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Desenvolvimento socioeconômico na perspectiva das lideranças: o caso do município de Assis Chateaubriand, PR

Socioeconomic development from the perspective of leaders: the case of the municipality of Assis Chateaubriand, PR

Desarrollo socioeconómico en la perspectiva de los líderes: el caso del municipio de Assis Chateaubriand, PR

Resumo

As pesquisas sobre o desenvolvimento socioeconômico ganham maior relevância em países de dimensões continentais como o Brasil, onde cada região possui particularidades e distinções que devem ser investigadas e entendidas para melhor compreensão das realidades locais e regionais, a fim de, a partir destes conhecimentos, planejar-se e construir projetos próprios e específicos que visem ao seu desenvolvimento. Outro aspecto importante em relação aos projetos de desenvolvimento é o papel das lideranças locais e regionais, suas percepções, visões e aptidões em relação ao tema, tendo em vista o protagonismo que tais atores deveriam assumir. O objetivo deste estudo foi investigar e analisar a relação entre o desenvolvimento socioeconômico local e a perspectiva das lideranças empresariais, políticas e comunitárias do município de Assis Chateaubriand na região do oeste do Paraná. A base teórica foi a do desenvolvimento fundamentado nas características locais, nas peculiaridades regionais e nas especificidades de cada comunidade. Este é o conceito-base do chamado Desenvolvimento Local. Foram realizadas entrevistas com vinte e cinco lideranças locais no segundo semestre de 2021, numa amostra não probabilística. A abordagem foi qualitativa, utilizando a entrevista com método de coleta de dados. Os resultados apontaram forte perspectiva para o fortalecimento do desenvolvimento econômico no município, mas grande preocupação em relação ao desenvolvimento social.

Palavras-chave
desenvolvimento socioeconômico; lideranças; desenvolvimento local

Abstract

Research on socioeconomic development is more relevant in countries of continental dimensions such as Brazil, where each region has particularities and distinctions that must be investigated and understood in order to better understand local and regional realities to plan and build its own specific projects to develop from this knowledge. Another important aspect in relation to development projects is the role of local and regional leaders, their perceptions, visions and skills in relation to the theme, in view of the role that such actors should assume. The aim of this study was to investigate and analyze the relationship between local socioeconomic development and the perspective of business, political and community leaders in the municipality of Assis Chateaubriand in the Western region of Paraná State. The theoretical basis was development grounded on local characteristics, regional peculiarities and specificities of each community. This is the basic concept of so-called Local Development. Interviews were conducted with twenty-five local leaders in the second half of 2021, in a non-probabilistic sample. The approach was qualitative, using the interview with data collection method. The results indicated a strong perspective for strengthening economic development in the municipality, but a great concern in relation to social development.

Keywords
socioeconomic development; leaders; local development

Resumen

Las investigaciones sobre desarrollo socioeconómico son más relevantes en países de dimensiones continentales como Brasil, donde cada región tiene particularidades y distinciones que deben ser investigadas y entendidas para mejor comprensión de las realidades locales y regionales, a fin de planificar y construir sus propios proyectos específicos para desarrollar a partir de este conocimiento. Otro aspecto importante en relación con los proyectos de desarrollo es el papel de los líderes locales y regionales, sus percepciones, visiones y habilidades en relación con el tema, en vista del papel que dichos actores deben asumir. El objetivo de este estudio fue investigar y analizar la relación entre el desarrollo socioeconómico local y la perspectiva de los líderes empresariales, políticos y comunitarios en el municipio de Assis Chateaubriand en la región oeste del Estado do Paraná. La base teórica fue el desarrollo basado en las características locales, las peculiaridades regionales y las especificidades de cada comunidad. Este es el concepto básico del llamado Desarrollo Local. Se realizaron entrevistas a veinticinco líderes locales en el segundo semestre de 2021, en una muestra no probabilística. El enfoque fue cualitativo, utilizando el método de entrevista con recolección de datos. Los resultados indicaron una fuerte perspectiva para fortalecer el desarrollo económico en el municipio, pero una gran preocupación en relación con el desarrollo social.

Palabras clave
desarrollo socioeconómico; líderes; desarrollo local

1 INTRODUÇÃO

O Brasil possui mais de cinco mil municípios. Dadas as dimensões continentais do país, existe uma grande diversidade entre eles, pois cada um tem características, peculiaridades, potencialidades e, consequentemente, níveis diferenciados de desenvolvimento socioeconômico.

Tais dessemelhanças entre as características municipais em termos de perfil de desenvolvimento complicam a execução de um projeto único de desenvolvimento municipal. Isso impõe a necessidade de projetos específicos para cada região, município, comunidades e localidades. Então, a consciência da necessidade de projetos específicos para cada localidade/comunidade proporcionou o surgimento de diversos conceitos, tais como: desenvolvimento territorial, desenvolvimento regional e desenvolvimento local. Dentre esses conceitos, o desenvolvimento local se aproxima mais da realidade municipal, no que tange à escala e às categorias de análise, dentre elas a relação entre as lideranças e o processo de desenvolvimento socioeconômico do lugar.

Diante do exposto, a presente pesquisa tem o objetivo de analisar a relação entre o desenvolvimento socioeconômico e a perspectiva das lideranças empresariais, políticas e comunitárias em relação ao desenvolvimento local do município de Assis Chateaubriand, PR. Ao final de 2022, no município de Assis Chateaubriand, PR, instalou-se um frigorífico de abate de suínos da Cooperativa Central Frimesa. A instalação do frigorífico representou uma mudança no mercado de trabalho e possivelmente no perfil do desenvolvimento econômico do município. Com isso, a opinião das lideranças locais sobre o processo de desenvolvimento local e sua visão prospectiva torna-se referência para compreender as tendências da economia municipal e os desafios da municipalidade.

Para atender ao objetivo proposto, a base teórica buscou o marco conceitual do desenvolvimento socioeconômico baseado nas características locais, as peculiaridades regionais e as especificidades de cada comunidade.

