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Efeito de uma intervenção remota de atividade física no risco cardiovascular e na aptidão física

RESUMO

Devido à pandemia da COVID-19, os projetos de orientação de atividade física (AF) tiveram que adaptar suas atuações para o formato remoto. O objetivo deste estudo foi avaliar os efeitos de uma intervenção remota de AF no risco cardiovascular e na aptidão física em participantes desses projetos. Para isso, 29 participantes do Projeto Exercício e Coração (66±5 anos) foram orientados a realizar, 2 caminhadas, 1 videoaula de exercícios aeróbicos e 2 videoaulas de exercícios de força muscular por semana, sendo cada atividade realizada por 30 min e em intensidade moderada. No início e após 8 semanas, foram medidos marcadores de risco cardiovascular e de aptidão física, que foram comparados por testes t-student ou Wilcoxon, considerando-se p≤0,05. Comparando-se as avaliações pré e pós-intervenção, houve redução da circunferência da cintura (95,9±11,3 vs. 94,7±11,3 cm, p=0,013) e aumento da capacidade cardiorrespiratória (117±21 vs. 123±23 passos, p=0,019), da força dos membros superiores (23±6 vs. 25±6 repetições, p=0,003), da resistência abdominal (20±9 vs. 22±10 repetições, p=0,002) e da aptidão física geral (-0,04±3,55 vs. 1,30±4,10, p=0,000). Em conclusão, a intervenção remota aumentou a aptidão física geral, aumentando a capacidade cardiorrespiratória, a força e a resistência muscular, além de reduzir a obesidade central.

Palavras-chave:
Atividade física; Educação online; Fatores de risco cardiovascular; Aptidão física

ABSTRACT

Due to the COVID-19 pandemic, the projects that offer guidance for physical activity (PA) had to be adapted to the remote format. This study aimed at assessing the effects of a remote PA intervention on the cardiovascular risk and physical fitness of the individuals engaged in these projects. Thus, 29 participants of the Brazilian project known as Projeto Exercício e Coração (Exercise and Heart Project) (66±5 years) were instructed to perform 2 walking sessions, 1 aerobic exercise video class and 2 muscle strength video classes per week with each activity lasting 30 min and performed at moderate intensity. At baseline (pre) and after 8 weeks (post), markers of cardiovascular risk and physical fitness were evaluated and compared by using paired t-tests or Wilcoxon signed rank tests considering p≤0.05. When comparing pre- and post-intervention evaluations, there was a significant reduction in waist circumference (95.9±11.3 vs. 94.7±11.3 cm, p=0.013) and significant increases in cardiorespiratory fitness (117±21 vs. 123±23 steps, p=0.019), upper limb strength (23±6 vs. 25±6 repetitions, p=0.003), abdominal endurance (20±9 vs. 22±10 repetitions, p= 0.002) and overall physical fitness (-0.04±3.55 vs. 1.30±4.10, p=0.000). In conclusion, the remote intervention improved general physical fitness, increasing cardiorespiratory fitness, muscle strength and endurance, in addition to reducing central obesity.

Keywords:
Physical activity; Remote intervention; Cardiovascular risk; Physical Fitness

Introdução

As doenças cardiovasculares (DCV) representam em conjunto a principal causa de morte no mundo, tendo sido responsáveis por pelo menos 30% dos óbitos em 201611 World Health Organization [Internet]. Global action plan for the prevention and control of noncommunicable diseases 2013-2020: Suiça. 2013[acesso em 14 fev 2022]. [Internet] < [Internet] https://www.who.int/publications/i/item/9789241506236 >.
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. A maior prevalência dessas mortes se concentra em países de baixa e média renda, que somam aproximadamente três quartos do total22 World Health Organization [Internet]. Cardiovascular diseases: Suiça. 2021[acesso em14 fev 2022 ]. [Internet] [Internet] https://www.who.int/news-room/fact-sheets/detail/cardiovascular-diseases-(cvds) .
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. A Organização Mundial da Saúde define as DCVs como um grupo de doenças que afetam o coração e/ou dos vasos sanguíneos, como a doença coronariana, a insuficiência cardíaca, a doença cerebrovascular, entre outras22 World Health Organization [Internet]. Cardiovascular diseases: Suiça. 2021[acesso em14 fev 2022 ]. [Internet] [Internet] https://www.who.int/news-room/fact-sheets/detail/cardiovascular-diseases-(cvds) .
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. A probabilidade de se desenvolver as DCVs está diretamente associada à presença dos fatores de risco cardiovascular, que se caracterizam por condições inatas ou adquiridas, como as características genéticas, a idade cronológica, a exposição ao ambiente e o estilo de vida33 Perdigão C, Rocha E, Duarte JS, Santos A, Macedo A. Prevalência, caracterização e distribuição dos principais fatores de risco cardiovascular em Portugal. Uma análise do Estudo AMÁLIA. Rev Port Cardiol 2011;30(4):393-432..

