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Antropologia e deficiência: uma conversa com Rayna Rapp e Faye Ginsburg

Introdução

Desde a década de 1980, as antropólogas Rayna Rapp e Faye Ginsburg contribuem para o modo como a antropologia estuda reprodução, gênero e deficiência. Os livros de Rapp (1999)RAPP, R. Testing women, testing the fetus: the social impact of amniocentesis in America. New York: Routledge, 1999.Testing women, testing the fetus: the social impact of amniocentesis in America e de Ginsburg (1998)GINSBURG, F. Contested lives: the abortion debate in an American community. 2nd ed. Berkeley: University of California Press, 1998.Contested lives: the abortion debate in an American community mudaram o campo da antropologia da reprodução, assim como o fez o volume por elas editado Conceiving the new world order: the global politics of reproduction (Ginsburg; Rapp, 1995)GINSBURG, F.; RAPP, R. (ed.). Conceiving the new world order: the global politics of reproduction. Berkeley: University of California Press, 1995.. Faye Ginsburg é professora de antropologia na New York University (NYU), nos Estados Unidos, onde é diretora do Center for Media, Culture and History. Rayna Rapp foi professora do mesmo departamento até 2021, quando se aposentou. Em 2017, em conjunto com a professora Mara Mills, elas fundaram o Center for Disability Studies na NYU, resultado de um trabalho de mais de duas décadas de pesquisa que abriu caminhos para inúmeras antropólogas da deficiência que vieram com e depois delas.

Em 2001, elas publicaram o artigo “Enabling disability: rewriting kinship, reimagining citizenship” (Rapp; Ginsburg, 2001RAPP, R.; GINSBURG, F. Enabling disability: rewriting kinship, reimagining citizenship. Public Culture, [s. l.], v. 13, n. 3, p. 533-556, Fall 2001.). O trabalho foi um marco para a antropologia da deficiência e resultou da experiência prévia das autoras nas áreas da antropologia da reprodução, parentesco e estudos de gênero em combinação com sua experiência pessoal enquanto mães de crianças com deficiência que tiveram que aprender a como navegar um contexto social até então desconhecido. Naquela ocasião, elas analisaram o porquê de as informações sobre deficiência serem tão escassas e como as famílias, e principalmente as mulheres, enfrentaram as consequências morais e práticas de decidir sobre manter a gravidez ou não, como criar seus filhos deficientes e como garantir que suas vidas fossem tão boas quanto as das demais pessoas a sua volta. Desde então, através de um trabalho longitudinal que acompanhou mudanças nas legislações, tecnologias e representações acadêmicas da deficiência nos Estados Unidos, e o crescimento do “campo emergente” dos estudos sobre deficiência, as autoras exploraram como a deficiência conforma e é conformada por imaginários de parentesco, políticas públicas, atores biomédicos e jurídicos e representações públicas sobre ela.

Desde então, eles não apenas publicaram extensivamente sobre deficiência e antropologia, mas trabalharam para chamar a atenção para a importância que o tema da deficiência possui para questões fundamentais da antropologia, como parentesco, reprodução, personhood e temporalidade. Nesse sentido, elas publicaram, em 2013, o emblemático artigo “Disability worlds” (Ginsburg; Rapp, 2013GINSBURG, F.; RAPP, R. Disability worlds. Annual Review of Anthropology, [s. l.], v. 42, p. 53-68, 2013.), no qual apresentam como a deficiência vêm sendo abordada por antropólogos ao longo dos anos, bem como argumentam ser esse um tema fundamental para a disciplina. Em 2020, elas aprofundaram essa reflexão ao organizarem um volume de mesmo o nome na revista Current Anthropology (Ginsburg; Rapp, 2020)GINSBURG, F.; RAPP, R. Disability/anthropology: rethinking the parameters of the human. Current Anthropology, v. 61, suppl. 21, p. S4-S15, 2020., baseado em um simpósio internacional realizado em 2017 e financiado pela Wenner-Gren Foundation. Elas acabaram de finalizar um novo livro que será publicado pela Duke University Press, no qual exploram as diferentes facetas dos mais de 20 anos de pesquisas dedicadas a uma antropologia da deficiência.

Encontrei-me com Rayna Rapp e Faye Ginsburg para uma entrevista virtual sobre seu trabalho em junho de 2021. Dada sua dedicação a esse campo de estudos, não é surpresa que tenhamos conversado por quase três horas sobre suas trajetórias, as várias maneiras pelas quais “o pessoal é político” e acadêmico, e o presente, passado e futuro da pesquisa sobre deficiência dentro da antropologia.

Em 25 de setembro de 2022, Samantha Ginsburg Myers, filha de Faye e amiga de Rayna, faleceu. Ao longo de seus 33 anos, Sam transformou a vida de inúmeras pessoas com sua bondade, amor, senso de humor e ativismo em prol daqueles com disautonomia familiar. Seu legado seguirá vivo naqueles com quem conviveu e através do trabalho de tantos de nós a quem ela, ainda que indiretamente, influenciou. Muito obrigada, Sam.

