Acessibilidade / Reportar erro

Ensaio clínico controlado randomizado triplo-cego dos efeitos de simbióticos sobre marcadores de inflamação em crianças com sobrepeso Como citar este artigo: Kelishadi R, Farajian S, Safavi M, Mirlohi M, Hashemipour M. A randomized triple-masked controlled trial on the effects of synbiotics on inflammation markers in overweight children. J Pediatr (Rio J). 2014;90:161-8.

Resumos

OBJETIVO:

o baixo grau de inflamação na obesidade contribui para disfunção metabólica sistêmica. Estudos experimentais recentes propuseram alguns efeitos de alteração na microbiota intestinal sobre fatores inflamatórios. O objetivo deste estudo foi avaliar os efeitos anti-inflamatórios de um suplemento simbiótico sobre marcadores de inflamação em crianças e adolescentes com sobrepeso e obesos.

MÉTODOS:

este ensaio clínico controlado randomizado triplo-cego foi conduzido entre 70 participantes com idade entre seis e 18 anos, com índice de massa corporal (IMC) igual ou acima do 85º percentil. Eles foram aleatoriamente divididos em dois grupos de igual número de participantes para receber simbiótico ou placebo por oito semanas.

RESULTADOS:

no todo, 56 de 70 participantes (80%) concluíram o estudo. Em comparação ao grupo placebo, o grupo simbiótico teve redução significativa nos valores médios de necrose tumoral-α e interleucina-6, com aumento significativo na adiponectina; essas alterações não eram mais expressivas após o ajuste do IMC. Não houve alteração importante nos valores médios da proteína C-reativa altamente sensível.

CONCLUSÃO:

nossas conclusões sugerem a influência positiva da suplementação simbiótica sobre fatores inflamatórios, dependente de seu efeito sobre a redução de peso em crianças com sobrepeso e obesas.

Simbiótico; Crianças e adolescentes; Obesidade; Inflamação; Ensaio clínico


OBJECTIVE:

the low degree of inflammation in obesity contributes to systemic metabolic dysfunction. Recent experimental studies proposed some effects of alteration in gut microbiota on inflammatory factors. This study aimed to assess the anti-inflammatory effects of a synbiotic supplement on inflammation markers in overweight and obese children and adolescents.

METHODS:

this randomized triple-masked controlled trial was conducted among 70 participants aged 6 to 18 years, with a body mass index (BMI) equal or higher than the 85th percentile. They were randomly assigned into two groups of equal number to receive synbiotic or placebo for eight weeks.

RESULTS:

fifty-six of 70 participants (80%) completed the study. Compared with the placebo group, the synbiotic group had significant decrease in mean values of tumor necrosis-α and interleukin-6, with significant increase in adiponectin; these changes were no longer significant after adjustment for BMI. There was no significant change in the mean values of high-sensitive C-reactive protein.

CONCLUSION:

the present findings suggest the positive influence of synbiotic supplementation on inflammation factors, which are dependent to its effect on weight reduction in overweight and obese children.

Synbiotic; Children and adolescents; Obesity; Inflammation; Trial


Introdução

A emergente epidemia global de obesidade é um grave problema de saúde individual e pública. Isso é principalmente preocupante com relação à faixa etária pediátrica. A obesidade está relacionada a um baixo grau de inflamação crônica, o que contribui para disfunção metabólica sistêmica associada a doenças ligadas à obesidade, como a síndrome metabólica.11.Scarpellini E, Tack J. Obesity and metabolic syndrome: an inflammatory condition. Dig Dis. 2012;30:148-53.

O aumento da expressão e produção de citocinas e reagentes de fase aguda como proteína C-reativa (PCR), interleucinas (ILs), fator de necrose tumoral (FNT) α ou lipopolissacarídeos (LPS) resulta no baixo grau de inflamação entre pessoas obesas.22.Hotamisligil GS. Endoplasmic reticulum stress and inflammation in obesity and type 2 diabetes. Novartis Found Symp. 2007;286:86-94. , 33.Hotamisligil GS, Erbay E. Nutrient sensing and inflammation in metabolic diseases. Nat Rev Immunol. 2008;8:923-34.

Alguns estudos propuseram que a microbiota intestinal pode participar no metabolismo do corpo todo, afetando o equilíbrio de energia, o metabolismo da glicose e o baixo grau de inflamação associado à obesidade e relacionado a doenças metabólicas.44.Cani PD, Osto M, Geurts L, Everard A. Involvement of gut microbiota in the development of low-grade inflammation and type 2 diabetes associated with obesity. Gut Microbes. 2012;3:279-88.