O combate às DCVs é uma grande preocupação dos sistemas de saúde pública do Brasil e do mundo e tem como meta principal a redução do risco cardiovascular através do controle dos fatores de risco modificáveis, ou seja, daqueles passíveis de serem alterados por intervenções de saúde44 Sociedade Brasileira de Cardiologia. Atualização da Diretriz de Prevenção Cardiovascular da Sociedade Brasileira de Cardiologia. Arq Bras Cardiol 2019;113(4):787-891. DOI:10.5935/abc.20190204
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. Entre esses fatores, destacam-se para este estudo, os componentes da síndrome metabólica (i.e a diabetes, a dislipidemia, a hipertensão arterial e a obesidade total e, principalmente, central), que normalmente ocorrem de forma associada, potencializando o risco cardiovascular global (i.e. definido pela associação dos fatores de risco cardiovascular presentes em cada indivíduo)5 D'agostino RB, Vasan RS, Pencina MJ, Wolf PA, Cobain M, Massaro JM, et al. General cardiovascular risk profile for use in primary care: the Framingham Heart Study. Circulation2008;117(6):743-53. DOI:10.1161/CIRCULATIONAHA.107.699579
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As estratégias de prevenção das DCVs possuem como um dos principais alicerces o incentivo e a orientação da prática regular de atividade física (AF), reconhecida como uma forma efetiva de combater essas doenças através, entre outros aspectos, da redução dos fatores de risco cardiovascular66 Ford ES, Harold WK, Ali HM, Umed AA. Sedentary behavior, physical activity, and the metabolic syndrome among U.S. adults. Obes Res2005;13(3):608-14. DOI:10.1038/oby.2005.65
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. Além disso, essa prática melhora a aptidão física geral, facilitando a execução das atividades de vida diária e, dessa forma, promove melhora na qualidade de vida77 Nahas MV. Atividade Física, Saúde e Qualidade de Vida: Conceitos e sugestões para um estilo de vida ativo. 7 ed. Florianópolis: Ed. do Autor; 2017.. Perante tantos benefícios, diversos projetos têm sido desenvolvidos para estimular e orientar a prática de AF na população88 Ferreira MS, Najar AL. Programas e campanhas de promoção da atividade física. Cien. Saude Colet. 200510(Suppl):207-19. DOI:10.1590/S1413-81232005000500022
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. Alguns desses projetos são realizados em locais públicos, como o Projeto Exercício e Coração, que ao longo dos últimos 20 anos, tem promovido a melhora da aptidão física e a redução do risco cardiovascular de seus participantes através de uma prescrição individualizada da prática com supervisão limitada da execução99 Forjaz CLM, Modesto BT, Bartholomeu T, Costa LAR, Tinucci T. Projeto exercício e coração: uma década a serviço da comunidade. Revista Cultura e Extensão USP2011;6:61-9. DOI:10.11606/issn.2316-9060.v6i0p61-69
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,1010 Modesto BT, Bartholomeu T, Costa LAR, Tinucci T, Forjaz CLM. Projeto “Exercício e Coração”: uma proposta para a prevenção de doenças cardiovasculares a partir da prática de atividades físicas em locais públicos. Casa da Educ Física2018;2:269-82..

Entretanto, desde que a COVID-19 atingiu seu estágio pandêmico, essa doença tornou-se um desafio à saúde pública, sendo necessário tomar condutas para diminuir seu contágio. Assim, o distanciamento social, a quarentena e o lockdown foram ações implementadas por vários meses. Apesar de necessárias no combate à COVID-19, a aplicação dessas estratégias dificultou a manutenção de um estilo de vida ativo1111 Smirmaul BPC, Chamon RF, Moraes FM, Rozin GR, Moreira ASB, Almeida R, et al. Lifestyle medicine during (and after) the COVID-19 Pandemic. Am J Lifestyle Med 2020;15(1):60-7. DOI:10.1177/1559827620950276
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. Nesse sentido, estudos revelaram diminuição do número de passos dados pela população durante a pandemia, com reduções variando entre 7 e 38% em diferentes países1212 Fitbit [Internet]. The impact of coronavirus on global activity: United States. 2020[acesso em 14 fev 2022]. [Internet] [Internet] https://blog.fitbit. com/covid-19-global-activity/
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; além de redução de 30% na prática de AF de lazer por pessoas que praticavam essas atividades antes da pandemia1313 Meyer J, Mcdowell C, Lansing J, Brower C, Smith L, Tully M, et al. Changes in physical activity and sedentary behavior due to the COVID-19 outbreak and associations with mental health in 3,052 US adults. Int J Environ Res Public Health2020;17(18):1-13. DOI:10.3390/ijerph17186469
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. No Brasil, essa redução da prática da AF também foi evidenciada1414 Silva IC, Knuth AG, Wendt A, Nunes BP, Hallal PC, Santos LP, et al. Prática de atividade física em meio à pandemia da COVID-19: estudo de base populacional em cidade do sul do Brasil. Ciên Saúde Colet 2020;25(11):4249-58. DOI:10.1590/1413-812320202511.29072020
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, afetando inclusive os participantes de projetos de incentivo à prática física1515 Costa CLA, Costa TM, B FilhoVCB, Bandeira PFR, Siqueira RCL. Influência do distanciamento social no nível de atividade física durante a pandemia do COVID-19. Rev Bras Ativ Fís Saúde2020;25:1-6. DOI:10.12820/rbafs.25e0123
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.

