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“Une autre manière d’enseigner”: as classes nouvelles francesas e seu transbordamento no Brasil nos anos 1950

Resumo

O presente artigo se propõe a compreender as classes nouvelles e sua circulação e apropriação no ensino secundário brasileiro nos anos de 1950. Idealizadas e colocadas em marcha por Gustave Monod no ensino secundário francês, a partir de 1945, as classes nouvelles estabeleceram uma cultura escolar inovadora fundamentada na Educação Nova. Essa experiência pedagógica circulou no estado de São Paulo, por obra de Luís Contier, que, após estagiar na França, passou a aplicá-la na escola onde trabalhava. O ensaio de Contier, conhecido como classes secundárias experimentais, instigou o MEC a criar uma legislação, em 1958, que permitia a introdução dessas classes nos colégios brasileiros. Este trabalho é pensado a partir de conceitos da nova história cultural e é realizado com fontes escritas em língua francesa e portuguesa.

Palavras-chave:
Classes nouvelles; Inovação pedagógica; Ensino secundário

Abstract

This article proposes an understanding of the “classes nouvelles”, their circulation and appropriation in Brazilian secondary education in the 1950s. Idealized and implemented by Gustave Monod in French secondary education, from 1945 onwards, the “classes nouvelles” established an innovative school culture based on New Education. This pedagogical experience circulated in state of São Paulo thanks to Luis Contier who, after an internship in France, implemented it at a São Paulo school where he worked. The Contier experience, known as experimental secondary classes, instigated the Brazilian Ministry of Education and Culture to create legislation, in 1958, that allowed the introduction of these classes in Brazilian schools. This work is thought from concepts of the new cultural history and is carried out with sources written in French and Portuguese.

Keywords:
Classes nouvelles; Pedagogical innovation; Secondary education.

Resumen

Este artículo se propone comprender las classes nouvelles y su circulación y apropiación en la educación secundaria brasileña en los años de 1950. Concebidas y puestas en marcha por Gustave Monod en la educación secundaria francesa, a partir de 1945, las classes nouvelles establecieron una cultura escolar innovadora basada en la Educación Nueva. Esta experiencia pedagógica circuló en el estado de São Paulo a través de Luis Contier, quien, luego de una estancia en Francia, comenzó a aplicarla en la escuela de São Paulo donde trabajaba. El ensayo de Contier, conocido como clases secundarias experimentales, instigó al MEC a crear una legislación, en 1958, que permitió la introducción de estas clases en las escuelas brasileñas. Este trabajo está pensado a partir de conceptos de la nueva historia cultural y es realizado con fuentes escritas en francés y portugués.

Palabras clave:
Classes nouvelles; Innovación pedagógica; Enseñanza secundaria.

Résumé

Cet article propose de comprendre les classes nouvelles et leur circulation et appropriation dans l'enseignement secondaire brésilien des années 1950. Conçues et mises en marche par Gustave Monod dans l’enseignement secondaire français, à partir de 1945, les classes nouvelles instaurent une culture scolaire innovante fondée sur l’Éducation nouvelle. Cette expérience pédagogique a circulé dans l’État de São Paulo grâce à Luis Contier qui, après un stage en France, a commencé à l’appliquer à l’école de São Paulo où il travaillait. L'essai de Contier, connu sous le nom de classes secondaires expérimentales, a incité le MEC à créer une législation, en 1958, qui a permis l'introduction de ces classes dans les écoles brésiliennes. Ce travail est pensé à partir de concepts de la nouvelle histoire culturelle et réalisé avec des sources écrites en français et en portugais.

Mots-clés:
Classes nouvelles; Innovation pédagogique; Enseignement secondaire.

Instituídas na França no imediato pós-Segunda Guerra Mundial, as classes nouvelles contribuíram para instigar uma onda de renovação no ensino secundário brasileiro. Essas classes foram idealizadas e instituídas sob a liderança de Gustave Monod na condição de diretor do ensino de segundo grau, função vinculada ao Ministério da Educação Nacional da França. Em realidade, as classes nouvelles foram o coroamento de um processo de renovação do ensino secundário francês que se colocou ao longo da primeira metade do século XX e do qual Monod participou de diferentes maneiras. Essa renovação educacional estava ligada ao movimento da Educação Nova que se espraiou pelo continente europeu a partir de várias matrizes pedagógicas, mas foi afetado por fatos políticos como as duas guerras mundiais e o governo do Front Populaire na França na década de 1930 - uma frente formada por partidos políticos de esquerda. A rica trajetória profissional de Monod permite compreender processos educacionais que se colocaram na França contextualizados na Europa e no mundo ocidental.

Em primeiro lugar, é preciso dizer que Gustave Monot formou-se em Filosofia e, em meados de 1912, passou no concurso de agregação, tornando-se agrégé em Filosofia. Na França, esse concurso era realizado para o ingresso em liceus e em algumas faculdades e conferia distinção profissional. No entanto, a partir de 1911 atuou como professor de Filosofia na École de Roches, um colégio-internato localizado na Normandia e de caráter privado e laico destinado a adolescentes homens, criado, em 1899, pelo sociólogo Edmond Demolins. Inspirada nas escolas inglesas de Abbotsholme e de Bedales, a École de Roches se tornou umas das principais referências nas experiências da Educação Nova, na França, na primeira metade do século XX (Araújo; Dallabrida, 2017DALLABRIDA, Norberto. As classes secundárias experimentais: uma tradição escolar (quase) esquecida. Revista Brasileira de História da Educação, v. 17, n. 3[46], p. 196 - 218, 24 jul. 2017.). Em 1914, Monod deixou de lecionar para integrar as tropas francesas na Primeira Guerra Mundial e somente abandonou as trincheiras em março de 1918 porque foi gravemente ferido. Muito marcado pela experiência da guerra, na década de 1920, Monod se engajou em associações pacifistas como Sociedade das Nações e criou uma filial dessa instituição e uma Escola da Paz, bem como filiou-se ao Comité de Vigilance de Intellectueles Antifascistes (Lecoq; Liderlé, 2009LECOQ, Tristan; LEDERLÉ, Annick. Gustave Monod: une certaine idée de l`école. Sèvres: Centre International d`études pédagogiques, 2009.). Como cidadão e educador vinculado à Educação Nova, cerrou fileiras políticas para evitar nova guerra.

Em 1919, voltou a lecionar Filosofia em liceus públicos de várias cidades francesas e passou a integrar a associação Compagnons de l`Université Nouvelle, formada por jovens universitários que conviveram nas trincheiras durante a Primeira Guerra Mundial, cujo manifesto defende o avanço da democratização da educação com medidas como a gratuidade do ensino secundário e a escolarização obrigatória até os 14 anos. A chegada ao poder nacional do Front Populaire, em maio de 1936, engendrou o estabelecimento de reformas sociais e educacionais na França. No campo educacional, essas reformas foram explicitadas no Congresso de Havre, realizado de 31 de maio a 4 de junho de 1936, e que contou com a participação marcante de Monod. As orientações desse importante encontro para o ensino secundário são as seguintes: turmas com 25 alunos, introdução de trabalho manual, integração de disciplinas, criação de escolas experimentais e renovação pedagógica no sistema nacional de ensino. Logo após o Congresso de Havre, Monod foi nomeado inspetor da Academia de Paris, função que lhe conferia poder sobre as dimensões pedagógicas e administrativas do ensino secundário francês (Lecoq; Liderlé, 2009LECOQ, Tristan; LEDERLÉ, Annick. Gustave Monod: une certaine idée de l`école. Sèvres: Centre International d`études pédagogiques, 2009.).

Em 9 de outubro de 1936, o ministro da Educação Nacional do Front Populaire, Jan Zay, oficializa a escolarização obrigatória até os 14 anos, adotando reivindicação dos Compagnons de l`Université Nouvelle. No ano seguinte, nomeia Monod diretor adjunto do ensino secundário e, nesta condição, coordenou a implantação das classes d`orientation, uma experiência inovadora no ensino secundário, realizada no ano letivo de 1937-8, sendo marcada pela implementação da orientação educacional, que não tinha um viés de direcionamento profissional, mas de sondagem de aptidões dos estudantes, pela redução de 25 alunos por turma, pelo uso de métodos ativos, pela introdução do conselho de classe com o propósito de efetivar o trabalho coletivo docente e por um contato mais estreito entre escola e família dos discentes. A Segunda Guerra Mundial abortou o ensaio nascente das classes d`orientation e afastou Monod de sua função administrativa na direção do ensino secundário porque ele se colocou contrário às leis anti-semitas de 1940 do governo de Vichy. Desta forma, Monod voltou a atuar como professor de Filosofia em liceus da região de Paris (Lecoq; Liderlé, 2009LECOQ, Tristan; LEDERLÉ, Annick. Gustave Monod: une certaine idée de l`école. Sèvres: Centre International d`études pédagogiques, 2009.).

