CARACTERÍSTICAS DE FREQUENTADORES DO PARQUE MINHOCÃO-SP

CHARACTERISTICS OF THE USERS OF PARQUE MINHOCÃO, SÃO PAULO-SP

RESUMO

O Parque Minhocão foi criado pela interdição do tráfico de veículos em uma via elevada em determinados dias e horários. Por essa peculiaridade, seus frequentadores podem apresentar características distintas das dos frequentadores de parques tradicionais e que precisam ser conhecidas para embasar atuações de saúde pública neste local. Este estudo investigou essas características a partir de uma amostra de 265 participantes de uma intervenção de saúde neste parque. Observou-se que a população era formada por adultos jovens (45,3%) ou de meia idade (36,6%), com nível de escolaridade superior (46%) e de diferentes classes econômicas, que moravam a até 1000 m do parque (75,5%) e deslocavam-se para ele a pé (84,5%), principalmente nos fins de semana (56,2%), e fazendo esse percurso em até 10 min (71,3%). A maioria era ativa no lazer (60,4%) e usava o parque para realizar atividades físicas (84,9%), especialmente caminhada (65,7%) e corrida (32,5%). Essas características, em geral, foram semelhantes entre os sexos e as faixas etárias. Em conclusão: os frequentadores adultos do Parque Minhocão são, principalmente, jovens e de meia idade, fisicamente ativos, de diferentes classes econômicas, que moram nas imediações do parque e o frequentam para praticar atividades físicas de lazer, sobretudo caminhada e corrida.

Palavras-chave:
Parques lineares; Atividades físicas de lazer; Políticas de saúde pública

ABSTRACT

Parque Minhocão was created by the interdiction of an elevated road for traffic on certain days and times. Because of this peculiarity, its users may have different characteristics from those of the users of traditional parks that need to be known to support heath action on this place. This study investigated these characteristics from a sample of 265 participants of a health champaign conducted in this park. It was observed that the park users were formed by young (45.3%) or middle-aged (36.6%) adults, with higher education level (46%) and from different economic classes, living up to 1000 m from the park (75.5%) and doing the route to the park on foot (84.5%), mainly on weekends (56, 2%), in up to 10 min (71.3%). Most were active in leisure time (60.4%) and used the park mainly for performing physical activities (84.9%), especially walking (65.7%) and running (32.5%). These characteristics, in general, were similar between genders and age groups. In conclusion, the adult users of Parque Minhocão are mainly young and middle aged, physically active, from different economic classes who live in its vicinity and go to the park to practice leisure physical activities, especially walking and running.

Keywords:
Linear parks; Leisure physical activity; Public health policies

Introdução

A prevalência da inatividade física em níveis alarmantes no Brasil é um importante fator de risco para o desenvolvimento de doenças crônicas não transmissíveis. Essas doenças são as principais responsáveis pelas mortes em nosso país e seus custos diretos e indiretos são muito elevados¹. Segundo a Organização Mundial da Saúde², quase metade (47%) da população brasileira é insuficientemente ativa, ou seja, não acumula um mínimo de 150 min de atividade física moderada e/ou 75 min de atividade física vigorosa por semana.

A prática regular de atividades físicas promove benefícios expressivos à saúde de adultos, aumentando a metabolização da glicose, diminuindo a pressão arterial, melhorando o perfil lipídico, auxiliando no controle ponderal, retardando a perda da massa óssea, prevenindo vários tipos de câncer, promovendo bem-estar emocional, reduzindo a ansiedade e depressão, ajudando na manutenção da função cognitiva, entre outros³. Assim, essa prática previne e auxilia no controle das doenças crônicas não transmissíveis⁴.

Diante desses benefícios, a inserção da atividade física no comportamento da população é uma prioridade na agenda global de saúde pública⁵. No Brasil, o Ministério da Saúde lançou em 2011, o Plano de Ações Estratégicas para o Enfrentamento dessas doenças⁶, que tem como um dos seus principais alicerces, a promoção de ações para aumentar o número de pessoas ativas no país. Entre elas, uma importante ação é a ampliação de espaços públicos para a prática física⁷⁾ e, nesse sentido, a criação de parques lineares em centros urbanos a partir da desativação e readequação de vias expressas tem sido uma das estratégias adotadas^8),(9.