Para contornar esse impacto da pandemia, os profissionais de educação física e os projetos de incentivo à prática física tiveram que adaptar suas atividades para o formato remoto. Nesse contexto, o uso de vídeos gravados foi a estratégia mais utilizada e a mudança para a atuação remota apresentou pontos positivos, como a maior flexibilidade de horário e praticidade para a execução da AF, mas também teve pontos negativos, como as dificuldades de manuseio das ferramentas tecnológicas, de dosagem da sobrecarga e de monitoramento dos participantes1616 Guimarães JAC, Guerra PH, Ueno DT, Christofoletti AEM, Nakamura PM. Estudo transversal sobre o uso de ferramentas virtuais para orientar a atividade física durante a COVID-19. Rev Bras Ativ Fís Saúde 2020;25:e150. DOI:10.12820/rbafs.25e0150
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. Apesar das dificuldades, essa estratégia permitiu a orientação da prática de AF nesse período.

Assim, da mesma forma que outros projetos, o Projeto Exercício e Coração também recorreu ao formato remoto, utilizando tecnologias digitais para a divulgação de videoaulas de orientação da prática de diferentes tipos de AF. Porém, a eficácia desse formato para a manutenção da saúde cardiovascular e da aptidão física precisava ser avaliada. Dessa forma, o presente estudo foi desenhado para avaliar os efeitos de uma intervenção remota de orientação de AF no risco cardiovascular e na aptidão física de participantes de projetos de orientação de atividade física, usando a experiência do Projeto Exercício e Coração.

Métodos

Participantes

A amostra foi composta por participantes do Projeto Exercício e Coração, selecionados retrospectivamente entre aqueles que haviam sido avaliados antes do início da pandemia da COVID-19 e que atendiam os seguintes critérios: 1) tinham assinado o termo de consentimento livre e esclarecido para que seus dados pudessem ser utilizados em pesquisas do Projeto Exercício e Coração; 2) tinham celulares com acesso à internet; 3) não tinham doença cardíaca e não usavam betabloqueadores; 4) não tinham sido internados, não tinham tido diagnóstico nem sinais ou sintomas de COVID; 5) não tinham tido contato com pessoas com COVID-19 nos últimos 14 dias; e 5) tinham interesse em participar deste estudo. A coleta de dados foi realizada em dois momentos de flexibilização, por parte da Universidade, da realização de atividades presenciais de pesquisa durante a pandemia (dezembro de 2020 a fevereiro de 2021 e de junho a agosto de 2021). Em cada momento, os possíveis voluntários foram contatados por telefone e esclarecidos sobre os procedimentos da pesquisa. Aqueles que se voluntariaram a participar foram convidados para as etapas seguintes. Esse estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética da Escola de Educação Física e Esporte da Universidade de São Paulo, como adendo ao projeto principal de pesquisa do Projeto Exercício e Coração.

Procedimentos

Os indivíduos que atenderam os critérios do estudo foram avaliados antes (pré) e após (pós) 60 dias de intervenção. Para cada uma dessas avaliações, os indivíduos foram convidados a comparecer presencialmente, pela manhã e em jejum de 10 horas. Todas as medidas de biossegurança para prevenção da COVID-19 foram tomadas para garantir a segurança dos avaliados e avaliadores.

Nessas avaliações, foram medidos os seguintes fatores de risco cardiovascular: índice de massa corporal (IMC), circunferência da cintura (CC), pressão arterial sistólica (PAS), pressão arterial diastólica (PAD), glicemia de jejum (GLI) e colesterolemia total de jejum (COL). A seguir, foram realizados testes para medir os seguintes parâmetros de aptidão física: capacidade cardiorrespiratória, força de membros superiores, força de membros inferiores, resistência abdominal, flexibilidade de ombros e flexibilidade lombar.

Entre as avaliações pré e pós, os indivíduos foram orientados a realizar, pelo menos, 150 min de AF moderada por semana. Para isso, foram instruídos a realizar, em cada semana, 2 sessões de caminhada por 30 min, 1 videoaula de exercícios aeróbicos e 2 videoaulas de exercícios de força/resistência muscular. Essas videoaulas também tinham duração aproximada de 30 min e foram disponibilizadas em playlists específicas num canal do YouTube (https://www.youtube.com/channel/UC_Pz5_e2tZPgHRuS64SdBVg). Durante a execução das atividades, os indivíduos foram instruídos a manter uma intensidade moderada, ou seja, nas atividades aeróbicas deviam sentir aumento da respiração e da sudorese, sem ficarem ofegantes e nas atividades de força deviam usar sobrecargas que permitissem realizar o número de repetições solicitado nas videoaulas (normalmente cerca de 10 repetições). Além disso, durante o período de intervenção, os indivíduos foram solicitados a preencher um formulário online, após a realização de cada atividade, informando que atividade fizeram, por quanto tempo e em que intensidade. Para completar, os indivíduos foram acompanhados por monitores que ficavam à disposição em caso de dúvidas e que fizeram contato após 1 e 4 semanas da intervenção.

