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Síndrome de Budd-Chiari por obstrução da via de saída da veia hepática por membrana: tratamento percutâneo por angioplastia com balão

Resumo

A síndrome de Budd-Chiari é uma doença venosa hepática rara, mais incidente em adultos jovens, podendo se apresentar na forma aguda, subaguda ou crônica, o que resulta em hipertensão portal. O tratamento tradicional consiste em técnicas de trombólise e de shunts portossistêmicos intra-hepáticos, como pontes para o transplante hepático. Recentemente, técnicas de angioplastia com balão ou stents têm sido relatadas para o tratamento dessa afecção. Neste artigo, é relatado e discutido um caso de síndrome de Budd-Chiari por obstrução membranosa da via de saída da veia supra-hepática com trombose da veia hepática média em uma paciente de 24 anos. O tratamento estabelecido foi a angioplastia transjugular com balão, que obteve resultados satisfatórios e boa evolução clínica.

Palavras-chave:
síndrome de Budd-Chiari; trombose venosa; angioplastia; procedimentos endovasculares

Abstract

The Budd-Chiari syndrome is a rare hepatic venous disease. It is more prevalent in young adults and may present in acute, subacute, or chronic forms, causing portal hypertension. Traditional treatment consists of thrombolysis techniques and transjugular intrahepatic portosystemic shunt, as a bridge to liver transplantation. Recently, use of balloon or stent angioplasty techniques has been reported for treatment of this condition. In this article, we report and discuss a case of BCS by membranous obstruction in the hepatic vein outflow tract, with middle hepatic vein thrombosis, in a 24-year-old patient. The treatment chosen and employed was transjugular balloon angioplasty, which achieved satisfactory results and good clinical evolution.

Keywords:
Budd-Chiari syndrome; venous thrombosis; angioplasty; endovascular procedures

INTRODUÇÃO

A síndrome de Budd-Chiari (SBC) primária é uma doença vascular hepática extremamente rara, decorrente da obstrução do fluxo venoso de saída hepático, geralmente ao nível da veia hepática (VH) ou da veia cava inferior (VCI)11 Li Y, De Stefano V, Li H, et al. Epidemiology of Budd-Chiari syndrome: a systematic review and meta-analysis. Clin Res Hepatol Gastroenterol. 2019;43(4):468-74. http://dx.doi.org/10.1016/j.clinre.2018.10.014. PMid:30528513.
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2 Bozorgmanesh A, Selvam DA, Caridi JG. Budd-Chiari syndrome: hepatic venous web outflow obstruction treated by percutaneous placement of hepatic vein stent. Semin Intervent Radiol. 2007;24(1):100-5. http://dx.doi.org/10.1055/s-2007-971200. PMid:21326746.
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-33 Mukund A, Gamanagatti S. Imaging and interventions in Budd-Chiari syndrome. World J Radiol. 2011;3(7):169-77. http://dx.doi.org/10.4329/wjr.v3.i7.169. PMid:21860712.
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. Os dados epidemiológicos globais da SBC são escassos e estimam que a sua incidência seja cerca de um caso por milhão de habitantes por ano, considerando estudos epidemiológicos nos continentes asiático e europeu11 Li Y, De Stefano V, Li H, et al. Epidemiology of Budd-Chiari syndrome: a systematic review and meta-analysis. Clin Res Hepatol Gastroenterol. 2019;43(4):468-74. http://dx.doi.org/10.1016/j.clinre.2018.10.014. PMid:30528513.
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.