Durante a guerra, Monod se engajou como membro ativo em várias associações da resistência francesa e, em particular, integrou a Comissão da reforma do ensino, criada em 8 de novembro de 1944, presidida pelo físico Paul Langevin e, com sua morte em dezembro de 1946, por Henri Wallon. Em 1º de janeiro de 1945, o ministro da Educação do governo provisório da França, René Capitant, nomeou Monod diretor do ensino secundário, que criou uma equipe pedagógica de apoio, formada por Alfred Weiler, Roger Gal, Georges Petit e Claire Roby (Cros, 1981CROS, Louis. Un pionnier en éducation: Gustave Monod - les classes nouvelles de la Libération. Paris: Éditions Casterman, 1981.). Nesse mesmo ano, fundou o Centre Internation d`études pédagogique (CIEP), em Sèvres, e instituiu as classes nouvelles no ensino secundário, iniciativas umbilicalmente conectadas. As classes nouvelles foram implantadas no ano escolar 1945-6 no primeiro ano do primeiro ciclo do ensino secundário (sixième)5 5 Na França, o ensino secundário era e ainda é formado por dois ciclos: o collège, formado por quatro classes/anos letivos (sixième, cinquième, quatrième e troisième) e o lycée, constituído por três classes/anos letivos (seconde, première e terminal) (Araújo; Dallabrida, 2017). e, progressivamente, nos outros anos desse ciclo e nos anos do segundo ciclo (Cros, 1981CROS, Louis. Un pionnier en éducation: Gustave Monod - les classes nouvelles de la Libération. Paris: Éditions Casterman, 1981.). Elas se constituíram na continuidade e ampliação das classes d`orientation, cujos princípios foram anunciados pelos Compagnons d`Université nouvelle.

Nesta direção, o presente trabalho se propõe a compreender o movimento das classes nouvelles francesas e sua circulação e uso no ensino secundário brasileiro na década de 1950. Esse movimento partiu dos princípios de organização curricular prescritos pelo Ministério da Educação Nacional, mas foi colocado em prática nos liceus e avaliados e reinventados nos estágios dos professores no CIEP. Para tanto, considera-se que os modelos pedagógicos são construídos em lugares e momentos históricos singulares, são colocados em circulação por diferentes suportes e atores sociais e são usados em instituições educativas (Carvalho, 2003CARVALHO, Marta Maria Chagas de. A Escola e a República e outros ensaios. Bragança Paulista, EDUSF, 2003.). A produção de um modelo pedagógico se apoia em outras ideias pedagógicas e experiências educacionais e define prescrições curriculares e a sua circulação envolve difusão de textos, criação de ocasiões e mobilidade de pessoas. Esta investigação histórica é fundamentada em fontes escritas em francês e em português coligidas em acervos na França e no estado de São Paulo como a legislação sobre as classes nouvelles e registros de educadores brasileiros, particularmente aqueles de Luís

Contier. Enfim, o texto é dividido em duas seções: em primeiro lugar é apresentado o movimento das classes nouvelles; posteriormente, procura-se estudar a sua circulação e apropriação no ensino secundário brasileiro.

O MOVIMENTO DAS CLASSES NOUVELLES

A proposta pedagógica das classes nouvelles teve uma prescrição dos princípios de organização da cultura escolar do primeiro ciclo do ensino secundário feita pela Direção do Ensino Secundário do Ministério da Educação Nacional que, à luz da prática nos colégios, foi sendo reinventada. Inicialmente deve-se mencionar a constituição turmas com até 25 alunos, destoando das classes massificadas do ensino secundário “tradicional”. Essa redução de alunos por turma tinha o propósito de tornar o ensino mais ativo e sobretudo mais individualizado, bem como viabilizar a observação psicopedagógica na vida escolar, visando a implementação da orientação educacional no ensino secundário (Savoye, 2010SAVOYE, Antoine. Capitre 3 - Réforme pédagogique, reforme disciplinaire: l`expérience des classes nouvelles das l`enseignement du second degré (1945-1952). In: KAHAN, Pierre; ENFERT, Renaud d`(orgs.). En attendant la reforme. Grenoble: PUG, 2010. p.49-64.). Para as séries do primeiro ciclo do ensino secundário também houve a determinação da redução do número de docentes, de forma que um professor assumisse disciplinas afins como Ciências Naturais e Matemática ou alguém da área de História/Geografia, ministrasse também disciplinas na área de letras. Essa estratégia do docente polivalente visava uma maior aproximação entre os corpos docente e discente, que viabilizasse uma observação mais eficaz dos estudantes, bem como a articulação das diferentes disciplinas (Principes..., 1950PRINCIPES D`ORGANIZATION. In: MINISTÈRE DE L`ÉDUCATION NATIONALE. Les classes nouvelles. Paris: Imprimerie Nationale, 1950. p.5-7.). Desta forma, a transição do ensino primário, marcado pela unidocência, para o ensino secundário ministrado por vários professores tornava-se menos brusca e mais eficaz.

Na proposta das classes nouvelles inicialmente foi estabelecida uma divisão do tempo entre os turnos matutino, dedicado às disciplinas do currículo oficial, e vespertino, voltado a atividades físicas, manuais e artísticas (Gabinet du Director, 1945GABINET DU DIRECTEUR [DU SECOND DEGRÉ]. Circulaire du 20 août 1945. Paris: Ministère Nationale de L`Éducation, 1945. ). No horário em tempo integral da primeira série do primeiro ciclo de ensino secundário para o ano escolar de 1945-46 indicava que pela manhã seriam ensinadas as disciplinas Francês, Instrução Cívica e Moral, História/Geografia, Língua Viva, Matemática e Ciências de Observação; no período vespertino deveriam ser colocadas em prática as atividades Educação Física, Desenho, Estudo do Meio, Educação Musical e opção uma entre atividades artísticas, atividades manuais e Latim (Savoye, 2010SAVOYE, Antoine. Capitre 3 - Réforme pédagogique, reforme disciplinaire: l`expérience des classes nouvelles das l`enseignement du second degré (1945-1952). In: KAHAN, Pierre; ENFERT, Renaud d`(orgs.). En attendant la reforme. Grenoble: PUG, 2010. p.49-64.). No entanto, essas disciplinas e atividades escolares deveriam ser coordenadas pelo conselho de classe, formado por todos os professores de cada turma, tendo um chefe que tinha responsabilidades pedagógicas e administrativas. Nas duas primeiras séries do primeiro ciclo do ensino secundário, o conselho de classe tinha reunião semanal, mas, nas outras duas séries, quando a nova cultura escolar já estava incorporada, os encontros dos docentes passaram a ser quinzenais (1er Bureau, 19481er BUREAU [DU SECOND DEGRÉ]. Circulaire du 8 juillet 1948. Paris: Ministère Nationale de L`Éducation , 1945. p. 69-76.).

Como parte do movimento da Educação Nova, as classes nouvelles tiveram indicações oficiais para usar métodos ativos como o trabalho com os centros de interesses, o estudo do meio e o trabalho dirigido. Inicialmente Gustave Monot se apropriou do método dos centros de interesse desenvolvido pelo educador belga Ovide Decroly que estimulava os estudantes a explorar os seus interesses para os seus estudos escolares, contribuindo para a individualização do ensino. Nesta direção, o trabalho dirigido em pequenos grupos também dava um importante passo na materialização do ativismo discente, dando autonomia aos estudantes na sua ação educativa escolar (Gabinet du Director, 1945GABINET DU DIRECTEUR [DU SECOND DEGRÉ]. Circulaire du 20 août 1945. Paris: Ministère Nationale de L`Éducation, 1945. ). No entanto, o estudo do meio natural e humano foi a estratégia curricular que procurava integrar todas as disciplinas e a que melhor representou as classes nouvelles. O estudo do meio natural proporcionava um contato direto com a flora e a fauna, desenvolvendo nos estudantes sobremaneira conhecimentos nas chamadas Ciências de Observação. O estudo do meio humano procura inserir os estudantes em diferentes instituições humanas, aproximando-os da sua realidade sócio-econômico-cultural. Esse contato com a natureza e a sociedade próximas, mas não fechadas sobre elas mesmas, mas em conexão com a França, a Europa e o mundo, estava afinado com o propósito de criar nos estudantes consciência da solidariedade social (Savoye, 2010SAVOYE, Antoine. Capitre 3 - Réforme pédagogique, reforme disciplinaire: l`expérience des classes nouvelles das l`enseignement du second degré (1945-1952). In: KAHAN, Pierre; ENFERT, Renaud d`(orgs.). En attendant la reforme. Grenoble: PUG, 2010. p.49-64.). Para Goblot (1950GLOBOT, François. 6 - Um mouvement pédagogique. In: CROS, Louis (org.). Un pionnier en éducation: Gustave Monod - les classes nouvelles de la Libération. Paris: Éditions Casterman , 1981. p. 137-141.) o trabalho dirigido encorpou-se, efetivamente, na implantação da quatrième e da troisième, contribuindo para a individualização do ensino.