Medidas

A massa corporal e a estatura foram medidas, respectivamente, numa balança digital (Welmy, modelo 110) e com um estadiômetro fixado na parede (Welmy, modelo 110)9 Forjaz CLM, Modesto BT, Bartholomeu T, Costa LAR, Tinucci T. Projeto exercício e coração: uma década a serviço da comunidade. Revista Cultura e Extensão USP2011;6:61-9. DOI:10.11606/issn.2316-9060.v6i0p61-69
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,¹⁰10 Modesto BT, Bartholomeu T, Costa LAR, Tinucci T, Forjaz CLM. Projeto “Exercício e Coração”: uma proposta para a prevenção de doenças cardiovasculares a partir da prática de atividades físicas em locais públicos. Casa da Educ Física2018;2:269-82.. O IMC foi calculado pelo quociente entre a massa corporal e o quadrado da estatura (kg/m2). A CC foi medida em duplicata com uma fita métrica posicionada na altura da cicatriz umbilical, sendo considerada a média dos valores obtidos. Foram classificados como obesos, os indivíduos com IMC igual ou maior que 30 kg/m2 e com obesidade central, os homens com CC > 102 cm e as mulheres com CC > 88 cm1717 Associação Brasileira para Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica [Internet]. Diretrizes Brasileiras de Obesidade: São Paulo. 2016. [acesso em 14 fev 2022]. [Internet] [Internet] https://abeso.org.br/wp-content/uploads/2019/12/Diretrizes-Download-Diretrizes-Brasileiras-de-Obesidade-2016.pdf
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.

A pressão arterial foi medida por avaliadores experientes utilizando a técnica auscultatória, um esfigmomanômetro aneroide devidamente calibrado e um manguito de tamanho adequado ao braço de cada indivíduo1818 Barroso WKS, Rodrigues CIS, Bortolotto LA, Mota MAM, Brandão AA, Feitosa ADM, et al. Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial - 2020. Arq Bras Cardiol 2021;116(3):516-658. DOI:10.36660/abc.20201238
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. A medida foi realizada com o indivíduo sentado em repouso por, pelo menos, 5 min, sendo utilizadas as fases I e V dos sons de Korotkoff para a determinação da PAS e PAD, respectivamente. Foram realizadas 3 medidas consecutivas com intervalo de 1 min e foi calculada a média dos valores obtidos. Foram classificados como hipertensos, indivíduos com PAS igual ou maior que 140 mmHg e/ou PAD igual ou maior que 90 mmHg ou ainda aqueles que estavam em uso de medicamentos anti-hipertensivos1818 Barroso WKS, Rodrigues CIS, Bortolotto LA, Mota MAM, Brandão AA, Feitosa ADM, et al. Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial - 2020. Arq Bras Cardiol 2021;116(3):516-658. DOI:10.36660/abc.20201238
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.

Para as medidas de GLI e COL, foram coletadas amostras de sangue por punção digital, que foram analisadas, respectivamente, por monitores automáticos de medida de GLI (Advantage® II, Roche) e de COL total (Accutrend® GC - Roche). Foram classificados como diabéticos, os indivíduos com GLI de jejum igual ou superior a 126 mg/dL e dislipidêmicos com COL de jejum igual ou superior a 240 mg/dL, além daqueles que utilizavam, respectivamente, hipoglicemiantes e redutores de colesterol1919 Sociedade Brasileira de Cardiologia. V Diretriz Brasileira de Dislipidemia e Prevenção da Aterosclerose. Arq Bras Cardiol. 2013;101(4 Suppl 1):1-36. DOI:10.5935/abc.2013S010
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)-(2020 Sociedade Brasileira de Diabetes[Internet]. Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes 2019-2020: São Paulo. 2019. [acesso em 14 dez 2021]. [Internet] [Internet] http://www.saude.ba.gov.br/wp-content/uploads/2020/02/Diretrizes-Sociedade-Brasileira-de-Diabetes-2019-2020.pdf
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.

O risco cardiovascular global foi calculado para cada indivíduo em cada momento (pré e pós) a partir da somatória dos escores z de cada fator de risco. Para isso, o valor de cada fator de risco cardiovascular foi transformado em escore z, considerando-se a média e o desvio padrão dos valores obtidos na avaliação pré-intervenção, e esses valores foram somados (i.e Z = zIMC + zCC + zPAS + zPAD + zGLI + zCOL).