Em São Paulo, o Elevado Presidente João Goulart, conhecido como Minhocão, é uma via de 2,8 km no centro da cidade por onde trafegam, aproximadamente, 80 mil veículos por dia¹⁰. Esse espaço foi oficialmente transformado em Parque Municipal do Minhocão em 2018 (Lei 16.833, de 7 de fevereiro de 2018)¹¹, o que permitiu seu uso para atividades de lazer em horários específicos e previu sua desativação gradual. Esse parque tornou-se, assim, um equipamento público de lazer no centro de São Paulo e estava, no momento da execução desta pesquisa, aberto aos sábados, domingos e feriados, e também nos dias úteis das 20h às 7h.

Com essa transformação, este espaço se tornou um importante local de lazer nesta região da cidade. Em 2017, foi utilizado por cerca de 500 pessoas nos dias da semana e 5.000 nos fins de semana¹²_. Com esse público, o Parque Municipal do Minhocão pode ser um espaço público interessante para a realização de atuações populacionais de incentivo e orientação para a prática de atividades físicas visando a melhora e manutenção da saúde e qualidade de vida. No entanto, para a elaboração de atuações adequadas e, portanto, com maior chance de sucesso, é fundamental conhecer as características da população que faz uso desse parque e as formas desse uso. Como um parque linear difere dos parques tradicionais, as características de seus usuários também podem ser diferentes, o que torna essa investigação necessária. Além disso, as características podem diferir entre os sexos e nas diferentes faixas etárias e, caso isso ocorra, é necessário conhecer essas diferenças para que se possa elaborar atuações específicas.

Diante dessas necessidades, este estudo objetivou descrever as características dos frequentadores do Parque Minhocão a partir de participantes de uma intervenção de saúde realizada neste parque. Em complemento, observou se havia diferenças nessas características entre os usuários de diferentes sexos e faixa etárias.

Métodos

Participantes

O presente estudo apresenta característica observacional, transversal e descritiva. Contou com uma amostra formada por frequentadores adultos (maiores de 18 anos) do Parque Minhocão, que participaram de uma intervenção de saúde realizada em dois dias neste parque e que permitiram o uso de seus dados para pesquisa. Essa intervenção incluía o levantamento de dados pessoais e de saúde, além da orientação de prática de atividade física. Para sua realização foi utilizada a estrutura do Projeto “Exercício e Coração” do Laboratório de Hemodinâmica da Atividade Motora da Escola de Educação Física e Esporte da Universidade de São Paulo (LAHAM-EEEFE/USP), que realiza atuações em locais públicos com finalidade assistencial e de pesquisa¹³. A execução do presente estudo faz parte das investigações desse projeto, que foram aprovadas pelo Comitê de Ética de Pesquisa da Instituição (CAAE: 01565318.0.0000.5391).

Procedimentos

A intervenção foi realizada no Parque Minhocão nos dias 14 de setembro e 20 de outubro de 2019 das 8 às 12hs e das 14 às 18hs. Os participantes que permitiram o uso dos dados para a pesquisa assinaram o termo de consentimento e foram incluídos neste estudo. A intervenção foi realizada por 26 monitores treinados (8 horas de capacitação teórica e prática).

Os dados analisados para essa pesquisa foram: dados pessoais e demográficos, prática de atividade física no tempo de lazer e características do uso do parque. Os dados pessoais e demográficos coletados foram: sexo - feminino ou masculino; idade (anos de vida) - categorizada em adulto jovem (18 - 39 anos), meia idade (40 - 59 anos) e idoso (60 anos ou mais); escolaridade - categorizada em fundamental/analfabeto, médio, superior ou pós-graduação, independentemente se completos ou incompletos; e classificação econômica - perguntando-se a renda média do domicílio e categorizada segundo os critérios do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getúlio Vargas em classe A (R$ 11.262,00 ou mais), B (R$ 8.641,00 a R$ 11.261,00), C (R$ 2.005,00 a R$ 8.460,00), D (R$ 1255,00 a R$ 2004,00) e E (R$ 0,00 a R$ 1.254,00)¹⁴.