A etiopatogênese da SBC difere entre países orientais e ocidentais. Na maioria dos países ocidentais, a principal etiologia da SBC é trombótica, e, por isso, as principais formas de tratamento são a trombólise e o shunt trans-hepático portossistêmico (TIPS), como pontes para o transplante hepático. Já na China e em diversos outros países orientais, a principal causa é a doença venosa oclusiva por membrana desde qualquer segmento venoso hepático até a junção cavo-atrial, sendo a angioplastia com ou sem stent a primeira escolha para tratamento22 Bozorgmanesh A, Selvam DA, Caridi JG. Budd-Chiari syndrome: hepatic venous web outflow obstruction treated by percutaneous placement of hepatic vein stent. Semin Intervent Radiol. 2007;24(1):100-5. http://dx.doi.org/10.1055/s-2007-971200. PMid:21326746.
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,33 Mukund A, Gamanagatti S. Imaging and interventions in Budd-Chiari syndrome. World J Radiol. 2011;3(7):169-77. http://dx.doi.org/10.4329/wjr.v3.i7.169. PMid:21860712.
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.

Relatamos o tratamento endovascular de uma SBC por membrana oclusiva na via de saída da veia supra-hepática, com repercussão clínica e hemodinâmica, pela venografia via acesso jugular e uso de angioplastia com balão.

O protocolo foi aprovado pelo Comitê de Ética de nossa instituição (parecer número 4.749.464).

DESCRIÇÃO DO CASO

Paciente do sexo feminino, 24 anos, previamente saudável, raça branca, natural e procedente de Feira de Santana (BA), com história de distensão abdominal, prostração e um episódio de hematêmese havia 3 meses. A paciente não apresentava histórico de traumas, tromboses prévias, gestação, dor abdominal, icterícia, hematomas ou acolia fecal, assim como negava qualquer descendência oriental. O exame clínico confirmou a distensão abdominal, com veias colaterais abdominais, hepatomegalia e ascite. O exame laboratorial revelou enzimas hepáticas, provas de coagulação e bilirrubina dentro da normalidade e albumina sérica baixa. O exame ultrassonográfico revelou ascite com fluxo sanguíneo portal hepatopedal normal. A tomografia computadorizada (TC) com contraste revelou hepatomegalia com realce heterogêneo, denominado fígado em “noz-moscada”, lobo caudado hipertrofiado, e as veias hepáticas direita e esquerda apresentavam retenção de contraste. Não houve boa visualização da VH média, sugerindo trombose (Figura 1A). A paciente foi diagnosticada com SBC por provável obstrução da via de saída da veia supra-hepática, sendo encaminhado à radiologia intervencionista para venografia e tratamento, após endoscopia digestiva alta com escleroterapia endoscópica das varizes esofágicas.

Figura 1
Imagens tomográficas axiais na fase portal do pré-operatório da primeira intervenção em (A) e antes da segunda intervenção (B) endovascular (2 anos e 8 meses após), demonstrando a evolução das estenoses nas vias de saídas nas veias hepáticas (setas longas) e da alteração na proporção dos distúrbio perfusional do parênquima hepático (cabeça de seta). Nota-se também a não opacificação da veia hepática média.

A venografia foi realizada sob anestesia local e analgesia com sedação consciente, utilizando abordagem transjugular, mas houve dificuldade de cateterização da veia supra-hepática. Foi, então, utilizado o ultrassom intravascular (UI) para melhor visualização da desembocadura da VH na VCI. O UI confirmou uma estenose > 80% na via de saída das VHs, direita e esquerda, e a flebografia demonstrou estase venosa dessas duas veias, assim como estenose crítica na via de saída. A VH média não foi visualizada. Um fio guia hidrofílico 0,035 x 260 mm (Terumo Medical, Somerset, NJ) foi, então, introduzido através da estenose crítica da veia supra-hepática, via veia jugular direita. A angioplastia da estenose com balões de alta pressão de 8 mm, inicialmente, e 12 mm posteriormente restabeleceu o fluxo (Figura 2). A paciente evoluiu satisfatoriamente no pós-operatório, com acentuada redução na circunferência abdominal e dos vasos colaterais abdominais, tendo alta hospitalar com 15 dias de pós-operatório, em uso de rivaroxabana, com a intenção de uso por 6 meses.

