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Gênero e Psicologia: Experimentações Discursivas na Produção do Conhecimento sobre a Homossexualidade

Gender and Psychology: Discursive Experimentation in the Production of Knowledge about Homosexuality

Género y Psicología: Experimentaciones Discursivas en la Producción del Conocimiento sobre la Homosexualidad

Resumo

O objetivo deste texto é problematizar a conceituação de gênero no campo da Psicologia, em articulação com a homossexualidade e ancorada pela epistemologia feminista decolonial em nossa ciência e profissão. Para tanto, este ensaio crítico se dará a partir de uma discussão teórica, utilizando elementos de caráter literário e estéticos enquanto recursos para a produção do conhecimento em Psicologia. Também considerarei algumas singularidades e inquietações quanto às elaborações sobre gênero e homossexualidade, a partir de estudos em nossa área. Esse debate foi proposto diante da avaliação de que há certa invisibilidade e silenciamento sobre a homossexualidade nos contextos interioranos, inclusive no âmbito da Psicologia, que tem atuado sob uma perspectiva universalista e que não tem se dedicado a entender os processos de subjetivação de homossexualidades nesse lugar. Pretende-se estimular o estudo acadêmico dessas questões, apresentando elementos em torno de gênero, sexualidade, homossexualidade e alguns parâmetros literários a respeito da construção de narrativas, considerando problematizações prévias em Psicologia sobre esse dilema. Abordamos as subjetivações de gênero e homossexualidade, como forma de estimular o debate epistemológico que possibilite mais pesquisas, assim como promover avanços em processos formativos de futuras psicólogas e futuros psicólogos, de forma contextualizada e gendrada.

Palavras-chave:
Gênero; Feminismo; Homossexualidade; Decolonialidade; Literatura

Abstract

This text aims to problematize the conceptualization of gender in the field of Psychology, in articulation with homosexuality and anchored by the decolonial feminist epistemology in our science and profession. For this, we will base this critical essay on a theoretical discussion, using elements of literary and aesthetic character as resources to produce knowledge in Psychology. We will also consider some singularities and concerns regarding the elaborations on gender and homosexuality, based on studies in our area. This debate was proposed before the assessment that homosexuality is partially invisiblized and silenced in the interior contexts, including in the field of Psychology, which has acted from a universalist perspective and which has neglected understanding the subjectivation processes of homosexualities in this place. The idea is to stimulate the academic study of these issues, presenting elements around gender, sexuality, homosexuality, and some literary parameters regarding the construction of narratives, considering previous problematizations in Psychology about this dilemma. We approach the subjectivations of gender and homosexuality to stimulate the epistemological debate that allows more research, and promote advances in the formative processes of future psychologists, in a contextualized and gendered way.

Keywords:
Gender; Feminism; Homosexuality; Decoloniality; Literature

Resumen

El objetivo de este texto es problematizar la conceptualización de género en el campo de la Psicología, en articulación con la homosexualidad, anclada por la epistemología feminista decolonial en nuestra ciencia y profesión. Para ello, este ensayo crítico parte de una discusión teórica, utilizando elementos de carácter literario y estético como recursos para la producción del conocimiento en Psicología. También considera algunas singularidades e inquietudes en cuanto a las elaboraciones sobre género y homosexualidad a partir de estudios en nuestra área. Se propone este debate ante la evaluación de que hay cierta invisibilidad y silenciamiento sobre la homosexualidad en los contextos interioranos, incluso en el ámbito de la Psicología, que ha actuado bajo una perspectiva universalista y que no ha dedicado a entender los procesos de subjetivación de homosexualidades en ese lugar. La idea es estimular el estudio académico de esas cuestiones, presentando elementos sobre género, sexualidad, homosexualidad y algunos parámetros literarios respecto a la construcción de narrativas, considerando problematizaciones previas en Psicología sobre ese dilema. Se abordan las subjetivaciones de género y homosexualidad como forma de estimular el debate epistemológico que posibilite más investigaciones, así como también promueva avances en procesos formativos de futuras psicólogas y futuros psicólogos, de forma contextualizada y gendrada.

Palabras clave:
Género; Feminismo; Homosexualidad; Decolonialidad; Literatura

Introdução

Este texto pretende problematizar a conceituação de gênero no campo da Psicologia, considerando a homossexualidade e ancorada pela epistemologia feminista decolonial em nossa ciência e profissão. Para tanto, este ensaio crítico se dará a partir de uma discussão teórica, utilizando elementos de caráter literário e estéticos enquanto recursos para a produção do conhecimento em Psicologia. Também serão consideradas algumas singularidades e inquietações quanto às elaborações sobre gênero e homossexualidade em nossa área.

Meu interesse em discutir essas questões parte do fato de este autor que vos escreve ser negro, homossexual, servidor público, viver no Nordeste e atuar como professor de universidade pública interiorizada na formação de psicólogas e psicólogos, com graduandas e graduandos majoritariamente pobres. Diante disso, tenho focado meus interesses de pesquisa na identificação e análise das formas de resistência de jovens homens homossexuais rurais em seus contextos comunitários e em escolas no e do campo.

Tenho circulado por esse contexto há alguns anos e me chama à atenção o foco dado ao crescente debate sobre gênero em torno das mobilizações de mulheres no semiárido, com críticas ao sexismo. Também tem sido alvo de meus questionamentos o fato de não termos uma Psicologia de fato voltada para o contexto rural. Diante dos objetivos deste texto, não será possível aprofundar aqui este debate. Mas considero que há avanços na atuação, formação e pesquisa em Psicologia, nos contextos rurais (Leite, Macedo, Dimenstein, & Dantas, 2013Leite, J. F., Macedo, J. P. S., Dimenstein, M., & Dantas, C. (2013). A formação em Psicologia para a atuação em contextos rurais. In J. F. Leite & M. Dimenstein (Orgs.), Psicologia e contextos rurais (pp. 27-55). EDUFRN.) e que, apesar de ainda ser incipiente, tem crescido a movimentação nesse sentido, por conta do avanço das políticas sociais e a inserção profissional nesses espaços, assim como tivemos na expansão das universidades públicas.

Porém, tenho percebido a partir de minha atuação docente, no ensino, na pesquisa e na extensão, que há certa invisibilidade e silenciamento em torno de gênero e da homossexualidade nesse contexto. Diante disso, tenho interesse em evidenciar avanços e tensões em torno dessa questão, auxiliar na afirmação de homossexualidades no agreste e sertão de Alagoas, fomentar esse debate na academia, na produção de conhecimento em Psicologia e com os jovens homossexuais em seus territórios.

Nesse sentido, tenho abordado estudos sobre a influência dos padrões heteronormativos no âmbito escolar, realizados no contexto da Psicologia Escolar e Educacional, e considerado também pressupostos atuais no âmbito da educação do campo, que tem começado a se situar com maior afinco nas questões de gênero e sexualidade nesse território (Oliveira, 2013Oliveira, M. V. L. (2013). Inclusão da diversidade no currículo das escolas do semiárido. In A. P. M. Duarte & V. M. O. Carneiro (Orgs.), Contribuições para a construção de um currículo contextualizado para o semiárido (pp. 97-120). MOC; Curviana.). A partir dessa contextualização, tenho questionado as formas de resistência exercidas por jovens homens homossexuais rurais em escolas desse contexto, e que impactos essas resistências têm para a escola e para eles.

Na busca sobre estudos que tratassem sobre a homossexualidade em nosso contexto rural, defrontei-me com os escritos de Ferreira (2006aFerreira, P. R. S. (2006a). Entre elas: Afetividade versus complementaridade. In E. Woortmann, R. Menache & B. Heredia (Orgs.), Margarida Alves: Coletânea sobre estudos rurais e gênero (pp. 99-121). MDA, IICA., 2006bFerreira, P. R. S. (2006b). Os afectos mal-ditos: O indizível das sexualidades camponesas [Dissertação de mestrado, Instituto de Ciências Sociais, Universidade de Brasília].), que se preocupou em revelar práticas homoeróticas e afetivas entre os homens e entre as mulheres no semiárido nordestino, algo extremamente próximo e rico a meus interesses. Embora não seja um estudo em Psicologia, penso ser importante essa referência antropológica, porque dialoga com os modos de vida homossexuais no semiárido. Em seus estudos, os participantes não são todos jovens, mas os relatos dos jovens que tinham práticas sexuais com pessoas do mesmo sexo foram extremamente reveladores, sobretudo a respeito da presença deles nesses espaços e do fato de empreenderem estratégias para se afirmarem, direta ou indiretamente.

Em sua dissertação, Ferreira (2006b)Ferreira, P. R. S. (2006b). Os afectos mal-ditos: O indizível das sexualidades camponesas [Dissertação de mestrado, Instituto de Ciências Sociais, Universidade de Brasília]. preocupou-se em questionar a forma como o corpo campesino tem sido interditado em termos das possibilidades de vivências homoeróticas, sobretudo entre os homens. A partir dos rumores de uma localidade do semiárido nordestino, ele consegue acessar homens que mantêm relações sexuais com homens. São homens que, diante da comunidade, silenciam suas práticas sexuais com outros homens, de modo que nem todos se assumem homossexuais, mas não abrem mão dessas práticas.