O projeto das classes nouvelles também previa uma aproximação mais estreita entre escola e família, viabilizada por meio de reunião regulares entre diretores e professores com os pais e mães dos estudantes. À luz de relatórios Direção do Ensino sobre uma pesquisa feita sobre as classes nouvelles durante primeiro ciclo do ensino secundário (1945-9), a Direção do Ensino Secundário afirma que “o primeiro objetivo das classes nouvelles era ajudar as famílias na tarefa de orientação educacional, isto é, na escolha do ramo de estudos capazes de provocar o desenvolvimento máximo de cada crianças” 6 6 “Le premier but des classes nouvelles était d'aider les familles dans la tâche de l`orientation scolaire, c`est-à-dire dans le choix de la branche d'études capables de provoquer le développement maximum de chaque enfant”. [tradução nossa] (Notes..., 1949NOTES sur les rapports fournis em réponse à l`enquete sur l`état des classes nouvelles à date du 15 juin 1949. In: MINISTÈRE DE L`ÉDUCATION NATIONALE. Les classes nouvelles. Paris: Imprimerie Nationale, 1950. p. 96-108., p. 97). Essa nota indica claramente que o estreitamento de relações entre escola e famílias dos seus estudantes era parte integrante do foco das classes nouvelles com a orientação educacional de seus estudantes, incluindo atendimentos pessoais. Todavia, essa relação entre educadores e familiares também era azeitada por meio de encontros para exposições de trabalhos dos estudantes, bem como através de pequenas festas ao longo do ano, particularmente no Natal e no final do ano letivo (Notes..., 1949NOTES sur les rapports fournis em réponse à l`enquete sur l`état des classes nouvelles à date du 15 juin 1949. In: MINISTÈRE DE L`ÉDUCATION NATIONALE. Les classes nouvelles. Paris: Imprimerie Nationale, 1950. p. 96-108.). Neste processo, deve-se levar em conta o caráter voluntário dos pais dos estudantes e dos professores em relação ao projeto das classes nouvelles, ambos motivados pela inovação escolar.

Na cultura escolar das classes nouvelles a prescrição da orientação educacional, viabilizada pela observação contínua dos estudantes, se estabelecia como pano de fundo das inovações pedagógicas. Ou seja, a redução do número de estudantes e do número de professores nas turmas, a instituição do conselho de classe, a possibilidade de opções de disciplinas e a utilização de métodos ativos e individualizantes, bem como a aproximação entre escola e família, concorriam para uma melhor observação psicopedagógica dos estudantes (Savoye, 2010SAVOYE, Antoine. Capitre 3 - Réforme pédagogique, reforme disciplinaire: l`expérience des classes nouvelles das l`enseignement du second degré (1945-1952). In: KAHAN, Pierre; ENFERT, Renaud d`(orgs.). En attendant la reforme. Grenoble: PUG, 2010. p.49-64.). Em 1950, o idealizador das classes nouvelles constata que:

A orientação educacional está na ordem do dia. Não há projeto de reforma do ensino que não lhe dê espaço. Quando a Comissão Langevin [-Wallon] procurou estabelecer a estrutura do ensino de segundo grau, ela se debateu com o problema da orientação educacional e, em boa medida, para resolvê-lo, ela solicitou a organização das classes nouvelles (Monod, 1981MONOD, Gustave. Sur l`orientation. In: CROS, L. (org.). Un pionnier en éducation: Gustave Monod - les classes nouvelles de la Libération. Paris: Éditions Casterman , 1981. p. 58-61., p. 58, tradução nossa)7 7 “L'orientation scolaire est à l'ordre du jour. Il n`est pas de projet de réforme de l`enseignement qui ne lui fasse sa place. Lorsque la Commission Langevin a cherché à établir la structure de l`Enseignement du Second degré, elle s'est heurtée au problème de l`orientation et c`est en grande partie pour le résoudre qu`elle a demandé l'organisation des classes nouvelles”. .

A questão da orientação educacional na França vinha se colocando desde o período entreguerras devido ao crescimento do ensino secundário, que deixava de ser direcionado para as elites, passando a acolher cada vez mais frações das classes médias. Gustave Monod confessa que desenvolveu a sensibilidade social durante a Primeira Guerra Mundial, quando atuou como soldado de segunda classe e conviveu com militares humildes e com pouca escolaridade e imaginou que, na perspectiva de uma educação republicana e laica, todos poderiam se desenvolver de acordo com os seus interesses e necessidades (Lecoq; Liderlé, 2009LECOQ, Tristan; LEDERLÉ, Annick. Gustave Monod: une certaine idée de l`école. Sèvres: Centre International d`études pédagogiques, 2009.). Segundo Cros (1981CROS, Louis. Un pionnier en éducation: Gustave Monod - les classes nouvelles de la Libération. Paris: Éditions Casterman, 1981., p.3), como professor do ensino secundário público, Monod foi “o primeiro a pressentir a ‘explosão escolar’”, que se colocaria, de modo mais explícito, no sistema de ensino francês, a partir da segunda metade da década de 1950. Desta forma, no governo do Front Populaire, Monod liderou a implantação classe d`orientação que, apesar de ter curtíssima duração, representou um ensaio no sentido de entranhar a orientação educacional na cultura escolar na classe de sixième.

Nas classes nouvelles, a orientação educacional atravessa toda a sua proposta pedagógica para o primeiro ciclo do ensino secundário, que tinha dois momentos bem marcados. Por um lado, as duas primeiras séries - sixième e cinquième - formavam o ciclo de observação em que os estudantes eram seguidos com atenção pedagógica nas suas participações em disciplinas obrigatórias e nas atividades opcionais pela equipe educativa formada pelos docentes e por um psicólogo escolar. A partir de relatórios sobre uma pesquisa feita sobre as classes nouvelles durante primeiro ciclo do ensino secundário (1945-9), a Direção de Ensino Secundário anota que “a observação psicológica dos alunos, seja sob a forma intuitiva feita pelos professores, seja na forma científica de testes [psicológicos] pela ação de psicólogos escolares ou de orientadores profissionais, revelou-se muito útil nesse processo” [tradução nossa] (NOTES..., 1949NOTES sur les rapports fournis em réponse à l`enquete sur l`état des classes nouvelles à date du 15 juin 1949. In: MINISTÈRE DE L`ÉDUCATION NATIONALE. Les classes nouvelles. Paris: Imprimerie Nationale, 1950. p. 96-108., p. 98). A operação de observação de cada estudante era viabilizada pela redução do número de alunos e de professores por turma, a existência de dois turnos diários e o uso de métodos personalizados e em equipes, bem como o estreitamento de relações entre professores e pais e mães dos estudantes. Por outro lado, “após este ciclo, nos anos 4ème e 3ème, a partir das opções indicadas pelo banco de testes [psicológicos] e observação do educando, realizava-se a oferta de currículo especializado, permitindo ao aluno diversas opções: científica, técnica industrial, econômica, línguas, música, artes” (Vieira, 2020VIEIRA, Letícia. Classes experimentais secundárias de instituições públicas do ensino do estado de São Paulo: um estudo sobre formas de circulação e apropriação de práticas pedagógicas (1951-1962). 2020. 305 f. Tese (Doutorado em Educação). Faculdade de Educação - Universidade de São Paulo, 2020., p. 62). A orientação educacional praticada nas classes nouvelles, portanto, tinha como propósito fazer a sondagem dos interesses e aptidões de cada estudante.

A partir dessas prescrições pedagógicas, as classes nouvelles foram gradativamente implantadas no primeiro ciclo do ensino secundário francês, de forma que no ano letivo de 1945-6 funcionaram 200 turmas de sixième em 150 colégios localizados em 40 cidades; no ano seguinte foram colocadas em marcha turmas de cinquième e assim por diante... Tratava-se de um ensaio restrito no conjunto do ensino secundário francês, que, na segunda metade dos anos 1950, foi muito dinâmico devido aos usos criativos que os professores faziam da prescrição oficial das classes nouvelles. Esses ensaios singulares foram socializados no periódico Classes Nouvelles, criado pela Associação Nationale des Éducateurs des Classes Nouvelles de L`enseignement du Seconde Degré (ANECNES), que circulou de 15 de julho de 1947 a 10 de julho de 1948 (Vieira, 2020VIEIRA, Letícia. Classes experimentais secundárias de instituições públicas do ensino do estado de São Paulo: um estudo sobre formas de circulação e apropriação de práticas pedagógicas (1951-1962). 2020. 305 f. Tese (Doutorado em Educação). Faculdade de Educação - Universidade de São Paulo, 2020.). Assim, devido à sua abertura pedagógica e constante revisão, esse ensaio inovador no ensino secundário francês foi chamado de “movimento das classes nouvelles” (CENTRE INTERNATIONALE D`ÉTUDES PÉDAGOGIQUES, 1996CENTRE INTERNATIONALE D`ÉTUDES PÉDAGOGIQUES. Le Livre du Cinquantenaire. Nancy: Association des Amis de Sévres, 1996., p.87).