A prática de atividades físicas de lazer foi avaliada por um questionário já utilizado em outros estudos^{15),(16),(17),(18}. Basicamente, foram feitos 2 blocos de perguntas: 1) Você pratica caminhada regularmente? Se sim: em que dias da semana, com qual duração, com que intensidade (escala de Borg de 20 pontos¹⁹) e há quanto tempo; 2) Você pratica outra atividade física (corrida, natação, ginástica, etc) no seu tempo de lazer? Se sim, para cada prática: em que dias da semana, com qual duração, com que intensidade (mesma escala) e há quanto tempo. O volume de cada atividade foi calculado multiplicando-se a frequência semanal por sua duração, enquanto a escala de Borg foi utilizada para classificar a intensidade da atividade em leve (<12), moderada (12 ou 13) ou vigorosa (> 14)⁴. O volume semanal de atividade física moderada foi obtido somando-se o volume semanal de caminhada com o volume semanal de outras atividades físicas realizadas em intensidade moderada. O volume semanal de atividades físicas vigorosas foi calculado pela somatória das atividades realizadas em intensidade vigorosa. Os indivíduos foram considerados ativos quando perfaziam pelo menos 150 min/semana de atividades físicas moderadas e/ou 75 min/semana de atividades vigorosas⁴.

As características de acesso ao Parque Minhocão foram obtidas a partir das seguintes questões: i) Com que frequência você vem ao Parque Minhocão? - raramente, nos fins de semana ou várias vezes na semana; ii) Qual o principal modo de deslocamento que utiliza para vir da sua casa para o Minhocão? - categorizado em meios não motorizados (à pé, bicicleta, skate, patins, etc) ou motorizados (carro, moto, ônibus, metrô, etc); e iii) Qual o tempo de deslocamento a pé da sua casa até o Minhocão? - categorizados em até 10 min ou 10 min ou mais²⁰. Além disso, a distância entre a moradia e o Parque Minhocão foi calculada pelo Google Maps (https://www.google.com.br/maps/), sendo tais distâncias classificadas em até 500 m, de 501 a 1000 m, de 1001 a 1500 m e 1501 m ou mais²¹.

Para identificar o uso do parque feito pelos frequentadores, recorreu-se às perguntas: i) O que você vem fazer no Parque Minhocão? - as atividades foram categorizadas em atividades físicas (caminhada, corrida, ciclismo, passeio com cachorro, skate, patins, alongamento, yoga e exercício) e outras atividades (passear, conversar, encontrar amigos, tomar sol, filmar, fotografar, ler, etc); e ii) Você utiliza a extensão total do parque para práticas de lazer? - categorizada em não ou sim (unindo uso sempre ou às vezes da extensão total). Para completar, avaliou-se a percepção dos indivíduos em relação ao horário de uso do parque a partir da seguinte pergunta: Com a ampliação do horário de funcionamento do Parque Minhocão, sua disposição de fazer atividade física aumentou? - categorizada em sim, não ou não sei.

Análise estatística

Os dados coletados foram tabulados com dupla entrada e posterior ajuste de inconsistências. As comparações das características entre sexos e faixas etárias foram realizadas através de testes Qui-quadrado (χ2) usando-se o programa SPSS (IBM Corp. Released 2011. IBM SPSS Statistics for Windows, Version 20.0. Armonk, NY: IBM Corp.). Foi considerado significante o nível de p<0,05.

Resultados

Duzentos e oitenta frequentadores do parque Minhocão participaram da intervenção e desses, 15 não assinaram o termo de consentimento. Dessa forma, a amostra foi composta por 265 indivíduos (115 mulheres e 150 homens) (Tabela 1).

