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Utilidade clínica de um monitoramento por EEG de amplitude integrada precoce em recém-nascidos a termo com risco de lesão neurológica Como citar este artigo: Toso PA, González AJ, Pérez ME, Kattan J, Fabres JG, Tapia JL, et al. Clinical utility of early amplitude integrated EEG in monitoring term newborns at risk of neurological injury. J Pediatr (Rio J). 2014;90:143-8. , ☆ ☆ ☆☆ Unidade de Terapia Intensiva Neonatal, Hospital Clínico, Pontificia Universidad Católica de Chile, Santiago, Chile.

Resumos

OBJETIVO:

testar a utilidade clínica do aEEG precoce em recém-nascidos a termo com risco delesão neurológica, para prever resultados neurológicos de curto prazo.

MÉTODOS:

estudo prospectivo e descritivo. Os critérios de inclusão foram encefalopatia neonatal, distúrbios neurológicos e bebês com SARA grave. Sensibilidade, especificidade, valor preditivo positivo e negativo e razão de verossimilhança foram calculados. Dados clínicos edemográficos foram analisados. O resultado neurológico foi definido como a soma de conclusões clínicas, de eletro e de neuroimagem.

RESULTADOS:

dentre os 21 neonatos monitorados, dez (48%) apresentaram resultado neurológico de curto prazo alterado. O aEEG apresentou sensibilidade de 90%, especificidade de 82%, valor preditivo positivo de 82% e valor preditivo negativo de 90%. A VR positiva foi de 4,95, e a RV negativa de 0,12. Em três dos 12 (25%) neonatos com encefalopatia foi possível definir melhora gravidade de sua condição pelo aEEG. Foram detectadas convulsões em oito neonatos (38%), todas subclínicas no início do estudo, e nenhum apresentou um padrão histórico normal no aEEG. O estado de três neonatos (43%) evoluiu e exigiu dois ou mais medicamentos para tratamento.

CONCLUSÕES:

em neonatos com encefalopatia ou outra doença grave, os distúrbios no aEEGocorrem com mais frequência. O aEEG forneceu uma classificação melhor da gravidade da encefalopatia, detectou convulsões subclínicas precoces e permitiu que fosse feito o monitoramento da resposta ao tratamento. O aEEG é uma ferramenta útil para prever resultados neurológicos de curto prazo em todos os bebês doentes na UTIN.

Eletroencefalo- gramade amplitude integrada (aEEG); Encefalopatia hipóxico-isquêmica (EHI); Terapia intensiva neonatal; Convulsões


OBJECTIVE:

to test the clinical utility of an early amplitude-integrated electroencephalography (aEEG) to predict short-term neurological outcome in term newborns at risk of neurology injury.

METHODS:

this was a prospective, descriptive study. The inclusion criteria were neonatal encephalopathy, neurologic disturbances, and severe respiratory distress syndrome. Sensitivity, specificity, positive and negative predictive values, and likelihood ratio (LR) were calculated. Clinical and demographic data were analyzed. Neurological outcome was defined as the sum of clinical, electroimaging, and neuroimaging findings.

RESULTS:

ten of the 21 monitored infants (48%) presented altered short-term neurologic outcome. The aEEG had 90% sensitivity, 82% specificity, 82% positive predictive value, and 90% negative predictive value. The positive LR was 4.95, and the negative LR was 0.12. In three of 12 (25%) encephalopathic infants, the aEEG allowed for a better definition of the severity of their condition. Seizures were detected in eight infants (38%), all subclinical at baseline, and none had a normal aEEG background pattern. The status of three infants (43%) evolved and required two or more drugs for treatment.

CONCLUSIONS:

in infants with encephalopathy or other severe illness, aEEG disturbances occur frequently. aEEG provided a better classification of the severity of encephalopathy, detected early subclinical seizures, and allowed for monitoring of the response to treatment. aEEG was a useful tool at the neonatal intensive care unit for predicting poor short-term neurological outcomes for all sick newborn.