Figura 2
Imagens da flebografia intraoperatória de veia supra-hepática seguida de angioplastia com balão na primeira intervenção. Em (A), flebografia demonstrando estase de veias hepáticas, ocasionada por estenose em via de saída da veia supra- hepática. Em (B), pré-dilatação com uso de balão de 8 mm. Observe a estenose ocasionada no balão. Em (C), dilatação com balão de 12 mm. Observe a diminuição da estenose ocasionada no balão. Em (D), flebografia de controle demonstrando melhora importante do fluxo na via de saída.

Durante o acompanhamento pós-operatório com 1, 3 e 12 meses, apresentou evolução favorável e sem sinais de síndrome de hipertensão portal (SHP) nos exames clínicos, laboratoriais e de imagem. Foram feitos exames para trombofilia, após a suspensão da anticoagulação, com resultados normais. Após 2 anos de acompanhamento, a paciente retornou em consulta ambulatorial grávida de 14 semanas, sem sinais de descompensação clínica ou laboratorial, sendo introduzida anticoagulação com heparina fracionada pela gastroenterologia e hematologia. A gestação veio a termo com 38 semanas, e, no puerpério, a paciente manteve evolução favorável, sendo mantida a anticoagulação. Após o puerpério, realizou nova TC que demonstrou uma diminuição do diâmetro da via de saída (7 mm) comparada ao exame prévio (12 mm), com o aparecimento de ascite detectada pela TC, porém sem evidências clínicas (Figura 1B). Optado, em conjunto com a gastro-hepatologia, por nova angioplastia da veia supra-hepática.

O procedimento foi realizado pela mesma via e utilizando os procedimentos anestésicos anteriormente descritos, sendo evidenciada estenose na via de saída de cerca de 50% pela flebografia. Foram realizadas angioplastias consecutivas com balões venosos de alta pressão de 10 e 14 mm. O resultado venográfico foi satisfatório, e a alta hospitalar foi realizada no dia seguinte ao procedimento (Figura 3). A TC de controle com 1 mês de pós-operatório demonstrou uma melhora do diâmetro da via saída (12 mm) e ausência de ascite. Atualmente encontra-se em acompanhamento, com 1 ano de pós-operatório, sendo realizado ultrassom abdominal total (USG) e dúplex das veias supra-hepáticas a cada 6 meses, estando assintomática e com exames laboratoriais normais. A paciente deu consentimento para a descrição e publicação do caso.

Figura 3
Imagens da flebografia intraoperatória de veia supra-hepática seguida de angioplastia com balão na segunda intervenção. Em (A), flebografia demonstrando estase de veias hepáticas, ocasionada por estenose em via de saída da veia supra- hepática. Em (B), pré-dilatação com uso de balão de 10 mm. Observe a estenose ocasionada no balão. Em (C), dilatação com balão de 14 mm. Em (D), flebografia de controle demonstrando melhora importante do fluxo na via de saída.