Em outra publicação da mesma pesquisa, Ferreira (2006a)Ferreira, P. R. S. (2006a). Entre elas: Afetividade versus complementaridade. In E. Woortmann, R. Menache & B. Heredia (Orgs.), Margarida Alves: Coletânea sobre estudos rurais e gênero (pp. 99-121). MDA, IICA. evidencia mulheres que também fazem sexo com outras mulheres, que, mesmo atreladas ao modelo patriarcal vigente nesses espaços rurais, subvertem as instituições desse modelo, como o casamento e o status de dona de casa, e utilizam esses espaços para terem suas práticas sexuais e afetivas entre si, ainda que de forma velada, mas sem maiores preocupações com os rumores das suas localidades. Nesse sentido, ele advoga que esses homens e essas mulheres estão constituindo outros corpos camponeses a partir de suas experiências.

A liberdade do corpo do camponês e da camponesa em suas relações homossexuais relatada por Ferreira (2006aFerreira, P. R. S. (2006a). Entre elas: Afetividade versus complementaridade. In E. Woortmann, R. Menache & B. Heredia (Orgs.), Margarida Alves: Coletânea sobre estudos rurais e gênero (pp. 99-121). MDA, IICA., 2006bFerreira, P. R. S. (2006b). Os afectos mal-ditos: O indizível das sexualidades camponesas [Dissertação de mestrado, Instituto de Ciências Sociais, Universidade de Brasília].), mesmo que esteja circunscrita aos arranjos possíveis para ser vivenciada, contrasta com a realidade dramatizada e dirigida por Chico Amorim em seu curta-metragem Travessia (2012Amorim, C. (2012, 31 mar.). Travessia [Vídeo]. YouTube. https://www.youtube.com/watch?v=cJZiLZ2pmdo
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), disponível (e, portanto, disseminado publicamente) no YouTube. Acho também importante trazer essa referência não bibliográfica para o debate, pois ela visibiliza e afirma a homossexualidade no âmbito dos jovens rurais no semiárido nordestino, também com os perigos de ser vivida. O curta foi criado para o Centro de Testagem Anônima (CTA) de Afogados de Ingazeira, sertão pernambucano, filmado no sertão do Pajeú, para a campanha contra a homofobia realizada pela secretaria de saúde do município. Além de se aproximar bastante do que estou discutindo neste texto, é também revelador esse curta-metragem mostrar o universo dessas experiências homossexuais no semiárido rural nordestino, utilizando-se do lírico e da narrativa fílmica para apontar os limites e possibilidades dessa experiência e vivência nesse contexto.

Retomando os estudos em Psicologia, observei que parte das pesquisas em nossa área que tratam de alguma forma a juventude rural relacionada com as questões de gênero e sexualidade, estão mais baseadas em perspectivas pós-estruturalistas (Arcoverde, 2013Arcoverde, L. R. (2013). Gravidez e juventude no meio urbano e rural: Significados e aproximações [Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Pernambuco].; Diniz, 2010Diniz, L. R. (2010). Um espelho para se contemplar: a adolescência em discursos de adolescentes da zona rural [Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Pernambuco ].; Ribeiro, 2010Ribeiro, K. C. S. (2010). Adolescência e sexualidade: Vulnerabilidade às DSTs, HIV/AIDS e a gravidez em adolescentes paraibanos [Dissertação de mestrado em Psicologia Social, Universidade Federal da Paraíba].; Silva; 2014Silva, R. A. (2014). Os significados do uso de álcool entre os/as jovens quilombolas de Garanhuns/PE: Uma perspectiva interseccional [Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Pernambuco].). Essa constatação corrobora minhas intenções epistemológicas e metodológicas em promover o debate sobre afirmações de jovens homens homossexuais rurais. Algumas das referidas pesquisas detiveram-se nos aspectos em torno de gênero. Assim, se fortalece a necessidade de também debater em torno da sexualidade, com destaque para a homossexualidade e a resistência diante das imposições heteronormativas, considerando as bases e o campo da Psicologia.

Para compreender e aprofundar algumas questões desse problema, este ensaio crítico de base bibliográfica se deterá inicialmente em alguns apontamentos sobre uma Psicologia que tem considerado a epistemologia feminista, de gênero e sexualidade (Azerêdo, 2010Azerêdo, S. (2010). Encrenca de gênero nas teorizações em psicologia. Revista de Estudos Femininos, 18(1), 175-188. https://doi.org/10.1590/S0104-026X2010000100011
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; Jesus & Galinkin, 2015Jesus, J. G. de, & Galinkin, A. L. (2015). Gênero e psicologia social no brasil: entre silêncio e diálogo. Barbarói, 1(43), 90-103. http://doi.org/10.17058/barbaroi.v0i0.4482
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; Paiva, 2008Paiva, V. (2008). A psicologia redescobrirá a sexualidade? Psicologia em Estudo, 13(4), 641-651. http://doi.org/10.1590/S1413-73722008000400002
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; Santos, Carvalho, Amaral, Borges, & Mayorga, 2016Santos, L. C., Carvalho, A. B., Amaral, J. G., Borges, L. A., & Mayorga, C. (2016). Gênero, feminismo e psicologia social no Brasil: Análise da revista Psicologia & Sociedade (1996-2010). Psicologia & Sociedade, 28(3), 589-603. https://doi.org/10.1590/1807-03102016v28n3p589
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), focando em alguns aspectos que a ciência psicológica tem sido chamada a ressignificar, quanto aos modos de subjetivação. Em interlocução com outras áreas de conhecimento, sobretudo com a Literatura, discuto também de que forma as narrativas literárias podem fundamentar a produção e socialização do conhecimento sobre essa demanda (Alós, 2011Alós, A. P. (2011). Histórias entrelaçadas: Redes intertextuais em narrativas afro-brasileiras. Cerrados, 20(31), 107-122.; Duarte, 2008Duarte, E. A. (2008). Literatura afro-brasileira: Um conceito em construção. Estudos de Literatura Brasileira Contemporânea, (31), 11-23.; Schmidt, 2006Schmidt, R. T. (2006). O fim da inocência: Das medusas de ontem e de hoje. Signo, 31(n. esp.), 95-112.), direcionando para a Psicologia.

Em seguida, trago alguns elementos em torno da concepção de gênero, contemplando algumas das diversas nuances históricas dessa concepção e elementos em torno da resistência e da experiência (Butler, 2008Butler, J. (2008). Problemas de gênero: Feminismo e subversão da identidade (2a ed.). Civilização Brasileira.; Lugones, 2014aLugones, M. (2014a). Rumo a um feminismo descolonial. Estudos Feministas, 22(3), 320, 935-952., 2014bLugones, M. (2014b). Colonialidad y género: Hacia um feminismo descolonial. In W. Mignolo (Org.), Género y decolonialidad (2a ed., pp. 13-42). Del Signo.; Scott, 1995Scott, J. W. (1995). Gênero: Uma categoria útil para a análise histórica. Educação e Realidade, 16(2), 5-22., 1999Scott, J. W. (1999). Experiência. In A. L. Silva, M. C. de S. Lago, T. R. O. Ramos (Orgs.), Falas de gênero (pp. 21-54). Ed. Mulheres. ). Com base nessa discussão, foco no debate sobre homossexualidade em articulação com as concepções de gênero e masculinidades, apresentando alguns posicionamentos e apontamentos em torno de uma Psicologia que reconheça e afirme possibilidades de gênero e da homossexualidade (Cassal, Carrielo, Moreira, Norte, & Bicalho, 2010Cassal, L. C. B., Carrielo, L., Moreira, C., Norte, C. E, & Bicalho, P. P. G. de. (2010). Psicologia, homofobia e processos de subjetivação: Alguns enlaçamentos [Trabalho apresentado]. Enlaçando Sexualidade, v. II, Salvador.…; Parker, 2002Parker, R. G. (2002). Abaixo do equador: Culturas do desejo, homossexualidade masculina e comunidade gay no Brasil. Record.; Rios et al., 2016Rios, L. F., Albuquerque, A. P., Pereira, A. F., Oliveira Jr., C. J. de, Santana, W. J. de, & Lira Filho, C. C. de. (2016). Pintosas, boys e cafuçus: Estilos corporais, erotismo e estigmatização entre homens que participam da comunidade entendida do Recife. In L. L. F. Vieira, L. F. Rios & T. N. Queiroz (Orgs.), Gays, lésbicas e travesti em foco: Diálogos sobre sociabilidade e acesso à educação e saúde (1a ed., pp. 17-47). EdUFPE.; Veiga, 2019Veiga, L. (2019). Além de preto é gay: As diásporas da bixa preta. In H. Restier & R. M. Souza (Orgs.), Diálogos contemporâneos sobre homens negros e masculinidades (pp. 77-94). Ciclo Contínuo Editorial.), a partir de narrativas sob a perspectiva epistemológica feminista e decolonial.