No entanto, as classes nouvelles foram extintas em 1952 pela direção do Ensino Secundário do Ministério da Educação Nacional devido ao grande crescimento de estudantes na rede pública francesa devido ao baby boom do pós-guerra, de forma que havia uma projeção de que o número de alunos do ensino secundário, em 1956, seria de aproximadamente o dobro. Desta forma, para equilibrar o orçamento do ensino secundário, as classes nouvelles foram suprimidas, mas a renovação pedagógica neste nível de escolarização seria continuada pelas chamadas classes-pilotes, que foram implantadas na rentrée de 1952. Em relação às classes nouvelles, as classes-pilotes eram em número menor, sendo estabelecidas junto a cada Centro Pedagógico Regional, bem como na escola experimental do CIEP (Gabinet du Director, 1952).

Ademais, apesar de os professores das classes nouvelles serem voluntários, o que indicava abertura à inovação pedagógica, Monod teve uma preocupação com a formação docente deles. Por isso, juntamente com a instituição das classes nouvelles, criou, em 30 de junho de 1945, o Centre internacionale d`études pédagogiques (CIEP), que passou a ser dirigido pela professora Edmée Hatinguais, com o objetivo de promover estágios de formação de docente para as classes nouvelles (CENTRE INTERNATIONALE D`ÉTUDES PÉDAGOGIQUES, 1996CENTRE INTERNATIONALE D`ÉTUDES PÉDAGOGIQUES. Le Livre du Cinquantenaire. Nancy: Association des Amis de Sévres, 1996.). O primeiro estágio realizou-se antes do início do ano letivo de 1945-6, mas posteriormente os chefes das equipes de professores das classes nouvelles foram reunidos regularmente ora para planejar suas atividades escolares ora para avaliá-las. No entanto, como está inscrito no seu nome, o CIEP tinha uma dimensão internacional porque se propunha a ser um espaço de trocas de experiências entre educadores franceses e estrangeiros e acolheu reuniões da UNESCO, criada também em 1945 e com sede em Paris. Assim, vários professores e diretores de colégios públicos de ensino secundário brasileiros que realizaram estágios no CIEP sobre as classes nouvelles.

No tradicional ensino secundário francês, as classes nouvelles se converteram, como afirmou argutamente Cros (1981CROS, Louis. Un pionnier en éducation: Gustave Monod - les classes nouvelles de la Libération. Paris: Éditions Casterman, 1981.) em “une outre manière d`enseigner” - uma outra maneira de ensinar - atravessada pela redução de alunos e de professores nas turmas, pela escolarização em tempo integral pelo uso de métodos ativos, pelo trabalho docente coletivo e, enfim, pela prática da orientação educacional.

CIRCULAÇÃO E APROPRIAÇÃO DAS CLASSES NOUVELLES NO ESTADO DE SÃO PAULO

O CIEP cumpriu um papel fundamental em relação à circulação da matriz das classes nouvelles pois, pelas vias dos estágios de educadores promovidos neste centro, consolidaram-se e circularam fortemente os pressupostos dessa matriz. Possuindo configuração de um órgão formador e constituindo-se como sede para o debate da experiência das classes nouvelles, o CIEP passou a ser referenciado por realizar ações de promoção de estágios departamentais de professores do ensino francês, na França ou no exterior, bem como jornadas de informação sobre os problemas do ensino e educação que se realizavam então. Sob a égide da UNESCO ou do Conseil de l’Europe, foram realizados pelo CIEP grandes estágios internacionais, buscando uma maior compreensão do contexto educativo internacional (CENTRE INTERNATIONAL D’ÉTUDES PEDAGOGIQUES, 1950CENTRE INTERNATIONALE D`ÉTUDES PÉDAGOGIQUES. [Encarte informativo do Centre international d'études pedagogiques]. Sèvres - France, [1950].). Pelas ações desse centro, o modelo desenvolvido e operacionalizado nas classes nouvelles foi colocado em ampla circulação, tendo sido fortemente apropriado a exemplo de entrada no Brasil.

Os estágios de educadores franceses contavam com a organização dos inspetores gerais do ensino e de assessores técnicos pedagógicos e foram um grande sucesso, de maneira que os professores das primeiras classes nouvelles passaram a retornar a Sèvres para realizar balanços das experiências nos anos que se sucederam - 5ème, 4ème e, depois, 3ème. Creditando a realização da reforma aos educadores, as reuniões no centro permitiam aos educadores já integrados à proposta o contato com os recém-chegados, possibilitando-lhes a discussão dos resultados alcançados e o proveio das lições desejadas: “Sem esse contato direto, muitos entusiasmos se extinguiriam, muitas das experiências frutíferas não se teriam transmitido” (CENTRE INTERNATIONAL D’ÉTUDES PÉDAGOGIQUES, 1950CENTRE INTERNATIONALE D`ÉTUDES PÉDAGOGIQUES. [Encarte informativo do Centre international d'études pedagogiques]. Sèvres - France, [1950]., p. 2, tradução nossa)8 8 “Sans ce contact direct, bien des enthousiasmes se seraient éteints, bien des expériences fructueuses n’auraient pu se transmettre”. .

O CIEP proporcionava aos profissionais um espaço profícuo de discussões e avaliações dos trabalhos realizados para que, em debate e numa atmosfera favorável de liberdade e criatividade pedagógica, pudessem avançar na experiência com vistas ao seu progresso constante. Dessa forma, segundo Contier (1981CONTIER, Luis. Luiz Contier: Introdutor das Classes Experimentais no Brasil. Entrevista 04 de fevereiro de 1981. Mimeo. , p. 1), “à medida em que obtinham resultados, os ensaios iam se ajustando, se enquadrando e se incorporando ao sistema de educação geral”. Como resultado do sucesso dos estágios, o CIEP se consolida como espaço destinado a receber educadores franceses e estrangeiros e informar os problemas de qualidade do ensino e, mesmo após concluída a experiência dessas classes no território francês, continuou figurando como espaço de circulação de seus pressupostos pedagógicos.

No CIEP funcionava também uma escola piloto onde se realizavam experiências educacionais cujas aulas eram abertas aos visitantes. Além disso, ofereciam-se os serviços de diretoria de estudos, pesquisas educacionais e secretaria pedagógica com serviços de estágios para franceses e estrangeiros, serviços de relações com países estrangeiros, serviços de pesquisas educacionais, serviços de documentação e biblioteca e se abrigava o Centre de Recherches pour l’Enseignement de la Civilisation (Crec), onde professores franceses faziam treinamentos corporativos e cursos sob os auspícios da United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization (UNESCO) e do Conseil de l’Europe (CENTRE INTERNATIONAL D’ETUDES PÉDAGOGIQUES, 1950CENTRE INTERNATIONALE D`ÉTUDES PÉDAGOGIQUES. [Encarte informativo do Centre international d'études pedagogiques]. Sèvres - France, [1950].; Araújo; Dallabrida, 2017DALLABRIDA, Norberto. As classes secundárias experimentais: uma tradição escolar (quase) esquecida. Revista Brasileira de História da Educação, v. 17, n. 3[46], p. 196 - 218, 24 jul. 2017.).

A forte circulação de ideias operacionalizada via CIEP é evidente. Observou-se, nas fontes analisadas, a presença de diversos teóricos, dos mais diferentes países, sendo muitos deles considerados integrantes do movimento escolanovista como Helen Parkhust com o Plano Dalton, Montessori, Decroly e Piaget, e, ainda outros, como Kees Boeke, com seu método sociocrático, e Tagore, da Escola Nova Shantiniketan. Interessante observar que esses intelectuais e as teorias por eles cunhadas são referenciados não na forma de teorias estanques, distantes, abstratas e de difícil compreensão, mas a partir de uma experiência de educadores que as mobilizavam. Vale ressaltar, aqui, que era objetivo do CIEP mobilizar conhecimentos de forma a ampliar os horizontes e romper o isolamento das teorias e experiências escolares. Buscava-se um formato que ultrapassasse a “formação codificada” com vistas a viabilizar as contribuições pessoais destes educadores para que os encontros se constituíssem em oportunidades de contato e enriquecimento (CENTRE INTERNATIONAL D’ETUDES PÉDAGOGIQUES, 1950CENTRE INTERNATIONALE D`ÉTUDES PÉDAGOGIQUES. [Encarte informativo do Centre international d'études pedagogiques]. Sèvres - France, [1950].).

