017Silva, L. L. N. B., & Rabelo, D. F. (2017). Afetividade e conflito nas díades familiares, capacidade funcional e expectativa de cuidado de idosos. Pensando Famílias, 21(1), 80-91.). Nesse sentido, o apoio instrumental é indispensável, devido às demandas de cuidado que muitos idosos apresentam ao ter que conviver com determinadas limitações (Marques et al., 2014Marques, E. M. B. G., Sánchez, C. S., & Vicario, B. P. (2014). O apoio como fator promotor da qualidade de vida do idoso. Revista Interuniversitaria, (23), 253-271. https://doi.org/10.7179/PSRI_2014.23.11
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). Também é necessário que haja reciprocidade nas trocas de apoio, senso de autonomia e equilíbrio de poder nas relações, para que a convivência seja solidária (Bennett et al., 2016Bennett, K. M., Reyes-Rodriguez, M. F., Altamar, P., & Soulsby, L. K. (2016). Resilience amongst older Colombians living in poverty: An ecological approach. Journal of Cross-cultural Gerontology, 31(4), 385-407. https://doi.org/10.1007/s10823-016-9303-3
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; Juliano & Yunes, 2014Juliano, M. C. C., & Yunes, M. A. M. (2014). Reflections on the social support network as a mechanism for the protection and promotion of resilience. Ambiente & Sociedade, 17(3), 135-54. https://doi.org/10.1590/S1414-753X2014000300009
https://doi.org/10.1590/S1414-753X201400...
).

A construção de vínculos afetivos significativos, em que é possível criar um espaço relacional respeitoso e solidário, é, sobretudo, o efeito mais desejado nas relações entre os sujeitos, para que advenham os processos de resiliência (Cyrulnik, 2003Cyrulnik, B. (2003). Resiliência: Essa inaudita capacidade de construção humana. Instituto Piaget., 2005Cyrulnik, B. (2005). O murmúrio dos fantasmas. Martins Fontes.; Juliano & Yunes, 2014Juliano, M. C. C., & Yunes, M. A. M. (2014). Reflections on the social support network as a mechanism for the protection and promotion of resilience. Ambiente & Sociedade, 17(3), 135-54. https://doi.org/10.1590/S1414-753X2014000300009
https://doi.org/10.1590/S1414-753X201400...
; Silveira et al., 2018Silveira, D. R., Giacomin, K. C., Dias, R. C., & Firmo, J. O. A. (2018). A tessitura da resiliência em idosos, a reinvenção de si “apesar de”. Revista Brasileira de Geriatria e Gerontologia, 21(3), 312-319. https://doi.org/10.1590/1981-22562018021.170118
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). No segundo grupo focal, havia um casal que estava junto há pouco tempo e que se conheceu em um grupo de atividade física da universidade que é oferecido à comunidade. Os dois moravam sozinhos e queixavam-se, principalmente, da solidão e da falta de suporte afetivo por parte de seus filhos. A companhia e o apoio que um dá ao outro atualmente foram um motivo de animação no grupo, que partilhou da felicidade dos dois, por terem se permitido viver um relacionamento na velhice, cuja parceria resultou em bem-estar para ambos: “Estou satisfeito com ela, minha companheira, estou bem legal.... Eu era muito nervoso, a gente está se combinando assim, os dois está dando certo até agora, vai fazer um ano que estamos juntos” (Eduardo, 74 anos).

Recursos pessoais

Essa categoria reúne os fatores protetores pessoais de que os idosos dispõem para lidar com os eventos estressores e as demais situações que colocam em risco sua saúde e seu equilíbrio. Tais recursos podem ser caracterizados como indicadores de resiliência, que é produto da interação entre a natureza, a quantidade e a intensidade dos fatores de risco e de proteção (Fontes, 2010Fontes, A. P. (2010). Resiliência, segundo o paradigma do desenvolvimento ao longo da vida (life-span). Revista Kairós, 7, 8-20.; Fontes & Neri, 2015Fontes, A. P., & Neri, A. L. (2015). Resilience in aging: Literature review. Ciência & Saúde Coletiva, 20(5), 1475-1495. https://doi.org/10.1590/1413-81232015205.00502014
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). A regulação emocional (subcategoria B.1) destacou-se entre os recursos psicológicos que auxiliam os participantes a enfrentarem os eventos estressantes de vida e foi um assunto muito debatido nos dois grupos focais: “A gente ver a natureza tão equilibrada, e muitas vezes, a gente é tão desequilibrado, pessoal. Se a gente fosse mais equilibrado, a vida era tão melhor pra gente” (Paulo, 65 anos). Esse recurso tem sido associado à resiliência. Sabe-se que o bem-estar emocional e a satisfação com a vida são fundamentais para a experimentação do envelhecimento bem-sucedido (Carpentieri et al., 2017Carpentieri, J. D., Elliott, J., Brett, C. E., & Deary, I. J. (2017). Adapting to aging: Older people talk about their use of selection, optimization, and compensation to maximize well-being in the context of physical decline. The Journals of Gerontology: Series B, Psychological Sciences and Social Sciences, 72(2), 351-361. https://doi.org/10.1093/geronb/gbw132
https://doi.org/10.1093/geronb/gbw132...
; Huijg et al., 2017Huijg, J. M., van Delden, A. L., van der Ouderaa, F. J., Westendorp, R. G., Slaets, J. P., & Lindenberg, J. (2017). Being active, engaged, and healthy: Older Persons’ plans and wishes to age successfully. The Journals of Gerontology: Series B, Psychological Sciences and Social Sciences, 72(2), 228-236. https://doi.org/10.1093/geronb/gbw107
https://doi.org/10.1093/geronb/gbw107...
). Em idosos, o aprimoramento da capacidade de regular as emoções é considerado uma conquista do envelhecimento, que favorece processos de adaptação e de administração dos conflitos na velhice (Fontes & Neri, 2015Fontes, A. P., & Neri, A. L. (2015). Resilience in aging: Literature review. Ciência & Saúde Coletiva, 20(5), 1475-1495. https://doi.org/10.1590/1413-81232015205.00502014
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). Tais apontamentos reforçam a necessidade de os estudos considerarem as opiniões e motivações específicas das pessoas ao terem que lidar com as adversidades ao longo da vida. A expressão de seus sentimentos e a maneira como lidam com seus problemas revelam como as pessoas idosas desenvolvem estratégias de enfrentamento (coping) (Hayman et al., 2017Hayman, K. J., Kerse, N., & Consedine, N. S. (2017). Resilience in context: The special case of advanced age, Aging & Mental Health, 21(6), 577-585. https://doi.org/10.1080/13607863.2016.1196336
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; Silveira et al., 2018Silveira, D. R., Giacomin, K. C., Dias, R. C., & Firmo, J. O. A. (2018). A tessitura da resiliência em idosos, a reinvenção de si “apesar de”. Revista Brasileira de Geriatria e Gerontologia, 21(3), 312-319. https://doi.org/10.1590/1981-22562018021.170118
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).