Amplitude integrated electroencephalography (aEEG); Hypoxic ischemic encephalopathy (HIE); Neonatal intensive care; Seizures


Introdução

As práticas neonatais modernas envolvem a gestão de pacientes cada vez mais doentes e complexos. A avaliação da função neurológica desses pacientes é limitada pela gravidade da doença de base e pelo uso de sedativos. É difícil determinar quais pacientes precisam de acompanhamento neurológico especializado após uma doença neonatal.

A introdução do monitoramento cerebral contínuo por eletroencefalograma de amplitude integrada (aEEG) permite avaliar a função cerebral em tempo real e por longos períodos. As ondas de aEEG parecem ser o resultado da soma do potencial de repouso da membrana, influenciada primeiramente pelo estado metabólico e, em segundo lugar, pelo fluxo sanguíneo recebido pelo cérebro, entre outros fatores.11.Victor S, Marson AG, Appleton RE, Beirne M, Weindling AM. Relationship between blood pressure, cerebral electrical activity, cerebral fractional oxygen extraction, and peripheral blood flow in very low birth weight newborn infants. Pediatr Res. 2006;59:314-9.

2.Greisen G, Pryds O, Rosén I, Lou H. Poor reversibility of EEG abnormality in hypotensive, preterm neonates. Acta Paediatr Scand. 1988;77:785-90.

3.Benders MJ, Meinesz JH, van Bel F, van de Bor M. Changes in electrocortical brain activity during exchange transfusions in newborn infants. Biol Neonate. 2000;78:17-21.
- 44.West CR, Groves AM, Williams CE, Harding JE, Skinner JR, Kuschel CA, et-al. Early low cardiac output is associated with compromised electroencephalographic activity in very preterm infants. Pediatr Res. 2006;59:610-5.

Apesar de comprovado o valor prognóstico da evolução no monitoramento por aEEG após eventos hipóxico-isquêmicos,55.Thornberg E, Ekström-Jodal B. Cerebral function monitoring: a method of predicting outcome in term neonates after severe perinatal asphyxia. Acta Paediatr. 1994;83:596-601.

6.Hellström-Westas L, Rosén I, Svenningsen NW. Predictive value of early continuous amplitude integrated EEG recordings on outcome after severe birth asphyxia in full term infants. Arch Dis Child Fetal Neonatal Ed. 1995;72:F34-8.

7.van Rooij LG, Toet MC, Osredkar D, van Huffelen AC, Groenendaal F, de Vries LS. Recovery of amplitude integrated electroencephalographic background patterns within 24 hours of perinatal asphyxia. Arch Dis Child Fetal Neonatal Ed. 2005;90:F245-51.

8.ter Horst HJ, Sommer C, Bergman KA, Fock JM, van Weerden TW, Bos AF. Prognostic significance of amplitude-integrated EEG during the first 72 hours after birth in severely asphyxiated neonates. Pediatr Res. 2004;55:1026-33.

9.Sarnat HB, Sarnat MS. Neonatal encephalopathy following fetal distress. A clinical and electroencephalographic study. Arch Neurol. 1976;33:696-705.
- 1010.Spitzmiller RE, Phillips T, Meinzen-Derr J, Hoath SB. Amplitude-integrated EEG is useful in predicting neurodevelopmental outcome in full-term infants with hypoxic-ischemic encephalopathy: a meta-analysis. J Child Neurol. 2007;22:1069-78. sua utilidade para outras morbidades neonatais comuns não foi muito estudada. A principal limitação ao monitoramento por aEEG é que ele fornece informações limitadas sobre a atividade elétrica cerebral. As áreas monitoradas correspondem à irrigação máxima das três artérias cerebrais que supostamente são mais suscetíveis a insultos hipóxico-isquêmicos.1111.Hellström-Westas L, Westgren U, Rosén I, Svenningsen NW. Lidocaine for treatment of severe seizures in newborn infants I. Clinical effects and cerebral electrical activity monitoring. Acta Paediatr Scand. 1988;77:79-84. Há controvérsias sobre sua utilidade na detecção de convulsões.1212.Shellhaas RA, Soaita AI, Clancy RR. Sensitivity of amplitude-integrated electroencephalography for neonatal seizure detection. Pediatrics. 2007;120:770-7. Outra limitação é a distinção da real imagem de artefatos.1313.Hagmann CF, Robertson NJ, Azzopardi D. Artifacts on electroencephalograms may influence the amplitude-integrated EEG classification: a qualitative analysis in neonatal encephalopathy. Pediatrics. 2006;118:2552-4.