Alguns apontamentos para uma Psicologia feminista e literária

Ao atuar como docente na formação de psicólogas e psicólogos, tem me incomodado a forma como a Psicologia esteve sempre voltada em categorizar sujeitos desde o início de sua configuração enquanto ciência e profissão. Esse caminho tem sido criticado, sobretudo no âmbito da Psicologia Escolar e Educacional (Antunes, 2011Antunes, M. A. M. (2011). Psicologia e educação no Brasil: Uma análise histórica. In R. G. Azzi & M. H. T. A. Gianfaldoni Azzi (Orgs), Psicologia e educação (pp. 9-32). Casa do Psicólogo.; Patto, 1991Patto, M. H. S. (1991). A produção do fracasso escolar. T. A. Queiroz.), que contribuiu para a criação de uma controversa psicologia das diferenças, focada em patologizar, normalizar, classificar, medicalizar e disciplinar corpos e relações. São constructos com resquícios presentes nos manuais, diretrizes e diversas outras prescrições.

O fato é que, atualmente, há uma crescente discussão sobre a forma de atuar diante de outros e diferenciados modos de subjetivação de gênero e sexualidade; isso, além de ser algo pessoal - e, portanto, também político (Mayorga, Oliveira, & Gonzaga, 2017Mayorga, C., Oliveira, J, & Gonzaga, P. (2017). O pessoal é político: Aborto e ação política. In E. F. Rasera, M. S. Pereira & D. Galindo. (Orgs.), Democracia participativa, Estado e laicidade: Psicologia social e enfrentamentos em tempos de exceção (1a ed., pp. 76-97). Abrapso Editora.) -, tem me instigado profissionalmente. O desafio também está em articular essa demanda com as especificidades do contexto rural.

No âmbito da Psicologia Escolar e Educacional, Gesser, Oltramari, Cord e Nuernberg (2012Gesser, M., Oltramari, L. C., Cord, D., & Nuernberg, A. H. (2012). Psicologia escolar e formação continuada de professores em gênero e sexualidade. Psicologia Escolar e Educacional, 16(2), 229-236. https://doi.org/10.1590/S1413-85572012000200005
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) reconhecem que tem havido um grande debate na área sobre a importância da educação sexual em escolas, e evidenciam que diversos profissionais de Psicologia que atuam no contexto escolar têm focado seus trabalhos em torno das questões de gênero e sexualidade. Nesse sentido, elas apresentam a preocupação em problematizar elementos teóricos, metodológicos e epistemológicos a respeito dessa atuação, e reivindicam que nossas práticas estejam atreladas a parâmetros político-educacionais, especificamente os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN). Diante do que elas afirmam, aponto a necessidade de consolidar esse debate na área, como forma construir uma práxis em Psicologia Escolar crítica, contextualizada e que considere efetivamente a diversidade humana.

Jesus e Galinkin (2015Jesus, J. G. de, & Galinkin, A. L. (2015). Gênero e psicologia social no brasil: entre silêncio e diálogo. Barbarói, 1(43), 90-103. http://doi.org/10.17058/barbaroi.v0i0.4482
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) e Santos et al. (2016Santos, L. C., Carvalho, A. B., Amaral, J. G., Borges, L. A., & Mayorga, C. (2016). Gênero, feminismo e psicologia social no Brasil: Análise da revista Psicologia & Sociedade (1996-2010). Psicologia & Sociedade, 28(3), 589-603. https://doi.org/10.1590/1807-03102016v28n3p589
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) trazem um panorama da produção do conhecimento sobre gênero em Psicologia Social. Embora a maioria dos estudos localizados por elas tenham sido realizados no período denominado de terceira onda feminista, o volume de publicações foi considerado baixo em relação aos avanços críticos e históricos sobre gênero, algo que Jesus e Galinkin (2015)Jesus, J. G. de, & Galinkin, A. L. (2015). Gênero e psicologia social no brasil: entre silêncio e diálogo. Barbarói, 1(43), 90-103. http://doi.org/10.17058/barbaroi.v0i0.4482
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consideram como cegueira teórica. Entre os dados em comum dos dois estudos, destaca-se a prevalência de investigações realizadas por mulheres e também mais localizadas no centro-sul brasileiro.

Outro resultado foi que, ao considerar a relação entre os estudos de gênero, feminismo e psicologia, boa parte das primeiras publicações se apresentaram de certa forma despolitizadas, ou não se associaram a uma teoria de poder. No entanto, muitos apresentam críticas ao universalismo de gênero (Santos et al., 2016Santos, L. C., Carvalho, A. B., Amaral, J. G., Borges, L. A., & Mayorga, C. (2016). Gênero, feminismo e psicologia social no Brasil: Análise da revista Psicologia & Sociedade (1996-2010). Psicologia & Sociedade, 28(3), 589-603. https://doi.org/10.1590/1807-03102016v28n3p589
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). De forma geral, os dois levantamentos apontaram para a necessidade de fortalecer pesquisas que articulem gênero com questões psicossociais.

Paiva (2008Paiva, V. (2008). A psicologia redescobrirá a sexualidade? Psicologia em Estudo, 13(4), 641-651. http://doi.org/10.1590/S1413-73722008000400002
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) tece críticas sobre a forma como nossa área tem priorizado um discurso que perpetua a ideia de práticas sexuais saudáveis, com base em teorias do desenvolvimento humano naturalizantes, inclusive no modelo nuclear de família. A autora compreende que esses pressupostos atrelados à sexologia merecem ser contrapostos, devido à necessidade de compreender a sexualidade como um fenômeno social. Os estudos de Paiva (2018) também apontam que não há práticas sexuais desprovidas de sentido, que desconsiderem o contexto e quem são as pessoas que estão nessa prática.

Diante dessas e outras questões, o contato com autoras feministas de diversos âmbitos, dentro e fora da Psicologia, tem implicado em um reposicionamento meu e de outras e outros colegas quanto à forma de pensar a ciência e a profissão psicológicas. Tal reposicionamento tem possibilitado a construção de escutas e escritas em torno do feminismo militante, de epistemologias feministas, do feminismo decolonial, do feminismo negro e na manifestação de diferentes formas de gênero e sexualidade. Assim, tenho interesse em fundamentar uma Psicologia que assuma os constructos sobre gênero e sexualidade em interlocução com outras ciências, mas que também seja uma Psicologia que se proponha a teorizar os modos de subjetivação em torno da pluralidade de gênero e sexualidade. Do contrário, a Psicologia prescritiva e classificatória permaneceria, e não é esse o desejo.

Quanto à possibilidade da inventividade na produção de conhecimento psi, o artigo de Azerêdo (2010Azerêdo, S. (2010). Encrenca de gênero nas teorizações em psicologia. Revista de Estudos Femininos, 18(1), 175-188. https://doi.org/10.1590/S0104-026X2010000100011
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) discute a relação entre Psicologia e Literatura com foco na criação, a partir da escuta, visibilidade e inscrição de subjetividades no âmbito das questões de gênero e sexualidade. Ao problematizar os documentários de João Moreira Salles (Santiago) e Eduardo Coutinho (Jogo de Cena), a autora foca nas narrativas fílmicas e na transição entre a realidade dos fatos e a ficção como recurso agregado às narrativas construídas a partir da realidade.

Azerêdo (2010Azerêdo, S. (2010). Encrenca de gênero nas teorizações em psicologia. Revista de Estudos Femininos, 18(1), 175-188. https://doi.org/10.1590/S0104-026X2010000100011
https://doi.org/https://doi.org/10.1590/...
) atenta, a partir de Butler, para o perigo de a Psicologia domesticar academicamente o conceito de gênero. Discutirei sobre Butler e Scott mais à frente neste texto, destacando a fluidez da constituição do gênero. A autora advoga que a Psicologia tem a contribuir se considerar, de fato, as múltiplas possibilidades de compreender o corpo, o sexo e o gênero, e fugir das reiterações de normas nesses âmbitos assumindo uma produção de conhecimento que também fuja às normas da academia e do próprio status de ciência normalizadora. Uma forma de seguir nessa fuga é possibilitar o questionamento e afirmação da pluralidade em torno de gênero e sexualidade a partir de narrativas próprias, inventivas, potencializadoras da saúde de sujeitos ao agregarem a potencialidade criativa e estética da poesia e da literatura em geral em seus constructos.