DISCUSSÃO

A SBC constitui uma afecção de incidência extremamente baixa. Os dados epidemiológicos são escassos, e, quando encontrados, os estudos são em sua maioria realizados no continente asiático11 Li Y, De Stefano V, Li H, et al. Epidemiology of Budd-Chiari syndrome: a systematic review and meta-analysis. Clin Res Hepatol Gastroenterol. 2019;43(4):468-74. http://dx.doi.org/10.1016/j.clinre.2018.10.014. PMid:30528513.
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. Essa síndrome é causada pela oclusão do fluxo venoso hepático a qualquer nível desde as VHs até a junção átrio-caval, podendo ser de origem primária ou secundária. A trombose intraluminal intrínseca constitui a principal causa primária da SBC, mais frequente em adultos jovens e com anormalidade hematológica subjacente, que desencadeia um estado de hipercoagulabilidade. Algumas das afecções que originam o estado de hipercoagulação são doença mieloproliferativa, deficiência de proteína C ou S, trombocitose essencial, lúpus eritematoso sistêmico, mutação do fator V Leiden, hemoglobinúria paroxística noturna, síndrome antifosfolipídica e uso de contraceptivos orais. Já as causas secundárias podem ser representadas por compressão extraluminal (abscesso ou tumor) ou ainda por invasão intraluminal (tumoral ou parasitária)22 Bozorgmanesh A, Selvam DA, Caridi JG. Budd-Chiari syndrome: hepatic venous web outflow obstruction treated by percutaneous placement of hepatic vein stent. Semin Intervent Radiol. 2007;24(1):100-5. http://dx.doi.org/10.1055/s-2007-971200. PMid:21326746.
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3 Mukund A, Gamanagatti S. Imaging and interventions in Budd-Chiari syndrome. World J Radiol. 2011;3(7):169-77. http://dx.doi.org/10.4329/wjr.v3.i7.169. PMid:21860712.
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4 Bayraktar UD, Seren S, Bayraktar Y. Hepatic venous outflow obstruction: three similar syndromes. World J Gastroenterol. 2007;13(13):1912-27. http://dx.doi.org/10.3748/wjg.v13.i13.1912. PMid:17461490.
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-55 Ding PX, Liu C, Han XW, Ding JY, Tse G, Lee EW. Obstructed membranous transformation of the inferior vena cava in patients with hepatic vein-type Budd-Chiari syndrome: a case series. Clin Res Hepatol Gastroenterol. 2020;44(2):e17-24. http://dx.doi.org/10.1016/j.clinre.2019.10.008. PMid:31786160.
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.

A fisiopatologia da formação da trombose intraluminal não é bem conhecida, mas a principal suspeita é de um processo multifatorial que envolve o constante movimento respiratório do diafragma associado a uma confluência perpendicular da veia supra-hepática à VCI, que causa lesões endoteliais microscópicas na VCI em seu segmento supra-hepático. Além disso, na população ocidental diagnosticada com SBC, é possível observar uma forte associação com um estado de hipercoagulabilidade que promove a microtrombose. Esse processo é lento e gradual, levando a uma organização de tecido fibrótico na parede da veia. Já nos pacientes orientais, é incomum identificar anormalidades hematológicas subjacentes, evidenciando diferenças relevantes da etiologia dessa síndrome entre as distintas populações, sendo a presença de membranas a principal causa para a SBC nessa população55 Ding PX, Liu C, Han XW, Ding JY, Tse G, Lee EW. Obstructed membranous transformation of the inferior vena cava in patients with hepatic vein-type Budd-Chiari syndrome: a case series. Clin Res Hepatol Gastroenterol. 2020;44(2):e17-24. http://dx.doi.org/10.1016/j.clinre.2019.10.008. PMid:31786160.
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A SBC pode ser classificada de acordo com o seu tempo de evolução e gravidade, em fulminante, aguda, subaguda ou crônica22 Bozorgmanesh A, Selvam DA, Caridi JG. Budd-Chiari syndrome: hepatic venous web outflow obstruction treated by percutaneous placement of hepatic vein stent. Semin Intervent Radiol. 2007;24(1):100-5. http://dx.doi.org/10.1055/s-2007-971200. PMid:21326746.
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. Outra classificação utilizada é de acordo com o local de acometimento da obstrução: tipo VCI (acomete apenas a VCI, sem comprometimento da VH), tipo VH (acometimento da VH, incluindo a VH acessória, mas sem comprometimento da VCI) e tipo combinado (comprometimento da VCI e pelo menos uma das tributárias da VH)55 Ding PX, Liu C, Han XW, Ding JY, Tse G, Lee EW. Obstructed membranous transformation of the inferior vena cava in patients with hepatic vein-type Budd-Chiari syndrome: a case series. Clin Res Hepatol Gastroenterol. 2020;44(2):e17-24. http://dx.doi.org/10.1016/j.clinre.2019.10.008. PMid:31786160.
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. Essas classificações são importantes no planejamento da abordagem terapêutica. O caso relatado trata-se de uma obstrução primária, sem disfunção de coagulabilidade subjacente conhecida, classificada como crônica e do tipo VH, como evidenciado pelo quadro clínico e pela TC com contraste.