A metodologia consistiu na realização de entrevistas com vinte e cinco lideranças locais no segundo semestre de 2021, numa amostra não probabilística. A abordagem foi qualitativa, utilizando a entrevista com método de coleta de dados. Os resultados da pesquisa contribuirão para a construção de futuros projetos de desenvolvimento no município de Assis Chateaubriand, PR, pois a perspectiva dos consensos em relação ao município é um elemento importante para a construção do desenvolvimento local.

2 REFERENCIAL TEÓRICO

O desenvolvimento é um processo de transformação econômica, política e social, por meio do qual o crescimento do padrão de vida da população tende a tornar-se autônomo. Trata-se de um processo social global, no qual as estruturas econômicas, políticas e sociais sofrem contínuas e profundas transformações. Não tem sentido falar em desenvolvimento apenas econômico, ou apenas político, ou apenas social (Bresser-Pereira, 2003BRESSER-PEREIRA, Luiz Carlos. Desenvolvimento e crise no Brasil: história, economia e política de Getúlio Vargas a Lula. São Paulo: 34, 2003.).

Ou seja, em suas mais diversas dimensões, o processo de desenvolvimento vai além do que o simples crescimento do produto da economia. Tal esclarecimento é importante, uma vez que, até os anos 1950, muitos pensadores sociais confundiram crescimento econômico com desenvolvimento econômico. Por muito tempo, prevaleceu o consenso de que, para o desenvolvimento acontecer, era necessário apenas e tão somente investimento em forma de recursos financeiros. Segundo a lógica deste raciocínio, se houvesse abundância de aplicação de recursos financeiros em um lugar, o desenvolvimento ocorreria naturalmente. No entanto, o crescimento econômico é apenas um dos aspectos do desenvolvimento.

Vale recordar a lição de Costa Pinto (1978)COSTA PINTO, Luiz de Aguiar. A sociologia e o desenvolvimento: temas e problemas do nosso tempo. 7. ed. São Paulo: Civilização Brasileira, 1978., que ressalta que o desenvolvimento não pode ser entendido como operação técnica ou inovação tecnológica. E que essa postura resultaria em não aceitar as implicações decorrentes da complexidade da vida cotidiana das comunidades e seria verdadeiro absurdo.

Todavia, a experiência dos países latino-americanos, especialmente a brasileira, contrariou essa visão. Ao longo da história do Brasil, o desenvolvimento econômico, impulsionado apenas por injeções de capital e paternalismo estatal, tem sido atravancado por corrupção, falta de qualificação técnica e outros inúmeros fatores, todos esbarrando em um outro elemento: a imposição de projetos de cima para baixo. Ou seja, apenas fatores exógenos como os recursos financeiros ou tecnológicos de fora de uma localidade, mesmo acompanhados de treinamento e de montagem de campos de produção e de agregação de valor, são insuficientes diante da importância dos fatores endógenos, quais sejam: a motivação da comunidade, o empreendedorismo local, o associativismo (Ávila, 2021ÁVILA, Vicente Fideles. Anotações contextuais e conceituais sobre Desenvolvimento Local (DL) ou Desenvolvimento Comunitário-Local (DCL) Endógeno-Emancipatório. Campo Grande: Life Editora, 2021.).

Desta forma, aspectos ou dimensões sociais e culturais ganharam relevância pela necessidade de enraizar e de metabolizar o desenvolvimento econômico no território, a fim de proporcionar a sensibilização, ampliar sua consciência e incentivar a participação da população no processo de gestação de um desenvolvimento integral (Ávila, 2006ÁVILA, Vicente Fideles. Cultura de sub/desenvolvimento e desenvolvimento local. Sobral: UVA, 2006.).

A necessidade de elementos endógenos para potencializar o processo de desenvolvimento socioeconômico nas comunidades agregou novos elementos, aspectos e dimensões à compreensão do progresso social. Além disso, reforçou novas perspectivas, associando-se e alterando a antiga visão de que desenvolvimento econômico seria possível apenas com o crescimento econômico. Até porque, crescimento econômico cria riqueza, mas nunca, por si só, promove a sua distribuição de forma automática, muitas vezes apenas contribui para o aumento da desigualdade social. Um olhar atento sobre a capacidade de atuação da comunidade e o acompanhamento dos indicadores socioeconômicos se tornaram também dimensões para compreender a dinâmica do desenvolvimento socioeconômico na sua escala local.

Conforme ensina Oliveira (2020OLIVEIRA, Nilton Marques. Desenvolvimento local: quo vadis. Redes, Santa Cruz do Sul, v. 25, n. especial, p. 1698-714, 2020., p. 170), o conceito de local é utilizado de forma diversificada, podendo se referir desde um bairro ou distrito até um município, região ou país. Porém o “local” sempre “é tido como um campo de possibilidades e de experimentação cotidiana de respostas aos desafios levantados pela comunidade”.

Ao longo do tempo, a comunidade muda seu comportamento perante a sua percepção da melhoria ou não das condições de vida. A comunidade local, por meio das suas lideranças e organizações, percebe as transformações da mesma forma que os gestores públicos percebem o movimento dos indicadores socioeconômicos e os utiliza para balizar políticas públicas de desenvolvimento.

O estudo clássico de Myrdal (1972)MYRDAL, Gunnar. Teoria económica y regiones sousdesarrolladas. Mexico: FCE, 1972. confirma essa perspectiva e reforça o caráter cumulativo do desenvolvimento socioeconômico, qual seja: a melhoria nos indicadores socioeconômicos contribui para fortalecer o processo de melhoria dos próprios indicadores. Da mesma maneira, a piora nas condições de desenvolvimento econômico só reforça a redução desses indicadores, a menos que uma intervenção seja feita para redirecionar o processo de desenvolvimento. No caso, o monitoramento das condições de vida da população por parte das lideranças e organizações da sociedade civil é primordial.