Para a medida dos parâmetros de aptidão física, a capacidade cardiorrespiratória foi avaliada pelo teste de marcha estacionária de 2 min, contabilizando-se o número total de passos realizados corretamente nesse período2121 Rikli RE, Jones CJ. Functional fitness normative scores for community-residing older adults. Aging and Phys Act19997(2):129-61. DOI:10.1123/japa.7.2.162
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. A força dos membros superiores foi medida pelo teste de flexão de cotovelo, avaliando-se o número máximo de repetições desse exercício realizadas em 30 s, segurando-se um peso de dois quilos nas mulheres e de quatro quilos nos homens²¹. A força de membros inferiores foi medida pelo teste de impulsão vertical sem utilização dos braços, que permaneceram elevados2222 Soares JS, M. Medidas de força muscular. In: CELAFISCS(ed). Testes em ciências do esporte. 5ª ed. São Caetano do Sul: CELAFISCS. 1995. p. 73-7., sendo considerado o melhor resultado a partir de três tentativas consecutivas. A resistência abdominal foi avaliada pelo número de exercícios abdominais realizados em 30 s, partindo-se da posição de decúbito dorsal com os joelhos flexionados e os braços estendidos na lateral do corpo e elevando-se as costas em pelo menos 45° do solo2222 Soares JS, M. Medidas de força muscular. In: CELAFISCS(ed). Testes em ciências do esporte. 5ª ed. São Caetano do Sul: CELAFISCS. 1995. p. 73-7.. A flexibilidade de ombros foi medida pelo teste específico sugerido por Rikli & Jones2121 Rikli RE, Jones CJ. Functional fitness normative scores for community-residing older adults. Aging and Phys Act19997(2):129-61. DOI:10.1123/japa.7.2.162
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, no qual se mede a distância em centímetros entre os dedos médios das duas mãos, quando se posiciona um braço por cima do ombro e o outro por baixo, aproximando as mãos nas costas. Foram considerados valores negativos quando os dedos não se encontraram e positivos quando houve sobreposição. Foram realizadas três tentativas, sendo considerado o melhor resultado. A flexibilidade lombar foi medida pelo teste de sentar e alcançar utilizando-se o Banco de Wells2323 American College of Sports Medicine. ACSMs guidelines for exercise testing and prescription. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins, 2010.. Foram realizadas três tentativas, sendo considerada a maior medida. Para a classificação do nível de aptidão física em cada um dos testes, foram utilizadas as tabelas apresentadas por Albino et al.2424 Albino J, Freita CG, Martins VMS, Kanegusuku H, Roque TP, Bartholomeu T, et al. Tabelas de classificação da aptidão física para frequentadores de parques públicos. Rev Bras Med Esporte2010;16(5):373-7. DOI:10.1590/s1517-86922010000500011
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.

A aptidão física geral foi calculada para cada indivíduo em cada momento (pré e pós) a partir da somatória dos escores z de cada parâmetro de aptidão física. Para isso, o valor de cada parâmetro foi transformado em escore z, considerando-se a média e o desvio padrão dos valores obtidos na avaliação pré-intervenção e esses valores foram somados (i.e. Z = zCapacidade cardiorrespiratória+ zForça de membros superiores + zForça de membros inferiores + zResistência abdominal + zFlexiblidade de ombros + zFlexibilidade lombar).

Análise estatística

Inicialmente, a normalidade da distribuição dos dados foi avaliada com o teste de Shapiro Wilk aplicado às diferenças entre os valores pré e pós-intervenção. A seguir, as comparações dos dados obtidos pré- e pós-intervenção foram realizadas com testes t-student para amostras dependentes ou testes de Wilcoxon na dependência respectiva da presença ou não de distribuição normal dos dados, sendo considerado o nível de significância de p < 0,05. Então, o tamanho do efeito foi calculado pelo Eta Quadrado Parcial (η2), considerando-se η2<0,01 como sem efeito, 0,01> η2<0,06 como efeito pequeno, 0,06> η2<0,14 como efeito moderado e η2>0,14 como efeito grande2525 Cohen J. Statistical power analysis for behavior sciences. New York, Routledge, 1988.. Os dados são apresentados como média±desvio-padrão e média (95% intervalo de confiança-IC).

Resultados

Trinta e dois indivíduos se propuseram a participar da pesquisa, mas 3 não compareceram às avaliações pós-intervenção, de modo que a amostra final foi formada por 29 indivíduos. Essa amostra foi composta por idosos entre 60 e 78 anos, sendo a maioria mulheres (79,3%). Diversos indivíduos apresentavam obesidade central, dislipidemia e hipertensão arterial. A maioria apresentava aptidão física acima ou na média esperada para seu sexo e idade (Tabela 1).

Tabela 1
- Características da amostra (n=29)

Efeito no Risco Cardiovascular

A CC diminuiu significantemente da avaliação pré- para a pós-intervenção, com essa redução apresentando um tamanho de efeito de η2=0,215. Os demais fatores de risco cardiovascular (IMC, PAS, PAD, GLI e COL) não se alteraram significantemente. Dessa forma, o risco cardiovascular global, avaliado pelo escore Z, não se alterou do momento pré- para o pós-intervenção (Tabela 2).