Entrevista

Helena Fietz: Vocês escreveram seu primeiro ensaio juntas em 1991. Desde lá, são 30 anos trabalhando juntas e também desenvolvendo projetos individuais. Lembro-me de quando eu estava na NYU, as pessoas se referiam a vocês como “Fayna”. Vocês poderiam falar um pouco sobre essa trajetória?

Rayna Rapp: Faye e eu nos conhecemos quando ela era estudante de pós-graduação, e eu professora recém-formada. Eu dei uma palestra sobre gênero e antropologia com minha questão habitual: onde estão as mulheres? Onde está o gênero como a relação social central em tudo que a antropologia estuda, desde o parentesco à política até a economia? Começamos a conversar e, resumindo, Faye me colocou no comitê de doutorado dela e nunca paramos de falar depois disso. Quando comecei a fazer minha pesquisa sobre amniocentese, fui com Faye acompanhar seu exame. Em 1988, eu estava imersa nesse livro,1 1 Testing women, testing the fetus: the social impact of amniocentesis in America (Rapp, 1999). trabalhando com amniocentese e tecnologias reprodutivas e genética como parte da antropologia médica, mas sob uma ótica feminista. Eu fui com Faye, fizemos um monte de piadas que irritaram o radiologista. Tudo teria sido muito engraçado, mas a filha de Faye e Fred nasceu com uma deficiência muito significativa e muito incomum. Com isso, ficamos unidas não só pelo interesse por tecnologia reprodutiva, mas pelo aprendizado sobre deficiência. Do meu ponto de vista, eu me tornei a família estendida na tentativa de entender como proporcionar uma boa vida para Samantha, que se desenvolveria de maneiras incomuns, mas, Faye, você deveria assumir.

Faye Ginsburg: Quando Rayna veio e deu aquela palestra, ela mudou totalmente a minha vida. Foi na época em que Ronald Reagan foi eleito. Entre o horror daquele evento, perceber para onde a política estava indo e ouvir Rayna falar sobre antropologia feminista, olhando para questões de gênero, eu me interessei pelo movimento do direito à vida e em como as mulheres se dividiam na questão do aborto. É um problema político, mas também intelectual, porque a teoria feminista diz: “devemos levar a sério a vida e as crenças das mulheres”, mas havia exceções a essa ideia - mulheres posicionadas à direita no espectro político -, e pensei: eu vou descobrir o que está acontecendo. Claro, eu imediatamente queria que Rayna estivesse no meu comitê. Eu tinha algumas pessoas excelentes, mas ninguém que levasse a antropologia feminista ao nível que precisávamos. Ficamos muito ligadas desde então. De certa forma a reprodução e a deficiência estão entrelaçadas nessa questão. Não de certa forma: elas estão. Antes de pensar sobre deficiência, eu pensava mais sobre reprodução, mas ambas surgiram daquele mesmo lugar para mim. Claro, seguindo o trabalho de Rayna com testes genéticos, e depois sendo sua vítima de pesquisa. Minha filha Samantha não nasceu apenas com uma deficiência, mas com uma condição genética, disautonomia familiar (DF), que fez com que famílias se organizassem para gerar conscientização e levantar recursos, trabalhassem com especialistas médicos e cientistas, o que se tornou uma história comum no mundo das doenças genéticas. Foi em 2001 que encontramos a mutação genética que causa a DF, o que possibilitou a criação de um teste genético que a identificasse. Quando fui fazer minha amniocentese em 1988, apenas algumas condições específicas eram testas e praticamente nenhuma discussão sobre a pergunta existencial para a qual não há resposta: se o conhecimento sobre a condição de Samantha estivesse disponível para mim naquele momento, que decisão eu poderia ter tomado diante da ausência de conhecimentos sobre o que significa viver com DF? Isso levou a primeira coisa que escrevemos em 2001, depois de “A política da reprodução”:2 2 Ginsburg e Rapp (1991). “Enabling disability: rewriting kinship, reimagining citizenship”.3 3 Rapp e Ginsburg (2001). A emergente tecnologia de testes genéticos foi mantida separada da questão social do conhecimento sobre deficiência colocando as mulheres grávidas na difícil posição de serem, como Rayna as chama, pioneiras morais. Foi aí que começamos, as primeiras partes de escrita que uniram esses dois fluxos do nosso trabalho. Mas devemos voltar à política da reprodução. É com você, Rayna.