Está documentado que a microbiota intestinal é diferente entre pessoas obesas e magras.55.Bäckhed F, Manchester JK, Semenkovich CF, Gordon JI. Mechanisms underlying the resistance to diet-induced obesity in germ-free mice. Proc Natl Acad Sci U S A. 2007;104:979-84. , 66.Ley RE, Bäckhed F, Turnbaugh P, Lozupone CA, Knight RD, Gordon JI. Obesity alters gut microbial ecology. Proc Natl Acad Sci USA. 2005;102:11070-5. O LPS da microbiota intestinal é conhecido como um fator envolvido no aparecimento e progressão de doenças inflamatórias e metabólicas.77.Bäckhed F, Ding H, Wang T, Hooper LV, Koh GY, Nagy A, et-al. The gut microbiota as an environmental factor that regulates fat storage. Proc Natl Acad Sci USA. 2004;101:15718-23. O LPS é um componente das paredes celulares de bactérias gram-negativas, que estão entre os indutores de inflamação mais potentes e bem estudados.44.Cani PD, Osto M, Geurts L, Everard A. Involvement of gut microbiota in the development of low-grade inflammation and type 2 diabetes associated with obesity. Gut Microbes. 2012;3:279-88. Ademais, qualquer alteração na microbiota intestinal pode levar a uma alteração na produção de endotoxinas e, por sua vez, alteração nos níveis de LPS.77.Bäckhed F, Ding H, Wang T, Hooper LV, Koh GY, Nagy A, et-al. The gut microbiota as an environmental factor that regulates fat storage. Proc Natl Acad Sci USA. 2004;101:15718-23. , 88.Cani PD, Amar J, Iglesias MA, Poggi M, Knauf C, Bastelica D, et-al. Metabolic endotoxemia initiates obesity and insulin resistance. Diabetes. 2007;56:1761-72.

Apesar de o epitélio intestinal agir como uma barreira contínua para evitar a translocação de LPS, alguns eventos poderiam danificar essa barreira. Por exemplo, um estudo mostrou que a modulação das bactérias intestinais, ao seguir uma dieta rica em gordura, aumentou fortemente a permeabilidade intestinal, reduzindo a expressão da codificação de genes.99.Cani PD, Bibiloni R, Knauf C, Waget A, Neyrinck AM, Delzenne NM, et-al. Changes in gut microbiota control metabolic endotoxemia-induced inflammation in high-fat diet-induced obesity and diabetes in mice. Diabetes. 2008;57:1470-81.

Portanto, pode-se assumir que regular a microbiota intestinal pode ser uma estratégia adequada para controlar a obesidade e as doenças relacionadas a ela. Assim sendo, supomos que a suplementação com simbióticos, que modulam a microbiota intestinal e sua produção, pode ser eficaz na mudança de marcadores de inflamação em indivíduos com excesso de peso. Este estudo visa investigar o efeito da suplementação simbiótica sobre fatores inflamatórios em crianças e adolescentes com sobrepeso e obesa.

Métodos

Publicamos anteriormente os métodos detalhados deste estudo,1010.Safavi M, Farajian S, Kelishadi R, Mirlohi M, Hashemipour M. The effects of synbiotic supplementation on some cardio-metabolic risk factors in overweight and obese children: a randomized triple-masked controlled trial. Int J Food Sci Nutr. 2013;64:687-93. e apresentamos aqui os achados sobre marcadores de inflamação, que não foram relatados antes. Foi realizado, de setembro a novembro de 2011, na Isfahan University of Medical Sciences (IUMS), Isfahan, Irã, um ensaio clínico controlado randomizado triplo-cego, ou seja, os pesquisadores, os participantes e os estatísticos desconheciam que grupos em estudo recebiam o tratamento.

O protocolo do ensaio estava de acordo com a Declaração de Helsinque e foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da IUMS. O ensaio está registrado sob o código de registro como Ensaio: IRCT201103081434N4, no registro nacional de ensaios clínicos, que é membro da Organização Mundial de Saúde.

Após fornecer informações detalhadas, obtivemos consentimento informado por escrito de pais e consentimento verbal dos participantes.