Nos estágios nacionais e regionais também eram pensados e planejados os ajustes necessários às classes nouvelles, viabilizando seu acompanhamento e avaliação, bem como a realização de pesquisas sobre as práticas docentes impulsionadas e realizadas através das ações do CIEP. Essa organização acabava por estabelecer uma forma de supervisão e administração colaborativa da reforma uma vez que completava tais processos pelas vias de uma auto-organização dos conhecimentos e práticas. Interessa frisar que se oportunizou a um grande número de educadores a vivência de longos estágios de aproximação com este ensaio francês de renovação, de maneira que esta circulação se tornou uma das principais portas de entrada da matriz em território brasileiro.

A importância atribuída à troca de experiências impulsionou a criação de periódicos, como o “Dossiers pédagogiques pour l’enseignement du second degré”, com publicação do primeiro número em dezembro de 1945, e “Les Cahiers pour l’enseignement du second degré”, em 1949. Pelo conjunto da experiência, pelo entusiasmo que despertou, pela reflexão pedagógica acerca do ensino secundário francês que gerou e pela transformação coletiva que suscitou, a experiência é chamada de “mouvement des classes nouvelles” (Savoye, 2010SAVOYE, Antoine. Capitre 3 - Réforme pédagogique, reforme disciplinaire: l`expérience des classes nouvelles das l`enseignement du second degré (1945-1952). In: KAHAN, Pierre; ENFERT, Renaud d`(orgs.). En attendant la reforme. Grenoble: PUG, 2010. p.49-64.). A publicação e circulação desses periódicos, assim como de outros criados ao longo da história para circulação do movimento promovia a difusão das ideias pedagógicas neles apregoadas, permitia aproximações e as fortalecia. Contier dispunha, em seu acervo pessoal, de diversos exemplares de periódicos de circulação mundial, sobretudo franceses, que tratavam do movimento da Escola Nova e da metodologia ativa, bem como da divulgação das classes nouvelles. Neste sentido, sua criação é compreendida como estratégia de difusão de um movimento, não só das classes nouvelles, mas também, e sobretudo, do escolanovismo e dos pressupostos por eles preconizados, ou seja, como estratégia de propaganda dessa causa e de arregimentação de adeptos dessa causa (CARVALHO, 2007CARVALHO, Marta Maria Chagas de. A bordo do navio, lendo notícias do Brasil: o relato de viagem de Adolphe Ferrèire. In: MIGNOT, A. C. V.; GONDRA, J. G. (Orgs.). Viagens Pedagógicas. São Paulo: Cortez, 2007. p. 277-293.). No mesmo sentido, a realização de estágios de educadores se tornou também ferramenta central para circulação e divulgação da matriz das classes nouvelles, constituindo o que Carvalho (2007CARVALHO, Marta Maria Chagas de. A bordo do navio, lendo notícias do Brasil: o relato de viagem de Adolphe Ferrèire. In: MIGNOT, A. C. V.; GONDRA, J. G. (Orgs.). Viagens Pedagógicas. São Paulo: Cortez, 2007. p. 277-293.) denomina de instrumento de articulação interna do movimento. Logo, a partir dessas estratégias de divulgação e circulação, alcançou-se a apropriação da experiência pedagógica fora de seu país de origem, sendo o Brasil um dos países inseridos fortemente nesse processo.

Inserido na rota de circulação da matriz pedagógica das classes nouvelles, o Brasil fez parte do intercâmbio com o centro de pesquisa francês, enviando educadores que, ao retornarem ao solo brasileiro, disseminaram aqui os pressupostos da experiência francesa. No caso específico de São Paulo, cidade que teve multiplicação expressiva dos ensaios do que se convencionou chamar “classes experimentais”, um educador em específico é peça chave para compreensão dos primeiros movimentos de apropriação da matriz das classes nouvelles: Luis Contier, que atuava como diretor no Instituto de Educação “Professor Alberto Conte”, escola pública localizada no bairro de Santo Amaro (São Paulo - Brasil), e, imerso neste debate de dimensões transnacionais, buscava respostas para seus anseios de renovação. Contier compôs o primeiro grupo de brasileiros a realizar estágio no Ciep (Contier, 1981CONTIER, Luis. Luiz Contier: Introdutor das Classes Experimentais no Brasil. Entrevista 04 de fevereiro de 1981. Mimeo. ), permanecendo no referido centro por aproximadamente dois anos, do início de 1950 até metade de 1951. Nesse período, conheceu a proposta de renovação do ensino secundário francês, a qual, segundo ele, respondia à busca dos governos por adaptar as práticas educacionais à realidade pós-guerra (Designações para o ensino vocacional, 1965Designações para o ensino vocacional. Folha de São Paulo. São Paulo, 19 mar. 1965. [não paginado] Acervo Luis Contier: Centro de Memória da Educação da Universidade de São Paulo.).

As apropriações táticas constituem uma forma de manipular determinado objeto cultural a partir das falhas de vigilância do poder na conjuntura (Certeau, 2012CERTEAU, Michel. A Invenção do Cotidiano: 1. Artes de fazer. Tradução: Ephraim Ferreira Alves. Petrópolis, RJ: Vozes, 2012.). A tática ocorre, portanto, no terreno do “outro”, nas brechas das prescrições vigentes, tornando possível práticas que subvertem essas prescrições. Nesse sentido, compreendendo-se tolhido tanto pela legislação vigente, considerada aqui dispositivo de estratégia quanto pelas limitações impostas pela escassez de recursos, mas motivado pela experiência, Contier dá início, taticamente, a partir de medida ousada e contrária à legislação vigente à aplicação de métodos ativos no Instituto de Educação Professor Alberto Conte, dando, nessa escola, os primeiros passos no sentido de aplicar no ensino (Vieira, 2023VIEIRA, Letícia. Surgimento das classes secundárias experimentais em instituições públicas de ensino do estado de São Paulo (1951-1962). In: DALLABRIDA, N. (org.). “Brechas no monólito educacional”: classes secundárias experimentais e inovação do ensino secundário nos anos 1950 e 1960. Curitiba: Appris , 2023. p. 21-51.).

Nesse instituto de educação, dentro dos limites da legislação, apropriou a estrutura das classes nouvelles de acordo com condições brasileiras, solicitando tempo integral para alunos e professores, promovendo renovação curricular a partir do desdobramento do currículo em um arranjo composto, em parte, por disciplinas comuns a todos, e, em parte, por disciplinas facultativas, o que, em sua opinião, era inédito no campo educacional brasileiro. Com essa iniciativa, procurava avançar na solução de questões apontadas como deficiências do ensino secundário, visando à reformulação de sistemas que injetava nos jovens a ojeriza pelo estudo (Contier, 1981CONTIER, Luis. Luiz Contier: Introdutor das Classes Experimentais no Brasil. Entrevista 04 de fevereiro de 1981. Mimeo. ).

Propunha-se, no Instituto Estadual Alberto Conte, via pressupostos das classes nouvelles, uma experiência de ensino que possibilitasse aos alunos a compreensão efetiva dos conteúdos a partir de um “método racional da percepção”, que substituiria os princípios mnemônicos até então aplicados. Para cumprimento desse objetivo, organizaram-se novos princípios pedagógicos e de orientação, os quais indicavam o uso prioritário de métodos ativos, ou seja, métodos de ensino centrados na atividade dos alunos, para que fossem proporcionadas situações de aprendizagem através das quais se pudessem adquirir conhecimentos vinculados a experiências pessoais, tendo sempre por finalidade “prepará-los para as lutas da vida moderna” (Strenger, [1950STRENGER, Irineu. Luta contra o academismo nas escolas: alunos ajudam professores na revolução pedagógica. São Paulo, [1950].], p. 3).