Cabe salientar que a ação das lideranças e da sociedade civil é fortalecida pelo caráter associativista da população, que tem um caráter comportamental. A população e seu comportamento demandam cada vez mais atenção, especialmente nos pequenos municípios, pois ela está cada vez mais esclarecida quanto aos seus direitos e sobre a adequação dos produtos e serviços às suas necessidades. Enfim, ela exige mais qualidade de vida. O espaço para “pacotes prontos”, importados ou copiados de outras regiões, é cada vez menor, inclusive em relação aos projetos de desenvolvimento socioeconômico (Brose, 2000BROSE, Markus. Fortalecendo a democracia e o desenvolvimento local: 103 experiências inovadoras no meio rural gaúcho. Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2000.).

Por isso, na nova concepção de desenvolvimento econômico, ganharam importância, entre outros, alguns comportamentos socioculturais. Assim, o espaço deixa de ser contemplado simplesmente como suporte físico das atividades e dos processos econômicos. No espaço territorial, as relações entre os atores sociais, suas organizações concretas, as técnicas produtivas, o meio ambiente e a mobilização social e cultural passaram a ser mais valorizadas (Martinelli; Joyal, 2004MARTINELLI, Dante P; JOYAL, André. Desenvolvimento local e o papel das pequenas e médias empresas. Barueri: Manole, 2004.). Ou seja, o foco passou a ser a perspectiva territorial do desenvolvimento, numa abordagem “pela base”, pelo anseio e pela mobilização das comunidades.

Sobre esta nova tendência, Joyal (2019)JOYAL, André. Do desenvolvimento regional ao desenvolvimento territorial: uma comparação Québec - Brasil (1960-2010). Revista Informe GEPEC, Toledo, v. 23, n. especial, p. 191-209, 2019. observa que o insucesso das chamadas “intervenções centralizadas” são suficientes para dar munição às críticas em relação às políticas “intervencionistas de caráter regional”, propiciando o surgimento de uma abordagem diferenciada de projetos de desenvolvimento, desta feita de maneira ascendente. Assim, o desenvolvimento local, entendido por Ávila (2021ÁVILA, Vicente Fideles. Anotações contextuais e conceituais sobre Desenvolvimento Local (DL) ou Desenvolvimento Comunitário-Local (DCL) Endógeno-Emancipatório. Campo Grande: Life Editora, 2021., p. 31) como o processo de “desabrochamento de capacidades, competências e habilidades de uma comunidade definida”, transforma-se no elo motor de novas condições de vida.

O desenvolvimento local parte dos interesses comuns da comunidade. A comunidade, por meio das suas lideranças e movimentos, torna-se gerente do seu próprio desenvolvimento e das suas próprias potencialidades. Além de maximizar o aproveitamento de insumos e investimentos públicos e privados externos, a mobilização das lideranças também impulsiona a busca pelas soluções dos mais diversos problemas e põe em marcha ações para fomentar as aspirações e o futuro desejado pela comunidade. Nesta perspectiva, fortaleceu-se o conceito de desenvolvimento local.

As características do desenvolvimento local levam a entendê-lo como um processo dinamizador das capacidades, competências e habilidades da comunidade específica de um lugar para melhorar a sua qualidade de vida. O desenvolvimento local é o resultado de um compromisso, pelo qual espaço é visto como lugar de solidariedade ativa, o que implica mudanças de atitudes e comportamentos de instituições, grupos e indivíduos (Marques et al., 2001MARQUES, Heitor Romero; RICCA, Domingos; Figueiredo, Gilberto Porto; MARTÍN, José Carpio. Desenvolvimento local em Mato Grosso do Sul: reflexões e perspectivas. Campo Grande: UCDB, 2001.).

Para Joyal e Bessa (2012)JOYAL, André; BESSA, Luiz Fernando. Inteligência territorial e desenvolvimento sustentável: exemplos Marroquinos e Brasileiros. Revista Informe GEPEC, Toledo, v. 16, n. 1, p. 6-25, 2012., o novo conceito de desenvolvimento local requer mudanças institucionais que proporcionem maior governabilidade e governança. Ainda, corroboram a sua dinâmica como processo endógeno de mudança, que induz a uma maior vitalidade econômica e melhor qualidade de vida da população.

Entre os conceitos de desenvolvimento local, aquele formulado por Ávila (2006ÁVILA, Vicente Fideles. Cultura de sub/desenvolvimento e desenvolvimento local. Sobral: UVA, 2006., p. 68) parece o mais adequado para o escopo desta pesquisa, pois define que o “núcleo conceitual” do desenvolvimento local está no necessário e efetivo “desabrochamento das capacidades, competências e habilidades de uma ‘comunidade definida’ (com interesses comuns e situada em determinado território ou local com identidade social e histórica)”. Segundo o autor, esse desabrochamento propicia à comunidade tomar conta e gerenciar seus próprios potenciais.

Por suas virtudes endógenas, o desenvolvimento local tende a mais facilmente explicitar e usufruir da grande diversidade que marca o território e usá-la em seu favor. O caráter endógeno do desenvolvimento local também se fortalece com a participação política e social, que brota da organização dos seus lugares, contemplando as características e as peculiaridades locais, para que sua população comece a ser gestora de seu destino, ou seja, atores protagonistas de seu próprio desenvolvimento.

O desenvolvimento local, assim como o regional, não é um acontecimento, um fato ou um instante, mas um processo que ocorre num lugar específico. Neste processo, surgem problemas que só mais desenvolvimento e organização poderão resolver. As dificuldades, as resistências e os obstáculos ao desenvolvimento surgem durante esse processo. Eles surgem da própria estrutura social que se transforma, pela inércia das situações estabelecidas; ou pela “dinâmica regressiva” dessas mesmas situações. As dificuldades e resistências procuram reforçar seus controles sobre os fatores de impulsão, tentando eliminá-los ou pelo menos reduzindo seus efeitos (Costa Pinto, 1978COSTA PINTO, Luiz de Aguiar. A sociologia e o desenvolvimento: temas e problemas do nosso tempo. 7. ed. São Paulo: Civilização Brasileira, 1978.; Ferrera de Lima, 2020FERRERA DE LIMA, Jandir. O desenvolvimento regional como fenômeno regional. In: SOUSA, Cidoval M.; THEIS, Ivo. M.; BARBOSA, J. L. Albino (Ed.). Celso Furtado: a esperança militante - desafios. Campina Grande: EDUEPB, 2020, p. 129-39. V. 3.).