O impacto de emoções negativas foi amenizado com o processo de seletividade socioemocional, em que o sujeito passa a se concentrar menos em emoções negativas enquanto busca desfrutar mais intensamente de emoções positivas e prazerosas (Rabelo & Neri, 2014Rabelo, D. F., & Neri, A. L. (2014). A complexidade emocional dos relacionamentos intergeracional e a saúde mental dos idosos. Pensando Famílias, 18(1), 138-53.; Snyder & Lopez, 2009Snyder, C. R., & Lopez, S. J. (2009). Psicologia positiva: Uma abordagem científica e prática das qualidades humanas. Artmed.). Trata-se de um mecanismo psicológico que é um reflexo do amadurecimento pessoal, na medida em que se sobressai em faixas etárias mais avançadas e quando os idosos passam a compreender que lhes resta menos tempo de vida (Snyder & Lopez, 2009Snyder, C. R., & Lopez, S. J. (2009). Psicologia positiva: Uma abordagem científica e prática das qualidades humanas. Artmed.). Sobre isso, os participantes afirmaram que não dão importância a certos preconceitos e restrições que são impostos aos idosos pela sociedade:

Não escutar muito os preconceitos das pessoas, né? E procurar não se estressar. Porque o que tem de desvalorização de muita gente com o idoso, o idoso não pode ser isso, o idoso não pode ser aquilo. E ele não dando atenção nisso, pra não se estressar, ele supera (Mirtes, 68 anos).

O suporte religioso e a espiritualidade (subcategoria B.2) foram dois pilares citados frequentemente pelos idosos que os ajudam a resistir e a enfrentar os eventos estressores, conforme observado em outros estudos com idosos (Chaves & Gil, 2015Chaves, L. J., & Gil, C. A. (2015). Concepções de idosos sobre espiritualidade relacionada ao envelhecimento e qualidade de vida. Ciência & Saúde Coletiva, 20(12), 3641-3652. https://doi.org/10.1590/1413-812320152012.19062014
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; Bennett et al., 2016Bennett, K. M., Reyes-Rodriguez, M. F., Altamar, P., & Soulsby, L. K. (2016). Resilience amongst older Colombians living in poverty: An ecological approach. Journal of Cross-cultural Gerontology, 31(4), 385-407. https://doi.org/10.1007/s10823-016-9303-3
https://doi.org/10.1007/s10823-016-9303-...
; Manning et al., 2019Manning, L., Ferris, M., Rosario, C. N., Prues, M., & Bouchard, L. (2019). Spiritual resilience: Understanding the protection and promotion of well-being in the later life. Journal of Religion, Spirituality & Aging, 31(2), 168-186. https://doi.org/10.1080/15528030.2018.1532859
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; Reis & Menezes, 2017Reis, L. A., & Menezes, T. M. O. (2017). Religiosity and spirituality as resilience strategies among long-living older adults in their daily lives. Revista Brasileira de Enfermagem, 70(4), 794-799. https://doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0630
https://doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0...
; Silveira et al., 2018Silveira, D. R., Giacomin, K. C., Dias, R. C., & Firmo, J. O. A. (2018). A tessitura da resiliência em idosos, a reinvenção de si “apesar de”. Revista Brasileira de Geriatria e Gerontologia, 21(3), 312-319. https://doi.org/10.1590/1981-22562018021.170118
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). Os participantes da pesquisa acreditam que o exercício da religiosidade os fortalece nos momentos difíceis (Manning et al., 2019Manning, L., Ferris, M., Rosario, C. N., Prues, M., & Bouchard, L. (2019). Spiritual resilience: Understanding the protection and promotion of well-being in the later life. Journal of Religion, Spirituality & Aging, 31(2), 168-186. https://doi.org/10.1080/15528030.2018.1532859
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; Reis & Menezes, 2017Reis, L. A., & Menezes, T. M. O. (2017). Religiosity and spirituality as resilience strategies among long-living older adults in their daily lives. Revista Brasileira de Enfermagem, 70(4), 794-799. https://doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0630
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): “A igreja me sustenta, me dá força, que eu sou católica apostólica romana praticante, trabalho também na igreja muito. Então eu não tenho de que reclamar” (Ema, 80 anos).

A espiritualidade foi um aspecto enfatizado pelos idosos como um exercício diário, que os auxilia em seu cotidiano. Chaves e Gil (2015Chaves, L. J., & Gil, C. A. (2015). Concepções de idosos sobre espiritualidade relacionada ao envelhecimento e qualidade de vida. Ciência & Saúde Coletiva, 20(12), 3641-3652. https://doi.org/10.1590/1413-812320152012.19062014
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) observaram que a espiritualidade é uma dimensão amadurecida e aprofundada na velhice que possibilita a expressão de sentimentos positivos e funciona como um suporte constante a que os idosos recorrem na tentativa de ter paciência e sabedoria para lidar com as perdas, os declínios e o sofrimento. As orações amenizam as dores e as angústias e dão alento e mais tranquilidade, porquanto auxiliam os idosos a enfrentarem os problemas e lhes dão forças para acreditar que eles podem ser superados (Reis & Menezes, 2017Reis, L. A., & Menezes, T. M. O. (2017). Religiosity and spirituality as resilience strategies among long-living older adults in their daily lives. Revista Brasileira de Enfermagem, 70(4), 794-799. https://doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0630
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). A religiosidade auxilia no enfrentamento das inúmeras perdas e dos processos de luto na velhice (Silveira et al., 2018Silveira, D. R., Giacomin, K. C., Dias, R. C., & Firmo, J. O. A. (2018). A tessitura da resiliência em idosos, a reinvenção de si “apesar de”. Revista Brasileira de Geriatria e Gerontologia, 21(3), 312-319. https://doi.org/10.1590/1981-22562018021.170118
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), assim como auxilia as pessoas idosas a lidarem com contextos de extrema pobreza (Bennett et al., 2016Bennett, K. M., Reyes-Rodriguez, M. F., Altamar, P., & Soulsby, L. K. (2016). Resilience amongst older Colombians living in poverty: An ecological approach. Journal of Cross-cultural Gerontology, 31(4), 385-407. https://doi.org/10.1007/s10823-016-9303-3
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): “É por isso que eu enfrento tudo, eu enfrento tudo, eu não tenho medo de nada, entendeu? Eu não tenho medo de nada na vida, de nada, de nada, porque eu creio em Deus” (Mirtes, 68 anos).