O principal objetivo deste estudo foi testar a utilidade clínica de um aEEG precoce para prever resultados neurológicos de curto prazo entre recém-nascidos a termo internados na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN), com risco de lesão neurológica.

Materiais e métodos

Pacientes

Foram selecionados, para monitoramento por aEEG, recém-nascidos a termo entre setembro de 2005 a agosto de 2006, caso considerados como evolução para risco neurológico. Dessa forma, foram incluídos bebês com encefalopatia neonatal, distúrbio neurológico ou com síndrome da angústia respiratória aguda (SARA). Médicos plantonistas fizeram os diagnósticos com base nos critérios clínicos e laboratoriais. Em neonatos com encefalopatia hipóxico-isquêmica (EHI), foi utilizada a classificação I-III de Sarnat por ordem de gravidade crescente.99.Sarnat HB, Sarnat MS. Neonatal encephalopathy following fetal distress. A clinical and electroencephalographic study. Arch Neurol. 1976;33:696-705. Os critérios de inclusão no protocolo de hipotermia foram: nascidos a termo, menos de seis horas de idade, sofrimento fetal agudo (e necessidade de reanimação prolongada e/ou sangue do cordão umbilical com pH < 7,0 e/ou índice de Apgar < 5 aos cinco minutos), evolução da encefalopatia e registro de aEEG alterado após a primeira hora de vida. Monitoramos pacientes com SARA atingindo o índice oxigenação (IO) > 18. Os critérios para o tratamento da oxigenação por membrana extracorpórea (ECMO) foram IO > 40, após administração máxima por via respiratória e doença pulmonar reversível. Foram incluídos bebês diagnosticados com lesão cerebral pré-natal ou malformação, além de pacientes simultâneos, pois apenas um monitor cerebral estava disponível. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética de nossa instituição, e foi obtido o consentimento informado dos pais.

Monitoramento

Foram posicionados eletrodos no couro cabeludo raspado dos pacientes, e os mesmos foram monitorados com equipamentos que fornecem informações sobre ambos os hemisférios do cérebro em regiões equivalentes às C3-P3 e C4-P4 de um EEG padrão. Esse aparelho amplifica o sinal obtido após ser filtrado entre 2-15 Hz, integra informações da amplitude das ondas obtidas e, então, as digitaliza para mostrar padrões na tela a 6 cm/hora, e os dados brutos do EEG em tempo real. Um médico (não cego), com o auxílio de supervisores médicos treinados nessa técnica, interpretou os traçados. As informações foram armazenadas em um disco rígido do computador para análise adicional utilizando dois softwares(Analyze e Chart Analyzer). Os padrões obtidos foram qualificados segundo a classificação de Hellström-Westas, na qual o Tipo 1 é normal e 2, 3, 4 e 5 são alterados com ordem de gravidade crescente.1414.Hellström-Westas L, Rosén I, de Vries LS, Greisen G. Amplitude-integrated EEG classification and interpretation in preterm and term infants. NeoReviews. 2006;7:e76-87. O monitoramento foi feito o mais rápido possível, e continuou até que os pacientes estivessem estáveis. EEG foi solicitado em casos selecionados como uma necessidade clínica padrão. A presença e o manejo de convulsões foram registrados, bem como eventos adversos relacionados à técnica de aEEG. Registramos o uso de medicamentos que afetam o sistema nervoso central.1515.Bell AH, Greisen G, Pryds O. Comparison of the effects of phenobarbitone and morphine administration on EEG activity in preterm babies. Acta Paediatr. 1993;82:35-9.