A importância desse posicionamento de Azerêdo (2010Azerêdo, S. (2010). Encrenca de gênero nas teorizações em psicologia. Revista de Estudos Femininos, 18(1), 175-188. https://doi.org/10.1590/S0104-026X2010000100011
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) reside na forma como ela identifica a potencialidade da resistência ao considerar, a partir de Luiz Eduardo Soares, no prefácio do livro Travestis entre o espelho e a rua, de Hélio Silva1 1 Soares, L. E. (2007). Prefácio. In H. Silva, Travestis entre o espelho e a rua (pp. 13-24). Rocco. , que o ato de escrever é “desaprender convenções e contrariar expectativas cristalizadas” (Soares, 2007, p. 15, como citado em Azerêdo, 2010Azerêdo, S. (2010). Encrenca de gênero nas teorizações em psicologia. Revista de Estudos Femininos, 18(1), 175-188. https://doi.org/10.1590/S0104-026X2010000100011
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, p. 183). Diante disso, compreendi que a Psicologia deve assumir um compromisso de potencializar resistências a convenções e cristalizações sobre gênero e sexualidade, a partir da construção e socialização conjunta de conhecimentos sobre os modos de subjetivação que estão para além da norma, também conforme discute Butler (2008Butler, J. (2008). Problemas de gênero: Feminismo e subversão da identidade (2a ed.). Civilização Brasileira.).

Azerêdo (2010Azerêdo, S. (2010). Encrenca de gênero nas teorizações em psicologia. Revista de Estudos Femininos, 18(1), 175-188. https://doi.org/10.1590/S0104-026X2010000100011
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) ainda pontua que essa construção de conhecimento em Psicologia deve estar aliada a narrativas que teçam teorizações, como forma de fundamentar politicamente os modos de subjetivação plurais em torno de gênero e sexualidade. A dificuldade de atribuir esse caráter político nas elaborações teóricas da Psicologia tem sido nosso “ponto cego” (Azerêdo, 2010Azerêdo, S. (2010). Encrenca de gênero nas teorizações em psicologia. Revista de Estudos Femininos, 18(1), 175-188. https://doi.org/10.1590/S0104-026X2010000100011
https://doi.org/https://doi.org/10.1590/...
, p. 185).

As provocações de Azerêdo me levaram a buscar outras autoras e autores que evidenciassem o valor político da construção literária. As experiências vividas a partir dos estudos sobre Representações de Gênero na literatura feminista me levaram a questionar quais seriam os parâmetros de criação de minha escrita e quais seriam as implicações políticas dessa escrita. Essas questões se somam a outra: que compromisso ético-político tenho construído como psicólogo homossexual, negro, servidor público e professor universitário no semiárido?

Como forma de construir possíveis respostas a essas questões, lembro que Duarte (2008Duarte, E. A. (2008). Literatura afro-brasileira: Um conceito em construção. Estudos de Literatura Brasileira Contemporânea, (31), 11-23.) tece considerações sobre a forma como a escrita afro-brasileira tem tido dificuldades de reconhecimento e também ao lidar com a norma e os cânones eurocêntricos. De Duarte, tomo emprestadas as noções de constantes discursivas de autor, que são: o ponto de vista, a linguagem, a temática e a formação de um público leitor. Essas constantes são algumas das formas de considerar o quanto, a partir da Psicologia, eu posso e devo pensar uma produção de conhecimento coadunada com afirmações em torno da homossexualidade no âmbito rural, que é um dos meus grandes interesses de pesquisa.

Para relacionar melhor essas constantes com essa escrita, avalio que na elaboração de uma narrativa produtora de conhecimento que crie resistências, devo considerar: quem eu sou e de onde parto em termos de gênero, sexualidade, raça, entre outros marcadores (autor); qual o meu posicionamento político em torno da homossexualidade (ponto de vista); que tipo de narrativa devo elaborar como forma de contemplar a mim e a outros e outras (linguagem); qual questão que devo assumir politicamente (temática); e também como devo dialogar, divulgar e tornar acessíveis minhas construções teóricas com as pessoas que farão a leitura de meu conhecimento produzido, dentro e fora da academia (formação do público leitor)?

Ainda a partir de estudos sobre representação de gênero na Literatura, também acessei Alós (2011Alós, A. P. (2011). Histórias entrelaçadas: Redes intertextuais em narrativas afro-brasileiras. Cerrados, 20(31), 107-122.), que discute a narrativa e a produção do conhecimento a partir da memória, a autoria feminina e a identidade afro-brasileira nas obras Becos da Memória, de Conceição Evaristo, Úrsula, de Maria Firmina dos Reis, e Quarto de despejo: Diário de uma favelada, de Carolina Maria de Jesus. Ao tratar sobre o contexto de pobreza do negro brasileiro, com alguns destaques para as questões de gênero, Alós (2011)Alós, A. P. (2011). Histórias entrelaçadas: Redes intertextuais em narrativas afro-brasileiras. Cerrados, 20(31), 107-122. discute sobre a importância, na literatura afro-brasileira, do ato de falar de si, a partir de elementos autobiográficos, também dando conta de falar de seu povo. Destaca também o caráter político da literatura afro-brasileira, em termos de resistência, principalmente quando as obras abordam os conflitos de classe e raça, com foco na opressão.

Nesse sentido, tanto ao considerar Alós quanto Duarte, chama-me à atenção a possibilidade de construir uma literatura em Psicologia que implique em ato de afirmação e resistência, ao tratar não só a partir de meus elementos autobiográficos, mas principalmente das autobiografias de outros sujeitos com os quais me relaciono que sejam fundamentadas na memória e na produção de narrativas de seres humanos desconsiderados pelo discurso heteronormativo. Com isso, vamos evidenciar opressões, mas principalmente possibilitar subjetivações que nos coloquem em evidência, a partir da tomada de espaços e da afirmação de si como produção de resistência.

Outra autora feminista que me instigou a pensar a resistência a partir da escrita é Schmidt (2006Schmidt, R. T. (2006). O fim da inocência: Das medusas de ontem e de hoje. Signo, 31(n. esp.), 95-112.), que discute alguns aspectos epistemológicos da formação literária ao tecer críticas sobre a forma como o mito da Medusa foi ressignificado para despotencializar o feminino. A partir dela, destaco que a forma como somos subjugados em diversas obras literárias e concepções pode construir um lugar de leitor passivo, sem potência, na medida em que suas caraterísticas de subalternidade são naturalizadas pelo autor descomprometido com a potencialização de sujeitos que não sejam o masculino, como uma das evidências seculares do patriarcado na Literatura.

Quando constata isso, a autora faz alguns apontamentos que, em minha análise, contribuem para modos de subjetivação que impliquem em resistências. Um primeiro apontamento é: “pensar o que conhecemos e como conhecemos é uma forma de pensar quem somos e como somos” (Schmidt, 2006Schmidt, R. T. (2006). O fim da inocência: Das medusas de ontem e de hoje. Signo, 31(n. esp.), 95-112., p. 96), e isso me leva a refletir que a negação histórica da leitora, do leitor negro, do leitor homossexual e do leitor pobre na academia, tem implicado em negação histórica da construção de narrativas em Psicologia que tragam à tona conhecimentos que possam potencializar as mulheres, as negras e os negros, os homossexuais, os pobres, entre outros sujeitos negados. A Psicologia pouco tem questionado seu lugar de privilégio e opressão construído secularmente a partir de suas literaturas prescritivas e normativas, sobretudo2 2 Porém, vale destacar o movimento histórico da corrente da Psicologia sócio-histórica no Brasil, que tem questionado sua elitização. Ainda assim, considero que muitas questões em torno da ciência e profissão, como as que eu trago aqui, necessitam de contínuo debate também a partir do compromisso ético-político em outras abordagens, visto que a demanda de formação sempre se atualiza (Bock, 2000). . Consequentemente, raramente nós psicólogos e psicólogas nos questionamos sobre nosso papel ético-político e sobre o lugar que ocupamos na produção e reprodução desse tipo de Psicologia, na estrutura social brasileira como um todo.

Outro apontamento da autora, que mostra um possível caminho para retificar esse lugar de privilégio da Psicologia, é a compreensão que ela constrói, com base nas afirmações da filósofa Naomi Scheman, de que “precisamos também perguntar como expressamos o que sabemos e como procedemos para descobrir as coisas, pois saber não é simplesmente uma coisa que fazemos por acaso, mas uma ação que inscreve o desejo de uma identidade humana” (Schmidt, 2006Schmidt, R. T. (2006). O fim da inocência: Das medusas de ontem e de hoje. Signo, 31(n. esp.), 95-112., p. 106). A partir dessa afirmação compreendo que devemos questionar os cânones da Psicologia, bem como abrir canais para que a diversidade de desejos em torno de diversas identidades tenha espaço para fluir e construir saberes que nos afirmem.