Rayna Rapp: Em algum momento, entendemos que estávamos olhando para o que chamamos de “a política da reprodução”. Não apenas o poder, não apenas a reprodução como um ato biológico, que tinha sido deixado de lado pela antropologia, ou normas, como em couvade, ou que a mulher grávida deve fazer 16 rituais aleatórios em determinado grupo. A questão é que havia uma enorme quantidade de poder envolvido em ter, coagir, conceder ou retirar os recursos para a reprodução das mulheres, assim como para seus aliados em famílias ou comunidades, em grupos religiosos, em suas escolas. A política da reprodução era uma óptica para se concentrar em algo muito importante que estava escondido à vista de todos. Para nossa surpresa, quando falamos sobre a política da reprodução, as pessoas perguntavam: o que aconteceu com o feminismo? Onde estão as mulheres? A resposta era: elas estão no centro disso se você arrastar a reprodução para o centro da teoria social. Esse se tornou o princípio organizador de um seminário internacional promovido pela Wenner-Gren, em 1991, e um livro que organizamos, Conceiving the new world order: the global politics of reproduction,4 4 Ginsburg e Rapp (1995). e um monte de outros projetos que fizemos. Definitivamente, foi insistir que a preocupação feminista que nos levou à reprodução enquanto uma abordagem mais ampla devia ser entendida como algo central para a antropologia, não apenas uma questão das mulheres.

Faye Ginsburg: Nós tentamos mostrar o quão central era a questão da reprodução em nossas pesquisas individuais, e o fato de que a Rayna estava pesquisando o impacto social dos testes genéticos e eu profundamente envolvida na política do aborto.

Rayna Rapp: Certo, começamos a entender que nossos projetos eram lados opostos da mesma moeda. Uma de suas perguntas tinha a ver com o duplo telos da modernidade [doubled telos of modernity], que criamos em 2001 ou algo assim. Ele é uma tentativa de fazer uma síntese teórica social do que estamos falando, que é: a separação, a segregação, a supressão do conhecimento sobre a deficiência não é desconectada de como podemos falar sobre perfectibilidade por meio da medicina e da reprodução. Seja na saúde pública ou pela ideia de que você pode intervir com um teste genético ou com qualquer outra coisa. Parte dessa intervenção permite que as pessoas prosperem, como a UTI neonatal. Mas parte disso diz respeito à eliminação da deficiência sob o pretexto de tornar a vida perfeita ou melhor através da medicina. Eu não estou dizendo para não fazer uso dessa tecnologia, mas estou dizendo que se manter conhecimento compartimentado, esse tipo de expertise da deficiência (como mais tarde os estudiosos mais jovens viriam a chamá-la) segregada ou separada, é uma maneira conveniente de deixar o preconceito e, francamente, o pensamento eugênico em curso contra as pessoas com deficiência fora das conversas.

Faye Ginsburg: Em 1990, fomos convidadas a escrever um capítulo para a Annual Review of Anthropology sobre a política da reprodução. De qualquer forma, queríamos fazer isso juntas. E foi uma experiência fantástica. Não me lembro exatamente como, mas propusemos uma conferência para expandir esse tema. O tema estava emergindo e a antropologia tinha muito a contribuir, e queríamos que fosse muito mais internacional.

Rayna Rapp: Em 1992 a conferência e em 1995 Conceiving the new world order,5 5 Ginsburg e Rapp (1995). resultado daquela conferência.

Faye Ginsburg: Muitos anos depois, na reunião anual da Associação Americana de Antropologia (AAA) de 2004, recebemos um prêmio do Conselho de Antropologia e Reprodução por esse livro. Eu acredito que isso deixou claro que a reprodução havia aparecido como um tópico importante. Nós certamente não estávamos sozinhas. Para nós, a expansão da reprodução nessas questões em torno da deficiência veio, eu diria, mais fortemente a partir da pesquisa que Rayna estava fazendo. E depois, é claro, com minha experiência com minha filha, porque eu fui jogada no meio de todas essas perguntas. Demorou um pouco para diagnosticá-la e eu não tinha nenhuma experiência. Isso trouxe todas essas questões que eram tão existenciais, sobre por que esses domínios do conhecimento serem estão separados. Como fazemos essas conversas sobre deficiência e reprodução convergir sem, como Rayna estava dizendo, julgar as pessoas por tomar o tipo de decisão que Rayna tomou? Quer falar sobre isso, Rayna?

Rayna Rapp: Eu passei a me interessar por testes genéticos e sua conexão com a deficiência da maneira mais difícil. Aos 34 anos, quase 35, fui fazer um teste de amniocentese sem nem pensar muito, e voltei com o que é tão antisepticamente chamado de “diagnóstico positivo da síndrome de Down”. Meu parceiro e eu decidimos terminar a gravidez. Foi tudo muito confuso e muito solitário. Eu me senti a única pessoa do mundo que precisou tentar descobrir o que fazer e comecei a usar minhas redes médicas e feministas para conversar com outras mulheres que tiveram um “diagnóstico positivo”. Isso foi há tanto tempo, 1982, 1983. Você ainda tinha que usar um telefone de linha e lista telefônica em vez dos celulares que usamos agora. Mas eu falei com mulheres de todo o país que tiveram essa experiência. Havia muito poucas delas. Ninguém nunca tinha falado com mais ninguém. E comecei a escrever sobre isso. Escrevi sobre isso para a revista Ms. porque queria que fosse um artigo feminista popular e não uma discussão médica. Um artigo que as próprias feministas tomassem para si, para suas considerações éticas. Comecei a pesquisar sobre testes pré-natais e em todos os lugares que fui, o mundo médico abriu suas portas. Eles disseram: “Sim, não temos ideia do impacto do que estamos fazendo. Se você quiser ir falar com as pessoas, se você quiser entrevistar as pessoas, se você quiser seguir nossos conselheiros genéticos, se você quiser ir aos laboratórios, se você quiser falar com famílias que optaram ou não por usar esse teste. Sim, sim. Sim.” Então esse se tornou o trabalho que eu fiz.