A metodologia ativa foi, num primeiro momento, oferecida, de forma opcional, aos professores que se dispuseram a adotar os novos princípios definidos para a instituição. Além disso, o educador demonstrava preocupação com a configuração da situação do meio educacional ou com as configurações do campo educacional, relações e tensões nele presentes, as quais, assim como no campo educacional francês, nem sempre davam contornos favoráveis ao desenrolar da experiência. Neste cenário, Contier dava início ao processo de renovação, conforme relato:

Em nossa escola, [...] estamos introduzindo aos poucos os métodos ativos, com algumas modificações ditadas não só pela obediência à atual legislação escolar, bem como pelo respeito a certas realidades do nosso meio educacional, com o objetivo principal de proporcionar ao aluno uma aquisição de conhecimentos de conjunto, à base de experiência pessoal, a fim de prepará-lo para as lutas da vida moderna. Para tanto, nas cadeiras cujos professores se dispuseram a adotar esses princípios, estamos dando a seguinte orientação: divisão dos alunos em equipes de trabalho; estudo do meio humano e natural, e a instituição, na classe, de centros de interesses para melhorar a entrosagem das diversas cadeiras do currículo, servindo-se os alunos principalmente das cadeiras de desenho e Trabalhos Manuais para ilustrações e demonstrações de seu aproveitamento (Contier, 1956CONTIER, Luis. Sugestões sobre renovação dos métodos e processos de ensino apresentadas à Jornada de Diretores do Ensino Secundário. São Paulo, 15 a 20 out. 1956. Mimeo. , s.p.).

O método foi inserido de forma moderada, devido às já aqui mencionadas limitações da legislação escolar vigente. Diante disso, os exercícios do ensino tradicional não foram, de imediato, abolidos, sendo, a dita liberdade pedagógica, segundo palavras do próprio educador, “limitada pelo bom senso”. Contudo, os princípios pedagógicos evidenciavam-se renovadores e colocavam o aluno no centro do trabalho educativo, conforme registrado por Strenger:

  1. para aprender, seria preciso fazer e não somente ouvir e decorar, a exemplo das crianças, que preferem fazer os próprios brinquedos;

  2. os alunos deveriam deixar de ser um número para ser um nome na classe;

  3. os alunos deveriam ter o seu papel na classe como o indivíduo na sociedade;

  4. os alunos deveriam sentir a sensação da descoberta pessoal;

  5. os alunos deveriam servir-se, principalmente, das cadeiras de Desenho e Trabalhos Manuais para ilustrações e demonstração de seu aproveitamento;

  6. deveria operar-se pela divisão da classe em Equipes de Trabalho;

  7. deveria praticar-se Estudo do Meio Humano e Natural; e

  8. deveriam instituir, na classe, Centros de Interesse para melhor entrosamento das diversas cadeiras de Curriculum (Strenger, [1950STRENGER, Irineu. Luta contra o academismo nas escolas: alunos ajudam professores na revolução pedagógica. São Paulo, [1950].], p. 3).

Promoveu-se, a partir desses princípios, uma dinâmica diferenciada para o planejamento das aulas, a partir da qual o conteúdo deveria contar com contribuições pessoais dos alunos, sempre com maior enfoque em aspectos que pudessem contribuir para a formação de sua inteligência e caráter. Além disso, expandiu-se a jornada para tempo integral, tanto para alunos quanto professores, o que, por si só, representava um avanço muitíssimo significativo, sobretudo se considerado o objetivo de melhor ou maior aproximação com o aluno. Contier situava os pilares de sua experiência na matriz das classes nouvelles que, segundo ele, tomaria por base os teóricos John Dewey, Claparède, Jean Piaget e Maria Montessori. Ademais, teoricamente, situava as atividades realizadas no Instituto Alberto Conte na metodologia de “centros de interesse”, desenvolvida por Olvide Decroly. Contudo, as fontes analisadas não permitem perceber suficientemente a aplicação do método (Contier, 1956CONTIER, Luis. Sugestões sobre renovação dos métodos e processos de ensino apresentadas à Jornada de Diretores do Ensino Secundário. São Paulo, 15 a 20 out. 1956. Mimeo. ; Processam-se em estabelecimento oficial da capital ensaios sobre aplicação de novos métodos de ensino, 1956Processam-se em estabelecimento oficial da capital ensaios sobre aplicação de novos métodos de ensino. Ensino e Magistério. Folha da manhã. São Paulo, 29.nov. 1956. ).

Em termos de organização de matriz curricular, promoveu-se alterações no sentido de reduzir as disciplinas obrigatórias, desdobrando o currículo prescrito (Contier, 1981CONTIER, Luis. Luiz Contier: Introdutor das Classes Experimentais no Brasil. Entrevista 04 de fevereiro de 1981. Mimeo. ). Ademais, configurou-se um sistema que visava à promoção de maior iniciativa por parte dos alunos a partir da instituição da metodologia de pesquisa, trabalhos em equipe e estudo do meio. As atividades de saída de campo, centrais para a proposta de estudo do meio e para a dinamização dos processos de pesquisa que esta prática proporcionava eram realizadas com o auxílio dos pais que levavam os alunos e de Contier, que levantava fundos para o custeio das atividades. Na definição por ele apropriada a partir de estágio e documentos norteadores do CIEP, a prática do estudo do meio pressupunha a visita dos alunos a museus, laboratórios e frequência a cinemas, teatros, concertos e conferências. Para tais visitas, segundo o educador, realizava-se uma preparação a partir de leitura de jornais e, ao final da atividade, fazia-se um debate baseado nos assuntos que palpitavam a partir do evento (Contier, 1956CONTIER, Luis. Sugestões sobre renovação dos métodos e processos de ensino apresentadas à Jornada de Diretores do Ensino Secundário. São Paulo, 15 a 20 out. 1956. Mimeo. ).

Prática também aplicada no Instituto de Educação Alberto Conte, os trabalhos em equipe eram organizados a partir da divisão da classe em grupos de alunos, escolhendo-se um chefe e um subchefe por equipe para a realização de estudos. Estes estudos, por sua vez, tinham seu plano previamente definido com as temáticas propostas, contemplando os diferentes assuntos do programa oficial. Após trabalhados os conteúdos, expunham-se aos alunos os resultados encontrados, podendo a explanação realizar-se a partir de diferentes estratégias, contemplando, inclusive, dramatizações com fins educativos. Nesse contexto, o professor cumpria exclusivamente a função de supervisão e orientação do trabalho educativo, dividindo, em sala de aula, com os alunos, os espaços de autoridade e enunciação.

A prática de trabalhos em equipe demonstrou-se eficaz, obtendo resultados significativamente positivos. Segundo Contier (1956CONTIER, Luis. Sugestões sobre renovação dos métodos e processos de ensino apresentadas à Jornada de Diretores do Ensino Secundário. São Paulo, 15 a 20 out. 1956. Mimeo. ), ainda que fosse demandado maior tempo para as atividades, alcançou-se ótimo aproveitamento, sendo observada a transformação dos papéis do aluno, de ator para autor, e de ouvinte para locutor. Com maior incentivo de direção à personalidade do indivíduo e à iniciação à solidariedade humana, observou-se o desenvolvimento de autodisciplina, de eliminação da cola e do sistema tradicional de competição de notas entre os alunos.

Ainda que a proposta apresentasse avanços, a boa aplicação da metodologia ativa pressupunha redução no número de alunos em sala. Isso porque, enquanto na experiência francesa das classes nouvelles se previa um máximo de 25 alunos por classe, no Brasil, era comum a formação de turmas com 50 discentes. Diante disso, Contier lançou mão de táticas para reduzir o número de alunos por classe, admitindo um número máximo de 40, embora a procura por matrículas fosse grande. Não foram possíveis, contudo, reduções mais expressivas: “eram 40 por força de minha resistência. Se a lei estipulava 50, eu admitia 40. A procura era grande e eu procurava conciliar o interesse da maioria e dar um bom ensino” (Contier, 1981CONTIER, Luis. Luiz Contier: Introdutor das Classes Experimentais no Brasil. Entrevista 04 de fevereiro de 1981. Mimeo. , p. 3).

Outro foco da experiência era o princípio de melhor orientação dos alunos. Neste sentido, buscava-se promover o estreitamento do vínculo entre família e escola, passando a se dedicar um dia por semana para atendimento de pais de alunos. Esses atendimentos, por sua vez, eram realizados pelos professores nos intervalos das aulas. Uma outra alteração, de extrema importância, refere-se à criação de um ‘Serviço De Orientação Educacional’ na instituição com o intuito de observar e acompanhar os alunos para sondagem de suas aptidões. Além disso, o processo avaliativo também passou por mudanças significativas, tornando-se qualitativo, e contando com a análise coletiva dos alunos nos conselhos de classe, antes não existentes na instituição (Contier, 1981CONTIER, Luis. Luiz Contier: Introdutor das Classes Experimentais no Brasil. Entrevista 04 de fevereiro de 1981. Mimeo. ).

Os resultados positivos alcançados na experiência, diante da aplicação desses pressupostos, atraíram a atenção nos campos educacional e político. Neste cenário, Contier recebe, em Santo Amaro, a visita de autoridades interessadas nas especificidades da nova cultura escolar da instituição. Entre essas autoridades, uma equipe de professores da Universidade de São Paulo (USP), da qual fazia parte Eurípede dos Simões de Paula, então diretor da Faculdade de Educação, e, ainda, Marina Cintra, Gildásio Amado e Laerte Ramos de Carvalho.