Que o questionamento em torno da identidade seja contínuo e que se constitua como forma de resistência diante de saberes em Psicologia que engessam identidades, sobretudo no âmbito do gênero e da sexualidade, que é o alvo da minha narrativa. Além de eleger a mulher como sujeito cognoscente, como Schmidt aponta, devemos questionar os sujeitos privilegiados e tornar os sujeitos que estão na margem epistêmica em sujeitos cognoscentes das elaborações teóricas em Psicologia: os gays, as lésbicas, as transexuais, os transexuais, as negras, os negros, entre outros sujeitos invisibilizados e inviabilizados nessa ciência.

Possibilidade(s) de construção de conhecimento sobre gênero(s) e homossexualidade(s)

Aqui me interessa compreender modos de subjetivações a partir das normas e resistências de gênero e sexo engendradas nas relações. Considero importante entender para além dos fatores culturais que constituem algumas das compreensões de gênero, como os que rondam o conceito de patriarcado, por exemplo. Também considero importante compreender como se constrói a opressão e a resistência em torno de gênero, articulado com a definição de sexo e da sexualidade e aqui, mais especificamente, da homossexualidade; e, diante disso, analisar prováveis implicações e possibilidades de modos de subjetivação. Para tanto, trarei nesta parte alguns elementos em torno da concepção de gênero, contemplando algumas das nuances históricas dessa concepção, com foco nos elementos de resistência e experiência.

Em meu contexto de pesquisa e docência, tenho percebido que, por muito tempo, as homossexualidades estiveram silenciadas e fugidias no semiárido e, após certo tempo, percebo que existem movimentos de resistência de jovens homossexuais3 3 Trago como exemplo o grupo no Facebook da União Agreste Livre (https://www.facebook.com/groups/1724152047851512/?ref=bookmarks), coletivo formado por jovens LGBT de Arapiraca, município do agreste alagoano. . Atribuo isso à forma como as redes sociais têm interferido na construção de formas de resistência, assim como algumas questões estruturais têm promovido o desenvolvimento e o acesso a conhecimentos diversos por via da expansão do ensino superior público e, consequentemente, de pesquisas, estudos e trabalhos de extensão que consideram saberes locais e acadêmicos, e que têm tensionado o conservadorismo e a heteronormatividade presentes na região4 4 Refiro-me, especificamente, à expansão da Universidade Federal de Alagoas, que tem fomentado pesquisas no âmbito da Educação, Serviço Social e Psicologia, entre outras áreas, que têm questionado a ordem local também em termos de gênero e sexualidade. .

Para iniciar a discussão sobre o gênero em si, trago as seguintes questões: qual a história da palavra gênero? Como ela se constituiu, e com quais sentidos em diferentes contextos, objetivos e momentos históricos? Essa é basicamente a preocupação de Joan Scott (1995Scott, J. W. (1995). Gênero: Uma categoria útil para a análise histórica. Educação e Realidade, 16(2), 5-22.) ao apresentar alguns pressupostos teóricos visando o resgate histórico do sentido construído de gênero para, em seguida, apresentar sua conceituação de gênero, imbricada por aspectos políticos, contextuais e, evidentemente, históricos. Seu debate está situado no resgate e promoção dos estudos feministas, objetivando questionar estruturas epistemológicas e metodológicas. Para tanto, ela elege gênero como categoria analítica.

Inicialmente, ela apresenta os pressupostos dos estudos sobre como o gênero perpassa indivíduos e diversas instituições sociais. O objetivo é fugir da história descritiva embasada na ideia de ordem causal, geralmente atrelada ao biologismo, questão que Butler (2008Butler, J. (2008). Problemas de gênero: Feminismo e subversão da identidade (2a ed.). Civilização Brasileira.) irá discutir também. No sentido de delimitar um novo terreno teórico, Scott (1995Scott, J. W. (1995). Gênero: Uma categoria útil para a análise histórica. Educação e Realidade, 16(2), 5-22.) destaca três perspectivas. A primeira trata das teóricas feministas do patriarcado e suas primeiras tentativas de conceituar gênero. Aqui, gênero não configura papel analítico e não considera as demais desigualdades entre mulheres, nem se atenta para as diversas construções sociais e culturais atreladas ao feminino. Portanto, não possibilita questionar e mudar paradigmas de teorias que negam historicamente e propositalmente a mulher.

A segunda perspectiva se refere às proposições das feministas marxistas com abordagem mais histórica, apontando a necessidade de estudos “das estruturações psíquicas das identidades de gênero” (Scott, 1995Scott, J. W. (1995). Gênero: Uma categoria útil para a análise histórica. Educação e Realidade, 16(2), 5-22., p. 79). Portanto, consideram algumas questões em torno das subjetividades, mas ainda apresentam grande centralidade nas relações de produção, o que Scott apresenta como limite para o conceito de gênero, na medida em que não escapam de alguns determinismos, como discutirei mais à frente a partir de Butler.

A terceira perspectiva, a psicanalítica, trata da forma como se constrói a identidade de gênero. Diante dessa relevante perspectiva, Scott (1995Scott, J. W. (1995). Gênero: Uma categoria útil para a análise histórica. Educação e Realidade, 16(2), 5-22.) discute que a corrente das teorias do objeto situa o debate sobre gênero no âmbito da experiência concreta e que as pós-estruturalistas centram-se na importância da linguagem para construção do gênero. Porém, a autora avalia que a limitação dessas correntes reside na consideração de poucas estruturas de interação quando focam na família e na vida doméstica, tendendo também a universalizar o masculino e o feminino, bem como focam demasiadamente em aspectos individuais, algo que é muito caro à Psicologia segregadora que tenho questionado mais acima.

Em seguida, Scott apresenta seu conceito de gênero, sob duas vertentes: gênero como elemento que constitui relações baseadas nas diferenças evidentes entre os sexos; e gênero como “forma primária de dar significado às relações de poder” (Scott, 1995Scott, J. W. (1995). Gênero: Uma categoria útil para a análise histórica. Educação e Realidade, 16(2), 5-22., p. 86). Para tanto, ela compreende: o papel dos símbolos culturalmente construídos em torno de gênero; a forma como os conceitos normativos limitam possibilidades de significar gênero; o papel político, institucional e social do conceito; e a consideração da identidade enquanto construção subjetiva.

A historiadora também compreende que o (en)gendramento articula poderes no âmbito da vida social, gerando a distribuição desigual desses poderes. Considera a reciprocidade entre gênero e sociedade e gênero e política em termos de influências construtivas mútuas. Isso tem se dado a partir das demandas históricas do Estado, que formulam o controle da mulher com base em diferenças sexuais, pois não é desejável a influência de qualquer sinal de feminilidade no poder, na medida em que indicaria fraqueza e submissão em termos de governos e Estado-nação. Por fim, ela questiona: como essas relações de poder podem ser modificadas? Então Scott (1995Scott, J. W. (1995). Gênero: Uma categoria útil para a análise histórica. Educação e Realidade, 16(2), 5-22.) analisa que a partir dos processos políticos deve haver também a busca do controle, conforme contexto e tempo histórico, com vistas a visibilizar cada vez mais a mulher em termos históricos, e considerando as interações entre elementos de raça e classe.

A concepção de gênero sofrerá determinações de diversas ordens, o que resultará em implicações nas relações de poder construídas com base em elementos em torno do binarismo, inclusive relações permeadas por políticas públicas de controle social (Scott, 1995Scott, J. W. (1995). Gênero: Uma categoria útil para a análise histórica. Educação e Realidade, 16(2), 5-22.). No que toca à homossexualidade, elementos de feminilidade em manifestações dos corpos e do discurso de homens gays serão rechaçadas, porém, esses rechaços têm implicado na construção de discursos e de corpos que ressignifiquem e evidenciem o afeminado como sujeito político a partir do uso da potencialidade do feminino.

Isso pode ser observado, por exemplo, em narrativas que têm utilizado a denominação bicha não mais no sentido pejorativo e de subjugação de homens gays5 5 Exemplo dessa ressignificação e valorização da bicha afeminada está presente no texto publicado pelo psicólogo Raul Brito, do coletivo Quilombo de Afetos (http://quilombodeafetos.tumblr.com/post/156325146997/bicha-p%C3%A3o-com-ovo), coletivo formado por ele e mais duas jovens LGBTs. Também pode ser observado no documentário Bichas, realizado em Pernambuco, lançado no início de 2016, e dirigido por Marlon Parente. Ver: www.bichas.com.br. . De forma geral, compreendo que essa ressignificação configura uma forma de resistência. Mas, então, de que modo as bichas, por exemplo, têm extrapolado o binarismo de sexo e gênero, construindo manifestações das mais variadas? E quais os modos de subjetivação que têm fomentado essas afirmações plurais em torno de sexo e gênero?