Participantes

Participaram do estudo 70 crianças e adolescentes com aparência saudável, com idade entre seis e 18 anos, com um índice de massa corporal (IMC) igual ou superior ao 85º percentil específico para a idade e o sexo, segundo os percentis revistos do Centro de Controle e Prevenção de Doenças,1111.Kuczmarski RJ, Ogden CL, Guo SS, Grummer-Strawn LM, Flegal KM, Mei Z, et-al. 2000 CDC growth charts for the United States: methods and development. Vital Health Stat 11. 2002;246:1-190. que estão de acordo com os percentis de crianças e adolescentes iranianos.1212.Kelishadi R, Ardalan G, Gheiratmand R, Majdzadeh R, Hosseini M, Gouya MM, et-al. Thinness, overweight and obesity in a national sample of Iranian children and adolescents: CASPIAN Study. Child Care Health Dev. 2008;34:44-54. Eles foram selecionados por amostragem aleatória entre crianças que foram encaminhadas à Clínica de Obesidade Pediátrica e Síndrome Metabólica, Centro de Crescimento Infantil e Pesquisa de Desenvolvimento, IUMS. Os participantes foram randomizados em grupos simbióticos (n = 35) ou placebo (n = 35) através de números aleatórios. Crianças com obesidade sindrômica, doenças endócrinas, qualquer incapacidade física, histórico de uso de medicação crônica, uso de suplementos minerais e/ou vitamínicos, histórico de quaisquer doenças crônicas e/ou uso de medicação crônica ou sob dietas especiais não foram incluídas no estudo. A duração do ensaio foi de oito semanas, e ambos os grupos receberam aconselhamento semelhante para alteração de estilo de vida em termos de hábitos alimentares e de atividade física.

Exame físico

A idade e data de nascimento dos participantes foram registradas. Todas as medições antropométricas foram feitas pela mesma pessoa treinada e sob supervisão do mesmo pediatra. O exame físico foi conduzido segundo protocolos-padrão, utilizando instrumentos calibrados no início e no fim do ensaio.

A massa corporal foi aferida (balança de chão digital; Seca, Hamburgo, Alemanha) com 100 gr de precisão, sem sapatos e com vestuário mínimo. A altura foi medida, com precisão de 1 mm, com fita não-elástica.

As circunferências da cintura e quadril foram medidas com uma fita não-elástica, em um ponto intermediário entre a borda inferior das costelas e a crista ilíaca, no final da expiração normal. A circunferência do quadril foi medida na circunferência máxima das nádegas. A razão cintura-quadril foi calculada pela divisão da circunferência da cintura pela do quadril.

Medições bioquímicas

Os participantes foram instruídos a jejuar por 12 horas antes da coleta de sangue. Com um dos pais acompanhando seu filho/filha, as amostras de foram coletadas da veia antecubital, entre 8h00 e 9h30. Após a coleta, foi servido aos participantes um lanche saudável, fornecido pela equipe do projeto. PCR, TNF-α, interleucina 6 (IL-6) e adiponectina foram medidos enzimaticamente com kitspadrão (Pars Azmoun, Iran) por autoanalisador.

Administração de simbiótico

Usamos uma cápsula de simbiótico (Protexin, Londres, Inglaterra), cada uma contendo 2,0 × 1088.Cani PD, Amar J, Iglesias MA, Poggi M, Knauf C, Bastelica D, et-al. Metabolic endotoxemia initiates obesity and insulin resistance. Diabetes. 2007;56:1761-72. unidades formadoras de colônias (UFC)/diariamente. Elas continham uma combinação de viáveis congelados e secos (Lactobacillus Casei, Lactobacillus Rhamnosus, Streptococcus Thermophilus, Bifidobacterium Breve, Lactobacillus Acidophilus, Bifidobacterium Longum, Lactobacillus Bulgaricus), de origem humana com prebióticos (fruto-oligossacarídeos), vitaminas E, A e C. Essas crianças e adolescentes atribuídos ao grupo simbiótico foram instruídos a tomar uma cápsula por dia, antes de uma refeição principal, por oito semanas.

O placebo foi preparado pelo Departamento Farmacêutico, Faculdade de Farmácia, IUMS. Ele continha maltodextrina e consistia de cápsulas com formato, gosto e cheiro idênticos aos das cápsulas simbióticas.

Além de visitas regulares dos participantes, a adesão à medicação foi monitorada pela coleta de amostra de fezes e contagem da quantidade de bactérias nas mesmas, bem como por ligações telefônicas semanais aos participantes.

Coleta de amostra de fezes

As amostras de fezes foram coletadas de ambos os grupos, simbiótico e placebo, no início do estudo e nos dias 15 e 60. As amostras foram mantidas refrigeradas em recipientes plásticos próprios para fezes, selados, por menos de seis horas, até serem transferidas ao laboratório, onde foram examinadas com a maior brevidade possível.

Meios

Agar para Lactobacillus segundo DE MAN, ROGOSA e SHARPE (Ágar MRS) (Merck - Alemanha, pH = 5,7) e ágar MRS (Merck - Alemanha, pH = 5,7) com 1% de mupirocina (Sigma, EUA) e 0,5% de cloridrato de cisteína (Sigma, EUA) foram usados para enumeração de colônias de Lactobacillus e Bifidobacterium, respectivamente.