A valorização de sentimentos positivos, por seu turno, contribui para que a velhice seja percebida como uma etapa da vida em que existem ganhos para serem usufruídos (Fernandes & Andrade, 2016Fernandes, J. S. G., & Andrade, M. S. (2016). Representações sociais de idosos sobre velhice. Arquivos Brasileiros de Psicologia, 68(2), 48-59.; Fontes, 2010Fontes, A. P. (2010). Resiliência, segundo o paradigma do desenvolvimento ao longo da vida (life-span). Revista Kairós, 7, 8-20.; Sousa & Rodríguez-Miranda, 2015Sousa, C. S., & Rodríguez-Miranda, F. P. (2015). Envelhecimento e educação para resiliência no idoso. Educação & Realidade, 40(1), 33-51. https://doi.org/10.1590/2175-623645562
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; Valer et al., 2015Valer, D. B., Bierhals, C. C. B. K., Aires, M., & Paskulin, L. M. G. (2015). The significance of healthy aging for older persons who participated in health education groups. Revista Brasileira de Geriatria e Gerontologia, 18(4), 809-819. https://doi.org/10.1590/1809-9823.2015.14042
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). Sentimentos como felicidade, fé, satisfação, bem-estar, otimismo, perseverança, esperança e gratidão expressam a força e o potencial humano que orientam mecanismos para o bem envelhecer (Snyder & Lopez, 2009Snyder, C. R., & Lopez, S. J. (2009). Psicologia positiva: Uma abordagem científica e prática das qualidades humanas. Artmed.; Viana, Oliveira, Rodrigues, Bastos, & Argimon, 2017Viana, S. A. R., Oliveira, C. R., Rodrigues, G. V. A., Bastos, A. S., & Argimon, I. I. L. (2017). Gratidão como fator protetivo no envelhecimento. Aletheia, 50(1-2), 132-42.) também são considerados na literatura corrente como “repertório de resiliência” (Hayman et al., 2017Hayman, K. J., Kerse, N., & Consedine, N. S. (2017). Resilience in context: The special case of advanced age, Aging & Mental Health, 21(6), 577-585. https://doi.org/10.1080/13607863.2016.1196336
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). O reconhecimento dessas virtudes representa uma valorização necessária, tendo em vista os esforços de muitos idosos que têm evitado pensamentos disruptivos e canalizado emoções negativas para fins construtivos (Araújo et al., 2016Araújo, L., Ribeiro, O., & Paúl, C. (2016). Envelhecimento bem sucedido e longevidade avançada. Actas de Gerontologia, 2(1), 1-11.).

A felicidade (subcategoria 3) expressa a valorização de estados emocionais positivos (Snyder & Lopez, 2009Snyder, C. R., & Lopez, S. J. (2009). Psicologia positiva: Uma abordagem científica e prática das qualidades humanas. Artmed.) na vivência dos idosos. Nesta pesquisa, a felicidade foi expressa em reconhecimento e agradecimento por todos os anos já vividos: “Eu que sou velho acho que quando a pessoa chega nessa idade tem que rir de felicidade, porque já passou do meio da viagem, já viveu bem, já contou muita história e tem que tá feliz disso” (Paulo, 65 anos). Para outra participante, a felicidade pode ser encontrada nas coisas simples da vida: “Valorizando as pequenas coisas que a gente tem, que conquistou” (Amara, 66 anos).

Laura caracterizou a felicidade como um ciclo em sua vida que ela não permite que seja interrompido e foi fruto também da superação de traumas vivenciados ao longo da vida: “Tentar ser feliz, não deixar que nada interrompa aquele ciclo que você está preparando pra ser, superar. Não deixar que nada interrompa esse ciclo dessa nossa felicidade, né? ... Eu superei várias coisas e hoje eu sou outra pessoa” (Laura, 74 anos).

O bom humor foi citado pelos sujeitos da pesquisa como uma estratégia para encontrar a felicidade, encarar os problemas sem sucumbir a eles e responder positivamente ao estresse diário. Nesse sentido, é possível evitar o levante de afetos negativos: “O que ajuda a superar é o humor, que eu sou uma verdadeira palhaça. Isso me ajuda muito. Eu levo tudo na brincadeira. Na hora séria, é séria” (Marta, 69 anos).

Diante de situações desafiadoras, alguns idosos ressaltaram o papel do otimismo (subcategoria B.4) em suas vidas e a importância de focar nas coisas boas: “Eu entendo assim, sabe? Que nos lugares mais críticos, mais desesperados, pode existir alguma coisa boa que muda! ... Naquele momento mais triste pode existir alguma coisa boa, que a gente se apega àquela coisa boa, que muda completamente” (Amara, 66 anos).

Observou-se que o otimismo, que envolveu o sentimento de perseverança, sustenta-se na concepção de transitoriedade dos eventos negativos, segundo a qual vale a pena acreditar que é possível avançar em direção a objetivos desejáveis e se afastar dos objetivos não desejáveis e que coisas boas acontecerão (Snyder & Lopez, 2009Snyder, C. R., & Lopez, S. J. (2009). Psicologia positiva: Uma abordagem científica e prática das qualidades humanas. Artmed.): “Sou otimista e perseverante. Quando eu começo uma coisa, tenho que chegar no final ... Não importa o que vai acontecer lá. Importa que eu chegue... . Eu procuro sempre ver o lado bom” (Fátima, 63 anos).