Para tanto, vale relacionar e discutir brevemente algumas dessas posições articulando-as a algumas questões que Judith Butler lançou a partir da obra Problemas de Gênero (2008Butler, J. (2008). Problemas de gênero: Feminismo e subversão da identidade (2a ed.). Civilização Brasileira.). Uma das primeiras questões da autora é a ambiguidade do termo “problema”, configurada tanto como questões que engessam sujeitos quanto também para um sentido de enfrentamento, que é o sentido assumido pela autora. Butler (2008)Butler, J. (2008). Problemas de gênero: Feminismo e subversão da identidade (2a ed.). Civilização Brasileira. aprofunda algumas questões de Scott, como o fato de a definição de gênero permanecer em muitos usos com foco nas configurações binárias de poder. Butler também questiona a prevalência da epistemologia heteronormativa, masculina e patriarcal. Porém, ela propõe alguns avanços.

Contra a ideia de um feminismo universal, bem como contra a ideia de acolher o conceito de “mulheres” como representacional das demandas de feminismo, uma vez que o conceito de mulheres está fortemente calcado na matriz masculina e heteronormativa, Butler (2008Butler, J. (2008). Problemas de gênero: Feminismo e subversão da identidade (2a ed.). Civilização Brasileira.) compreende que cabe construir uma “política feminista que tome a construção variável da identidade como um pré-requisito metodológico e normativo, senão como um objetivo político” (Butler, 2008Butler, J. (2008). Problemas de gênero: Feminismo e subversão da identidade (2a ed.). Civilização Brasileira., p. 23). Ao tipo de Psicologia que tenho demarcado neste texto, interessa considerar outra epistemologia para reformular sua atuação científica, metodológica e profissionalmente. Seria uma epistemologia feminista, que questione a matriz patriarcal que fundamenta boa parte dos constructos, práticas e análises psicológicas.

Butler (2008Butler, J. (2008). Problemas de gênero: Feminismo e subversão da identidade (2a ed.). Civilização Brasileira.) pontua que tanto a concepção de gênero quanto a concepção de feminino têm interseções com elementos de raça, classe, etnia, sexo e território, elementos esses que permeiam as relações de poder e constituem identidades singulares. Essa compreensão, mais elaborada em constructos posteriores de outras teóricas feministas, auxilia minha interlocução entre as homossexualidades forjadas em diferentes contextos, ora mais abertos a diversas manifestações, ora mais fechados, mas pelos quais permeiam questões que possibilitam ou restringem a manifestação da homossexualidade no campo, por exemplo.

Avalio que questões de classe interferem diretamente na expressão das diversas sexualidades nesse contexto, uma vez que a ordem patriarcal ainda é bastante determinante nas relações familiares no âmbito rural, nas quais prepondera a exploração do agronegócio em disputa com a agricultura familiar nas comunidades menores, e essa configuração tem implicado ainda mais especificamente em interdições de gênero e sexo (Oliveira Jr. & Prado, 2013Oliveira Jr., O., & Prado, M. A. M. (2013). A categoria juventude em contextos rurais: O dilema da migração. In J. F. Leite & M. Dimenstein (Orgs.), Psicologia e contextos rurais (pp. 57-87). EDUFRN.). Isso coaduna com o entendimento de Butler (2008Butler, J. (2008). Problemas de gênero: Feminismo e subversão da identidade (2a ed.). Civilização Brasileira.) de que as relações de dominação e exclusão estão atreladas às diversas representações femininas e de gênero.

Umas das questões centrais na discussão da autora é o debate sobre concepção de sexo atrelada ou não à concepção de gênero. Para ela, “. . . a distinção sexo/gênero sugere uma descontinuidade radical entre corpos sexuados e gêneros culturalmente construídos” (Butler, 2008Butler, J. (2008). Problemas de gênero: Feminismo e subversão da identidade (2a ed.). Civilização Brasileira., p. 24). Analiso que, para a autora, a própria ideia de sexo não é tão natural quanto atribuem historicamente, e esse entendimento é contrário ao de alguns manuais de Psicologia, especialmente os que tratam de Psicologia de Desenvolvimento, que têm compreendido e propagado o sexo como da ordem do natural e do biológico, em que pouco podemos interferir em termos de desenvolvimento humano.

Portanto, essa elaboração, que não é exclusiva da Psicologia, não dialoga com a ideia de que o sexo é uma construção cultural tal qual como gênero sempre foi, algo que Butler (2008Butler, J. (2008). Problemas de gênero: Feminismo e subversão da identidade (2a ed.). Civilização Brasileira.) problematiza também, como destacarei mais à frente. Nesse sentido, o binarismo masculino/feminino relacionado ao sexo pode e deve ser questionado. Porém, qual seria a definição de sexo, já que a partir desse conceito não prepondera o sentido biológico? E como fica o conceito de gênero, já que ele não detém a exclusividade de ser construído culturalmente? O que vai diferenciar sexo de gênero, ou como eles se articularão?

Butler advoga que a noção de sexo também foi construída historicamente e não pode ser dada como natural. Ela compreende que “se o caráter imutável do sexo é contestável, talvez o próprio constructo chamado ‘sexo’ seja tão culturalmente construído quanto o gênero; a rigor, talvez o sexo sempre tenha sido o gênero, de tal forma que a distinção entre sexo e gênero revela-se absolutamente nenhuma” (Butler, 2008Butler, J. (2008). Problemas de gênero: Feminismo e subversão da identidade (2a ed.). Civilização Brasileira., p. 25). Essa formulação auxilia na compreensão de que corpos podem ter o sexo ressignificado, que implica em modos de subjetivação que extrapolam o binarismo de sexo e gênero. A autora compreende que esse binarismo está a serviço efetivo e bem-sucedido da construção de discursos heteronormativos que engessam sujeitas, sujeitos e outras possíveis vivências e identidades dos seres humanos.

É interessante notar que, além da crítica ao determinismo biológico diante da concepção de sexo, há também, segundo a autora, um determinismo cultural nas construções teóricas sobre gênero. Nesse sentido, ela afirma que:

Em algumas explicações, a ideia de que o gênero é construído sugere um certo determinismo de significados do gênero, inscritos em corpos anatomicamente diferenciados, sendo esses corpos compreendidos como recipientes passivos de uma lei cultural inexorável. Quando a ‘cultura’ relevante que ‘constrói’ o gênero é compreendida nos termos dessa lei ou conjunto de leis, tem-se a impressão de que o gênero é tão determinado e tão fixo quanto na formulação de que a biologia é o destino. Nesse caso, não a biologia, mas a cultura se torna o destino (Butler, 2008Butler, J. (2008). Problemas de gênero: Feminismo e subversão da identidade (2a ed.). Civilização Brasileira., p. 26).

Esse apontamento trata sobre a possibilidade de flexibilizar a noção de gênero, ao possibilitar compreender a diversidade de formulações corporais e relacionais que subvertem a ordem binária entre o masculino e feminino, com fluidez de articulação de elementos dos dois gêneros e da criação e afirmação de gêneros que impliquem em outras relações para além das heteronormativas e em outras considerações políticas a partir dessas manifestações.

As pluralidades de manifestações e afirmações em torno do gênero e da sexualidade humana nos permitem conceber para além do homossexual, da lésbica e das transexuais. Esse entendimento dialoga com Butler (2008Butler, J. (2008). Problemas de gênero: Feminismo e subversão da identidade (2a ed.). Civilização Brasileira.) quando ela avalia que construção de identidades e de gênero pode ter um significado controverso, uma vez que pode permear entre o livre-arbítrio e o determinismo, implicando que corpos sejam passivos para serem inscritos de forma determinista, ou que se autodeterminam, o que nem sempre seria viável, uma vez que o corpo é, em si mesmo, também uma construção autônoma que demanda modos de subjetivação inimagináveis. Em torno do imaginável e do inimaginável, Butler afirma:

Os limites da análise discursiva de gênero pressupõem e definem por antecipação as possibilidades das configurações imagináveis e realizáveis de gênero na cultura. Isso não quer dizer que toda e qualquer possibilidade de gênero seja facultada, mas que as fronteiras analíticas sugerem os limites de uma experiência discursivamente condicionada. Tais limites se estabelecem sempre nos termos de um discurso cultural hegemônico, baseado em estruturas binárias que se apresentam como linguagem da racionalidade universal. Assim, a coerção é introduzida naquilo que a linguagem constitui como domínio imaginável do gênero (Butler, 2008Butler, J. (2008). Problemas de gênero: Feminismo e subversão da identidade (2a ed.). Civilização Brasileira., p. 28.).

Diante disso, compreendo que há limitações impostas no discurso para a construção de possibilidades outras e inimagináveis de gênero, que são contra hegemônicas, históricas e para além do binarismo, tal qual temos vivenciado em termos de gênero e sexo, por exemplo, nas diversas formas de manifestar e vivenciar a homossexualidade.

Considerando esse debate sobre gênero pelo feminismo norte-americano, me interessa também entender como gênero perpassa entre nós na América Latina, a partir do feminismo decolonial. Considero que essa perspectiva se relaciona diretamente com muitas questões do nosso contexto, com aproximações e distanciamentos entre os estudos feministas que partem do norte do globo e aquilo que vivemos em terras brasileiras, nordestinas e agrestinas.