O desenvolvimento local precisa refletir um projeto de sociedade, não apenas um choque de padrões de vida. Ou seja, para que haja desenvolvimento local em todas as suas dimensões, este deve ser um pacto de sociedade, articulado e buscado pelas lideranças locais e sua comunidade. Nesse aspecto, Ávila (2021ÁVILA, Vicente Fideles. Anotações contextuais e conceituais sobre Desenvolvimento Local (DL) ou Desenvolvimento Comunitário-Local (DCL) Endógeno-Emancipatório. Campo Grande: Life Editora, 2021., p. 183) afirma que, para o sucesso de projetos de desenvolvimento, deve-se saber “como funcionam as lideranças explícitas e implícitas no âmbito da comunidade, tanto ativas, proativas e freativas ou negativas, quanto interna e externamente”.

A compreensão deste ponto é fundamental, uma vez que, principalmente quando se mencionam políticas públicas, sempre se esperam resultados automáticos e imediatos. Essa atitude é incompatível quando se compreende o desenvolvimento local como um processo contínuo (Ávila, 2021ÁVILA, Vicente Fideles. Anotações contextuais e conceituais sobre Desenvolvimento Local (DL) ou Desenvolvimento Comunitário-Local (DCL) Endógeno-Emancipatório. Campo Grande: Life Editora, 2021.).

No caso da região oeste do Paraná, por ter sua economia baseada nas atividades primárias, em especial agricultura e pecuária, ela apresenta grande quantidade de cooperativas agroindustriais, com significativa contribuição socioeconômica, em especial em relação à oferta de emprego e geração de renda a partir do agronegócio (Ilha et al., 2011ILHA, Paulo; LEISMANN, Edison; RIPPEL, Ricardo. A contribuição socioeconômica das cooperativas agroindustriais do Oeste do Paraná. Revista Informe GEPEC, Toledo, v. 15, n. 1, p. 164-79, jan./jun. 2011.).

Segundo Santos e Ferrera de Lima (2015)SANTOS, Leandro Pereira; FERRERA DE LIMA, Jandir. Desenvolvimento econômico local em Assis Chateaubriand-PR. Desenvolvimento Regional em Debate, Conoinhas, v. 5, n. 1, p. 180-200, jan./jun. 2015., nos municípios do Oeste do Paraná, predominam os empregos formais no setor primário (agricultura, silvicultura, criação de animais, extração vegetal e pesca) e no processamento de produtos primários. Os referidos autores destacam o baixo valor agregado dessas atividades, em relação a outras formas de produção mais intensivas em capital e conhecimento. Nesse caso, as propostas de desenvolvimento local demandam mudanças na composição produtiva.

Pesquisas realizadas na região do oeste do Paraná apontaram que a tomada de decisão e o comportamento dos atores locais são fundamentais e determinantes no processo de desenvolvimento local (Denuzi; Ferrera de Lima, 2013DENUZI, Vanessa Stafuza Sala; FERRERA DE LIMA, Jandir. Organização e desenvolvimento local: o papel dos atores locais nos municípios de Assis Chateaubriand e Palotina - PR. Revista Ciências Sociais em Perspectiva, Cascavel, v. 12, n. 23, p. 1-25, 2013.). Desta forma, conhecer a perspectiva das lideranças locais sobre o desenvolvimento socioeconômico é pré-requisito para futuros projetos de desenvolvimento local.

3 MATERIAIS E MÉTODOS

O objeto da pesquisa é o município de Assis Chateaubriand (Figura 1). Com uma população estimada de 33.340 habitantes, ele está localizado no oeste do Paraná, próximo à fronteira internacional do Paraguai e do estado de Mato Grosso do Sul.

Figura 1
Localização do Município de Assis Chateaubriand, 2021

No aspecto econômico, Assis Chateaubriand registrou um Produto Interno Bruto (PIB) de aproximadamente R$ 1,2 bilhão e PIB per capita de R$ 38 mil em 2018. O setor primário foi o “carro-chefe” do crescimento econômico, com uma taxa média de crescimento de 8% ao ano desde 2014, conforme dados do NDR (2021NÚCLEO DE DESENVOLVIMENTO REGIONAL [NDR]. Caderno de estatísticas municipais: Assis Chateaubriand. Toledo: NDR, 2021. Disponível em: https://www.unioeste.br/portal/nucleos-toledo/ndr. Acesso em: 21 mar. 2022.
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).

No aspecto do procedimento metodológico, a pesquisa fez uso da abordagem qualitativa, utilizando, como instrumento de coleta de dados, entrevistas com roteiro semiestruturado como formas de avaliação, por meio também da análise de discurso, em que a linguística tem como reflexo a construção social do participante, na busca de articular a história e a sociedade que o produz (Caregnato; Mutti, 2006CAREGNATO, Rita Catalina Aquino; MUTTI, Regina. Pesquisa qualitativa: análise de discurso versus análise de conteúdo. Texto & Contexto - Enfermagem, Florianópolis, v. 15, n. 4, p. 679-84, 2006.).

A pesquisa ocorreu entre os meses de novembro de 2021 e janeiro de 2022, tendo a participação de lideranças previamente escolhidas, numa amostra não probabilística, seguindo as indicações dos próprios entrevistados. Essa estratégia é conhecida como bola de neve ou snowball, na qual os entrevistados iniciais indicam outros nomes que entendem ou percebem, no caso da presente pesquisa, como liderança no município.