Tabela 1
Características sociodemográficas e nível de prática de atividade física de lazer da amostra total, separada por sexo e idade, do Parque Minhocão-SP, 2019 (n=265).

	Total		Homens		Mulheres		χ2	Adultos jovens		Meia idade		Idosos		χ2
	n	%	n	%	n	%		n	%	n	%	n	%
Número de indivíduos	265	100,0	150	56,6	115	43,4	-	120	45,3	97	36,6	48	18,1	-
Sexo
Homens	150	56,6	-	-	-	-	-	69	57,5	53	54,6	28	58,3	0,882
Mulheres	115	43,4	-	-	-	-		51	42,5	44	45,4	20	41,7
Faixa etária (anos)
18 - 39	120	45,3	69	46,0	51	44,3	0,882	-	-	-	-	-	-	-
40 - 59	97	36,6	53	35,3	44	38,3		-	-	-	-	-	-
≥ 60	48	18,1	28	18,7	20	17,4		-	-	-	-	-	-
Escolaridade
Analfabeto/ fundamental	26	9,8	17	11,4	9	7,8	0,713	2	1,7	12	12,4	12	25,0	0,000*
Médio	62	23,4	31	20,7	31	27,0		16	13,3	27	27,8	19	39,6
Superior	122	46,0	70	46,7	52	45,2		71	59,2	40	41,2	11	22,9
Pós-graduação	55	20,8	32	21,3	23	20,0		31	25,8	18	18,6	6	12,5
Classe econômica
A	23	8,7	17	11,3	6	5,2	0,143	9	7,5	8	8,2	6	12,5	0,436
B	31	11,7	20	13,3	11	9,6		11	9,2	17	17,5	3	6,3
C	124	46,8	68	45,3	56	48,7		57	47,5	45	46,4	22	45,8
D	29	10,9	16	10,7	13	11,3		12	10,0	12	12,4	5	10,4
E	14	5,3	10	6,7	4	3,5		6	5,0	4	4,1	4	8,3
Não respondeu	44	16,6	19	12,7	25	21,7		25	20,8	11	11,3	8	16,7
Classificação do nível de AFL(a)
Ativo	160	60,4	98	65,3	62	53,9	0,095	73	60,8	59	60,8	28	58,3	0,987
Insuficientemente ativo	54	20,4	24	16,0	30	26,1		23	19,2	20	20,6	11	22,9
Inativo	51	19,2	28	18,7	23	20,0		24	20,0	18	18,6	9	18,8

• Nota: ^aAFL = atividades físicas de lazer; * Diferença significante (p < 0,05)
• Fonte: autores

A maioria da amostra foi formada por adultos jovens (45,3%) ou de meia idade (36,6%), principalmente com nível de escolaridade superior (46%) e da classe econômica C (46,8%). Não houve diferenças nessas características entre sexos. Entre as faixas etárias, os indivíduos mais jovens apresentam maiores níveis de escolaridade. Quanto à atividade física praticada, a maioria (60,4%) foi formada por pessoas ativas no tempo de lazer, sendo esse resultado semelhante entre homens e mulheres (65,3 vs. 53,9, p = 0,10) e nas diferentes faixas etárias (60,8 vs. 60,8 vs. 58,3% para jovens, meia-idade e idosos, respectivamente, p=0,99).

Considerando-se o acesso ao parque (Tabela 2), a maioria (56,2%) frequentava-o aos fins de semana, mas uma parcela expressiva (44,8%) também o frequentava durante a semana.