A filósofa argentina e feminista decolonial Maria Lugones (2014aLugones, M. (2014a). Rumo a um feminismo descolonial. Estudos Feministas, 22(3), 320, 935-952., 2014bLugones, M. (2014b). Colonialidad y género: Hacia um feminismo descolonial. In W. Mignolo (Org.), Género y decolonialidad (2a ed., pp. 13-42). Del Signo.) apresenta um estudo histórico e situado sobre como o processo de colonização imprimiu outra concepção de homens e mulheres, colonizadores e colonizados, a partir do pensamento eurocêntrico dos sujeitos que invadiram as Américas e outros territórios. Ela questiona os limites do feminismo branco norte-americano e europeu e propõe o conceito de sistema moderno colonial de gênero, sistema no qual os colonizadores atuam para dicotomizar e hierarquizar sujeitos, relações e práticas que antes não correspondiam a esses critérios.

O processo de dicotomização e hierarquização de corpos se deu de diversas formas. Uma delas foi a definição de padrão de humano atribuído hierarquicamente aos colonizadores. E a outra se deu a partir de concepções e atos que nos tornaram seres sem humanidade, reduzidos, animalizados e discriminados como machos ou fêmeas, sem a condição de sermos classificados como masculinos ou femininos, característica exclusiva dos sujeitos responsáveis pela missão dita civilizatória (Lugones, 2014aLugones, M. (2014a). Rumo a um feminismo descolonial. Estudos Feministas, 22(3), 320, 935-952.). Maldonado-Torres (2019Maldonado-Torres, N. (2019). Analítica da colonialidade e decolonialidade: algumas dimensões básicas. In J. Bernardino-Costa, N. Maldonado-Torres & R. Grosfoguel (Orgs.), Decolonialidade e pensamento afrodiaspórico (1a ed., pp. 27-53). Autêntica. ) complementa dizendo que os colonizados foram despojados de sua diferença sexual, por não terem sido considerados humanos.

Diante dessa concepção, Lugones atribuirá, nesta construção de gênero, um outro papel para o sexo, diferente do que o feminismo norte-americano ou europeu tem tratado, ao afirmar que na “colonialidade de gênero, na distinção entre humano e não-humano, sexo tinha que estar isolado” (Lugones, 2014aLugones, M. (2014a). Rumo a um feminismo descolonial. Estudos Feministas, 22(3), 320, 935-952., p. 937). Essa noção é fundamental para compreender o quanto a perspectiva da colonialidade de gênero ainda permanece, se perpetua e destitui seres de suas masculinidades ou feminilidades.

Lugones (2014a)Lugones, M. (2014a). Rumo a um feminismo descolonial. Estudos Feministas, 22(3), 320, 935-952. também considera a racialização no processo de construção das colonialidades, afirmando que há intersecção entre raça e gênero presente na colonialidade do poder, conforme a perspectiva eurocêntrica - branca, capitalista, heterossexual, masculina e cristã. Muitos homens que constituíram as colônias não compreenderam a dimensão da colonialidade de suas mentes e corpos; por isso, muitos subjetivavam e reproduziam a violência dominadora do colonizador. Para conformar os colonizados, foram utilizados discursos e violências diretas para empreender a desumanização e racialização de sujeitos.

No que toca a esse estudo crítico, considero que as masculinidades têm sido forjadas historicamente, nos contextos rurais, sob a perspectiva da colonialidade. Entendo que há uma intencionalidade e atuação, dentro dessa lógica manipuladora do sistema-mundo colonial, em minar as possibilidades de o feminino também constituir os homens. Também é negada a muitos homens classificados como machos, a possibilidade de serem categorizados como homens em si. Nesse sentido, esse processo da colonialidade de gênero resulta na interdição das práticas sexuais e afetivas que se configuram para além da heteronormatividade. Os homens que reproduzem a lógica da colonialidade em nosso contexto ou controlam e/ou são controlados nos jogos de poder presentes nas relações do âmbito rural.

Contudo, a perspectiva decolonial também permite compreender que sucumbimos não somente às imposições coloniais. Lugones (2014b)Lugones, M. (2014b). Colonialidad y género: Hacia um feminismo descolonial. In W. Mignolo (Org.), Género y decolonialidad (2a ed., pp. 13-42). Del Signo. também trata sobre os processos de resistência constituídos historicamente, de forma que temos na atualidade práticas e definições de gênero e sexualidade que se apresentam e se afirmam, mesmo diante de tanta opressão vivida por séculos. Para tanto, ela destaca a necessidade de tecermos processos considerando nossas subalternidades diante do julgo colonial, como forma de evidenciar e afirmar também nossas potencialidades e experiências próprias construídas e vividas historicamente e, sobretudo, coletivamente.

Em termos de manifestação e vivência das diversas sexualidades, considerando também a forma como a colonialidade de gênero nos pauta, volto para Scott (1999Scott, J. W. (1999). Experiência. In A. L. Silva, M. C. de S. Lago, T. R. O. Ramos (Orgs.), Falas de gênero (pp. 21-54). Ed. Mulheres. ) quanto à importância da experiência enquanto algo coletivo, individual, histórico e discursivo. A partir desses pressupostos, cabe questionar: quais tipos de experiências gerariam narrativas que apreendessem questões da coletividade nas relações de gênero, que constituíssem e afirmassem singularidades também nesses termos, que atentassem para o caráter histórico das identidades e que implicassem na elaboração de diversos tipos de discursos que afirmem gênero e sexualidades para além da heteronormatividade?

A elaboração das escritas de si, que possam ser apreendidas e elaboradas em conjunto com as narrativas da produção do conhecimento em Psicologia, dependem de formulações e interpretações de experiências que sejam significativas, ricas em referências que afirmem sexualidades e que potencializem possibilidades outras de constituição humana. Mais especificamente, a experiência pode constituir narrativas que legitimem ou interditem manifestações da homossexualidade.

Ao relacionar a experiência com a historicização, Scott compreende que não basta evidenciar a experiência, pois é necessário analisar como os indivíduos se constituem por meio dela, ou seja, é preciso entender quais subjetivações ocorrem com e na experiência. Para ilustrar, volto a tratar da feminilidade na homossexualidade. Em seus estudos sobre homossexualidade no Brasil, Parker (2002Parker, R. G. (2002). Abaixo do equador: Culturas do desejo, homossexualidade masculina e comunidade gay no Brasil. Record.) identificou que é comum aos homossexuais evitarem agregar, à sua masculinidade, a feminilidade e passividade, por alguns entenderem que essas atribuições os tornam menores e desprezíveis, embora alguns contraditoriamente desejem corpos afeminados ou até performem a partir do feminino.

Outro estudo brasileiro que trata sobre as subjetivações a partir das experiências com nossos corpos, e no âmbito da Psicologia, diz sobre como discursos e relações resultam na estigmatização da homossexualidade. Esse processo ocorre em diversos âmbitos, desde os preceitos religiosos cristãos, passando pelos pressupostos científicos que denotam a homossexualidade como desvio; até os serviços de saúde, de educação, posições jurídicas, legais e no cotidiano da sociedade (Rios et al., 2016Rios, L. F., Albuquerque, A. P., Pereira, A. F., Oliveira Jr., C. J. de, Santana, W. J. de, & Lira Filho, C. C. de. (2016). Pintosas, boys e cafuçus: Estilos corporais, erotismo e estigmatização entre homens que participam da comunidade entendida do Recife. In L. L. F. Vieira, L. F. Rios & T. N. Queiroz (Orgs.), Gays, lésbicas e travesti em foco: Diálogos sobre sociabilidade e acesso à educação e saúde (1a ed., pp. 17-47). EdUFPE.).

Além desse tipo de experiência, destacamos outro estudo sobre homossexuais que têm tido práticas sexuais, afetivas e de luta também no contexto rural, mas também não sem opressões e resistência. Leite e Dimenstein (2013Leite, J. F., & Dimenstein, M. (2013). Relações de gênero e diversidade sexual na luta pela terra: A participação política de militantes mulheres e gays no MST. Bagoas: Estudos Gays: Gêneros e Sexualidades, 6(8), 87-203.) relatam experiências de mulheres e gays militantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) marcadas por estigmatizações e discriminações sofridas por elas e eles no próprio contexto de luta, nos acampamentos e assentamentos. Se por um lado há um “confronto entre os modos tradicionais de vida das mulheres e um novo modo de orientação de sua subjetividade em torno da prática militante” (Leite & Dimenstein, 2013Leite, J. F., & Dimenstein, M. (2013). Relações de gênero e diversidade sexual na luta pela terra: A participação política de militantes mulheres e gays no MST. Bagoas: Estudos Gays: Gêneros e Sexualidades, 6(8), 87-203., p. 193), os militantes gays têm vivenciado tensões marcadas por modelos de masculinidade que se veem como dominantes dentro do próprio movimento.