Faye Ginsburg: Demonstrando o princípio feminista de que o pessoal é político.

Helena Fietz: Ouvindo vocês, pensei no debate sobre Zika vírus, gravidez e aborto no Brasil. Como o aborto é ilegal, houve muita discussão se as mulheres que foram diagnosticadas com Zika vírus deveriam ter permissão para fazer um aborto ou não. E era comum que a questão fosse apresentada como uma oposição entre os direitos das pessoas com deficiência e os direitos das mulheres. Claro, com várias estudiosas como Anahí Guedes de Mello e Debora Diniz argumentando contra essa oposição. Construindo essa ponte entre os direitos das pessoas com deficiência e os direitos reprodutivos, como vocês vêm fazendo há tantos anos.

Rayna Rapp: E eu apenas adicionaria uma coisa ao que você acabou de dizer, Helena, que a tecnologia em si continua a evoluir no que eu chamaria de um ritmo assustador. Porque, ao contrário de 40 anos atrás, hoje a tecnologia está majoritariamente no setor comercial e há um conjunto diferente de pressões para usá-la. A tecnologia em si revela coisas que as pessoas não necessariamente sabem interpretar ou só podem interpretar parcialmente e isso aumenta a pressão sobre as mulheres. Por um lado, essa tecnologia é muito mais fácil, novos exames de sangue, etc. Por outro lado, a pressão para assumir a normalização desse conhecimento é contínua e feroz. Novamente, não estou argumentando para não usar a tecnologia, mas nas últimas 72 horas conversei com uma pessoa com uma condição genética que está enfrentando isso. Porque você pode testar um embrião e você pode decidir qual embrião reimplantar se você decidir utilizar a fertilização in vitro, que é uma tecnologia bastante comercial e muito cara. Essa pergunta não vai sair de cena em um futuro próximo. A suposição de que a tecnologia resolverá problemas. Isso é dialética simples. A tecnologia resolve alguns problemas ao mesmo tempo que apresenta novos problemas. Isso é algo que podemos dizer sobre toda tecnologia e é certamente verdade na medicina. Se você olhar para testes genéticos, ou tecnologia reprodutiva, ou a forma como todas essas tecnologias circulam na economia global, é muito seletivo. No Brasil, pelo que sei, as mulheres de classe média alta têm acesso muito diferente a tecnologias reprodutivas do que as mulheres da classe popular. Isso significa acesso a tudo, desde ao conhecimento sobre isso, aos serviços para tal, até ao que você faz se você obtiver informações. Isso é muito problemático. É altamente estratificado, mesmo estando em expansão. Isso acontecia aqui antes de Roe vs. Wade e vai continuar acontecendo, uma vez que a Suprema Corte dos Estados Unidos revogou o direito ao aborto legal. Eu quero ser muito direta em afirmar que não se trata de uma evolução em linha reta, em que os países ricos possuem as respostas.

Helena Fietz: E como vocês tanto escreveram sobre, parece que as implicações morais de decidir sobre encerrar a gravidez acabam recaindo sobre as mulheres, assim como as implicações morais e práticas de cuidar da pessoa que possa necessitar de mais cuidado também acaba recaindo sobre as mulheres. Nesse sentido, isso conecta o seu trabalho sobre deficiência ao seu trabalho sobre direitos reprodutivos, justiça reprodutiva e feminismo.

Rayna Rapp: Essa é a base sobre a qual estamos sempre construindo, e eu diria também que isso continua se intensificando. É diferente em diferentes décadas ou gerações, mas a interseccionalidade da deficiência não só com gênero, mas com diferenças baseadas em classe, raça, etnicidade, religião e linguagem, é contínua. Nenhuma dessas coisas está indo embora, elas são reproduzidas. Elas podem ter um significado diferente agora, mas na fertilização in vitro se fala em “doação de óvulos”, e estou colocando aspas com meus dedos, porque é uma venda. As mulheres que vendem seus óvulos tendem a ser de origem diferente daquelas que os compram. Esses são dilemas contínuos.

Faye Ginsburg: Acho que uma das principais razões pelas quais as pessoas gostaram de Conceiving the new world order é pela ideia de uma de suas ex-alunas, Rayna, Shelle Colen: reprodução estratificada. Você acabou de descrever outra iteração desse conceito. E foi um conceito tão importante de se apresentar porque no minuto em que você o usa, há uma mudança de paradigma. As pessoas dizem “ah, sim, nos vemos isso acontecendo aqui e em todos os lugares”. Qualquer que seja a forma que ela tomar atualmente, estamos cientes desse processo de estratificação que decorre da comodificação da reprodução.