Tabela 2
Fatores de risco cardiovascular medidos antes (Pré) e após 60 dias (Pós) de uma intervenção remota de orientação de prática de atividade física em participantes de um projeto de extensão.

Efeito na Aptidão Física

Houve aumento significante da capacidade cardiorrespiratória (116,8±21,3 vs. 122,5±23,0 passos, p=0,019), da força muscular de membros superiores (22,7±5,5 vs. 24,8±5,6 repetições, p=0,003) e da resistência abdominal (19,8±8,5 vs. 22,3±10,0 repetições, p=0,002) do momento pré- para o pós-intervenção e essas modificações apresentaram tamanhos de efeito maiores que 0,20. A força muscular de membros inferiores (18,2±7,5 vs. 18,8±7,1 cm, p=0,358), a flexibilidade lombar (24,0±11,8 vs. 24,6±12,0 cm, p=0,267) e a flexibilidade de ombros (0,7±8,4 vs. 0,6±8,6 cm, p=0,838) não se modificaram significantemente com a intervenção e essas modificações apresentaram tamanhos de efeito inferiores a 0,05. Dessa forma, houve aumento significante na aptidão física geral avaliada pelo escore Z após a intervenção (-0,04±3,55 vs. 1,30±4,10, p=0,000) com tamanho de efeito de η2=0,598 (Figura 1).

Figura 1
Modificação dos parâmetros de aptidão física calculada pela diferença entre os valores medidos após 60 dias (Pós) e antes (Pré) de uma intervenção remota de orientação de prática de atividade física em participantes de um projeto de extensão

Discussão

Os principais achados deste estudo foram que a intervenção remota de atividade física proposta diminuiu a obesidade central e aumentou a capacidade cardiorrespiratória, a força de membros superiores e a resistência abdominal dos participantes, não modificando o risco cardiovascular global, mas aumentando a aptidão física geral.

A intervenção remota proposta teve pouca influência nos fatores de risco cardiovasculares avaliados, reduzindo significantemente apenas a CC e auxiliando na manutenção dos demais fatores e do risco cardiovascular global. De fato, na maioria dos fatores, exceto CC, além das alterações não serem significantes, elas apresentaram tamanhos de efeito representativos de ausência de efeito ou efeito pequeno. Por outro lado, a diminuição da CC apresentou um tamanho de efeito grande, sugerindo uma importância clínica dessa redução2525 Cohen J. Statistical power analysis for behavior sciences. New York, Routledge, 1988.. Diversos estudos relatam uma relação inversa entre prática de AF e o risco cardiovascular⁶,¹⁰. Além disso, intervenções com AF em populações de idosos tem se mostrado efetivas em reduzir o risco cardiovascular⁹,¹⁰. De forma semelhante, estudos anteriores avaliando o efeito da intervenção presencial do Projeto Exercício e Coração no risco cardiovascular global demonstraram diminuição a partir da redução do IMC, da CC, da PAS e da PAD2626 Queiroz ACC, Brito LC, Santos MA, Fecchio RY, Stocco ALB, Bezerra AI, et al. Prescrição de caminhada não supervisionada, risco cardiovascular e aptidão física. Rev Bras Med Esporte 2013;27(3):377-86. DOI:10.1590/s1807-55092013000300005
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),(2727 Modesto BT, Bartholomeu T, Basso L, Costa LAR, Tinucci T, Forjaz CLM. Effects of a Real-Life Park-Based Physical Activity Interventional Program on Cardiovascular Risk and Physical Fitness. Prev Chronic Disease2021;18(6):200115. DOI:10.5888/PCD18.200115
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. O menor efeito observado no presente estudo pode se associar ao tamanho da amostra, às características da amostra ou ao protocolo proposto. Em relação ao número de indivíduos, destaca-se que apesar de menor que em estudos anteriores2626 Queiroz ACC, Brito LC, Santos MA, Fecchio RY, Stocco ALB, Bezerra AI, et al. Prescrição de caminhada não supervisionada, risco cardiovascular e aptidão física. Rev Bras Med Esporte 2013;27(3):377-86. DOI:10.1590/s1807-55092013000300005
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),(2727 Modesto BT, Bartholomeu T, Basso L, Costa LAR, Tinucci T, Forjaz CLM. Effects of a Real-Life Park-Based Physical Activity Interventional Program on Cardiovascular Risk and Physical Fitness. Prev Chronic Disease2021;18(6):200115. DOI:10.5888/PCD18.200115
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, ele foi suficiente para identificar efeito da intervenção sobre a CC e a aptidão física. Quanto às características da amostra, a baixa porcentagem de indivíduos com valores iniciais alterados (i.e. apenas 4 indivíduos com valores de PAS/PAD > 140/90 mmHg, nenhuma com GLI > 126 mg/dL e apenas 1 com COL > 240 mg/dL) pode explicar a ausência de efeito, visto que já está bem evidenciado na literatura que o efeito da AF sobre cada um desses fatores de risco é mais evidente quando eles estão alterados2828 Lin X, Zhang X, Guo J, Roberts CK, McKenzie S, Wu WC, et al. Effects of exercise training on cardiorespiratory fitness and biomarkers of cardiometabolic health: a systematic review and meta-analysis of randomized controlled trials. J Am Heart Assoc2015;4(7): e002014. DOI:10.1161/JAHA.115.002014
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. Corroborando com essa hipótese, observa-se em relação à obesidade central, cuja prevalência era grande na amostra (65,5%), que houve efeito relevante da intervenção reduzindo a CC. Considerando-se o protocolo empregado, destaca-se a indicação para a execução de 150min/semana de atividade física, como preconizado para a melhora da saúde2929 World Health Organization [Internet]. Guidelines on Physical Activity and Sedentary Behaviour: Suiça. 2020. [acesso em14 dez 2021] [Internet] [acesso em14 dez 2021] [Internet] https://www.who.int/publications/i/item/9789240015128
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, mas a ausência de controle objetivo da intensidade pode ter contribuído para os menores benefícios observados em alguns fatores de risco2929 World Health Organization [Internet]. Guidelines on Physical Activity and Sedentary Behaviour: Suiça. 2020. [acesso em14 dez 2021] [Internet] [acesso em14 dez 2021] [Internet] https://www.who.int/publications/i/item/9789240015128
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, de modo que estudos futuros devem pensar em intervenções que façam o controle desse importante componente da prática física. Para completar, é preciso considerar que a intervenção durou apenas 8 semanas, enquanto os estudos citados2626 Queiroz ACC, Brito LC, Santos MA, Fecchio RY, Stocco ALB, Bezerra AI, et al. Prescrição de caminhada não supervisionada, risco cardiovascular e aptidão física. Rev Bras Med Esporte 2013;27(3):377-86. DOI:10.1590/s1807-55092013000300005
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),(2727 Modesto BT, Bartholomeu T, Basso L, Costa LAR, Tinucci T, Forjaz CLM. Effects of a Real-Life Park-Based Physical Activity Interventional Program on Cardiovascular Risk and Physical Fitness. Prev Chronic Disease2021;18(6):200115. DOI:10.5888/PCD18.200115
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anteriormente avaliaram períodos de intervenção entre 3 e 6 meses, de modo que um maior período pode ser necessário para evidenciar efeitos mais expressivos da intervenção remota proposta no risco cardiovascular, o que precisa ser investigado no futuro.