O sentimento de controle pessoal, característico da autoeficácia (subcategoria B.5), esteve presente no modo como os idosos se posicionam em relação às adversidades da vida. Carmem defendeu a importância da autoconfiança e explicou que é preciso acreditar no próprio potencial para resolver as dificuldades como forma de alcançar os objetivos e superar as dificuldades que surgirem: “Acreditar nos seus objetivos, ter fé que vai conseguir vencer cada dificuldade, porque a gente não encontra nada fácil. Tem que acreditar em você mesmo. Você mesmo tem que ter fé e vou lutar pelo meu objetivo” (Carmem, 78 anos).

Alguns relatos dos idosos denotam a flexibilidade no uso de estratégias e a crença de que é possível ultrapassar determinadas dificuldades depois de tentativas sucessivas. Isso caracteriza padrões de comportamento proativo, peculiares da autoeficácia (Cruz, Navarro-Pardo, Pocinho, Anjos, & Jacob, 2017Cruz, C., Navarro-Pardo, E., Pocinho, R., Anjos, V. N., & Jacob, L. (2017). A auto-eficácia na adaptação aos desafios do envelhecimento. Revista Lusófona de Educação, 38, 181-194.; Fontes, 2010Fontes, A. P. (2010). Resiliência, segundo o paradigma do desenvolvimento ao longo da vida (life-span). Revista Kairós, 7, 8-20.; Pesce et al., 2005Pesce, R. P., Assis, S. G., Avanci, J. Q., Santos, N. C., Malaquias, J. V., & Carvalhaes, R. (2005). Adaptação transcultural, confiabilidade e validade da escala de resiliência. Cadernos de Saúde Pública, 21(2), 436-448. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2005000200010
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; Hayman et al., 2017Hayman, K. J., Kerse, N., & Consedine, N. S. (2017). Resilience in context: The special case of advanced age, Aging & Mental Health, 21(6), 577-585. https://doi.org/10.1080/13607863.2016.1196336
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): “O que posso melhorar aqui? O que posso resolver aqui? E isso é difícil, mas não é impossível. Então a gente não está aqui falando de coisas fáceis, é difícil, mas não é impossível” (Sérgio, 67 anos). Cruz et al. (2017Cruz, C., Navarro-Pardo, E., Pocinho, R., Anjos, V. N., & Jacob, L. (2017). A auto-eficácia na adaptação aos desafios do envelhecimento. Revista Lusófona de Educação, 38, 181-194.) tecem considerações sobre as contribuições da autoeficácia para manter a funcionalidade e a capacidade cognitiva em idosos. Esse construto pode ser considerado um indicador de envelhecimento ativo, com acréscimos em seu bem-estar. Hayman et al. (2017Hayman, K. J., Kerse, N., & Consedine, N. S. (2017). Resilience in context: The special case of advanced age, Aging & Mental Health, 21(6), 577-585. https://doi.org/10.1080/13607863.2016.1196336
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) observaram que a autoeficácia é um domínio importante em idosos que podem se utilizar de repertórios de enfrentamento empregados ao longo da vida para reduzir os impactos advindos de conflitos presentes.

O altruísmo (subcategoria B.6) é um comportamento por meio do qual se podem beneficiar outras pessoas com um auxílio material, prestar-lhes cuidados ou manter alguma atividade beneficente voluntária (Snyder & Lopez, 2009Snyder, C. R., & Lopez, S. J. (2009). Psicologia positiva: Uma abordagem científica e prática das qualidades humanas. Artmed.). Nesta pesquisa, os idosos expressaram reflexões sobre a espiritualidade, sobre a transitoriedade da vida e sobre os modos de externar o amor ao próximo: “Sempre ajudar o próximo [...] Não olhar só pra gente, não olhar para nós mesmos, olhar pra cima, pro alto, porque a nossa vida aqui é tão passageira” (Ema, 80 anos).

Observou-se que o altruísmo tem sido motivado pelos ganhos pessoais que os participantes conseguem ao se sentirem felizes e satisfeitos: “Eu me sinto feliz quando ajudo sempre uma pessoa. Uma pessoa está em dificuldade, eu estou ali, pronta pra ajudar ... é aquela maneira da gente se sentir feliz é quando a gente tem paz no coração da gente” (Fátima, 63 anos). Isso os auxilia a manter um sentido na vida: “Eu acredito pra maioria daqui que a gente veio pra isso, pra ajudar. Resolve, é feliz” (Fátima, 63 anos).

O fato de ter superado muitas dificuldades e de poder estar vivo para testemunhar suas conquistas e desafios foi expresso pelo sentimento de gratidão (subcategoria B.7). Alcançar a velhice foi motivo para muitos dos idosos serem gratos: “Estou completando mais uma data, então quer dizer que vou ficar triste porque tá aumentando? Não, eu estou contente, estou agradecida... . Estou feliz da vida porque vivi muito e meu pai viveu 100 anos, minha mãe 100 anos” (Carmem, 78 anos). Essa compreensão representa o movimento de reflexão dos idosos acerca de sua existência, em que são feitas estimativas sobre a própria vida. A gratidão pode auxiliar os idosos a ressignificarem lembranças difíceis e a fortalecerem memórias e eventos positivos, além de reduzir a ansiedade e a depressão, com consequente melhora na qualidade de vida (Viana et al., 2017Viana, S. A. R., Oliveira, C. R., Rodrigues, G. V. A., Bastos, A. S., & Argimon, I. I. L. (2017). Gratidão como fator protetivo no envelhecimento. Aletheia, 50(1-2), 132-42.).

O sentimento de gratidão, conforme aludido na literatura, resultou também em resposta ao enfrentamento de adversidades que trouxeram aprendizagem e proporcionaram mais força e autoconfiança (Snyder & Lopez, 2009Snyder, C. R., & Lopez, S. J. (2009). Psicologia positiva: Uma abordagem científica e prática das qualidades humanas. Artmed.) para lidar com o envelhecimento: “Aprendi muita coisa assim devido ao que tive que passar, né? Então eu aprendi muitas coisas e fiquei mais forte, agradeço por isso. Hoje eu sou mais forte, acho que era necessário eu passar por tudo o que passei” (Amara, 66 anos).