Contagem de bactérias

Cada amostra fecal (0,5 g) foi colocada num tubo esterilizado, misturada com 5 mL de solução fisiológica estéril normal, misturada completamente e centrifugada por 5 minutos a 100 rpm. Um mL da fase superior foi diluído dez vezes em série, a uma diluição de 10- 77.Bäckhed F, Ding H, Wang T, Hooper LV, Koh GY, Nagy A, et-al. The gut microbiota as an environmental factor that regulates fat storage. Proc Natl Acad Sci USA. 2004;101:15718-23..

Cem microlitros da diluição adequada foram cultivados na superfície de ambos os tipos de placas. As placas foram incubadas anaerobicamente com 5% de CO2, utilizando uma incubadora de CO2 injetado. As placas com MRS foram mantidas a 37°-38° C, durante 48 horas, e as placas contendo MRS-mupirocina-cloridrato foram mantidas à mesma temperatura durante 72 horas.

A contagem de colônias foi feita por especialistas e expressa como um log de CFU por grama de fezes frescas.

Registros alimentares

A ingestão de nutrientes foi estimada utilizando o registro alimentar de três dias (dois dias da semana e um dia de fim de semana), no início e no final do estudo. Foi solicitado que os participantes escrevessem o tipo e a quantidade de alimento ingerido, utilizando balanças ou medidas caseiras para aferir o tamanho das porções, quando possível. As médias da ingestão de energia e macronutrientes de três dias foram analisadas pelo softwareNutricionista 4 (First Databank Inc., Hearst Corp San Bruno, CA). A entrada de dados foi realizada por um nutricionista treinado. Caso um participante tivesse ingerido um alimento não incluído na base de dados, um alimento de composição nutricional muito semelhante era selecionado. As informações sobre nutrientes também foram obtidas por meio de rótulos de alimentos ou receitas de participantes. Estes foram incentivados a manter sua dieta e padrões de exercício após o Questionário de Atividade Física para Crianças Mais Velhas (PAQ-C), inalterados durante o experimento.

Análise estatística

Utilizamos o software SPSS para Windows (versão 16.00; SPSS, Chicago, IL) para a análise estatística. Os dados descritivos são expressos como média ± desvio-padrão (DP). Após a avaliação da distribuição normal pelo teste de Kolmogorov-Smirnov, as alterações dentro do grupo foram comparadas pelo teste t pareado e, para comparação de dados entre os dois, utilizamos o teste t independente. Também comparamos os dados entre participantes com sobrepeso e obesos. O teste t pareado foi usado para comparar o antes e o depois da intervenção em cada grupo. Os dados P tempo, P grupo e P tempo × grupo foram estabelecidos para cada variável, utilizando a análise de covariância (ANCOVA). A contagem total de bactérias fecais dos dois grupos estudados foi comparada no início e nos dias 15 e 60 do ensaio. Um valor de p inferior a 0,05 foi considerado estatisticamente significativo.

Resultados

No geral, 56 dos 70 participantes (80%) concluíram o estudo; o restante não teve adesão completa. Os participantes que concluíram o ensaio demonstraram boa conformidade com o consumo de suplementos e nenhum efeito ou sintoma adverso foi relatado.

Características físicas

Os dados demográficos e as características físicas dos indivíduos no início do estudo não foram significativamente diferentes entre os dois grupos. A tabela 1 apresenta as comparações das medidas antropométricas entre os grupos simbiótico e placebo, bem como diferenças dentro dos grupos antes e depois do ensaio. Ela mostra que o escore z do IMC diminuiu significativamente no grupo simbiótico (1,79 × 0,09 em comparação a 1,69 × 0,09, respectivamente, p < 0,0001), ao passo que o número correspondente não foi significativo no grupo placebo (1,67 ± 0,07 em comparação a 1,65 ± 0,07, respectivamente, p = 0,38). Da mesma forma, a alteração na média da circunferência da cintura foi significativa no grupo simbiótico (84,22 ± 2,85 em comparação a 82,89 ± 2,82 cm, respectivamente, p < 0,0001), mas não significativa no grupo de placebo (76,53 ± 1,91 em comparação a 76,85 ± 1,92 cm, respectivamente, p = 0,73).

Tabela 1
Medidas antropométricas(a) dos participantes antes e depois do ensaio clínico

Consumo alimentar e nível de atividade física dos participantes

O consumo de energia e de nutrientes, bem como os níveis de atividade física, não foram significativamente diferentes nos dois grupos e não apresentou alteração significativa durante o estudo (tabela 2).