Em relação os efeitos da intervenção na aptidão física, os resultados demonstram que mesmo de forma remota e não supervisionada, a intervenção proposta promoveu aumento de alguns parâmetros (capacidade cardiorrespiratória, força de membros superiores e resistência abdominal), levando à melhora da aptidão física geral. Destacando-se que os aumentos observados nesses parâmetros apresentaram tamanhos de efeito grandes, o que evidencia a relevância clínica dessa melhora2525 Cohen J. Statistical power analysis for behavior sciences. New York, Routledge, 1988.. Considerando esses aspectos, observou-se aumento da capacidade cardiorrespiratória, o que é a adaptação clássica ao treinamento aeróbico supervisionado3030 Baker MK, Atlantis E, Fiatarone Singh MA. Multi-modal exercise programs for older adults. Age and ageing 2007;36(4):375-81. DOI:10.1093/ageing/afm054
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e que também tem sido observado com intervenções não supervisionadas envolvendo atividades aeróbicas, como demonstrado no estudo de Modesto et al.2727 Modesto BT, Bartholomeu T, Basso L, Costa LAR, Tinucci T, Forjaz CLM. Effects of a Real-Life Park-Based Physical Activity Interventional Program on Cardiovascular Risk and Physical Fitness. Prev Chronic Disease2021;18(6):200115. DOI:10.5888/PCD18.200115
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na população que participava das atividades presenciais do Projeto Exercício e Coração antes da pandemia da COVID-19. Essa melhora, provavelmente, se deve ao componente aeróbico da intervenção remota proposta, que incluía duas sessões de caminhadas de 30 min por semana e uma aula remota de exercícios aeróbicos. De forma interessante e condizente, o mesmo desfecho de aumento da aptidão cardiorrespiratória foi observado em um estudo realizado por Kuldavletova et al.3131 Kuldavletova O, Pasquier F, Bigot L, Langeard A, Gauthier A, Quarck G. Videoconference-Based Adapted Physical Exercise Training Is a Good and Safe Option for Seniors. Int J Environ Res Public Health 2021;18(18):9439. DOI:10.3390/ijerph18189439
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, no qual foram comparados o treinamento presencial e por vídeo conferência e ambos promoveram aumento dessa capacidade física.