Das vinte e cinco entrevistas, vinte e três foram realizadas pessoalmente, proporcionando, além das respostas, a possibilidade de acompanhar a postura, as reações e as convicções e hesitações nas respostas de cada questionamento. As três entrevistas não presenciais ocorreram por meio de chamada de vídeo pela plataforma WhatsApp, tornando possível, assim, também acompanhar as mesmas atitudes e posturas diante das perguntas. Isso foi necessário por demanda dos próprios entrevistados, em função das dificuldades impostas por suas atividades profissionais ou pela pandemia da covid-19.

A pesquisa teve a participação de lideranças empresariais, lideranças políticas atuais e antigas, lideranças educacionais (diretores das instituições de ensino superior), jornalistas, um médico e um gestor de unidade local de cooperativa. Todos devidamente indicados por um entrevistado anterior, até a repetição desses. Aos todo, foram entrevistados vinte e cinco indivíduos, entre homens e mulheres.

Para ilustrar algumas respostas, foram utilizados dados do Índice FIRJAN de Desenvolvimento Municipal (IFDM). O IFDM é produzido pela Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (FIRJAN), com o intuito de monitorar anualmente o desenvolvimento socioeconômico dos municípios brasileiros. O IFDM cobre três áreas: Emprego e Renda; Educação; e Saúde. O IFDM é estimado a partir de estatísticas oficiais, disponibilizadas pelo governo brasileiro (Firjan, 2022FEDERAÇÃO DAS INDÚSTRIAS DO RIO DE JANEIRO [FIRJAN]. Índice Firjan de Desenvolvimento Municipal. Rio de Janeiro: FIRJAN, 2022. Disponível em: www.firjan.com.br/ifdm. Acesso em: 21 mar. 2022.
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).

Os dados levantados durante a pesquisa foram analisados conforme a proposta de tematização de Fontoura (2011)FONTOURA, Helena Amaral. Tematização como proposta de análise de dados na pesquisa quantitativa. In: Helena Amaral da Fontoura (Org.). Formação de professores e diversidades culturais: múltiplos olhares em pesquisa. Niterói: Intertexto, p. 61-82, 2011., na qual os resultados são apresentados e analisados por temas surgidos no decorrer da pesquisa.

4 RESULTADOS E DISCUSSÕES

Conforme informado, foram definidas algumas lideranças do município de Assis Chateaubriand. A partir das conversas com as primeiras lideranças entrevistadas, elas indicaram nomes que, para elas, tinham perfil de lideranças do município. Desta forma, participaram da pesquisa lideranças políticas (atuais e de outras épocas), lideranças empresariais, lideranças educacionais (os diretores das instituições de ensino superior do município), jornalistas, um médico e um gestor de unidade local de cooperativa. Chamou atenção não ter ocorrido indicação de nenhuma liderança religiosa, uma vez que, em cidades pequenas e médias, padres e pastores tendem a ter um papel importante como líderes das comunidades.

Outro fator de destaque foi a pouca indicação de lideranças femininas. Entre os trinta nomes indicados na pesquisa como lideranças, apenas quatro foram de mulheres, ou seja, pouco mais de dez por cento das lideranças indicadas.

4.1 Nível de desenvolvimento socioeconômico de Assis Chateaubriand

Em relação à percepção dos participantes quanto ao nível do desenvolvimento socioeconômico local do município de Assis Chateaubriand, a maioria considera o nível como bom. As opções oferecidas foram: excelente, bom, baixo e muito baixo.

Confrontando a resposta com o IFDM, o IFDM total de Assis Chateaubriand foi considerado moderado no ano-base 2016, último período de apuração. O resultado de 0,72, em 2016, é o mesmo de 2010. Ou seja, no contexto geral, o nível de desenvolvimento de Assis Chateaubriand nos quesitos emprego e renda, saúde e educação se manteve estagnado no segundo decênio do século XXI (Firjan, 2022FEDERAÇÃO DAS INDÚSTRIAS DO RIO DE JANEIRO [FIRJAN]. Índice Firjan de Desenvolvimento Municipal. Rio de Janeiro: FIRJAN, 2022. Disponível em: www.firjan.com.br/ifdm. Acesso em: 21 mar. 2022.
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).

A opinião geral é de que o nível poderia ser melhor, porém alguns fatores não permitiram um desenvolvimento mais elevado, tais como: a falta apoio político, a falta de planejamento e a forte dependência do agronegócio. A maior parte, entretanto, reconhece que o nível de desenvolvimento do município vem melhorando e tem grande perspectiva no curto prazo. No caso da forte dependência do agronegócio, a resposta validou os estudos de Colla et al. (2011)COLLA, Crislaine; RIPPEL, Ricardo; FERRERA DE LIMA, Jandir; ALVES, Lucir. Reestruturação da distribuição populacional e econômica do Oeste do Paraná, rebatimentos empregatícios e migratórios. Revista Informe GEPEC, Toledo, v. 15, n. 3, p. 203-21, 2011., Ferrera de Lima, Eberhardt e Barros (2011)FERRERA DE LIMA, Jandir; EBERHARDT, Paulo Henrique; BARROS, Augusto Augusto Luiz Heck. Os territórios econômicos no Oeste do Paraná: uma análise do seu crescimento no início do século XXI. Revista Ciências Sociais em Perspectiva, Cascavel, v. 10, n. 18, p. 10-8, 2011. e Ilha, Leismann e Rippel (2011)ILHA, Paulo; LEISMANN, Edison; RIPPEL, Ricardo. A contribuição socioeconômica das cooperativas agroindustriais do Oeste do Paraná. Revista Informe GEPEC, Toledo, v. 15, n. 1, p. 164-79, jan./jun. 2011., que apontaram como característica econômica principal da região Oeste do Paraná a sua dependência do agronegócio.