Tabela 2
Consumo alimentar e nível de atividade física dos participantes durante todo o ensaio clínico

Achados laboratoriais

Conforme apresentado na tabela 3, durante o período experimental, as contagens totais das fezes aumentaram significativamente no grupo simbiótico, em comparação ao grupo placebo.99.Cani PD, Bibiloni R, Knauf C, Waget A, Neyrinck AM, Delzenne NM, et-al. Changes in gut microbiota control metabolic endotoxemia-induced inflammation in high-fat diet-induced obesity and diabetes in mice. Diabetes. 2008;57:1470-81.

Tabela 3
Contagem de bactérias nas fezes três vezes durante o ensaio clínico

As médias (erro-padrão (EP)) dos fatores de inflamação antes e após receberem suplemento simbiótico e placebo são apresentadas na tabela 4. Em comparação ao grupo placebo, o grupo suplemento teve redução significativa nos níveis de TNF-α e IL-6, e aumento significativo na adiponectina; essas alterações não eram mais significativas após o ajuste do IMC. Não houve alteração significativa no nível de proteína C-reativa de alta sensibilidade (hs-CRP).

Tabela 4
Efeitos do consumo de simbiótico e placebo sobre marcadores de inflamação

Discussão

No melhor de nosso conhecimento, esse ensaio é o primeiro de seu tipo na faixa etária pediátrica, para investigar o efeito da suplementação com simbiótico sobre fatores inflamatórios em crianças e adolescentes com sobrepeso e obesidade. Observou-se que a ingestão de simbiótico teve resultados favoráveis na redução de peso de crianças e adolescentes obesos, assim como mudanças significativas de TNFα no soro, IL-6 e adiponectina, sem alteração no nível de hs-CRP. Entretanto, as alterações nos marcadores de inflamação dependiam da redução de peso.

Durante o período do estudo, a energia, os macronutrientes e também a ingestão de antioxidante e o nível de atividades físicas não sofreram alterações em cada grupo, a não ser o aumento nas concentrações de bactérias protetoras, conforme mostrado pelos dados microbiológicas, e suas atividades metabólicas sugerem que os resultados obtidos podem ser devidos à suplementação simbiótica.

Recentemente, Cani et al. demonstraram que ratos alimentados com uma dieta rica em gordura foram caracterizados por um aumento na permeabilidade intestinal e endotoxemia metabólica ou lipopolissacarídeo (LPS),1010.Safavi M, Farajian S, Kelishadi R, Mirlohi M, Hashemipour M. The effects of synbiotic supplementation on some cardio-metabolic risk factors in overweight and obese children: a randomized triple-masked controlled trial. Int J Food Sci Nutr. 2013;64:687-93. que vaza para dentro do corpo da parte gram-negativa da microbiota intestinal e é um fator envolvido no aparecimento e progressão da inflamação e doenças metabólicas.44.Cani PD, Osto M, Geurts L, Everard A. Involvement of gut microbiota in the development of low-grade inflammation and type 2 diabetes associated with obesity. Gut Microbes. 2012;3:279-88. Assim, probióticos podem ser efetivos para melhorar a barreira intestinal e suprimir gram-negativos no canal gastrointestinal.1313.Strowski MZ, Wiedenmann B. Probiotic carbohydrates reduce intestinal permeability and inflammation in metabolic diseases. Gut. 2009;58:1044-5. , 1414.Frazier TH, DiBaise JK, McClain CJ. Gut microbiota, intestinal permeability, obesity-induced inflammation, and liver injury. JPEN J Parenter Enteral Nutr. 2011;35:14S-20S. Foi demonstrado que cepas probióticas como Lactobacillus rhamnosus GG e Lactobacillus casei DN-114-001 protegem a função de barreira epitelial contra a redistribuição de proteínas com junção apertada induzida por Escherichia coli,1515.Johnson-Henry KC, Donato KA, Shen-Tu G, Gordanpour M, Sherman PM. Lactobacillus rhamnosus strain GG prevents enterohemorrhagic Escherichia coli O157: H7-induced changes in epithelial barrier function. Infect Immun. 2008;76:1340-8 , 1616.Parassol N, Freitas M, Thoreux K, Dalmasso G, Bourdet-Sicard R, Rampal P. Lactobacillus casei DN-114 001 inhibits the increase in paracellular permeability of enteropathogenic Escherichia coli-infected T84 cells. Res Microbiol. 2005;156:256-62. e que algumas cepas probióticas, por exemplo, L. plantarum 299v, podem minimizar a translocação bacteriana.1717.McNaught CE, Woodcock NP, Anderson AD, MacFie J. A prospective randomised trial of probiotics in critically ill patients. Clin Nutr. 2005;24:211-9. , 1818.Klarin B, Wullt M, Palmquist I, Molin G, Larsson A, Jeppsson B. Lactobacillus plantarum 299 v reduces colonisation of Clostridium difficile in critically ill patients treated with antibiotics. Acta Anaesthesiol Scand. 2008;52:1096-102.