Rayna Rapp: Eu quero aproveitar para destacar o trabalho da Shelle. Ela ainda fica surpresa que as pessoas estão citando artigos que ela escreveu nos anos 1990. Mas esse é um conceito muito importante, resultado de seu trabalho com babás anglófonas jamaicanas e West Indian. Empregadas domésticas cuidando de filhos de pessoas da cidade de Nova York, contratadas por famílias de classe média alta em que o homem e a mulher, ao invés de dividirem o trabalho, pagavam uma mulher imigrante de outra nacionalidade, raça e etnicidade para vir e cuidar de seus filhos. Esse é um conceito que se transporta e traduz de tantas maneiras.

Helena Fietz: Absolutamente. No seu artigo de 2001 “Enabling disability: rewriting kinship, reimagining citizenship”,6 6 Rapp e Ginsburg (2001). vocês falam do aumento de testes genéticos e tecnologias reprodutivas que trabalham para produzir “bebês perfeitos” e, por outro lado, o surgimento de tecnologias que permitem a inclusão de pessoas com deficiência e a crescente força dos movimentos sociais por incapacidade. Uma situação que vocês chamaram de “duplo telos da modernidade”. Vinte anos depois, esse ele parece mais presente do que nunca. Vocês poderiam falar um pouco mais sobre essa ideia e como ela evoluiu ao longo dos anos?

Faye Ginsburg: De certa forma, essas são questões culturais que perduram. Essa fantasia de uma perfeição e controle científico em oposição ao impulso democratizador da inclusão e ao aumento exponencial dos direitos das pessoas com deficiência e da presença desse público e tudo isso. Nunca falamos sobre isso dessa forma, mas sinto que essa presença é muito mais parte do discurso público do que quando escrevemos sobre isso com base em nossas próprias experiências e uma literatura sobre o tema que estava emergindo. E agora, há muito.

Rayna Rapp: Bem, na verdade, quando começamos a falar sobre deficiência, o que levou ao artigo de 2001, Helena, nós pensamos, bem, esse é um cenário social. Há um mapa que precisamos fazer porque todo mundo tem um diagnóstico para seu próprio filho. Meu segundo filho tem dislexia, e ele foi diagnosticado no contexto escolar e da educação especial. Faye descreveu a situação com Samantha. Todas nós experimentamos isso como indivíduos. E Faye e eu nos olhamos e dissemos: “Não, espere, algo está mudando. A lei mudou, a desinstitucionalização mudou, os direitos civis mudaram.” Nos propusemos a mapear um cenário que não sabíamos que existia. E mais tarde, quando começamos o livro, tendo publicado muitos artigos, podemos dizer: olha, algo mudou e a promulgação do American with Disabilities Act (ADA) em 1990 é um momento crucial para começar a traçar algumas dessas mudanças. Algumas começaram muito mais cedo. A desinstitucionalização começou nas décadas de 1970 e 1980. Mas sem o ativismo que levou ao ADA em 1990, as coisas que estávamos tentando mapear não estariam tão presentes quanto estão, talvez sequer estivessem presentes. E isso se tornou o ponto de ancoragem do livro e para muitas de nossas palestras e artigos subsequentes: entender a história oculta que tem sido revelada, em sua maioria, pelos próprios ativistas/estudiosos deficientes e seus aliados. E há mais por vir. Não sei se as pessoas no Brasil assistiram a Crip camp? Em janeiro de 2020, fomos à sessão de abertura do MoMA Documentary Fortnight e foi surpreendente e maravilhoso. É sobre a história oculta da execução do 504 Act, a Lei de Reabilitação que antecede o ADA. Olhamos uma para a outra e pensamos: por que não conhecemos essa história? Estamos nisso há 20 anos e não sabíamos o que 504 significava até vermos o filme. Ainda há tanta história para ser revelada.

Faye Ginsburg: Eu quero dizer uma outra coisa além da história revelada por Crip camp. Quando minha filha nasceu, acho que um dos primeiros momentos de autorreflexão foi: como é que eu não sei nada sobre deficiência? Essa experiência, que é tão disseminada. São 24% da população dos Estados Unidos. Onde estavam essas pessoas quando eu estava crescendo? Como é que eu não sabia? Então, é claro, você percebe que eles não tinham permissão para ir à escola. Fui para casa e perguntei aos meus pais, eu disse: “Onde estão as crianças com deficiência?” Eu lembro de uma família com a qual celebrávamos os feriados religiosos. Eles tinham um filho com síndrome de Down que foi institucionalizado. Era isso o que a maior parte das pessoas faziam. Meus pais me levavam para caminhar pelo quarteirão onde vivia em Chicago e, literalmente, diziam que aquela criança ficava apenas em casa porque não tinha outro lugar para ir. Ou eles eram mandados embora, ou ficavam trancados em casa. Esse é o tipo de diferença da nossa experiência para as salas de aula em que ensinamos, cheias de alunos pós-ADA que tiveram acesso ao ensino, puderam chegar até a faculdade. Antes não podiam. Eles não podiam nem cursar o ensino médio e agora eles estão em nossas salas de aula, e vêm com visões completamente diferentes sobre a deficiência. Parte disso foi refletir sobre nossa própria história, sobre o quanto era mantido em segredo e a energia cultural despendida para reprimir a realidade da deficiência e o trabalho de cuidadoras, as quais em sua maioria mulheres. Acho que quando escrevemos aquele artigo de 2001, estávamos nos ensinando sobre o que aconteceu. Por que a deficiência foi mantida escondida dessa maneira e estava finalmente sendo revelada? Além disso, havia uma literatura em primeira pessoa que emergia. Rayna pode falar sobre isso.