16.van Leuven K, Groenendaal F, Toet MC, Schobben AF, Bos SA, de Vries LS, et-al. Midazolam and amplitude-integrated EEG in asphyxiated full-term neonates. Acta Paediatr. 2004;93:1221-7.

17.Nguyen The Tich S, Vecchierini MF, Debillon T, Péréon Y. Effects of sufentanil on electroencephalogram in very and extremely preterm neonates. Pediatrics. 2003;111:123-8.
- 1818.Young GB, da Silva OP. Effects of morphine on the electroencephalograms of neonates: a prospective, observational study. Clin Neurophysiol. 2000;111:1955-60.

Coleta de dados e medidas de resultados

Foram coletados dados demográficos e clínicos de forma prospectiva. O principal resultado foi evolução neurológica de curto prazo, classificada como normal ou anormal.

O resultado neurológico anormal foi definido como práticas clínicas padrão: a presença de um exame físico alterado (perturbações na consciência, hiper ou hipotonia, ausência de fixação visual e/ou ausência de engasgo, sucção e autonomia na alimentação), documentado pelo médico plantonista após a evolução aguda ter sido resolvida; um exame de imagem cerebral alterado (presença de lesão da substância cinzenta ou branca, comprometimento dos gânglios da base, lesões hemorrágicas e/ou causadas por derrame); e/ou EEG alterado antes da alta (padrão histórico alterado, tensão reduzida persistente e/ou convulsões). Foi solicitada neuroimagem, dependendo da necessidade clínica (ultrassom da cabeça, tomografia computadorizada por transmissão ou ressonância magnética), e a mesma foi informada por um neurorradiologista independente, não ciente dos achados clínicos e do aEEG.

Análise

Os dados descritivos foram apresentados como média ± DP ou mediana (intervalo), conforme adequado. Foi utilizado o teste t bicaudal com intervalo de confiança de 95% para as variáveis paramétricas, e o teste de Mann Whitney para não paramétricas. As variáveis categóricas foram comparadas por meio do teste exato de mid-p.

Sensibilidade, especificidade, valores preditivos positivos e negativos e razões de verossimilhança (RV) positiva e negativa foram calculados com um intervalo de confiança de 95%, para avaliar o aEEG como uma ferramenta preditiva da evolução neurológica de curto prazo em todos os pacientes, independentemente do diagnóstico.

Resultados

Durante o período do estudo, 2.196 bebês nasceram em nosso centro, e 118 foram transferidos de outros centros. Desses pacientes, 225 neonatos a termo foram internados na UTIN. Foram monitorados 21 bebês, dos quais 13 eram transferidos de outros centros. Os diagnósticos dos pacientes incluídos foram: encefalopatia neonatal em 12 recém-nascidos (5 foram incluídos no protocolo de hipotermia); hipertensão pulmonar secundária a SARA em oito (quatro com início de ECMO); e um com suspeita de convulsões neonatais. A idade gestacional dos pacientes foi 38,6 ± 1,4 semanas (média ± DP). O monitoramento foi iniciado às dez (4-20) horas de vida [mediana (PC25-PC75)], e a duração média do monitoramento foi de 54 (27-120) horas. Obtivemos 1.626 horas de monitoramento. Nenhum dos pacientes veio a óbito durante o período do estudo.