A dieta rica em gordura contribui para o rompimento de proteínas com junção apertada (Zonula occludens-1 e ocludina), envolvidas na função de barreira intestinal,1010.Safavi M, Farajian S, Kelishadi R, Mirlohi M, Hashemipour M. The effects of synbiotic supplementation on some cardio-metabolic risk factors in overweight and obese children: a randomized triple-masked controlled trial. Int J Food Sci Nutr. 2013;64:687-93. , 1919.Cani PD, Possemiers S, Van de Wiele T, Guiot Y, Everard A, Rottier O, et-al. Changes in gut microbiota control inflammation in obese mice through a mechanism involving GLP-2-driven improvement of gut permeability. Gut. 2009;58:1091-103. e a modulação da microbiota intestinal de ratos com prebióticos levaria a um nível mais baixo de várias citocinas plasmáticas, como TNF α, IL6, devido à promoção no rompimento da junção apertada (ZO-1 e ocludina). Esses dados confirmam que ratos obesos exibem uma alteração da barreira intestinal, caracterizada por um rompimento das proteínas com junção apertada. Cani et al. concluíram que a modulação da microbiota intestinal utilizando prebióticos em ratos obesos poderia agir de forma favorável na barreira intestinal, reduzindo, assim, a endotoxemia e a inflamação sistêmica e do fígado, com consequências benéficas em distúrbios metabólicos associados.1919.Cani PD, Possemiers S, Van de Wiele T, Guiot Y, Everard A, Rottier O, et-al. Changes in gut microbiota control inflammation in obese mice through a mechanism involving GLP-2-driven improvement of gut permeability. Gut. 2009;58:1091-103. , 2020.Delzenne NM, Neyrinck AM, Cani PD. Modulation of the gut microbiota by nutrients with prebiotic properties: consequences for host health in the context of obesity and metabolic syndrome. Microb Cell Fact. 2011;10:S10.

Adicionalmente, mostrou-se em seres humanos saudáveis que a L. plantarum WCFS1 aumentou a realocação de ocludina e ZO-1 na área de junção apertada entre as células epiteliais duodenais.2121.Hakansson A, Molin G. Gut microbiota and inflammation. Nutrients. 2011;3:637-82.

Nossos resultados são compatíveis com os achados sobre a conexão entre a microbiota intestinal, inflamação e homeostase e seu papel na patogênese da obesidade e doenças relacionadas,1919.Cani PD, Possemiers S, Van de Wiele T, Guiot Y, Everard A, Rottier O, et-al. Changes in gut microbiota control inflammation in obese mice through a mechanism involving GLP-2-driven improvement of gut permeability. Gut. 2009;58:1091-103. , 2222.Tsukumo DM, Carvalho-Filho MA, Carvalheira JB, Prada PO, Hirabara SM, Schenka AA, et-al. Loss-of-function mutation in Toll-like receptor 4 prevents diet-induced obesity and insulin resistance. Diabetes. 2007;56:1986-98. bem como com os achados sobre a relação da dieta e microbiota intestinal com a homeostase, conforme investigado em modelos experimentais de obesidade induzida por dieta.2323.Hong YH, Nishimura Y, Hishikawa D, Tsuzuki H, Miyahara H, Gotoh C, et-al. Acetate and propionate short chain fatty acids stimulate adipogenesis via GPCR43. Endocrinology. 2005;146:5092-9. , 2424.Cani PD, Delzenne NM. The role of the gut microbiota in energy metabolism and metabolic disease. Curr Pharm Des. 2009;15:1546-58. Parece que, devido à associação entre a obesidade e inflamação,2525.Item F, Konrad D. Visceral fat and metabolic inflammation: the portal theory revisited. Obes Rev. 2012;13:30-9. pode-se propor que os efeitos favoráveis dos probióticos no controle da inflamação poderão desempenhar um importante papel na prevenção e controle da obesidade.

