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A linguagem da crise

A linguagem da crise

Gesner de Oliveira Filho

Economista, pesquisador do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (CEBRAP) e colunista econômico da "Folha de São Paulo"

A palavra surge de algum canto que ninguém sabe qual é. De repente, está no jornal, na televisão e na entrevista: todo mundo fala mas pouca gente entende. Aqui, uma lista para ajudar a entender:

RECESSÃO — situação em que ocorre uma queda do produto da economia, o chamado PIB (produto interno bruto). Isto é, o país passa a produzir um volume menor de bens (automóveis, televisores, etc.) e serviços (atendimento bancário, cortes de cabelo etc). Por isso, menos pessoas são empregadas e muitas que estavam trabalhando são mandadas embora, gerando desemprego. Quando o produto sobe, ou seja, quando há crescimento da economia, nada garante que a situação do trabalhador melhore. Mas uma coisa é certa: na recessão ela só pode piorar.

MORATÓRIA — renegociação do prazo para pagar um empréstimo. Falando claro, quando o devedor começa a ficar sem saída e só tem um jeito: suavizar as prestações e diminuir os juros. Caso contrário só resta o calote como opção. Portanto, moratória pode significar pelo menos duas coisas: um acordo em novas bases com os credores ou o repúdio da dívida (vulgo calote), o que, de um jeito mais educado, chamamos moratória unilateral.

RENEGOCIAÇÃO DA DÍVIDA — Mas, se a moratória é renegociação, afinal de contas por que uns são a favor da moratória e outros da renegociação da dívida? Acontece que a expressão renegociação ganhou um sentido um pouco mais moderado. Quando alguma pessoa se diz a favor da renegociação, e não da moratória, ela está pensando só num acordo em que o devedor e o credor, juntos, estabelecem novo prazo para o pagamento.

SUCATEAMENTO — todo mundo sabe que sucata é ferro-velho. Quando um trabalhador não arruma emprego em lugar nenhum, morre de fome e vira terra. Quando a fábrica fica parada, as máquinas que o trabalhador produziu não servem mais para nada e viram sucata. Como a política econômica do governo é recessiva (isto é, aprofunda a crise), está promovendo o sucateamento da indústria nacional. Isso acontece por dois motivos: ou porque não empregam trabalhadores para tocar as máquinas e, paradas, elas viram ferro-velho; ou porque, na recessão, o dono da fábrica não pode renovar a maquinaria e prossegue trabalhando com máquinas velhas e tecnologia antiga.

ROLAGEM — ato de rolar alguma coisa. Hoje, a novidade é que se fala em "rollover" ou rolagem da dívida externa. Isso significa que, dos novos empréstimos que o governo está fazendo, uma boa parte dos seis e meio milhões de dólares que os ministros andaram catando mundo afora vai só para pagar prestações e juros da dívida que já existia — e ainda vai ficar faltando.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Fev 2011
  • Data do Fascículo
    Jun 1984
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