Importante perceber que dois dos fatores citados têm grande relação: falta de apoio político e ausência de planejamento. A adesão e vontade política das lideranças políticas no apoio ao planejamento é condição importante para o sucesso de projetos que visem ao desenvolvimento. Cabe destacar que os entes públicos, por sua influência no orçamento e nas políticas públicas, auxiliam na necessária sensibilização, mobilização, organização e promoção dos meios para um efetivo “autodesenvolvimento comunitário-local endogenamente emancipatório”, conforme aponta Ávila (2021ÁVILA, Vicente Fideles. Anotações contextuais e conceituais sobre Desenvolvimento Local (DL) ou Desenvolvimento Comunitário-Local (DCL) Endógeno-Emancipatório. Campo Grande: Life Editora, 2021., p. 99).

No conjunto das lideranças, notou-se grande expectativa de melhora no desenvolvimento socioeconômico em um futuro próximo, em virtude da instalação do frigorífico de suínos da Frimesa Cooperativa Central. Ao final da sua instalação e de todas as etapas de sua estrutura produtiva, o frigorífico deverá ser o maior em abate de suínos da América Latina e com grande potencial de geração de empregos formais.

A perspectiva da expansão do emprego e renda gera uma onda de otimismo nas lideranças. Essa perspectiva é reforçada ao se analisar a dimensão emprego e renda no município. Em termos de desempenho, essa é a pior dimensão do desenvolvimento socioeconômico municipal de Assis Chateaubriand, conforme dados do IFDM Emprego & Renda.

Em 2016, o desempenho do IFDM Emprego & Renda foi regular, marcando 0,52. Em 2010, o mesmo indicador foi 0,60. Considerando-se que, em 2010, o Brasil crescia a taxas de 7,5% ao ano e, em 2016, a crise econômica gerou um crescimento bem abaixo de 1%, percebe-se que o município de Assis Chateaubriand foi duramente afetado pela crise que assolou o Brasil entre 2016/2017. Cabe ressaltar que o IFDM Emprego & Renda leva em consideração dados de oferta de emprego formal, participação da população local na ocupação de vagas formais e rendimento do trabalho (Firjan, 2022FEDERAÇÃO DAS INDÚSTRIAS DO RIO DE JANEIRO [FIRJAN]. Índice Firjan de Desenvolvimento Municipal. Rio de Janeiro: FIRJAN, 2022. Disponível em: www.firjan.com.br/ifdm. Acesso em: 21 mar. 2022.
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).

Na opinião das lideranças participantes da pesquisa, novamente as questões políticas apareceram. É consenso que as brigas e desavenças entre grupos políticos foram e são muito prejudiciais. Tal situação se materializa na descontinuidade de obras e políticas públicas, que acarretam prejuízos tanto em termos financeiros, ou seja, desperdício de recursos públicos, quanto em termos de qualidade do atendimento à população.

Ao mesmo tempo, o novo frigorífico, no entender dos entrevistados, poderá representar surgimento de problemas sociais, uma vez que se espera um rápido crescimento do número de habitantes, o que poderá resultar em sobrecarga do sistema educacional e de saúde, caso não aconteça o planejamento necessário. E, no sistema educacional e de saúde, localizam-se as melhores performances do IFDM, qual seja: desenvolvimento alto para a educação (IFDM 0,86) e desenvolvimento regular para a saúde (IFDM 0,78). A performance desses dois quesitos se manteve estável entre 2010 e 2016 (Firjan, 2022FEDERAÇÃO DAS INDÚSTRIAS DO RIO DE JANEIRO [FIRJAN]. Índice Firjan de Desenvolvimento Municipal. Rio de Janeiro: FIRJAN, 2022. Disponível em: www.firjan.com.br/ifdm. Acesso em: 21 mar. 2022.
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).

4.2 Fatores/impedimentos para maior desenvolvimento do município

Os participantes apontam que falta maior participação do setor público como agente indutor do desenvolvimento e, também, identificou-se a percepção da necessidade de maior parceria entre os setores público e privados para fomentar projetos de desenvolvimento. Os líderes políticos reconhecem tal falha.

Tal percepção vem ao encontro dos ensinamentos de Oliveira (2020OLIVEIRA, Nilton Marques. Desenvolvimento local: quo vadis. Redes, Santa Cruz do Sul, v. 25, n. especial, p. 1698-714, 2020., p. 1703), ao afirmar que o desenvolvimento local deve ocorrer “por meio de ações conjuntas entre o público e o privado, aproveitando os recursos endógenos existentes de forma mais eficiente, eficaz e sustentável”.

Outro fator muito citado foi a falta de capacitação e preparação da mão de obra local. Diversos empresários relataram a dificuldade em encontrar bons profissionais. Existem vagas abertas, porém não há mão de obra disponível para ocupar tais postos. Uma situação que ilustra tal situação e pode causar espanto em leitores de outras regiões é o fato de ser comum encontrar carros de som circulando nas ruas, anunciando vagas de emprego. Essa realidade deve afetar o desempenho da dimensão Emprego & Renda do Índice FIRJAN de Desenvolvimento Municipal, quando se fizerem as estimativas mais recentes.

Outro ponto de destaque foi a percepção dos participantes de certa “acomodação” de parcela do empresariado, que não busca ampliar seus negócios, pois não ocorre o imprescindível reinvestimento na expansão de suas empresas. Segundo relatos dos entrevistados, ainda existe o predomínio de uma certa “cultura conservadora”, que privilegia a poupança e dificulta o reinvestimento e a geração de novos negócios. Nota-se claramente o foco no rentismo em vez do investimento produtivo.