Entre os prováveis mecanismos, foi demonstrado que a modulação da microbiota intestinal aumenta a altura das vilosidades e a profundidade das criptas, e leva a uma camada de mucosa mais espessa no jejuno e no cólon.2626.Kleessen B, Hartmann L, Blaut M. Fructans in the diet cause alterations of intestinal mucosal architecture, released mucins and mucosa-associated bifidobacteria in gnotobiotic rats. Br J Nutr. 2003;89:597-606. Esses efeitos devem-se a produtos de fermentação por bactérias, principalmente ácidos graxos de cadeia curta (AGCCs), como o butirato, que age como um substrato energético para os colonócitos e tem um efeito trófico na mucosa.2727.Bartholome AL, Albin DM, Baker DH, Holst JJ, Tappenden KA. Supplementation of total parenteral nutrition with butyrate acutely increases structural aspects of intestinal adaptation after an 80% jejunoileal resection in neonatal piglets. JPEN J Parenter Enteral Nutr. 2004;28:210-22. , 2828.Tappenden KA, Drozdowski LA, Thomson AB, McBurney MI. Short-chain fatty acid-supplemented total parenteral nutrition alters intestinal structure, glucose transporter 2 (GLUT2) mRNA and protein, and proglucagon mRNA abundance in normal rats. Am J Clin Nutr. 1998;68:118-25. Em nosso estudo, esse mecanismo é enfatizado, pois o aumento nas concentrações de bactérias protetoras devido à suplementação com simbiótico foi documentada.

Os níveis de adipocitocinas plasmáticas sobem com um aumento no tecido adiposo e no volume dos adipócitos, exceto a adiponectina plasmática, que é menor na obesidade.2929.Reinhardt C, Reigstad CS, Bäckhed F. Intestinal microbiota during infancy and its implications for obesity. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2009;48:249-56. , 3030.Hugenholtz P, Goebel BM, Pace NR. Impact of culture-independent studies on the emerging phylogenetic view of bacterial diversity. J Bacteriol. 1998;180:4765-74. No presente estudo, o aumento da adiponectina plasmática ocorreu em virtude da redução de peso e supressão do tecido adiposo.

Concluindo, nossos achados sugerem a influência positiva da suplementação com simbiótico sobre fatores de inflamação, que depende de seu efeito na redução de peso em crianças com sobrepeso e obesas.

Agradecimentos

Este estudo foi financiado pela Vice-Chancelaria de Pesquisa e Tecnologia, Isfahan University of Medical Sciences, Isfahan, Irã. Nome do avalista: Prof. Roya Kelishadi.