Nas subcategorias, evidenciaram-se vários domínios da Psicologia Positiva que pretende contribuir com o florescimento e funcionamento saudável das pessoas; para isso, reserva-se ao estudo dos atributos que levam os sujeitos a enfrentar as situações adversas da vida e, ainda assim, referirem processos exitosos de desenvolvimento e crescimento pessoal (Paludo & Koller, 2007Paludo, S. S., & Koller, S. H. (2007). Psicologia positiva: Uma nova abordagem para antigas questões. Paidéia, 17(36), 9-20. https://doi.org/10.1590/S0103-863X2007000100002
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; Snyder & Lopez, 2009Snyder, C. R., & Lopez, S. J. (2009). Psicologia positiva: Uma abordagem científica e prática das qualidades humanas. Artmed.).

Processos adaptativos para uma velhice bem-sucedida

Essa categoria abrange aspectos da experiência de vida dos idosos que os ajudam a se adaptar às mudanças que ocorrem com o avanço da idade. Nessa categoria, os participantes assimilaram propriamente sua trajetória de vida (agora marcada pela velhice) sobre como a experiência adquirida ao longo dos anos possibilitou mudanças na forma de enfrentar as adversidades.

Na subcategoria “Manter-se ativo” (subcategoria C.1), valoriza-se a manutenção de uma vida ativa, em que os participantes procuram estar ocupados, em grande parte do tempo, com atividades diversas: “Não ficar parado, ter sempre uma atividade, sempre lutando, olha, eu trabalho com música, eu fiz música semana passada, eu vou tocar o show pra vocês daqui a pouco, é isso que eu preciso fazer” (Júlio, 81 anos).

O anseio por manter uma vida ativa na velhice é uma constante, quando se trata das atitudes, das representações e das concepções sobre alcançar a idade avançada (Araújo et al., 2016Araújo, L., Ribeiro, O., & Paúl, C. (2016). Envelhecimento bem sucedido e longevidade avançada. Actas de Gerontologia, 2(1), 1-11.; Araújo & Silva, 2017Araújo, L. F., & Silva, R. J. S. (2017). Resilience and aging: A comparative study among elderly people of different social classes. Psicologia em Estudo, 22(2), 141-152. https://doi.org/10.4025/psicolestud.v22i2.32437
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; Fernandes & Andrade, 2016Fernandes, J. S. G., & Andrade, M. S. (2016). Representações sociais de idosos sobre velhice. Arquivos Brasileiros de Psicologia, 68(2), 48-59.; Valer et al., 2015Valer, D. B., Bierhals, C. C. B. K., Aires, M., & Paskulin, L. M. G. (2015). The significance of healthy aging for older persons who participated in health education groups. Revista Brasileira de Geriatria e Gerontologia, 18(4), 809-819. https://doi.org/10.1590/1809-9823.2015.14042
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). Ser “ativo” excede a noção de capacidade física para o trabalho e remete à participação nas esferas social, econômica, cultural, educacional e espiritual (Araújo et al., 2016Araújo, L., Ribeiro, O., & Paúl, C. (2016). Envelhecimento bem sucedido e longevidade avançada. Actas de Gerontologia, 2(1), 1-11.; Carpentieri et al., 2017Carpentieri, J. D., Elliott, J., Brett, C. E., & Deary, I. J. (2017). Adapting to aging: Older people talk about their use of selection, optimization, and compensation to maximize well-being in the context of physical decline. The Journals of Gerontology: Series B, Psychological Sciences and Social Sciences, 72(2), 351-361. https://doi.org/10.1093/geronb/gbw132
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).

Os discursos revelaram que é preciso manter projetos e metas na vida e expandir os repertórios de atividades para se alcançar uma vida autônoma e independente, com satisfação e bem-estar, como previsto na perspectiva de um envelhecimento bem-sucedido (Araújo et al., 2016Araújo, L., Ribeiro, O., & Paúl, C. (2016). Envelhecimento bem sucedido e longevidade avançada. Actas de Gerontologia, 2(1), 1-11.; Teixeira & Neri, 2008Teixeira, I. N. D’A. O., & Neri, A. L. (2008). Envelhecimento bem-sucedido: Uma meta para o curso da vida. Psicologia USP, 19(1), 81-94. https://doi.org/10.1590/S0103-65642008000100010
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). A independência para realizar as atividades do dia a dia foi arrazoada com orgulho e satisfação pelos idosos que não enxergam a idade avançada como um impeditivo da sua autonomia: “Eu tenho 79 anos, eu lavo casa, varro casa. Ando sozinha, minha menina ... quando ela vem se levantar eu já tenho lavado roupa, tá estendida, já tem comida no fogo, café na mesa” (Goreti, 79 anos).

Além das atividades rotineiras com os afazeres de casa e os cuidados com a família, o dia a dia de muitos dos participantes também é preenchido com atividades em grupos de convivência, entre outros espaços que possibilitam a integração social: “Sou feliz, eu lido com as minhas obrigações, levo marido pra médico, vou pra hidroginástica, a gente faz coral lá na UFCG, a gente faz coral, a gente vai pra Uama, eu procuro ocupar meu tempo” (Laura, 74 anos).