As características demográficas e clínicas dos pacientes estão descritas na tabela 1. Dos 21 pacientes estudados, dez apresentaram resultado neurológico de curto prazo alterado, conforme definido por critérios clínicos, do EEG e/ou da neuroimagem alterada. Os bebês com alterações neurológicas apresentaram índices de Apgar de cinco minutos inferiores ao grupo normal, e os mesmos estavam mais propensos a desenvolver convulsões durante a evolução. O grupo resultado neurológico anormal tem uma tendência a ser mais representado por pacientes com encefalopatia, porém a diferença não foi estatisticamente significativa. Os três pacientes que não apresentaram encefalopatias nesse grupo também apresentaram um curso neurológico complicado, porém, tal fato não pareceu estar ligado a um evento hipóxico-isquêmico perinatal. O aEEG mostrou resultados anormais em nove desses dez bebês (sensibilidade de 90%, IC de 95% 59,6-98,2). Dos 11 pacientes neurologicamente normais, nove também apresentaram aEEG completamente normal (especificidade de 82%, IC de 95% 52,3-94,9). O valor preditivo positivo foi de 82% (IC de 95% 52, 3-94, 9), e o valor preditivo negativo foi de 90% (IC de 95% 59, 6-98, 2). Analisado como uma razão de verossimilhança (VR), a VR positiva foi de 4,95 (IC de 95% 1,81-13,51), e a RV negativa de 0,12 (IC de 95% 0,02-0,91).

Tabela 1
Características demográficas e clínicas do grupo de estudo

Dentre os bebês, 48% inicialmente apresentaram um padrão normal no aEEG, e os resultados permaneceram normais até o final do registro. Nenhum deles apresentou convulsões. Os registros mostraram que os padrões do tipo anormal 2, 3, 4 e 5 do aEEG eram mais propensos a continuar alterados.

Apresentaram convulsões durante o monitoramento 38% das crianças. Todas as constatações foram feitas inicialmente por monitoramento, pois as mesmas foram feitas cerca de três horas após a correlação clínica (fig. 1). Todas as crianças que tiveram convulsões apresentaram um padrão normal no aEEG no início do monitoramento. Dentre os recém-nascidos que evoluíram para um estado convulsivo, 75% necessitaram Dio uso de dois ou mais medicamentos para tratamento das convulsões (fig. 2).

Figura 1
Paciente com hipertensão pulmonar secundária grave relacionada à cardiomiopatia dilatada com insuficiência cardíaca. No terceiro dia de vida, o aEEG mostrou convulsões no hemisfério direito. Devido a uma suspeita clínica, um ultrassom da cabeça foi realizado, mostrando hemorragia intraventricular no lado direito do cérebro. aEEG, Amplitude integrated electroencephalography; aEEG, Eletroencefalograma de amplitude integrada; EEG Waveform Left, Forma de Onda no EEG do Lado Esquerdo; EEG Waveform Right, Forma de Onda no EEG do Lado Direito; aEEG Left, aEEG do Lado Esquerdo; aEEG Right, aEEG do Lado Direito.

Figura 2
Paciente com padrão suprimido no aEEG evolui para um estado epilético. Ele foi tratado com 60 mg/kg de fenobarbital sem efeitos sobre convulsões. A seta mostra como as convulsões são controladas com fenitoína, e a linha básica se torna mais suprimida. EEG Waveform Left, Forma de Onda no EEG do Lado Esquerdo; EEG Waveform Right, Forma de Onda no EEG do Lado Direito; aEEG Left, aEEG do Lado Esquerdo; aEEG Right, aEEG do Lado Direito.

Dentre os 12 neonatos com encefalopatia (tabela 2), os registros normais de cinco deles foram decisivos para que não fossem classificados para o protocolo de hipotermia. Dois recém-nascidos com encefalopatia apresentaram padrões alterados no aEEG, porém o tratamento da hipotermia foi feito tardiamente (recomenda-se iniciar antes de seis horas de vida). Os pacientes de números 3, 8 e 12 apresentaram sintomas de EHI grau I no momento da avaliação, porém o registro do aEEG mostrou anormalidade; um dos neonatos desenvolveu convulsões posteriormente, assim os três pacientes, de fato, evoluíram para EHI grau II em vez de EHI grau I, como na primeira abordagem clínica.

Tabela 2
Características clínicas e do aEEG de pacientes com encefalopatia

Foi realizado EEGs padrão em 11 dos recém-nascidos (57%), e os resultados foram compatíveis com os do aEEG.