No que toca às vivências de interdição processual de outros gêneros e sexualidades, Veiga (2019Veiga, L. (2019). Além de preto é gay: As diásporas da bixa preta. In H. Restier & R. M. Souza (Orgs.), Diálogos contemporâneos sobre homens negros e masculinidades (pp. 77-94). Ciclo Contínuo Editorial.) apresenta outro estudo em Psicologia atrelado ao nosso contexto e à racialização da homossexualidade. Para ele, jovens negros homossexuais ou bixas pretas, conforme ele denomina e posiciona, “experimentam a diáspora pela segunda vez” (Veiga, 2019Veiga, L. (2019). Além de preto é gay: As diásporas da bixa preta. In H. Restier & R. M. Souza (Orgs.), Diálogos contemporâneos sobre homens negros e masculinidades (pp. 77-94). Ciclo Contínuo Editorial., p. 83), experiência que corresponderia à dificuldade de negros homossexuais serem acolhidos e integrados em suas famílias que seriam, segundo ele, seus próprios quilombos. Para o negro homossexual, limitaria suas possibilidades, diante do possível dilema de negar sua homossexualidade e acatar a masculinidade heteronormativa como forma de não perder as poucas proteções afetivas e de subsistência com as quais ele conta. Caberia à bixa preta um não-lugar, uma vez que não é representada de forma ampla na sociedade, a não ser na fetichização ou na redução de sua humanidade.

Ao buscar compreender a expectativa da sociedade para com os profissionais de Psicologia diante da homossexualidade e homofobia, Cassal et al. (2010Cassal, L. C. B., Carrielo, L., Moreira, C., Norte, C. E, & Bicalho, P. P. G. de. (2010). Psicologia, homofobia e processos de subjetivação: Alguns enlaçamentos [Trabalho apresentado]. Enlaçando Sexualidade, v. II, Salvador.…) destacam a necessidade de a Psicologia se debruçar sobre a produção de conhecimento, práticas e políticas que questionem a lógica patologizante diante da homossexualidade, apontando caminhos para o enfrentamento dessas práticas opressoras, também conceituadas de forma ampla como homofobia.

Se considerarmos os homens homossexuais que experimentam a feminilidade como algo secundário e negativo da formação humana, dificilmente essa experiência possibilitará a afirmação positiva no modo desse homem homossexual subjetivar elementos da feminilidade como potência em sua homossexualidade, a partir do que ele experimenta com seu corpo. Contudo, o que antes era inimaginável tem sido cada vez mais possível, evidenciado, visibilizado e referenciado na atualidade.

Ainda no que toca à experiência, vivenciar a pluralidade de gênero e sexualidade coaduna com o sentido de historicidade da experiência, na medida em que possibilita configurar a experiência como ato político e subverter uma história normativa (Scott, 1999Scott, J. W. (1999). Experiência. In A. L. Silva, M. C. de S. Lago, T. R. O. Ramos (Orgs.), Falas de gênero (pp. 21-54). Ed. Mulheres. ). Destaco nessa questão que o foco de uma narrativa de produção de conhecimento em Psicologia seria reconhecer, registrar e visibilizar a experiência dos sujeitos segundo suas próprias narrativas, como processos que envolvam suas memórias e autobiografias em articulação com sua coletividade, tal como discuti a partir de Alós (2011Alós, A. P. (2011). Histórias entrelaçadas: Redes intertextuais em narrativas afro-brasileiras. Cerrados, 20(31), 107-122.). E, nesse sentido, que sejam configuradas experiências que subvertam a heteronormatividade resultante da imposição colonial, com grandes possibilidades de construir e visibilizar o inimaginável em termos de gênero e sexualidade. O inimaginável que foi ou será vivenciado é o elemento que vai configurar as inimagináveis formas de resistência, de ser e de viver.

Fechando com incertezas e muitas possibilidades

Diante deste exercício realizado, inimaginável em muitos âmbitos da Psicologia enquanto ciência e profissão, vale destacar que eu não tive a pretensão de esgotar o extenso rol de elaborações teóricas em torno de gênero, sexo e homossexualidade. Meu foco foi evidenciar, a partir de três concepções fundamentais sobre gênero, quais as possibilidades de entendermos que, nos engendramentos das elaborações em torno de gênero e sexualidade, residem alguns aspectos de resistência e afirmação dos modos de vida que devem ser destacados e valorados em narrativas, no sentido literário e criativo, de produção do conhecimento em Psicologia sobre esse âmbito da vivência humana.

Para mim, é importante compreender essa lógica como forma de constituir elementos de análise para elaborar em termos de narrativas de pesquisas, atuais e futuras, assim como também se constitui enquanto forma de construir novos processos formativos de futuros psicólogas e psicólogos. Nesse âmbito, conceber o inimaginável em gênero e sexualidade se estrutura enquanto estratégia de fazer parte, de fato, dos processos de resistência junto aos jovens rurais homossexuais, sendo eu um professor urbano homossexual que atua no âmbito do semiárido e/ou rural e que se constitui como referência profissional em Psicologia e, de alguma forma, também de militância. Interessa-me construir e visibilizar narrativas afirmativas e/ou performatividades de homossexualidade no âmbito rural no semiárido alagoano. Por mais que haja interferências estruturais ou não, há particularidades que têm sido forjadas há muito tempo, tanto no âmbito dos silenciamentos quanto nas resistências e nas vozes dessas resistências. O homossexual rural está efetivamente “saindo do armário”? De que forma ele está saindo? O que o levou a sair? Essas questões são provocações para futuras produções a respeito em Psicologia.

Nessa proposta de uma Psicologia Literária, cabe analisar o quanto tenho me submetido ao binarismo presente em minhas práticas e prescrições. Para tanto, cabe atuar em processo contínuo de reflexividade em coletividade com os jovens homossexuais rurais, grupos de pesquisa, psicólogas e psicólogos, educadoras e educadores e outras e outros seres ainda inimagináveis para mim. Destaco novamente que não há como deixar de atuar de forma transdisciplinar, sem considerar outros espaços de conhecimento, sejam eles os acadêmicos, sejam eles os espaços do cotidiano sobre juventude, ruralidade e homossexualidade, que constituem parte de meu objeto de pesquisa. O engajamento meu e de outros homens e mulheres em torno da afirmação e resistência nas relações não-heterossexuais no âmbito rural constituem a outra parte desse objeto. Construo e reafirmo o compromisso de me colocar vigilante, suspeitando das minhas próprias narrativas de diversas ordens, atentando para o quanto limito, legitimo ou possibilito em minhas questões de gênero e sexualidade, e aqui especificamente sobre a homossexualidade.

Assim, avalio que é importante construir e promover falas posicionadas que fundamentem cada vez mais uma outra epistemologia para a Psicologia que considere a dinamicidade do cotidiano e a humanidade que está constantemente em xeque. A desconstrução, em diversos âmbitos e trajetórias, tem sido constante. Esse exercício é uma dessas desconstruções, e a partir dele eu resisto e me afirmo diante do que tem me sido negado no mundo das ciências.

Referências

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  • 1
    Soares, L. E. (2007). Prefácio. In H. Silva, Travestis entre o espelho e a rua (pp. 13-24). Rocco.
  • 2
    Porém, vale destacar o movimento histórico da corrente da Psicologia sócio-histórica no Brasil, que tem questionado sua elitização. Ainda assim, considero que muitas questões em torno da ciência e profissão, como as que eu trago aqui, necessitam de contínuo debate também a partir do compromisso ético-político em outras abordagens, visto que a demanda de formação sempre se atualiza (Bock, 2000Bock, A. M. B. (2000). As influências do Barão de Münchhausen na Psicologia da Educação. In E. R. Tanamachi, M. Proença & M. L. Rocha (Orgs.), Psicologia e educação: Desafios teórico-práticos (pp. 11-33). Casa do Psicólogo.).
  • 3
    Trago como exemplo o grupo no Facebook da União Agreste Livre (https://www.facebook.com/groups/1724152047851512/?ref=bookmarks), coletivo formado por jovens LGBT de Arapiraca, município do agreste alagoano.
  • 4
    Refiro-me, especificamente, à expansão da Universidade Federal de Alagoas, que tem fomentado pesquisas no âmbito da Educação, Serviço Social e Psicologia, entre outras áreas, que têm questionado a ordem local também em termos de gênero e sexualidade.
  • 5
    Exemplo dessa ressignificação e valorização da bicha afeminada está presente no texto publicado pelo psicólogo Raul Brito, do coletivo Quilombo de Afetos (http://quilombodeafetos.tumblr.com/post/156325146997/bicha-p%C3%A3o-com-ovo), coletivo formado por ele e mais duas jovens LGBTs. Também pode ser observado no documentário Bichas, realizado em Pernambuco, lançado no início de 2016, e dirigido por Marlon Parente. Ver: www.bichas.com.br.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Jan 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    30 Jan 2020
  • Aceito
    24 Maio 2021
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