A busca por dispositivos psicossociais públicos, por meio dos quais se desenvolvem atividades de lazer, contribui para que os idosos se sintam incluídos e felizes em sua comunidade, o que se configura como um sentido positivo à velhice (Araújo & Silva, 2017Araújo, L. F., & Silva, R. J. S. (2017). Resilience and aging: A comparative study among elderly people of different social classes. Psicologia em Estudo, 22(2), 141-152. https://doi.org/10.4025/psicolestud.v22i2.32437
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; Valer et al., 2015Valer, D. B., Bierhals, C. C. B. K., Aires, M., & Paskulin, L. M. G. (2015). The significance of healthy aging for older persons who participated in health education groups. Revista Brasileira de Geriatria e Gerontologia, 18(4), 809-819. https://doi.org/10.1590/1809-9823.2015.14042
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). Além disso, o fato de os idosos manterem uma vida ativa os incitou a cuidarem mais da saúde: “Todos os dias eu caminho, 5h da manhã eu estou caminhando, 6h eu chego em casa, tomo um banho, tomo minha vitamina e continuo o meu dia” (Fátima, 63 anos). Percebe-se que a participação em atividades da comunidade - atividades socioculturais, centros religiosos e atividades em saúde - revela um fator potencialmente protetor para idosos que vivem em contextos de maior vulnerabilidade social, pois idosos pertencentes a classes socioeconômicas mais baixas recorrem mais frequentemente a essas estratégias (Araújo & Silva, 2017Araújo, L. F., & Silva, R. J. S. (2017). Resilience and aging: A comparative study among elderly people of different social classes. Psicologia em Estudo, 22(2), 141-152. https://doi.org/10.4025/psicolestud.v22i2.32437
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; Bennett et al., 2016Bennett, K. M., Reyes-Rodriguez, M. F., Altamar, P., & Soulsby, L. K. (2016). Resilience amongst older Colombians living in poverty: An ecological approach. Journal of Cross-cultural Gerontology, 31(4), 385-407. https://doi.org/10.1007/s10823-016-9303-3
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, Kok et al., 2018Kok, A. A. L., Nes, F. V., Deeg, J. H. D., Widdershoven, G., & Huisman, M. (2018). “Tough times have become good times”: Resilience in older adults with a low socioeconomic position. The Gerontologist, 58(5), 843-852. https://doi.org/10.1093/geront/gny007
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).

Os idosos têm se adaptado às mudanças decorrentes do envelhecimento, ao se depararem com algumas limitações e doenças (subcategoria C.2). Sobre isso, Marta contou que assume as restrições e os cuidados que precisa ter com sua mobilidade: “Então eu sou muito cautelosa em algumas coisas ... Eu já sei que a minha idade não é a de um jovem, não é como vocês, eu sei que a minha mobilidade não é a mobilidade de vocês” (Marta, 69 anos).

Aprender a conviver com os problemas de saúde, com as limitações e com as dores decorrentes deles contribuiu para que os idosos mantivessem uma autoavaliação de saúde positiva, em que são ponderadas as dificuldades inerentes ao convívio com determinadas doenças: “Então eu vivo bem na maneira que posso, tenho uma artrite, problemas no joelho, vou fazer o quê? Pergunto ao médico - ‘tem jeito?’, ele ‘tem não’, então eu aprendo a conviver com isso” (Sérgio, 67 anos).

A aceitação da velhice (subcategoria C.3) contribui para que os idosos valorizem sua experiência pessoal de envelhecimento e reconheçam suas potencialidades, apesar dos desafios quanto às concepções na sociedade que oscilam entre a valorização e a desvalorização da pessoa idosa (Brito, Camargo, & Castro, 2017Brito, A. M. M., Camargo, B. V., & Castro, A. (2017). Representações sociais de velhice e boa velhice entre idosos e sua rede social. Revista de Psicologia da IMED, 9(1), 5-21.). Ema relatou como lida com a categoria social da velhice e reflete sobre os ganhos adquiridos na idade avançada: “Não se incomode com nome de velha, de idoso, porque hoje já colocaram maturidade no meio, uns apelidos... . Pra mim a melhor coisa que me aconteceu foi a minha velhice, porque eu tenho qualidade de vida” (Ema, 80 anos).

Receber o reconhecimento da sociedade, ser respeitado e visualizar o cumprimento dos direitos que competem aos idosos contribuíram para elevar a autoestima e fortalecer o sentimento de segurança: “O meu é o apoio da sociedade, que ela está se conscientizando de que o idoso é importante e que a gente tem segurança, você chega se conscientiza dos seus direitos, dos seus deveres também” (Laura, 74 anos).

Percebe-se que a conquista inegável de mais longevidade da população assinala a urgência de positivar a identidade do idoso. Esse processo é pautado, segundo Minayo (2011Minayo, M. C. S. (2011). Envelhecimento demográfico e lugar do idoso no ciclo da vida brasileira. In B. Trench & T. E. C. Rosa (Orgs.), Nós e o Outro: Envelhecimento, reflexões, práticas e pesquisa (pp. 7-15). Instituto de Saúde.), no reconhecimento de que é possível aproveitar a vida na idade avançada ao mesmo tempo em que se deve prover as necessidades de cuidado e de atenção com os idosos. Trata-se de um movimento que visa substituir a ideia que ainda vigora de velhice associada a doença por uma nova visão, a de um tempo em que se pode optar sobre os rumos que se quer tomar na vida, a partir de uma síntese criadora (Minayo, 2011Minayo, M. C. S. (2011). Envelhecimento demográfico e lugar do idoso no ciclo da vida brasileira. In B. Trench & T. E. C. Rosa (Orgs.), Nós e o Outro: Envelhecimento, reflexões, práticas e pesquisa (pp. 7-15). Instituto de Saúde.).

O sentimento de liberdade (subcategoria C.4) foi exaltado pelos participantes, que afirmaram que essa é uma importante conquista adquirida na velhice. Laura enfatizou que se sente dona de sua vida, em que a liberdade de ir e vir e de expressar suas vontades reduz as tensões advindas com a velhice:

Envelhecer pra mim está sendo uma fase da vida, eu não vou dizer que é espetacular, mas eu estou me sentindo mais dona de mim. Eu quero dar banana pra um, dou, tô nem aí. Quero andar sozinha, saio. Quero conversar com um, converso, eu não vou ofender, dizer malcriação, mas vivo livre, pense numa liberdade (Laura, 74 anos).

As perdas que acompanham o envelhecimento também dizem respeito ao rompimento com algumas obrigações sociais. Essas perdas podem resultar em ganhos quando se muda de postura para uma nova realidade. Attias-Donfut (2004Attias-Donfut, C. (2004). Sexo e envelhecimento. In C. E. Peixoto (Org.), Família e envelhecimento (pp. 89-105). FGV.) fala sobre a “liberdade geracional” expressa com mais frequência pelas mulheres idosas, que se beneficiam da liberação de normas comportamentais sexuadas. Assim, as obrigações de dona de casa cedem espaço para que elas tenham mais tempo livre e mais autonomia para investir em seu crescimento pessoal ou em atividades que lhes proporcionem mais satisfação.