A formação da membrana obstrutiva no interior da veia é um processo lento que apresenta compensação através do estabelecimento de circulação colateral. Os sintomas só se tornam presentes nos pacientes quando a estenose é significativa, permanecendo assintomático até esse momento55 Ding PX, Liu C, Han XW, Ding JY, Tse G, Lee EW. Obstructed membranous transformation of the inferior vena cava in patients with hepatic vein-type Budd-Chiari syndrome: a case series. Clin Res Hepatol Gastroenterol. 2020;44(2):e17-24. http://dx.doi.org/10.1016/j.clinre.2019.10.008. PMid:31786160.
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. No entanto, a apresentação clínica depende ainda da extensão e rapidez da obstrução do fluxo de saída, podendo manifestar-se em poucos dias ou após anos de evolução44 Bayraktar UD, Seren S, Bayraktar Y. Hepatic venous outflow obstruction: three similar syndromes. World J Gastroenterol. 2007;13(13):1912-27. http://dx.doi.org/10.3748/wjg.v13.i13.1912. PMid:17461490.
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. Os sintomas são progressivos até cirrose hepática, quando não tratada em tempo hábil66 Cheng DL, Zhu N, Xu H, et al. Outcomes of endovascular interventional therapy for primary Budd-Chiari syndrome caused by hepatic venous obstruction. Exp Ther Med. 2018;16(5):4141-9. http://dx.doi.org/10.3892/etm.2018.6708. PMid:30402156.
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. Quando instaurado o quadro agudo, pode culminar em insuficiência hepática, manifestando-se com náuseas, vômitos, icterícia e alterações laboratoriais22 Bozorgmanesh A, Selvam DA, Caridi JG. Budd-Chiari syndrome: hepatic venous web outflow obstruction treated by percutaneous placement of hepatic vein stent. Semin Intervent Radiol. 2007;24(1):100-5. http://dx.doi.org/10.1055/s-2007-971200. PMid:21326746.
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,66 Cheng DL, Zhu N, Xu H, et al. Outcomes of endovascular interventional therapy for primary Budd-Chiari syndrome caused by hepatic venous obstruction. Exp Ther Med. 2018;16(5):4141-9. http://dx.doi.org/10.3892/etm.2018.6708. PMid:30402156.
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. Já o quadro crônico pode caracterizar-se pela presença de hepatomegalia, icterícia e SHP, além de complicações mais tardias, como sangramento do trato gastrointestinal e carcinoma hepatocelular22 Bozorgmanesh A, Selvam DA, Caridi JG. Budd-Chiari syndrome: hepatic venous web outflow obstruction treated by percutaneous placement of hepatic vein stent. Semin Intervent Radiol. 2007;24(1):100-5. http://dx.doi.org/10.1055/s-2007-971200. PMid:21326746.
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,44 Bayraktar UD, Seren S, Bayraktar Y. Hepatic venous outflow obstruction: three similar syndromes. World J Gastroenterol. 2007;13(13):1912-27. http://dx.doi.org/10.3748/wjg.v13.i13.1912. PMid:17461490.
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,66 Cheng DL, Zhu N, Xu H, et al. Outcomes of endovascular interventional therapy for primary Budd-Chiari syndrome caused by hepatic venous obstruction. Exp Ther Med. 2018;16(5):4141-9. http://dx.doi.org/10.3892/etm.2018.6708. PMid:30402156.
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O caso relatado evidencia uma paciente jovem, previamente saudável, com queixas crônicas de distensão abdominal, prostração e um episódio de hematêmese. Ao exame físico, apresentou os achados clínicos de SHP. A SBC deve constituir um dos diagnósticos diferenciais para todo paciente que apresentar esses achados na ausência de doença parenquimatosa hepática primária ou secundária77 Sparano J, Chang J, Trasi S, Bonanno C. Treatment of the Budd-Chiari syndrome with percutaneous transluminal angioplasty: case report and review of the literature. Am J Med. 1987;82(4):821-8. http://dx.doi.org/10.1016/0002-9343(87)90022-2. PMid:2952007.
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As opções de tratamento são anticoagulação, terapia endovascular de descompressão (trombólise, angioplastia ou shunt portossistêmico intra-hepático transjugular) ou transplante de fígado. A evolução das possibilidades de tratamento para a SBC possibilitou um importante aumento da sobrevida desses pacientes (80-90%)66 Cheng DL, Zhu N, Xu H, et al. Outcomes of endovascular interventional therapy for primary Budd-Chiari syndrome caused by hepatic venous obstruction. Exp Ther Med. 2018;16(5):4141-9. http://dx.doi.org/10.3892/etm.2018.6708. PMid:30402156.
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A angioplastia com balão ou stent é a primeira linha para o tratamento da SBC primária por membrana obstrutiva, e sua eficácia é de 95,7%33 Mukund A, Gamanagatti S. Imaging and interventions in Budd-Chiari syndrome. World J Radiol. 2011;3(7):169-77. http://dx.doi.org/10.4329/wjr.v3.i7.169. PMid:21860712.
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,66 Cheng DL, Zhu N, Xu H, et al. Outcomes of endovascular interventional therapy for primary Budd-Chiari syndrome caused by hepatic venous obstruction. Exp Ther Med. 2018;16(5):4141-9. http://dx.doi.org/10.3892/etm.2018.6708. PMid:30402156.
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,88 Lee BB, Villavicencio L, Kim YW, et al. Primary Budd-Chiari syndrome: outcome of endovascular management for suprahepatic venous obstruction. J Vasc Surg. 2006;43(1):101-8. http://dx.doi.org/10.1016/j.jvs.2005.09.003. PMid:16414396.
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9 Qi X, Han G, Guo X, et al. Review article: the aetiology of primary Budd-Chiari syndrome: differences between the West and China. Aliment Pharmacol Ther. 2016;44(11-12):1152-67. http://dx.doi.org/10.1111/apt.13815. PMid:27734511.
http://dx.doi.org/10.1111/apt.13815...
-1010 Valla DC. Budd-Chiari syndrome/hepatic venous outflow tract obstruction. Hepatol Int. 2018;12(Supl 1):168-80. http://dx.doi.org/10.1007/s12072-017-9810-5. PMid:28685257.
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. Pode ser realizada por via jugular, hepática percutânea ou femoral; no entanto, em alguns casos se faz necessária a abordagem combinada33 Mukund A, Gamanagatti S. Imaging and interventions in Budd-Chiari syndrome. World J Radiol. 2011;3(7):169-77. http://dx.doi.org/10.4329/wjr.v3.i7.169. PMid:21860712.
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,77 Sparano J, Chang J, Trasi S, Bonanno C. Treatment of the Budd-Chiari syndrome with percutaneous transluminal angioplasty: case report and review of the literature. Am J Med. 1987;82(4):821-8. http://dx.doi.org/10.1016/0002-9343(87)90022-2. PMid:2952007.
http://dx.doi.org/10.1016/0002-9343(87)9...