A dependência econômica do agronegócio também apareceu como fator que impede um melhor desenvolvimento do município, uma vez que, por exemplo: fatores climáticos podem gerar grandes dificuldades para os produtores rurais e, em efeito vicioso, atingir toda comunidade empresarial da região. Estudos como o de Ferrera de Lima, Eberhardt e Barros (2011)FERRERA DE LIMA, Jandir; EBERHARDT, Paulo Henrique; BARROS, Augusto Augusto Luiz Heck. Os territórios econômicos no Oeste do Paraná: uma análise do seu crescimento no início do século XXI. Revista Ciências Sociais em Perspectiva, Cascavel, v. 10, n. 18, p. 10-8, 2011., Colla et al. (2011COLLA, Crislaine; RIPPEL, Ricardo; FERRERA DE LIMA, Jandir; ALVES, Lucir. Reestruturação da distribuição populacional e econômica do Oeste do Paraná, rebatimentos empregatícios e migratórios. Revista Informe GEPEC, Toledo, v. 15, n. 3, p. 203-21, 2011., p. 209) e Ilha, Leismann e Rippel (2011)ILHA, Paulo; LEISMANN, Edison; RIPPEL, Ricardo. A contribuição socioeconômica das cooperativas agroindustriais do Oeste do Paraná. Revista Informe GEPEC, Toledo, v. 15, n. 1, p. 164-79, jan./jun. 2011. corroboram tal visão: “percebe-se então que a maioria dos municípios da região Oeste ainda mantém o setor primário com localização significativa em sua estrutura produtiva”. Isso faz com que os ciclos econômicos fiquem afetados tanto pela conjuntura nacional quanto climática.

4.3 Fatores/elementos potencialmente favoráveis ao desenvolvimento

Quando questionados sobre fatores/elementos que poderiam, sendo mais bem explorados, contribuir para um melhor desenvolvimento socioeconômico do município, foi consensual citarem os investimentos em educação e a capacitação de mão de obra. Diversos participantes registraram a importância das instituições de ensino superior do município, União Educacional do Médio Oeste Paranaense (UNIMEO) e Instituto Federal do Paraná (IFPR), organizações privada e pública, respectivamente, na necessária qualificação da mão de obra local.

Novamente, tal percepção veio ao encontro a pesquisa de Oliveira (2020OLIVEIRA, Nilton Marques. Desenvolvimento local: quo vadis. Redes, Santa Cruz do Sul, v. 25, n. especial, p. 1698-714, 2020., p. 1705), que afirma que indica a importância do capital social em projetos de desenvolvimento local: “o capital social assume patente visibilidade enquanto recurso potencial de desenvolvimento, tanto mais pelo fato de que tem seu aporte na dimensão cultural e não apenas sociológica ou espacial”.

Neste tópico da pesquisa, foi citada, uma vez mais, a importância da parceria entre poder público e iniciativa privada para promoção do desenvolvimento. Por suas características e peculiaridades, o poder público municipal, em parceria com a Associação Comercial e Industrial e outras organizações da sociedade civil, é um efetivo agente de desenvolvimento. Em conjunto, o poder público e as organizações podem liderar um grande desenho de cooperação e planejamento, a fim de aproveitar as potencialidades e os fatores positivos do local para propositura de um plano de desenvolvimento efetivo do município, o que viria ao encontro de Ávila (2021ÁVILA, Vicente Fideles. Anotações contextuais e conceituais sobre Desenvolvimento Local (DL) ou Desenvolvimento Comunitário-Local (DCL) Endógeno-Emancipatório. Campo Grande: Life Editora, 2021., p. 133): “é o próprio local que conquista capacidades e competências de se tornar ao mesmo tempo sujeito e objeto do seu peculiar, adequado e integral processo de autodesenvolvimento”.

Ainda sobre a importância da união entre o poder público e o privado para sucesso do desenvolvimento local, Oliveira (2020)OLIVEIRA, Nilton Marques. Desenvolvimento local: quo vadis. Redes, Santa Cruz do Sul, v. 25, n. especial, p. 1698-714, 2020. reforça a necessidade de articulação de diversas esferas (econômica, social, cultural, política), assim com os diversos autores (públicos e privados) do local para se obter uma visão sistêmica e global, além de uma inserção dos diversos atores para o planejamento e a organização de políticas públicas voltadas ao desenvolvimento local.

Outro ponto citado como elemento que poderia contribuir para o desenvolvimento de Assis Chateaubriand foi o aprimoramento e a exploração da cultura regional ligada ao cooperativismo.

Na opinião dos participantes, o agronegócio, por ser maior gerador de emprego e renda, tem capacidade de ser forte indutor do desenvolvimento. Aqui, vale registrar que o agronegócio tem diferentes percepções. Como anotado anteriormente, alguns o consideram elemento prejudicial, especialmente a dependência econômica que ele acarreta. Isso vem ao encontro de Colla et al. (2011)COLLA, Crislaine; RIPPEL, Ricardo; FERRERA DE LIMA, Jandir; ALVES, Lucir. Reestruturação da distribuição populacional e econômica do Oeste do Paraná, rebatimentos empregatícios e migratórios. Revista Informe GEPEC, Toledo, v. 15, n. 3, p. 203-21, 2011., Ferrera de Lima, Eberhardt e Barros (2011)FERRERA DE LIMA, Jandir; EBERHARDT, Paulo Henrique; BARROS, Augusto Augusto Luiz Heck. Os territórios econômicos no Oeste do Paraná: uma análise do seu crescimento no início do século XXI. Revista Ciências Sociais em Perspectiva, Cascavel, v. 10, n. 18, p. 10-8, 2011. e Ilha, Leismann e Rippel (2011)ILHA, Paulo; LEISMANN, Edison; RIPPEL, Ricardo. A contribuição socioeconômica das cooperativas agroindustriais do Oeste do Paraná. Revista Informe GEPEC, Toledo, v. 15, n. 1, p. 164-79, jan./jun. 2011., que salientam a participação significativa do setor primário na dinâmica de grande parte dos municípios do oeste do Paraná, dentre eles, Assis Chateaubriand.