Não ter mais a responsabilidade de criar os filhos e poder ocupar o tempo livre com passeios, viagens e outras atividades prazerosas acentuam a valorização da liberdade adquirida na velhice: “... minha vida hoje é bem melhor do que quando eu era solteira, de tudo, quando eu era solteira eu não tinha a chance que eu tenho hoje de sair, de passear, de viajar” (Valéria, 65 anos).

Na subcategoria C.5, amadurecimento, os idosos apresentaram reflexões sobre a vivência da velhice, as necessidades de se adaptar a novas situações, de ter equilíbrio, de ajustamento pessoal e de meditar sobre a finitude: “O importante pra você envelhecer bem, é se cuidar. É conhecer a necessidade da vida, a gente se equilibrar, tanto em alimentação, em vida ... Nasceu, se quiser viver se cuide e seja feliz velho, pra morrer” (Paulo, 65 anos).

A reflexão sobre as experiências de vida acumuladas e a rememoração de fatos e de procedimentos em que ocorrem simultaneamente novas associações e atualizações de padrões de comportamento correspondem ao saber prático/sabedoria que muitos idosos referem ao meditar sobre o tempo vivido (Mendes, 2017Mendes, F. (2017). Sabedoria e envelhecimento: A arte de sobreviver em diferentes mundos. In A. O. Silva & B. V. Camargo (Orgs.), Representações sociais do envelhecimento e da saúde (pp. 84-99). EDUFRN.). Nesse ponto, é fundamental que o sujeito idoso reconheça a experiência que adquiriu com os anos vividos (Minayo, 2011Minayo, M. C. S. (2011). Envelhecimento demográfico e lugar do idoso no ciclo da vida brasileira. In B. Trench & T. E. C. Rosa (Orgs.), Nós e o Outro: Envelhecimento, reflexões, práticas e pesquisa (pp. 7-15). Instituto de Saúde.) e amadureça por meio do autoconhecimento e da aceitação, que são geradores de formas positivas de apreciar a vida no encontro com a velhice (Fontes & Neri, 2015Fontes, A. P., & Neri, A. L. (2015). Resilience in aging: Literature review. Ciência & Saúde Coletiva, 20(5), 1475-1495. https://doi.org/10.1590/1413-81232015205.00502014
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).

A velhice foi propícia para os sujeitos da pesquisa trabalharem os traumas vivenciados em períodos anteriores da vida. Há 39 anos, Laura perdeu uma filha que cometeu suicídio. A dor e o inconformismo por causa dessa perda a perseguiram durante muitos anos. Depois de ter encontrado espaço de acolhida em grupos de convivência e de ter podido refletir melhor sobre tal evento, ela expressou um alívio por ter conseguido a oportunidade de ressignificar essa perda: “Olha, esse negócio da minha menina aconteceu em setenta e nove [1979] e eu vim me conscientizar da situação agora mais ou menos uns cinco anos atrás, mais ou menos” (Laura, 74 anos).

Esse processo pode ser explicado pelo fato de os idosos, comumente, fazerem movimentos de reflexão sobre a própria história (Cyrulnik, 2003Cyrulnik, B. (2003). Resiliência: Essa inaudita capacidade de construção humana. Instituto Piaget.). Em suas narrativas, os idosos podem repensar, contar novamente, tentar compreender e elaborar novos sentidos para suas experiências. Esse movimento é estimulado a partir do vínculo e do sentido. Não se trata de uma narrativa solitária; ela carece de um ou mais interlocutores para auxiliarem os sujeitos a encontrar as vias de elaboração de seus traumas e conflitos (Cyrulnik & Cabral, 2015Cyrulnik, B., & Cabral, S. (2015). Resiliência: Ações pela reinstauração de um futuro. In R. M. Coimbra & N. A. Morais, A resiliência em questão: Perspectivas teóricas, pesquisa e intervenção (pp. 19-35). Artmed.).

Além disso, as formas de enfrentar as adversidades na velhice também são amadurecidas em vista dos anos vividos (Fontes, 2010Fontes, A. P. (2010). Resiliência, segundo o paradigma do desenvolvimento ao longo da vida (life-span). Revista Kairós, 7, 8-20.; Fontes & Neri, 2015Fontes, A. P., & Neri, A. L. (2015). Resilience in aging: Literature review. Ciência & Saúde Coletiva, 20(5), 1475-1495. https://doi.org/10.1590/1413-81232015205.00502014
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). Sérgio relatou que a velhice o alertou para a necessidade de rever alguns de seus comportamentos anteriores e expandir seu repertório de habilidades interpessoais. Para ele, a velhice é o tempo da resiliência, pois considera que o amadurecimento pessoal é um contributo importante nessa fase do desenvolvimento: “Eu acho que a velhice aproxima você, é o tempo da resiliência, sabe? De você aprender a conviver com aquilo, de você aprender a viver com as suas limitações ... qualquer um tem o seu problema, você vive bem” (Sérgio, 67 anos).

Por fim, a geratividade (subcategoria C.6) expõe as motivações dos idosos em atividades que visam sua continuidade e existência (Neri, 2005Neri, A. L. (2005). Palavras-chave em gerontologia. Alínea.). Assim, uma participante expressou a relação entre as diferentes gerações com que ela conviveu e demonstrou que percebe sua vida articulada às de outras pessoas de seu convívio: “A experiência que eu tenho com 82 anos é essa. Papai passou pra mim, meu avô passou pra mim ... Eu acho que o viver da gente, tá no de outras pessoas, filho, neto, comunidade” (Carmem, 78 anos).

Os idosos se mostraram motivados a repassar para as gerações mais novas seus conhecimentos e valores adquiridos ao longo dos anos. Assim, conforme discutido por Erikson (1998Erikson, E. H. (1998). O ciclo da vida completo. Artmed.), os idosos se preocupam em orientar as novas gerações e os sentimentos de pertença e de utilidade são fortalecidos, pois se reconhece toda uma bagagem cultural acumulada durante os anos. Ao se lembrar da perda dos pais, Goreti refletiu sobre o sentido da vida através do apoio aos filhos e aos netos transmitindo seus conhecimentos: “... a gente não é sozinho no mundo, tem os filhos, tem os netos, e eles precisam dos conselhos da gente, né, sempre confiam” (Goreti, 79 anos).