Tabela 2
Característica do uso do Parque Minhocão-SP pelos frequentadores, 2019 (n=265)

	Total		Homens		Mulheres		χ2	Jovens		Meia idade		Idosos		χ2
	n	%	n	%	n	%		n	%	n	%	n	%
Frequência semanal
Fins de semana	149	56,2	83	55,3	66	57,4	0,776	63	52,5	53	54,6	33	68,8	0,365
Várias vezes	58	21,9	33	22,0	25	21,7		27	22,5	25	25,8	6	12,5
Raramente	47	17,7	29	19,3	18	15,7		23	19,2	17	17,5	7	14,6
Só dessa vez	11	4,2	5	3,3	6	5,2		7	5,8	2	2,1	2	4,2
Deslocamento
A pé	224	84,5	120	80,0	104	90,4	0,047*	102	85,0	78	80,4	44	91,7	0,482
Bicicleta/skate/ patins	27	10,2	21	14,0	6	5,2		11	9,2	13	13,4	3	6,3
Carro/moto/ ônibus/metrô	14	5,3	9	6,0	5	4,3		7	5,8	6	6,2	1	2,1
Moradia (metros)
até 500	125	47,2	70	46,7	55	47,8	0,163	58	48,3	45	46,4	22	45,8	0,422
de 501 a 1000	75	28,3	42	28,0	33	28,7		30	25,0	28	28,9	17	35,4
de 1001 a 1500	18	6,8	6	4,0	12	10,4		8	6,7	10	10,3	0	0,0
≥ 1501	41	15,5	28	18,7	13	11,3		20	16,7	13	13,4	8	16,7
Não disponível	6	2,3	4	2,7	2	1,7		4	3,3	1	1,0	1	2,1
Deslocamento
até 10 min	189	71,3	105	70,0	84	73,0	0,587	90	75,0	68	70,1	31	64,6	0,381
≥ 10 min	76	28,7	45	30,0	31	27,0		30	25,0	29	29,9	17	35,4
Atividades realizadas
AFL(a)	225	84,9	129	86,0	96	83,5	0,701	102	85,0	84	86,6	39	81,3	0,719
Outras	21	7,9	12	8,0	9	7,8		8	6,7	7	7,2	6	12,5
Ambas	19	7,2	9	6,0	10	8,7		10	8,3	6	6,2	3	6,3
Extensão utilizada
Total	206	77,7	122	81,3	84	73,0	0,108	89	74,2	84	86,6	33	68,8	0,023*
Parcial	59	22,3	28	18,7	31	27,0		31	25,8	13	13,4	15	31,3
Disposição em realizar AFL(a)
Aumentou	164	61,9	99	66,0	65	56,5	0,255	78	65,0	64	66,0	22	45,8	0,083
Não aumentou	85	32,1	42	28,0	43	37,4		36	30,0	29	29,9	20	41,7
Não sabe	16	6,0	9	6,0	7	6,1		6	5,0	4	4,1	6	12,5

• Nota ^aAFL = atividades físicas de lazer; * Diferença significante (p < 0,05)
• Fonte: autores

A grande maioria (84,5%) deslocava-se a pé para o parque, morando a até 500 (47,2%) ou entre 500 e 1000 m (28,3%) de distância e referindo levar até 10 min nesse deslocamento (71,3%). Verificou-se diferenças entre homens e mulheres quanto ao modo de deslocamento da residência ao parque, com os homens usando meios de transporte alternativos (bicicleta, skate, patins, etc) em maior percentual do que as mulheres (p=0,047).

A grande maioria dos frequentadores (84,9%) relatou utilizar o parque com a finalidade específica de praticar atividades físicas de lazer e mais de – (77,7%) utilizavam toda a extensão da via para essa prática (2,8 km), sendo essa frequência maior em pessoas de meia idade, seguido dos adultos jovens e dos idosos (86,6% vs. 74,2% vs. 68,8%, p=0,023). Mais da metade dos participantes (61,9%) relatou achar que a ampliação do horário de funcionamento do Parque Minhocão aumentou sua disposição para a execução de atividades físicas de lazer, sendo esse padrão de resposta semelhante em homens e mulheres e nas diferentes faixas etárias.