É interessante, aqui, atribuir a devida atenção ao fato de que a influência de Luis Contier no campo educacional figurou como aspecto favorável à divulgação da experiência no Instituto Alberto Conte, bem como ao processo de oficialização do ensaio, que teve início nos anos seguintes. Contier ocupou, naquele período, no campo educacional, posições que atribuíam prestígio e autorizavam suas práticas pedagógicas, como a função de professor da cadeira de formação de professores do “Curso de Especialistas em Educação para a América Latina”, ligado ao Centro Regional de Pesquisas Educacionais (CRPE) de São Paulo, ocupada por Contier entre os anos de 1956 e 1960. Nessa função estratégica no CRPE, o educador passou a ocupar um papel central no movimento de estudo e divulgação do projeto escolanovista, pela via da formação de professores, não só no Brasil, mas em toda a América Latina.

Em 1956 foi realizada a ‘Jornada de Diretores de Ensino Secundário’, evento no qual, durante três dias, diretores de colégios e escolas normais, oficiais e particulares, divididos em oito comissões, trataram de questões relativas à educação e ao ensino. Entre estas, a 4ª comissão, da qual fez parte Luis Contier, foi encarregada de tratar da “Renovação dos métodos e processos de ensino. Condições legais e mínimas exigidas para novas experiências”. Nesta comissão são anunciados, por Contier, princípios educacionais para as classes experimentais, segundo ele, inspirados em sua maioria, na experiência francesa das classes nouvelles. Nos princípios de organização sugeridos por Contier, seriam criadas, a partir de 1957, classes experimentais de primeira série em colégios cujos diretores e professores se dispusessem a realizar uma experiência educacional, a critério do Ministério da Educação. Essas experiências, na concepção desse educador, deveriam seguir algumas premissas básicas, conforme abaixo:

PRINCÍPIOS DE ORGANIZAÇÃO

  1. os alunos que constituíssem as classes experimentais teriam assegurado o direito de exame de adaptação no próprio estabelecimento, caso desejassem se transferir para outro colégio;

  2. as classes experimentais seriam constituídas de alunos cujos pais tivessem conhecimento da situação e dessem autorização por escrito, para que seus filhos as pudessem frequentar;

  3. os professores das classes experimentais teriam autorização especial para tal fim;

  4. os colégios realizadores dessa experiência seriam obrigados a apresentar relatório anual ao Ministério da Educação e Saúde, dos resultados obtidos;

  5. esses colégios deveriam oferecer condições mínimas asseguradoras da eficiência dos trabalhos escolares;

  6. essas classes experimentais não poderiam ter mais de quarenta alunos;

  7. esses colégios poderiam contar com assistência permanente não só da Inspetoria Seccional de São Paulo, como também de todas as Faculdades de Filosofia da Capital paulista;

  8. redução do número de professores nas primeiras séries ginasiais, agrupando duas cadeiras afins para o mesmo professor;

  9. criação, paralelamente, de estágios, seminários, palestras e conferências para os primeiros professores de tais classes (Contier, 1956CONTIER, Luis. Sugestões sobre renovação dos métodos e processos de ensino apresentadas à Jornada de Diretores do Ensino Secundário. São Paulo, 15 a 20 out. 1956. Mimeo. , p. 1-2).

Acrescentavam, ainda, que a experiência deveria prolongar-se por um prazo de quatro anos para que os resultados fossem devidamente apreciados; frisavam a importância da inclusão de um ‘gabinete de orientação educacional’, com atuação de um psicopedagogo, e acentuavam a função pedagógica do diretor, que não deveria ser um mero administrador (Criação de classes experimentais[…], 1956Criação de classes experimentais nos moldes da escola ativa. A Gazeta. São Paulo, 01. nov.1956. ; Primeira jornada de diretores, 1957PRIMEIRA JORNADA DE DIRETORES. Folheto de Anais da Primeira Jornada de Diretores. Editora Clássico-Científica: São Paulo, 1957.). Contier discorre, também, acerca de quais seriam os “Princípios de Orientação” da experiência. Segundo o educador, as classes experimentais, no Brasil, teriam, assim como as classes nouvelles francesas, a finalidade de orientação educacional, ou seja: de melhor conhecer o aluno, para melhor orientá-lo no seus estudos. Nesse sentido, destaca a importância do ‘Setor de Orientação Educacional’, para o qual define as principais funções.

Contier orientava que, “com toda a liberdade pedagógica ditada pelo bom senso”, e sem que os exercícios do ensino tradicional fossem sistematicamente abolidos, ao menos no início, o professor fizesse uso dos “diferentes métodos ativos da pedagogia moderna para levar o aluno a uma aquisição de conhecimentos de conjunto à base da experiência pessoal com o fim de prepará-lo para as lutas da vida moderna” (Contier, 1956CONTIER, Luis. Sugestões sobre renovação dos métodos e processos de ensino apresentadas à Jornada de Diretores do Ensino Secundário. São Paulo, 15 a 20 out. 1956. Mimeo. , p. 4). Neste sentido, debruçava-se sobre o método a ser empregado nas classes experimentais, defendendo o uso de metodologia ativa:

Emprego dos métodos ativos:

  1. para aprender, é preciso fazer e não somente ouvir e decorar, a exemplo das crianças que preferem fazer os próprios brinquedos;

  2. os alunos deverão deixar de ser um número para ser um nome na classe;

  3. os alunos deverão ter o seu papel na classe, como o indivíduo na sociedade;

  4. os alunos deverão sentir a sensação de descoberta pessoal;

  5. os alunos deverão servir-se, principalmente das cadeiras de Desenho e Trabalhos Manuais para ilustrações e demonstrações de seu aproveitamento;

  6. divisão da classe pelos professores em Equipes de Trabalho;

  7. Estudo do Meio Humano e Natural;

  8. instituição, na classe, de Centro de Interesses para melhor entrosamento das diversas cadeiras do Curriculum (Contier, 1956CONTIER, Luis. Sugestões sobre renovação dos métodos e processos de ensino apresentadas à Jornada de Diretores do Ensino Secundário. São Paulo, 15 a 20 out. 1956. Mimeo. , p. 4).

Dentre os métodos ativos, o educador atribui destaque, inicialmente, aos trabalhos em equipe, destacando, também, as práticas de ‘estudo do meio’ e, por fim, dos ‘centros de interesses’ (Contier, 1956CONTIER, Luis. Sugestões sobre renovação dos métodos e processos de ensino apresentadas à Jornada de Diretores do Ensino Secundário. São Paulo, 15 a 20 out. 1956. Mimeo. , p. 6).

Contier deixa clara a intencionalidade em colaborar com a formulação legal de um plano geral de reforma educacional, o que, em certa medida, situa as classes experimentais no mesmo patamar do que haviam sido, para o contexto educacional francês, as classes nouvelles: uma prefiguração para uma reforma da educação de segundo grau. É, também, interessante destacar o papel central atribuído por Contier aos educadores, ao realizar a defesa de uma reforma educacional que partiria do chão da escola para os gabinetes ministeriais e comissões parlamentares, partindo da premissa de que, por conhecerem e viverem a realidade escolar, poderiam emitir opiniões honestas e voltadas ao melhor rendimento escolar. Contier demonstra, ainda, ter muitíssimo clara a ideia de que o currículo proposto para a referida reforma educacional respondia a um contexto específico, tratando-se, não de uma proposta ou de um método absoluto em si e capaz de atravessar os tempos, mas, sim, de uma tentativa pontual que, diante de um contexto de políticas locais e globais específicas, intentava responder aos anseios das finalidades educacionais daquele tempo.

Sua exposição encontra espaço no campo educacional ao ter seu trabalho aceito e elogiado. Face à repercussão positiva, o relatório produzido foi enviado por Marina Cintra a Gildásio Amado, então diretor do ensino secundário, dando início a um movimento de autorização oficial do ensaio das classes experimentais. Tomando por base o regime de equivalência instituído pela Lei nº. 1.821, de 12 de março de 1953, Amado justifica que os cursos das Classes Experimentais seriam equivalentes aos do ensino secundário, como já eram, à época, os cursos profissionais. Nesse sentido, assegurava, o diretor, que as variações de currículo seriam mantidas dentro dos limites compatíveis com a legislação vigente, visando, tão somente, “dar ao curso secundário um sentido mais concreto de formação para as tarefas e responsabilidades da vida social e profissional” (Classes Experimentais no Ensino Secundário, 1958Classes Experimentais no Ensino Secundário. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos. São Paulo. V 30, N 72, Out-Dez 1958. P. 79-83. , p. 75). Em sua exposição de motivos, esclarecia-se que o regime experimental de ensino não seria dado de forma compulsória, nem para alunos, nem para professores ou escola, dependendo da aceitação dos profissionais e das famílias. Além disso, seriam previstas formas de adaptação para possíveis transferências, sendo resguardados, pela autoridade competente, os direitos de equivalência, de acordo com o estruturado pela Lei Orgânica do Ensino Secundário (Decreto-Lei n. 4.244 - de 9 de abril de 1942). Por fim, mas não menos importante, sugeria-se que a questão fosse submetida ao Conselho Nacional de Educação (Amado, 1959).