Rayna Rapp: Eu apenas acrescentaria, como uma nota de rodapé ao que Faye acabou de dizer, que depois que eu publiquei meu artigo na revista Ms. sobre a política de testes genéticos como uma questão feminista, eu fui contatada por uma mãe de uma criança com síndrome de Down, que era uma ativista, e ela disse “bem, você escreve sobre isso, mas você não está certa”. E eu disse, posso aprender com você? Posso ir ao seu grupo de apoio? Ela disse que sim. Então passei anos indo a reuniões de pais com filhos com Down e trabalhando em seu comitê de política educacional, documentando a criação da primeira sala de aula que funcionava em uma escola paroquial católica, assisti como as portas das instituições de ensino para os pais de crianças com síndrome de Down eram fechadas, porque se essas crianças tinham direito a qualquer coisa, eles tinham direito a algo chamado MIS, que é basicamente treinamento de habilidades de vida. Como contar dinheiro ou pegar um metrô, mas ninguém estava dando-lhes qualquer educação. Isso foi no final dos anos 1980. Agora você tem filhos, alguns com Down, que estão em programas universitários. Mas isso é pós-2008, 2010, quando a lei muda novamente, então, é um conjunto contínuo de contradições, tensões, dilemas e movimentos de inclusão democrática para isso. Legislação para isso. Mandatos para isso. Tudo isso continua crescendo ao mesmo tempo que continuam crescendo as ideologias de perfectibilidade por meio da tecnologia e as reivindicações da medicina.

Helena Fietz: No Brasil, não é tão diferente. Nossa Lei Brasileira de Inclusão é de 2015, e, é claro, a Convenção da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, de 2006, teve um grande impacto no país. Ainda assim, há muito da história da deficiência e sobre o movimento social das pessoas com deficiência que é desconhecido e ausente nos debates públicos. Mesmo que muito tenha sido conquistado nos últimos anos, com mais debates públicos sobre o tema e mais direitos conquistados e políticas voltadas para essa população, esse é um trabalho constante com muitos retrocessos. Particularmente no contexto brasileiro atual em que tivemos enormes perdas e há sempre o temor de que virão mais.

Rayna Rapp: Sempre. Então, outra anedota. Acabei de trabalhar com um grupo de artistas deficientes, a maioria com deficiência intelectual, que produziu um filme, um grupo diferente deles faz poesia e outro grupo faz teatro. Mas, de qualquer forma, a maneira como a mulher que organiza o grupo, que é uma gênia como mentora, descreve o que está acontecendo, como ela fala sobre toda a diversidade é que vocês são todos artistas que vivem sob a regulamentação do Medicaid [programa de saúde social dos EUA]. Você está vivendo sob esses estatutos. E ela não vai dizer que você tem uma deficiência intelectual, ela vai deixá-los descrever sua própria neurodivergência, mas ela está dizendo que o que vocês têm em comum é que todos vocês são disciplinados por regulamentos médicos governamentais pelos quais vocês recebem recursos a que têm direito. E, acredite, eles nunca são suficientes. Mas isso também significa que você tem que passar por todas as burocracias e fazer de tudo para fazê-los acreditar que você está seguindo os protocolos, ou você corre o risco de perder seus benefícios.

Faye Ginsburg: Já é ruim quando eles estão na escola e eles têm direitos muito claros que têm que ser colocados em prática muito rapidamente porque, por exemplo, você só tem 10 anos uma vez. Mas as coisas que você precisa fazer quando eles estão fora da escola não são tão fáceis de atingir. Muitas pessoas se referem a isso como o “penhasco da deficiência” [disability cliff].

Rayna Rapp: Isso. Caindo do penhasco. Quando você perde seus benefícios porque não está mais em idade escolar. Na escola, para além de toda burocracia e dos serviços que frequentemente não são muito bons, seus direitos são muito claros. São o resultado de lutas que ocorrem há anos. Enquanto as formas mais novas de benefícios para pessoas com deficiência que deixaram a escola são muito mais opacas.