Os resultados do presente estudo demonstram ainda que a intervenção remota proposta promoveu aumento da força de membros superiores e da resistência abdominal, sendo a melhora desses dois parâmetros possivelmente relacionada à orientação para a execução de duas videoaulas por semana de exercícios de força muscular, o que está em acordo com as diretrizes para o uso desse tipo de treinamento para a saúde2929 World Health Organization [Internet]. Guidelines on Physical Activity and Sedentary Behaviour: Suiça. 2020. [acesso em14 dez 2021] [Internet] [acesso em14 dez 2021] [Internet] https://www.who.int/publications/i/item/9789240015128
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. Adicionalmente, essa melhora tem importante impacto na saúde e qualidade de vida, principalmente de idosos77 Nahas MV. Atividade Física, Saúde e Qualidade de Vida: Conceitos e sugestões para um estilo de vida ativo. 7 ed. Florianópolis: Ed. do Autor; 2017..

Apesar da execução das caminhadas e das videoaulas de força muscular incluírem exercícios para as pernas, não houve aumento significante da força muscular dos membros inferiores com a intervenção proposta e o tamanho do efeito da intervenção nessa variável foi nulo, o que diverge de outros estudos, como o de Queiroz et al.2626 Queiroz ACC, Brito LC, Santos MA, Fecchio RY, Stocco ALB, Bezerra AI, et al. Prescrição de caminhada não supervisionada, risco cardiovascular e aptidão física. Rev Bras Med Esporte 2013;27(3):377-86. DOI:10.1590/s1807-55092013000300005
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que evidenciou aumento da força de membros inferiores com a execução de caminhada prescrita por profissionais qualificados e executada sem supervisão. A divergência de resultados pode estar atrelada aos indivíduos investigados já serem participantes do Projeto Exercício e Coração, que já estimulava a caminhada mesmo antes da pandemia e deles já possuírem força de membros inferiores acima da média esperada para a idade. Quanto à ausência de efeito da intervenção remota na flexibilidade, tanto de ombros quanto lombar, com tamanhos de efeito nulo ou pequeno, ela pode ser explicada pela falta, na intervenção remota proposta, de uma orientação específica para a execução de exercícios de alongamento, o que deve ser incluído numa proposta futura de intervenção.

Os resultados desse estudo têm importante implicação clínica ao demonstrar que em indivíduos já participantes de um projeto de orientação de prática de AF, a orientação para a execução de uma intervenção remota estruturada envolvendo atividades aeróbicas e de força, apesar das dificuldades já relatadas na literatura especialmente em relação à dosagem de carga e acompanhamento da execução1616 Guimarães JAC, Guerra PH, Ueno DT, Christofoletti AEM, Nakamura PM. Estudo transversal sobre o uso de ferramentas virtuais para orientar a atividade física durante a COVID-19. Rev Bras Ativ Fís Saúde 2020;25:e150. DOI:10.12820/rbafs.25e0150
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, pode ser eficaz para promover melhora da aptidão física e redução da obesidade central. Esse resultado é fortalecido pelo fato das análises de testes de hipóteses (significância) e tamanho de efeito revelarem resultados concordantes. Por outro lado, este estudo também apresenta limitações. Nesse sentido, a principal delas é a ausência de um grupo controle, que permita afirmar que os resultados obtidos se devem realmente a intervenção remota proposta. No entanto, as restrições impostas pelas medidas sanitárias restringiram o número de avaliações presencias passíveis de serem realizadas, de modo que foi necessário priorizar a avaliação do grupo com intervenção. Ressalta-se, entretanto, que esses mesmos indivíduos já haviam sido avaliados antes da pandemia e não houve modificações significantes em seu risco cardiovascular e aptidão física durante o período em que não receberam a intervenção específica descrita neste estudo (dados não publicados), o que reforça a possibilidade da melhora ter realmente decorrido da intervenção proposta. As demais limitações do estudo se relacionam à amostra, visto que foi composta apenas por indivíduos já participantes de um projeto de extensão, com acesso à internet e ao telefone celular. Além disso, a amostra foi composta principalmente por indivíduos idosos, sem diagnóstico de problemas cardíacos e de COVID-19, de modo que os resultados não podem ser extrapolados para outras populações.

Conclusões

Em conclusão, a intervenção remota de orientação de prática de atividade física proposta foi eficaz em aumentar a aptidão física geral dos participantes do projeto de orientação de atividade física, aumentando a capacidade cardiorrespiratória, a força de membros superiores e a resistência abdominal, além de reduzir a CC, auxiliando na manutenção do nível de risco cardiovascular global.

Agradecimentos:

Os autores agradecem aos voluntários, monitores e participantes do Projeto “Exercício e Coração” sem os quais a existência do projeto e deste estudo não seriam possíveis. Para completar, agradecemos ao Fundo Social do Estado de São Paulo pelo convênio que permite a realização deste projeto de extensão junto à comunidade e à administração do Parque Fernando Costa pelo apoio ao projeto. O presente trabalho foi realizado com apoio da CAPES (Processo - 001), do CNPQ (processo 304436/2018-6), do Programa Aprender na Comunidade da Pró-Reitoria de Graduação da Universidade de São Paulo e do Programa Unificado de Bolsas da Universidade de São Paulo.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Maio 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    15 Jun 2022
  • Revisado
    26 Ago 2022
  • Aceito
    23 Set 2022
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