Entre as atividades físicas praticadas no Parque Minhocão (Figura 1), a caminhada (65,7%) e a corrida (32,5%) foram as mais frequentes tanto nos homens quanto nas mulheres e também nas três faixas etárias. Comparando-se a frequência da prática das diferentes atividades entre os sexos, a prática da corrida (homens: 37,3 vs. mulheres: 26,1%, p= 0,053) e de outros exercícios físicos, como alongamento, yoga e treinamento funcional (homens: 4,0% vs. mulheres: 0%, p = 0,030) foi mais frequente nos homens do que nas mulheres. Quanto às diferentes faixas etárias, a frequência de prática de corrida (adultos jovens: 41,7 vs. meia idade: 28,9 vs. idosos: 16,7%, p = 0.005) e de skate/patins (adultos jovens: 7,5 vs. meia idade: 0% vs. idosos: 0%, p = 0,004) diminuiu com o avanço da idade.

Figura 1
Principais atividades realizadas no Parque Minhocão-SP no tempo de lazer pela amostra total (painel A), por sexo (painel B) e por faixa etária (painel C), 2019 (n=265)

Discussão

Os principais achados deste estudo indicam que frequentadores do Parque Minhocão são, principalmente, homens e mulheres adultos jovens ou de meia-idade, com grau de escolaridade superior e classe econômica C. Essa população é predominantemente ativa, mora próximo e vai ao parque a pé, frequentando-o, principalmente, nos fins de semana. Os participantes usam o parque primordialmente para a prática de atividades físicas, destacando-se a caminhada e corrida, e fazem uso de toda a extensão do parque para essa prática. A população relata entender que a disposição para a prática física aumentou com a ampliação do horário de funcionamento do parque. De modo geral, essas características foram semelhantes entre os sexos e entre as diferentes faixas etárias.

Os resultados obtidos em relação ao sexo, faixa-etária e nível de escolaridade foram semelhantes aos observados num outro estudo realizado com os usuários do Parque Minhocão através de observação remota¹², o que reforça a validade dos dados coletados nesta amostra para a caracterização dos usuários do parque. Destaca-se, ainda, que as características desta população são diferentes das encontradas em um outro parque urbano tradicional da região, no qual predominam os frequentadores do sexo feminino e idosos¹⁸. Essa diferença sustenta a hipótese de que o Parque Minhocão atende a uma população diferente da atendida nos parques tradicionais da região. Os motivos para essa diferença de público não são conhecidos e devem ser investigados no futuro.

Considerando-se as classes econômicas atendidas pelo parque, houve predominância da classe C (46,8%) e distribuição normal (gaussiana) dos participantes nas diferentes classes, sugerindo que o parque oferece oportunidades socialmente inclusivas. Isso também reflete os padrões de renda existentes nos bairros em seu entorno, visto que em Higienópolis e Pacaembu predominam rendas acima de 10 salários-mínimos, enquanto em Santa Cecília, Barra Funda, Campos Elíseos e República, essas rendas estão entre 2 e 10 salários-mínimos²².

Destaca-se que a população frequentadora do Parque Minhocão é predominantemente de moradores da localidade, visto que 47,2% moravam em até 500 m do parque e 75,5% informaram levar no máximo até 10 min à pé para chegar ao parque. Esse pode ser um aspecto importante, visto que a disponibilidade de espaços públicos urbanos construídos em até 500 m da residência parece aumentar a disposição para a realização de caminhadas de lazer²¹⁾ e, de fato, a maior parte dos usuários (65,7%) relatou utilizar o parque para caminhadas.

É interessante observar também que a maioria dos frequentadores do parque era fisicamente ativa (60,4%), o que difere do observado na população adulta do Brasil (39%), do Estado de São Paulo (34,6%) e da capital paulista (44% e 27% para homens e mulheres, respectivamente)²³. Por se tratar de um estudo observacional, não é possível atribuir essa maior proporção de pessoas ativas à existência do parque, mas como dito anteriormente, a disponibilidade desse espaço pode ter incentivado a prática²¹. Nesse contexto, é possível que a liberação do funcionamento do Parque Minhocão tenha corroborado para esse quadro de maior prevalência de nível ativo de atividade física neste ambiente, sendo interessante apontar que uma parcela expressiva dos participantes (61,9%) relatou considerar que a ampliação do horário de funcionamento do parque aumentou sua disposição para a prática física.