Faye Ginsburg: E toma muito de seu tempo. Eu tenho meses de papelada atrasada da minha filha. É um trabalho em tempo integral. Há um livro chamado Por conta própria, sem uma rede [On your own without a net], um título que captura isso completamente, o quão difícil é. E as burocracias são feitas para dificultar, com certeza. Eu tenho que te contar uma história engraçada. Eu não acho que nós temos nada disso no livro. Quando a Sam era pequena, havia uma organização chamada Projeto DOCC, criada por três ativistas, mães de crianças com deficiência, cansadas dos médicos não saberem conversar com a criança e com sua família. Fiz o treinamento delas e me tornei voluntária para trabalhar com estudantes de medicina. Uma vez por ano, os voluntários fazem grand rounds com os estudantes de medicina para que ouçam a experiência de famílias, com bebês e crianças muito pequenas com deficiência. Depois, há uma entrevista a domicílio, quando você convida os estudantes para ir a sua casa com outro pai para que você possa contar diferentes versões da mesma história. É muito interessante, muito coreografado. Você tem esses médicos muito jovens sentados em sua sala de estar com a boca aberta e os olhos arregalados. E a ordem é: não limpe a parte do seu apartamento onde você lida com a papelada e a burocracia. Não organize! Diga a eles como é! Diga a eles quanto trabalho dá! Quando fizeram isso pela primeira vez, eu não entendi, mas depois vi que estava completamente certo. É a expressão material disso. Em nosso livro, chamamos isso de mães moxie [moxie moms]. Porque são principalmente mães. Rayna e eu temos essa briga: eu digo, pais e ela, não, Faye, mães.

Rayna Rapp: Eu quero deixar registrado aqui uma saudação ao Fred, marido de Rayna, que sempre foi um pai muito ativo para Sam. Mas na maioria das vezes, como você disse, o peso, tanto representacional quanto prático, recai sobre as mães.

Faye Ginsburg: Estávamos tentando inventar uma palavra que descrevesse essas mulheres. Elas não nasceram ativistas. Elas se tornaram ativistas em razão do desespero e frustração para com a burocracia e com as pessoas que ficavam no seu caminho e que discriminavam seus filhos. Moxie é uma palavra que tem uma derivação mais antiga. Significa ter muita determinação e coragem. Eu a penso como um termo utilizado pelos filmes de detetive dos anos 1930 para descrever as namoradas dos gângsteres.

Rayna Rapp: Essas defensoras ferozes de seus filhos farão qualquer coisa e te socarão na mandíbula se não conseguirem o que precisam para seu filho. É uma mãe moxie. Temos todo um vocabulário que não sabemos o quanto as outras pessoas gostam. Desde duplo telos da modernidade ou a reprodução estratificada da Shelle, mas certamente inclui mães moxie.

Faye Ginsburg: Só para jogar aqui algumas das expressões que têm sido muito úteis para nós.

Rayna Rapp:Novos imáginários do parentesco [new kinship imaginaries].

Faye Ginsburg:Reescrever o parentesco [rewriting of kinship]. A ideia de que as pessoas têm que reimaginar essas relações e suas temporalidades, e as responsabilidades inesperadas que surgem. Nós temos circulado em torno dessa questão. Há muita gente com condições muito difíceis, como minha filha. Não tínhamos adultos com DF quando ela nasceu, a expectativa de vida era de 10 anos. Agora ela tem colegas adultos. Quero dizer, é uma comunidade pequena, é muito raro. E temos pessoas autistas e com síndrome de Down vivendo até a fase adulta. Muitas pessoas, porque viviam em casa e cresceram em um país pós-ADA tiveram acesso à educação. Elas receberam os cuidados adequados. Algumas vezes, as questões de cuidado na disautonomia familiar são muito complexas, mas com tecnologias simples, como tubos de alimentação, as pessoas, que antes não viviam para além dos 10 anos de idade, passaram a sobreviver, por não terem tantas pneumonias. Isso é parte dessa ideia. Essa temporalidade. Nos grupos de pais dos quais eu faço parte, eles vivem aquilo que a antropóloga Pamela Block chama de sobrevivência não planejada de seus filhos até a fase adulta. Algumas conversas expressam o sentimento, que é um tabu, de que eles não querem que seus filhos adultos com deficiência vivam mais do que eles. Porque eles não acreditam que alguém pode cuidar deles do jeito que eles cuidam. Em parte, porque uma vez que a terrível era da institucionalização colapsou, como deveria ter colapsado, não houve uma solução social para essa questão de suporte para adultos com deficiências significativas que estão ficando mais velhos. Essa mudança demográfica não foi prevista e resultou da melhora na assistência médica, na educação, todas essas coisas que trouxeram esse novo tipo de dilema de parentesco para muitas pessoa. Reescrever o parentesco em torno de diferentes temporalidades é diferente ao longo do ciclo de vida.

Helena Fietz: Um aspecto importante disso é, como você disse, ouvir de mães de filhos adultos como elas se preocupam caso morram antes dos filhos, como ouvi cedo em minha pesquisa. Algo que desafia nossos pressupostos sobre mães de filhos adultos.