8 Lee BB, Villavicencio L, Kim YW, et al. Primary Budd-Chiari syndrome: outcome of endovascular management for suprahepatic venous obstruction. J Vasc Surg. 2006;43(1):101-8. http://dx.doi.org/10.1016/j.jvs.2005.09.003. PMid:16414396.
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9 Qi X, Han G, Guo X, et al. Review article: the aetiology of primary Budd-Chiari syndrome: differences between the West and China. Aliment Pharmacol Ther. 2016;44(11-12):1152-67. http://dx.doi.org/10.1111/apt.13815. PMid:27734511.
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-1010 Valla DC. Budd-Chiari syndrome/hepatic venous outflow tract obstruction. Hepatol Int. 2018;12(Supl 1):168-80. http://dx.doi.org/10.1007/s12072-017-9810-5. PMid:28685257.
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. A via de acesso escolhida para a abordagem da paciente em questão foi a via jugular, que apresenta alta taxa de sucesso, pois o ângulo entre a VH e a VCI é relativamente grande, facilitando a passagem do fio-guia66 Cheng DL, Zhu N, Xu H, et al. Outcomes of endovascular interventional therapy for primary Budd-Chiari syndrome caused by hepatic venous obstruction. Exp Ther Med. 2018;16(5):4141-9. http://dx.doi.org/10.3892/etm.2018.6708. PMid:30402156.
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. Após a passagem do fio-guia pelo segmento ocluído, é realizada a dilatação do segmento estenosado com o uso do balão de alta pressão com diâmetros progressivamente maiores33 Mukund A, Gamanagatti S. Imaging and interventions in Budd-Chiari syndrome. World J Radiol. 2011;3(7):169-77. http://dx.doi.org/10.4329/wjr.v3.i7.169. PMid:21860712.
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. O uso do balonamento progressivo, assim como a insuflação e desinsuflação lenta dos balões, deve ser realizado consoante às medidas tomográficas pré-operatórias e também conforme a sintomatologia de dor da paciente — uma vez havendo essa queixa, pressão maior no balão não deve ser alcançada. O uso do stent é reservado para lesões que não melhoram o gradiente pressórico com a angioplastia com balão ou que apresentam recoil importante, mesmo após balonamentos progressivos. No caso apresentado, após a dilatação do segmento estenosado, foi possível notar a melhora do quadro clínico de forma precoce, com redução da ascite, do edema e dos vasos colaterais abdominais33 Mukund A, Gamanagatti S. Imaging and interventions in Budd-Chiari syndrome. World J Radiol. 2011;3(7):169-77. http://dx.doi.org/10.4329/wjr.v3.i7.169. PMid:21860712.
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.