Não houve eventos adversos locais ou gerais relacionados ao uso dessa técnica. Artefatos foram relatados em 29% dos pacientes, associados a algumas dificuldades com o sinal de detecção do aEEG, principalmente em pacientes com edema no couro cabeludo e em três pacientes com hipotermia. Os sinais intermitentes resultam do deslocamento dos sensores e, no caso de um bebê, da interferência do ventilador de alta frequência.

Discussão

Prior e Maynard inventaram o aEEG nos anos 60, para monitorar pacientes cardíacos adultos.1919.Maynard D, Prior PF, Scott DF. Device for continuous monitoring of cerebral activity in resuscitated patients. Br Med J. 1969;4:545-6. Desde o final da década de 1970, o mesmo tem sido utilizado em recém-nascidos, porém inicialmente apenas na Europa.2020.Verma UL, Archbald F, Tejani NA, Handwerker SM. Cerebral function monitor in the neonate I: Normal patterns. Dev Med Child Neurol. 1984;26:154-61.

21.Hellström-Westas L, Rosén I. Amplitude-integrated electroencephalogram in newborn infants for clinical and research purposes. Acta Paediatr. 2002;91:1028-30.

22.Toet MC, van der Meij W, de Vries LS, Uiterwaal CS, van Huffelen KC. Comparison between simultaneously recorded amplitude integrated electroencephalogram (cerebral function monitor) and standard electroencephalogram in neonates. Pediatrics. 2002;109:772-9.
- 2323.Hellström-Westas L. Comparison between tape-recorded and amplitude-integrated EEG monitoring in sick newborn infants. Acta Paediatr. 1992;81:812-9. A necessidade de identificar recém-nascidos com encefalopatia com risco neurológico elevado levou ao desenvolvimento dessa técnica, paralelamente a estudos multicêntricos de hipotermia,2424.Shalak LF, Laptook AR, Velaphi SC, Perlman JM. Amplitude-integrated electroencephalography coupled with an early neurologic examination enhances prediction of term infants at risk for persistent encephalopathy. Pediatrics. 2003;111:351-7. fazendo com que fosse utilizado no restante do mundo.2525.Gluckman PD, Wyatt JS, Azzopardi D, Ballard R, Edwards AD, Ferriero DM, et-al. Selective head cooling with mild systemic hypothermia after neonatal encephalopathy: multicentre randomised trial. Lancet. 2005;365:663-70. Atualmente, essa técnica está cada vez mais sofisticada, com um equipamento menos invasivo. Então, este estudo visou testar a tecnologia emergente, na ânsia de melhor entender a abordagem clínica.

Na época de nosso estudo, cerca de 10% de nossos nascidos a termo estavam muito doentes e qualificavam-se para o monitoramento por aEEG. Com os critérios de inclusão utilizados para monitorar os pacientes em nossa UTIN, o aEEG precoce serviu como um bom teste de diagnóstico, para prever resultados neurológicos de curto prazo mal diagnosticados. Ele mostrou ser menos preciso ao prever resultados normais, quando as ferramentas de diagnóstico comuns se mostraram úteis.

Um dos achados mais notáveis foi que mais da metade dos pacientes apresentaram alterações nos registros do aEEG. Também constatamos que os pacientes com padrão alterado no aEEG eram mais propensos a desenvolver convulsões, e isso aconteceu não apenas com pacientes com encefalopatia. Inicialmente, todas as convulsões eram subclínicas, como descrito na literatura.2626.Tekgul H, Bourgeois BF, Gauvreau K, Bergin AM. Electroencephalography in neonatal seizures: comparison of a reduced and a full 10/20 montage. Pediatr Neurol. 2005;32:155-61. Contudo, também houve um período de latência notável entre o início da perturbação elétrica e o aparecimento clínico em nosso meio. Em neonatos com estado epilético, foram necessários dois ou mais medicamentos para conter as convulsões, e o aEEG ajudou a administrar a terapia anticonvulsivante.