4.4 Outros pontos relevantes

Quando questionados sobre qual cidade da região possui o melhor nível de desenvolvimento socioeconômico entre as cidades do meio-oeste paranaense (Assis Chateaubriand, Palotina, Formosa do Oeste, Iracema do Oeste, Nova Aurora, Tupãssi e Jesuítas), houve grande dúvida em meio aos participantes, entre Assis Chateaubriand e Palotina. Porém a maioria optou por Assis Chateaubriand, levando-se em conta a perspectiva de melhora no futuro e a localização geográfica. Um único participante escolheu outro município: Tupãssi.

Tendo em vista que os participantes da pesquisa foram exclusivamente assis-chateaubriandenses, foi natural que a maioria escolhesse sua cidade em uma questão desse tipo. O pertencimento e o bairrismo são sentimentos naturais nos entrevistados. Assis Chateaubriand foi escolhida por dezoito participantes; Palotina, por sete; e Tupãssi, por um.

Na última pergunta da entrevista, solicitava-se que o participante indicasse nomes de lideranças do município de Assis Chateaubriand: “Quando se fala em lideranças aqui do município, quais os nomes lhe vêm à cabeça?”. Primeiro, é importante registrar certa hesitação e dificuldade recorrente na indicação de nomes.

Ao total, foram citados trinta nomes. Quinze deles apareceram apenas uma vez. Três nomes apareceram com duas indicações. Um nome foi citado três vezes. Quatro nomes aparecem com quatro indicações. Um nome apareceu cinco vezes. O terceiro nome, mais frequentemente citado, recebeu seis indicações. O segundo nome mais citado foi indicado por onze entrevistados, e o nome mais citado aparece indicado por dezesseis participantes da pesquisa.

O nome mais citado é de um assis-chateaubriandense de nascimento e tradicional liderança empresarial, ex-presidente da Associação Comercial e Empresarial. Dos três outros nomes com maior quantidade de indicações, dois são atuais lideranças políticas, que ocupam cargos de destaque, sendo o primeiro na capital do estado, o segundo no governo municipal, e o outro nome é de liderança empresarial.

Entre as lideranças indicadas, encontraram-se mais quatro políticas (três atuais e outra antiga), dois jornalistas, um médico, dois diretores de instituição de ensino, um gestor de unidade local de cooperativa e dezesseis empresários.

O grande número de empresários citados tem indicação natural, em virtude da contribuição desses para o progresso e desenvolvimento econômico do município por meio da geração de emprego e renda proporcionada por seus empreendimentos. Contudo, é importante anotar que esses foram criticados, por diversos participantes, por certa acomodação com o status quo e falta de reinvestimento em seus negócios.

Ainda sobre os empresários, é válido registrar que muitos deles reclamaram das dificuldades impostas à categoria, como falta de apoio, burocracia excessiva e grandes valores cobrados na forma de impostos, sem a proporcional prestação de serviços pelos entes públicos.

Conforme registrado anteriormente, chamou atenção o fato de nenhuma indicação de liderança religiosa ser registrada.

De forma geral, predominou nas entrevistas a percepção de elevada expectativa, grande autoestima, autoconfiança e esperança em relação ao desenvolvimento socioeconômico futuro do município de Assis Chateaubriand. O otimismo é reflexo dos investimentos da Cooperativa Frimesa, por meio da instalação de um grande frigorífico e das obras de infraestrutura que estão chegando à cidade, das perspectivas de crescimento populacional e aumento de renda, que já começaram a ser percebidos, com a ampliação e as aberturas de novos supermercados e farmácias, entre outras empresas comerciais.

A autoconfiança e autoestima são elementos fundamentais para o desenvolvimento local, uma vez que, para este acontecer, é necessário que a comunidade, conforme ensina Ávila (2021ÁVILA, Vicente Fideles. Anotações contextuais e conceituais sobre Desenvolvimento Local (DL) ou Desenvolvimento Comunitário-Local (DCL) Endógeno-Emancipatório. Campo Grande: Life Editora, 2021., p. 128): “de fato se liberte inclusive de seu pessimismo, de sua dependência de assistencialismos, de sua apatia e falta de iniciativas, etc.”.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo desta pesquisa foi investigar e analisar a percepção das lideranças do município de Assis Chateaubriand em relação ao desenvolvimento socioeconômico local.

O procedimento metodológico foi composto por revisão de literatura e aplicação de entrevistas semiestruturadas, por meio de uma amostra não probabilística.

Os resultados apontaram forte perspectiva para o fortalecimento do desenvolvimento econômico no município, em especial a grande preocupação dos líderes locais em relação ao desenvolvimento social.

Os resultados evidenciam que a história e a atual realidade do interior paranaense nos mostram que o desafio de promover o desenvolvimento é dever prioritário de múltiplos agentes e instituições, e não se restringe mais apenas à atividade estatal. O processo de desenvolvimento mostra a importância e relevância das lideranças municipais como promotor-indutores de projetos de desenvolvimento.

Por suas virtudes endógenas, o desenvolvimento local tende a explicitar e usufruir da grande diversidade que marca o Brasil e usá-la em seu favor, por meio da participação política e social que brota da organização dos seus lugares, de seus territórios. O desenvolvimento local contempla as características e peculiaridades locais, para que sua população comece a ser senhora de seu destino, ou seja, atores protagonistas de seu próprio desenvolvimento.

Assim, os resultados das entrevistas com as lideranças locais de Assis Chateaubriand apontaram a consciência em relação aos fatores que dificultam/impendem e fatores que propiciam/contribuem para a melhora do desenvolvimento do município. Também apontaram uma autoestima elevada e percepção de que os investimentos externos que chegam ao município devem contribuir para o progresso e desenvolvimento socioeconômico.

Novas pesquisas sobre o tema devem ser incentivadas, proporcionando verificação da percepção de outros indivíduos que também possam ser importantes e venham a desempenhar papel relevante em futuros projetos de desenvolvimento.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Nov 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    11 Maio 2022
  • Aceito
    20 Jun 2023
  • Aceito
    24 Jun 2023
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