A exposição de motivos de Gildásio Amado foi respondida pelo técnico de educação Adalberto Correia Sena, da diretoria do ensino secundário. Em seu parecer, ele menciona experiências que se aventuraram na aplicação do método de estudos dirigidos e que promoveram mudanças nos critérios de avaliação, considerando que estes ensaios foram atenuados pela inflexibilidade da organização pedagógica legal vigente. Dentre estas, avultavam as chamadas classes experimentais de ensino secundário, das quais, segundo ele, já havia sido cogitado tratar na Lei Orgânica do Ensino Secundário. Contudo, considerava não ser imprescindível aguardar a solução definitiva, impressa nos termos da legislação, para, logo, colocar em prática estas experiências “didáticas facultativas e prudentemente conduzidas”, promovendo “modificações que dariam diversificação ao ensino secundário, admitindo disciplinas obrigatórias e optativas, além da ramificação dos cursos do primeiro e do segundo ciclo” (SENA, 1958SENA, Adalberto Correia Sena. Parecer do Técnico de Educação Adalberto Correia Sena, da Diretoria do Ensino Secundário. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos. São Paulo, v. 30, n. 72, out-dez 1958. p. 78-79., p. 78).

Nesta direção, no ano de 1958 foi publicado na Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos o documento “Instruções sobre a natureza e a organização das classes experimentais” (Classes Experimentais no Ensino Secundário, 1958), que trata das indicações gerais para funcionamento dessas classes. No referido documento, esclarece-se que, a partir da homologação dos Pareceres nº. 31/58 do Conselho Nacional de Educação, e nº 77/58, da Consultoria Jurídica do Ministério, passava a estar autorizada a organização de classes experimentais de curso ginasial ou colegial, para funcionamento a partir do ano letivo de 1959. Desta forma, o Ministério da Educação e Saúde do Brasil oficializava as classes secundárias experimentais no sistema público de ensino com uma cultura escolar em boa medida apropriada das classes nouvelles.

Após este movimento de oficialização, diversas instituições públicas e privadas integraram-se ao ensaio das Classes Experimentais no Estado de São Paulo, realizando diferentes apropriações, tanto da matriz das classes nouvelles, como de outras matrizes em circulação no Estado, a exemplo da matriz da Pedagogia Personalizada, de Pe. Pierre Faure (Vieira, 2015Vieira, Letícia. (2015). Um núcleo pioneiro da renovação da educação secundária brasileira: as primeiras classes experimentais do estado de São Paulo (1951-1964)(Dissertação de Mestrado).Universidade do Estado de Santa Catarina, Florianópolis, 2020VIEIRA, Letícia. Classes experimentais secundárias de instituições públicas do ensino do estado de São Paulo: um estudo sobre formas de circulação e apropriação de práticas pedagógicas (1951-1962). 2020. 305 f. Tese (Doutorado em Educação). Faculdade de Educação - Universidade de São Paulo, 2020.; Dallabrida, 2017DALLABRIDA, Norberto. As classes secundárias experimentais: uma tradição escolar (quase) esquecida. Revista Brasileira de História da Educação, v. 17, n. 3[46], p. 196 - 218, 24 jul. 2017.). No mesmo sentido, outras Unidades da Federação realizaram ensaios de experimentação, sendo alvo de estudo, já em 1963, por Jayme de Abreu e Nádia Cunha, na publicação “Classes secundárias experimentais: balanço de uma experiência” (Cunha; Abreu, 1963). Em um cenário mais recente, as classes secundárias experimentais foram efetivamente transformadas em objeto histórico por estudos que enfocaram as ressonâncias destas diferentes matrizes e suas múltiplas apropriações (Vieira, 2015Vieira, Letícia. (2015). Um núcleo pioneiro da renovação da educação secundária brasileira: as primeiras classes experimentais do estado de São Paulo (1951-1964)(Dissertação de Mestrado).Universidade do Estado de Santa Catarina, Florianópolis; Vieira, 2019; Dallabrida, 2023DALLABRIDA, Norberto. (org.). “Brechas no monólito educacional”: classes secundárias experimentais e inovação do ensino secundário nos anos 1950 e 1960. Curitiba: Appris, 2023. ), lançando luz às contribuições destes ensaios para o cenário educacional atual.

Conclusão

As classes nouvelles representaram uma ruptura significativa com o tradicionalismo pedagógico no ensino secundário francês no mínimo desde as reformas napoleônicas do início do século XIX. Elas tiveram um ensaio com as classes d`orientation dos anos 1930 e se colocaram, efetivamente, no momento Libération da França da ocupação nazista, de modo que integrava os mecanismos de reconstrução no imediato pós-guerra. Essas classes brotaram dos escombros da guerra, mas o seu pano de fundo era o crescimento do ensino secundário francês que passava a ter perfis sociológicos diversos de estudantes oriundos de frações de classes médias e alguns miraculosos casos de classes populares. É importante sublinhar as inovações da cultura escolar (re)criadas pelas classes nouvelles, iniciando com o estudo do meio natural e humano, metodologia que se tornou a sua marca pedagógica na França e em outros países. Não menos importante foi a redução de números de alunos por turma e a redução do número de professores no início do primeiro ciclo do ensino secundário, bem como, evidentemente, o ensino integral em tempo integral, o trabalho dirigido, as atividades em equipes e o trabalho docente coletivo no conselho de classe. E a instituição da orientação educacional que se impôs por meio da observação dos professores e do uso de testes psicológicos, procurando personalizar o aprendizado dos estudantes.

A proposta das classes nouvelles arquitetada por Monod teve uma preocupação com a preparação dos seus professores, que foi realizada por meio de estágios de formação docente no CIEP, que se abriu para receber professores estrangeiros. Desde o início da década de 1950, educadores brasileiros realizaram estágios no CIEP, entre os quais Luís Contier que, ao retornar ao Brasil, passou a usar a matriz das classes nouvelles no Instituto de Educação Alberto Conte - escola onde trabalhava. Esse ensaio pedagógico, chamado classes secundárias experimentais, ganhou visibilidade no campo educacional brasileiro e foi acolhido pelo titular da Diretoria do Ensino Secundário do MEC, Gildásio Amado, que viabilizou a criação de uma legislação nacional que permitia a realização dessas classes em colégios brasileiros. É importante observar essa conexão transnacional entre as classes nouvelles e as classes secundárias experimentais realizadas sobretudo pelo Luis Contier porque, em boa medida, o que está contido na legislação que permitia às classes experimentais no ensino secundário brasileiro tinha sido elaborado por este mediador pedagógico. Apesar dessa ligação umbilical entre as experiências francesas e brasileiras no tocante à renovação do ensino secundário público, é instigante indicar que as classes secundárias experimentais tiveram a sua singularidade.

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  • 5
    Na França, o ensino secundário era e ainda é formado por dois ciclos: o collège, formado por quatro classes/anos letivos (sixième, cinquième, quatrième e troisième) e o lycée, constituído por três classes/anos letivos (seconde, première e terminal) (Araújo; Dallabrida, 2017ARAÚJO, Elisabete Maria de; DALLABRIDA, Norberto. Gustave Monod e a renovação do ensino secundário francês. Acta Scientiarum. Education. Maringá, v. 39, p.475-481 suppl. 2017.).
  • 6
    “Le premier but des classes nouvelles était d'aider les familles dans la tâche de l`orientation scolaire, c`est-à-dire dans le choix de la branche d'études capables de provoquer le développement maximum de chaque enfant”.
  • 7
    “L'orientation scolaire est à l'ordre du jour. Il n`est pas de projet de réforme de l`enseignement qui ne lui fasse sa place. Lorsque la Commission Langevin a cherché à établir la structure de l`Enseignement du Second degré, elle s'est heurtée au problème de l`orientation et c`est en grande partie pour le résoudre qu`elle a demandé l'organisation des classes nouvelles”.
  • 8
    “Sans ce contact direct, bien des enthousiasmes se seraient éteints, bien des expériences fructueuses n’auraient pu se transmettre”.

Editado por

Editora Responsável:

Terciane Ângela Luchese

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    18 Mar 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    31 Mar 2023
  • Aceito
    03 Nov 2023
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