References

  • 1
    Scarpellini E, Tack J. Obesity and metabolic syndrome: an inflammatory condition. Dig Dis. 2012;30:148-53.
  • 2
    Hotamisligil GS. Endoplasmic reticulum stress and inflammation in obesity and type 2 diabetes. Novartis Found Symp. 2007;286:86-94.
  • 3
    Hotamisligil GS, Erbay E. Nutrient sensing and inflammation in metabolic diseases. Nat Rev Immunol. 2008;8:923-34.
  • 4
    Cani PD, Osto M, Geurts L, Everard A. Involvement of gut microbiota in the development of low-grade inflammation and type 2 diabetes associated with obesity. Gut Microbes. 2012;3:279-88.
  • 5
    Bäckhed F, Manchester JK, Semenkovich CF, Gordon JI. Mechanisms underlying the resistance to diet-induced obesity in germ-free mice. Proc Natl Acad Sci U S A. 2007;104:979-84.
  • 6
    Ley RE, Bäckhed F, Turnbaugh P, Lozupone CA, Knight RD, Gordon JI. Obesity alters gut microbial ecology. Proc Natl Acad Sci USA. 2005;102:11070-5.
  • 7
    Bäckhed F, Ding H, Wang T, Hooper LV, Koh GY, Nagy A, et-al. The gut microbiota as an environmental factor that regulates fat storage. Proc Natl Acad Sci USA. 2004;101:15718-23.
  • 8
    Cani PD, Amar J, Iglesias MA, Poggi M, Knauf C, Bastelica D, et-al. Metabolic endotoxemia initiates obesity and insulin resistance. Diabetes. 2007;56:1761-72.
  • 9
    Cani PD, Bibiloni R, Knauf C, Waget A, Neyrinck AM, Delzenne NM, et-al. Changes in gut microbiota control metabolic endotoxemia-induced inflammation in high-fat diet-induced obesity and diabetes in mice. Diabetes. 2008;57:1470-81.
  • 10
    Safavi M, Farajian S, Kelishadi R, Mirlohi M, Hashemipour M. The effects of synbiotic supplementation on some cardio-metabolic risk factors in overweight and obese children: a randomized triple-masked controlled trial. Int J Food Sci Nutr. 2013;64:687-93.
  • 11
    Kuczmarski RJ, Ogden CL, Guo SS, Grummer-Strawn LM, Flegal KM, Mei Z, et-al. 2000 CDC growth charts for the United States: methods and development. Vital Health Stat 11. 2002;246:1-190.
  • 12
    Kelishadi R, Ardalan G, Gheiratmand R, Majdzadeh R, Hosseini M, Gouya MM, et-al. Thinness, overweight and obesity in a national sample of Iranian children and adolescents: CASPIAN Study. Child Care Health Dev. 2008;34:44-54.
  • 13
    Strowski MZ, Wiedenmann B. Probiotic carbohydrates reduce intestinal permeability and inflammation in metabolic diseases. Gut. 2009;58:1044-5.
  • 14
    Frazier TH, DiBaise JK, McClain CJ. Gut microbiota, intestinal permeability, obesity-induced inflammation, and liver injury. JPEN J Parenter Enteral Nutr. 2011;35:14S-20S.
  • 15
    Johnson-Henry KC, Donato KA, Shen-Tu G, Gordanpour M, Sherman PM. Lactobacillus rhamnosus strain GG prevents enterohemorrhagic Escherichia coli O157: H7-induced changes in epithelial barrier function. Infect Immun. 2008;76:1340-8
  • 16
    Parassol N, Freitas M, Thoreux K, Dalmasso G, Bourdet-Sicard R, Rampal P. Lactobacillus casei DN-114 001 inhibits the increase in paracellular permeability of enteropathogenic Escherichia coli-infected T84 cells. Res Microbiol. 2005;156:256-62.
  • 17
    McNaught CE, Woodcock NP, Anderson AD, MacFie J. A prospective randomised trial of probiotics in critically ill patients. Clin Nutr. 2005;24:211-9.
  • 18
    Klarin B, Wullt M, Palmquist I, Molin G, Larsson A, Jeppsson B. Lactobacillus plantarum 299 v reduces colonisation of Clostridium difficile in critically ill patients treated with antibiotics. Acta Anaesthesiol Scand. 2008;52:1096-102.
  • 19
    Cani PD, Possemiers S, Van de Wiele T, Guiot Y, Everard A, Rottier O, et-al. Changes in gut microbiota control inflammation in obese mice through a mechanism involving GLP-2-driven improvement of gut permeability. Gut. 2009;58:1091-103.
  • 20
    Delzenne NM, Neyrinck AM, Cani PD. Modulation of the gut microbiota by nutrients with prebiotic properties: consequences for host health in the context of obesity and metabolic syndrome. Microb Cell Fact. 2011;10:S10.
  • 21
    Hakansson A, Molin G. Gut microbiota and inflammation. Nutrients. 2011;3:637-82.
  • 22
    Tsukumo DM, Carvalho-Filho MA, Carvalheira JB, Prada PO, Hirabara SM, Schenka AA, et-al. Loss-of-function mutation in Toll-like receptor 4 prevents diet-induced obesity and insulin resistance. Diabetes. 2007;56:1986-98.
  • 23
    Hong YH, Nishimura Y, Hishikawa D, Tsuzuki H, Miyahara H, Gotoh C, et-al. Acetate and propionate short chain fatty acids stimulate adipogenesis via GPCR43. Endocrinology. 2005;146:5092-9.
  • 24
    Cani PD, Delzenne NM. The role of the gut microbiota in energy metabolism and metabolic disease. Curr Pharm Des. 2009;15:1546-58.
  • 25
    Item F, Konrad D. Visceral fat and metabolic inflammation: the portal theory revisited. Obes Rev. 2012;13:30-9.
  • 26
    Kleessen B, Hartmann L, Blaut M. Fructans in the diet cause alterations of intestinal mucosal architecture, released mucins and mucosa-associated bifidobacteria in gnotobiotic rats. Br J Nutr. 2003;89:597-606.
  • 27
    Bartholome AL, Albin DM, Baker DH, Holst JJ, Tappenden KA. Supplementation of total parenteral nutrition with butyrate acutely increases structural aspects of intestinal adaptation after an 80% jejunoileal resection in neonatal piglets. JPEN J Parenter Enteral Nutr. 2004;28:210-22.
  • 28
    Tappenden KA, Drozdowski LA, Thomson AB, McBurney MI. Short-chain fatty acid-supplemented total parenteral nutrition alters intestinal structure, glucose transporter 2 (GLUT2) mRNA and protein, and proglucagon mRNA abundance in normal rats. Am J Clin Nutr. 1998;68:118-25.
  • 29
    Reinhardt C, Reigstad CS, Bäckhed F. Intestinal microbiota during infancy and its implications for obesity. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2009;48:249-56.
  • 30
    Hugenholtz P, Goebel BM, Pace NR. Impact of culture-independent studies on the emerging phylogenetic view of bacterial diversity. J Bacteriol. 1998;180:4765-74.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Mar-Apr 2014

Histórico

  • Recebido
    19 Mar 2013
  • Aceito
    29 Jul 2013
Sociedade Brasileira de Pediatria Av. Carlos Gomes, 328 cj. 304, 90480-000 Porto Alegre RS Brazil, Tel.: +55 51 3328-9520 - Porto Alegre - RS - Brazil
E-mail: jped@jped.com.br