Após o tratamento endovascular, faz-se necessário o acompanhamento do paciente com avaliação clínica e realização de exames de imagem com USG com Doppler e TC2, além de manutenção de anticoagulação por pelo menos 6 meses após a angioplastia, podendo esse período ser variável de acordo com as condições do paciente66 Cheng DL, Zhu N, Xu H, et al. Outcomes of endovascular interventional therapy for primary Budd-Chiari syndrome caused by hepatic venous obstruction. Exp Ther Med. 2018;16(5):4141-9. http://dx.doi.org/10.3892/etm.2018.6708. PMid:30402156.
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. A paciente apresentou uma nova estenose após 2,5 anos do tratamento endovascular inicial, logo após o período de puerpério. Essa condição fisiológica é responsável pelo estabelecimento de um estado de hipercoagulabilidade a partir da 10ª semana de gestação, o que pode agir como determinante na formação de nova membrana obstrutiva da VH e consequente trombose33 Mukund A, Gamanagatti S. Imaging and interventions in Budd-Chiari syndrome. World J Radiol. 2011;3(7):169-77. http://dx.doi.org/10.4329/wjr.v3.i7.169. PMid:21860712.
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,1111 Souza AI, Batista M Fo, Ferreira LOC. Alterações hematológicas e gravidez. Rev Bras Hematol Hemoter. 2002;24(1):29-36. http://dx.doi.org/10.1590/S1516-84842002000100006.
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. Portanto, tornam-se necessários a anticoagulação e o acompanhamento rigoroso do caso, para que, em uma eventual descompensação clínica, medidas como nova angioplastia com balão ou com stent, em caso de falha, estejam prontamente disponíveis.

  • Como citar: Metzger PB, Costa KR, Silva SL, et al. Síndrome de Budd-Chiari por obstrução da via de saída da veia hepática por membrana: tratamento percutâneo por angioplastia com balão. J Vasc Bras. 2021;20:e20200133. https://doi.org/10.1590/1677-5449.200133
  • Fonte de financiamento: Nenhuma.
  • O estudo foi realizado no Hospital da Bahia (HBA), Salvador, BA, Brasil.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    02 Ago 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    19 Jul 2020
  • Aceito
    24 Ago 2020
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