Ao cogitar sobre a precariedade de valores que os jovens enfrentam na atualidade, os idosos sinalizaram sua preocupação e empenho em ser suporte para as novas gerações: “Esses novos de hoje não pensam e o jeito que tem é vir saber dos velhos, e os velhos têm que ajudar os jovens” (Goreti, 79 anos). A transmissão, comum nos processos de geratividade (Neri, 2005Neri, A. L. (2005). Palavras-chave em gerontologia. Alínea.), também foi relativa ao ato de repassar para as novas gerações uma nova imagem acerca da velhice, em que o idoso não deve reduzir seus campos de ação e de interação social. Sobre isso, Valéria assevera que os idosos contemporâneos promoveram uma mudança nas representações das novas formas de envelhecer:

Um dia minha filha estava conversando com as amigas e eu ouvi... . Ela disse que queria envelhecer como nós dois estamos envelhecendo. Então isso é bom... . Então, ela dizia: “mãe dizia que a minha bisa, quando tinha 50 anos, ela colocava logo um xalezinho e ia fazer crochê na cadeira de balanço”. Hoje você não vê mais isso. Muito interessante isso aí, né? Eu sou feliz. Estou envelhecendo bem... . Estamos preparando o terreno pra vocês (Valéria, 65 anos).

Embora o envelhecimento e a velhice ainda sejam vistos na sociedade com conotações de inatividade e de desvalorização (Brito et al., 2017Brito, A. M. M., Camargo, B. V., & Castro, A. (2017). Representações sociais de velhice e boa velhice entre idosos e sua rede social. Revista de Psicologia da IMED, 9(1), 5-21.) e com crenças e valores negativos (Fernandes & Andrade, 2016Fernandes, J. S. G., & Andrade, M. S. (2016). Representações sociais de idosos sobre velhice. Arquivos Brasileiros de Psicologia, 68(2), 48-59.), os modos de enfrentar os desafios vivenciados com a longevidade avançada poderão reverter esses representações para os sujeitos que passam a experimentar propriamente os desafios de envelhecer e de viver a velhice com possíveis testemunhos de resiliência. Minayo (2011Minayo, M. C. S. (2011). Envelhecimento demográfico e lugar do idoso no ciclo da vida brasileira. In B. Trench & T. E. C. Rosa (Orgs.), Nós e o Outro: Envelhecimento, reflexões, práticas e pesquisa (pp. 7-15). Instituto de Saúde.) assevera que, socialmente, estão lançados os desafios para reverter o quadro em que a pessoa idosa é inferiorizada na cultura brasileira e estereotipada e mitificada. Não se pode negar o papel real dos idosos na conjuntura atual do país, em termos de contribuição econômica, social e cultural. Além disso, a autora discute que esses avanços são frutos de uma construção ao longo da vida: “Ninguém se torna um idoso respeitável, saudável e sábio se não construiu esses valores palmo a palmo” (p. 11).

Considerações finais

A pesquisa pautou-se na ideia de que o envelhecimento representa um processo heterogêneo e singular e de que o crescimento pessoal não declina com o avançar da idade. A experiência da velhice, por seu turno, foi apresentada com foco nas conquistas que, ao serem devidamente reconhecidas pelos sujeitos idosos, favoreceram construções positivas acerca do envelhecer e representaram a aquisição de processos de resiliência.

Os fatores de proteção, cujas funções voltaram-se à superação dos processos de risco, contribuíram para promover resiliência, bem-estar e satisfação pessoal na velhice. Os discursos revelaram que a rede de suporte social, composta de amigos, de familiares e de grupos, é fundamental para que as dificuldades resultantes de problemas de saúde e advindas do envelhecimento progressivo sejam atenuadas, ajustadas e passíveis de ressignificação. O companheirismo e a reciprocidade que ocorreram na relação com os familiares resultaram em interações positivas que reforçam a importância da convivência familiar pautada na afetividade e no equilíbrio das trocas estabelecidas.

A participação em grupos de convivência sobrepuja-se entre os espaços de integração social, age como facilitadora da expressão de sentimentos, participa da mediação e da elaboração de conflitos e fomenta o sentimento de valorização do idoso com consequente elevação da autoestima e da autoeficácia fundamentais para a promoção da resiliência.

As emoções positivas e as tentativas de intensificar essas experiências emocionais para enfrentar as vicissitudes que circundam o processo de envelhecimento e da velhice proporcionaram um desenvolvimento saudável e resiliente aos participantes, que debateram nos grupos focais que a ênfase na felicidade, na espiritualidade, no otimismo e na gratidão reflete a experiência dos muitos anos vividos e que antes as oportunidades de amadurecer e de refletir sobre si mesmos não se faziam tão presentes quanto na maturidade. A velhice, então, abarcou um período de maturação de suas virtudes e valores, com a intenção de transmitir os ganhos adquiridos para a posteridade.

Os repertórios de enfrentamento compartilhados nos encontros indicaram a resiliência como resistência, como construção interpessoal e intersubjetiva, permeada de vínculos, com adaptação às mudanças geradas em uma nova etapa do ciclo da vida e com saídas subjetivas traçadas conforme a valorização e a intensificação de qualidades humanas.

Espera-se que os achados possam auxiliar outros pesquisadores a criarem medidas para avaliar a resiliência em idosos e elaborar políticas públicas e ações para prestar os cuidados com a população idosa que carece de práticas resolutivas. O estudo mostrou que a resiliência é um importante construto pautado em uma concepção dialética de manejo das adversidades ao longo do ciclo de desenvolvimento, cujo foco deve estar na elaboração de estratégias concretas para que os idosos possam enfrentar as dificuldades próprias dessa fase, que sejam condizentes com o contexto sociocultural e ambiental em que estão inseridos.

Finalmente, sugere-se que sejam feitas outras pesquisas que visem avaliar a interação de fatores de risco e de proteção, especialmente de medidas positivas, no contexto do envelhecimento. A respeito do caráter dinâmico da resiliência, recomenda-se que sejam feitos estudos longitudinais e com metodologias de intervenção que possam analisar o desenvolvimento de repertórios resilientes em idosos situados em diferentes contextos.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Fev 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    19 Fev 2020
  • Aceito
    04 Maio 2021
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