Entre as diversas atividades realizadas, a caminhada foi a mais frequente, o que confirma estudos realizados em diferentes parques públicos²⁴. Os motivos para a preferência dessa prática não foram alvo deste estudo, mas estudos anteriores sugerem que a facilidade, segurança e autoconfiança na execução da caminhada a tornam a modalidade preferencial das práticas físicas de lazer sem supervisão²⁵. Além da caminhada, a corrida e o ciclismo também foram relatados por parte considerável dos participantes, principalmente nos homens e nos mais jovens. A característica específica de linearidade do parque e a permissão para uso de veículos não motorizados, o que não é permitido nos parques tradicionais da região, podem ter contribuído para a execução dessas modalidades no Parque Minhocão. Em relação ao ciclismo, tem sido verificado que a estruturação de espaços públicos que permitem a realização dessa modalidade, como as ciclovias, contribui para o aumento do número de praticantes^26),(27.

As características observadas neste estudo podem ter importantes implicações, uma vez que elas demonstram que o espaço público transformado em um parque linear atende uma população local (moradores dos arredores) diferente da que frequenta outros parques da região, sendo essa utilização basicamente para a prática de atividades físicas de lazer, o que é primordial para a melhora e manutenção da saúde da população, indo ao encontro do plano governamental para enfrentamento das doenças crônicas não transmissíveis⁶. O conhecimento dessas características pode ajudar na elaboração de intervenções de saúde pública neste local. Nesse sentido, o fato do parque já ser, basicamente, usado para a prática de atividades físicas, sugere que as intervenções devem incluir orientações para o aperfeiçoamento dessa prática e não apenas o incentivo a sua execução. Além disso, a ausência, em geral, de diferenças entre sexos e faixas etárias sugere que as intervenções podem visar todos os públicos, porém as diferenças observadas em relação às atividades físicas mais praticadas indicam a necessidade de foco em modalidades diferentes para os diferentes sexos e faixas etárias.

Esse estudo possui limitações. A coleta de dados foi realizada numa intervenção de saúde pública e não como num desenho específico de levantamento epidemiológico. Apesar dessa limitação, as características de sexo, faixa-etária e nível de escolaridade foram coerentes com pesquisas epidemiológicas anteriores, sugerindo que as demais variáveis estudadas também possam refletir, pelo menos parcialmente, as características gerais dos usuários do parque. As coletas foram realizadas apenas em fins de semana, não permitindo avaliar se o perfil e a forma de uso do parque pelos usuários dos dias de semana são diferentes. Porém, parte significativa dos participantes (44,8%) também relatou frequentar o parque durante a semana. A prática de atividade física foi obtida por um questionário próprio já utilizado^{15),(16),(17),(18}, mas sem validação oficial. No entanto, o volume total e a classificação de atividade física obtidos com esse questionário são concordantes com os obtidos na parte de atividades de lazer da versão longa do Questionário Internacional de Atividade Física (ICC= 0,81 e kappa = 0,848, respectivamente - dados não publicados).

Conclusões

Em conclusão, os frequentadores do Parque Minhocão são formados, principalmente, por adultos jovens e de meia idade, fisicamente ativos, de diferentes classes sociais, que moram nas imediações do parque e o frequentam para praticar atividades físicas de lazer, sobretudo a caminhada e a corrida.

Agradecimentos:

os autores agradecem à Associação Parque Minhocão e às Secretarias Executivas dos Órgãos Colegiados do Município de São Paulo pela colaboração na obtenção das autorizações necessárias para a coleta dos dados. Agradecem também os usuários do parque que permitiram o uso de seus dados para pesquisa e os monitores do Projeto Exercício e Coração que auxiliaram na coleta de dados. O projeto recebeu financiamento da Universidade de São Paulo (Programa Unificado de Bolsas e Aprender na Comunidade) e do CNPq (304436/2018-6).

Referências

• ¹
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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  11 Abr 2022
• Data do Fascículo
  2022

Histórico

• Recebido
  13 Fev 2021
• Revisado
  26 Abr 2021
• Aceito
  23 Jun 2021