Um tema de discussão é se o aEEG é necessário para decidir se um recém-nascido com encefalopatia é um candidato a terapia de resfriamento.2727.Thoresen M. Hypothermia after perinatal asphyxia: selection for treatment and cooling protocol. J Pediatr. 2011;158:e45-9. O aEEG tem sido utilizado como critério de inclusão em alguns protocolos de resfriamento,2525.Gluckman PD, Wyatt JS, Azzopardi D, Ballard R, Edwards AD, Ferriero DM, et-al. Selective head cooling with mild systemic hypothermia after neonatal encephalopathy: multicentre randomised trial. Lancet. 2005;365:663-70. , 2828.Azzopardi DV, Strohm B, Edwards AD, Dyet L, Halliday HL, Juszczak E, et-al. Moderate hypothermia to treat perinatal asphyxial encephalopathy. N Engl J Med. 2009;361:1349-58. porém não em outros. Descobrimos que monitoramento por aEEG precoce, principalmente em bebês com EHI grau I evidente,2424.Shalak LF, Laptook AR, Velaphi SC, Perlman JM. Amplitude-integrated electroencephalography coupled with an early neurologic examination enhances prediction of term infants at risk for persistent encephalopathy. Pediatrics. 2003;111:351-7. foi mais efetivo na identificação de quais pacientes com encefalopatia desenvolveriam doenças neurológicas graves, em vez de ser apenas uma avaliação clínica. Os achados se tornaram mais importantes se considerarmos que o tempo para decidir se uma criança é candidata a terapia de hipotermia é limitado, e não queremos errar quanto ao início desse tratamento tão importante.

Existe um estudo prospectivo recente sobre o uso precoce do aEEG (< 9 horas) em pacientes com encefalopatia moderada e grave, e que não apresenta vantagens sobre o fato de apenas testar para prever o resultado neurológico de longo prazo.2929.Shankaran S, Pappas A, McDonald SA, Laptook AR, Bara R, Ehrenkranz RA, et-al. Predictive value of an early amplitude integrated electroencephalogram and neurologic examination. Pediatrics. 2011;128:e112-20. Esse estudo difere quanto aos pacientes incluídos e quanto ao resultado principal; então não pode ser comparado ao nosso.

Foi notado um achado inesperado quanto à incapacidade de o exame clínico distinguir os pacientes que evoluem para uma doença neurológica grave em tempo real, e como o uso do aEEG influenciou em terapias mais rápidas. Isso foi mais notável em pacientes com SARA.

A principal limitação ao estudo é o pequeno número de pacientes, assim como a ausência de um protocolo rigoroso para o tempo total de monitoramento ou para solicitação de EEG ou de neuroimagem. Contudo, assemelha-se de forma mais confiável ao que acontece com bebês em UTINs.

Os benefícios de longo prazo do uso do aEEG em pacientes não foram avaliados. Esse é um relato de que a incidência posterior de epilepsia, entre pacientes com convulsões no período neonatal, é muito menor com o uso dessa técnica do que sem a mesma (9,4% em comparação a 56%).3030.Toet MC, Groenendaal F, Osredkar D, van Huffelen AC, de Vries LS. Postneonatal epilepsy following amplitude-integrated EEG-detected neonatal seizures. Pediatr Neurol. 2005;32:241-7. O aEEG parece ser uma ferramenta complementar interessante para nós.

Concluindo, o aEEG precoce em pacientes internados em UTIN possibilita fazer diagnósticos mais precisos para melhor selecionar pacientes para terapia de hipotermia, para detectar e tratar adequada e precocemente convulsões e para selecionar pacientes para acompanhamento neurológico.

O monitoramento cerebral na UTIN oferece várias possibilidades, e seria interessante ter mais conhecimento sobre sua aplicação em pacientes com problemas respiratórios, cardíacos e ECMO, bem como em neonatos extremamente prematuros.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Mar-Apr 2014

Histórico

  • Recebido
    21 Mar 2013
  • Aceito
    01 Jul 2013
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