Rayna Rapp: A primeira vez que ouvi isso, foi uma mãe que falava espanhol no Lower East Side de Nova York. Eu estava na casa dela com seu filho de 20 anos com síndrome de Down e ela disse: “Eu só espero que ele morra antes de mim.” Quando eu repeti isso aos conselheiros genéticos como uma lição, eles viram isso como sendo sobre ela, sobre fatalismo. Eu fiquei com raiva porque eu entendi que ela estava falando sobre a falta de apoio institucional. Ela estava dizendo: ninguém vai cuidar dele, não só porque ninguém vai amá-lo do jeito que eu amo, mas ninguém vai garantir que ele esteja lavado, vestido, saudável, todas essas coisas. Naquele momento, não havia muitas pessoas com síndrome de Down que viviam até a idade dele, e agora essa idade dobrou. Essa é uma diferença dramática na sobrevivência não planejada que está acontecendo com tantas deficiências. E o fato de que cada uma delas ser redescoberta como um problema individual, psicológico, em vez de um problema institucional de prestar cuidados humanos e respeitosos às famílias, bem como ao indivíduo com deficiência, é a dificuldade que persiste.

Faye Ginsburg: Mas é tão interessante como isso surgiu para você, Helena, tão cedo em seu projeto, porque é grandioso e é interessante. Não há muito escrito sobre isso. Estou nas listas de grupos dos pais, listas de e-mails, e as pessoas dizem algo como: “Eu só diria isso neste grupo.” Quero dizer, há um tabu social para dizer algo assim em público, não com uma antropóloga simpática ouvindo você ou um grupo de pais que entende completamente ou Rayna, mas é grandioso. E parece que está em erupção agora porque eu acho que parte disso se deve ao fato de que as crianças podem viver ou viver bem em casa, podem ter acesso à educação. Quero dizer, há tantas camadas nisso.

Helena Fietz: Quero falar um pouco mais sobre essa ideia de reescrever o parentesco e como essas ideias nos levam a focar os aspectos domésticos da deficiência.

Rayna Rapp: Bem, isso implica tudo, desde aprender o caminho para matricular uma criança em uma creche com tratamento de estimulação precoce a talvez pôr rampas em sua casa ou trabalhar com o dono do prédio para ter uma rampa na porta da frente. Pode implicar as coisas sobre as quais temos falado, como a papelada para os benefícios a que seu filho tem direito, porque obter os serviços de que eles precisam será caro. É muito concreto, porcas e parafusos. Mas é muito mais do que isso também. Uma moral ou ética, ou mesmo um tipo de orientação comunitária que diz eu amo essa pessoa, eu valorizo essa pessoa, eu honro essa pessoa, e essa pessoa tem direito a uma vida boa tanto quanto qualquer outra pessoa e o que quer que seja necessário demanda uma quantidade enorme de trabalho. Vou continuar no que parece ser uma tangente, mas prometo que não é, espero que não seja. Há uma conselheira genética maravilhosa chamada Barbara Beisecker. Conversamos sobre sua experiência trabalhando com um grupo de apoio a pais de filhos com síndrome de Down no hospital da Universidade de Michigan, que é onde ela está, e como o grupo a perturbou de maneira positiva. Eles eram incríveis. Todos falaram: eu não tinha ideia que eu tinha isso em mim, mas agora eu sou um feroz defensor do meu filho, eu vou mudar as escolas, eu vou mudar minha igreja ou templo, eu vou mudar o playground local, eu vou mudar qualquer coisa que fique entre meu filho e a chance de ter uma vida absolutamente aceitável e boa. Ela ficou tão impressionada com esses pais que, quando as pessoas recebiam um diagnóstico pré-natal de síndrome de Down na gravidez, ela convidava os membros do grupo de pais para virem conversar com eles. Ela pensou que daria às pessoas a coragem de talvez considerar não fazer um aborto. Só que, na verdade, a conversa teve o efeito oposto. Todos a quem ela apresentou essas famílias decidiram realizar o aborto e disseram que nunca poderiam ser tão fortes ou incrivelmente ativos como esses pais o são. Claro, Barb ficou horrorizada com isso. Porque a mensagem é que você não tem ideia de que você terá que fazer isso e você não tem ideia de que você pode conseguir fazê-lo. Nenhum de nós imagina os desafios em nossas vidas em geral, até que os tenhamos. E esse é um que você não pode imaginar, mas quando isso acontecer, a maioria vai fazer a coisa certa para o seu filho. E é disso que se trata a vida familiar. Parentesco, reescrevendo o parentesco, imaginário, seja lá como você chama isso, é um processo de desenvolvimento. É uma jornada familiar, ou é uma narrativa de vida. Use qualquer cronologia ou tipo de arco de transformação que você quiser, mas não é algo que você pode imaginar até que aconteça. Por outro lado, ter os tipos de recurso que Faye estava falando, ter grupos de pais, ter lugares para ir agora na internet para que você possa obter a informação, é um enorme avanço na tentativa de quebrar o isolamento de sentir como se você tivesse pousado na Lua e não soubesse o que fazer para cuidar desse novo bebê.

Faye Ginsburg: Outro aspecto disso é simplesmente perceber como histórias de parentesco são construídas em torno de temporalidades esperadas. Marcando eventos. Eu acho que a lição mais importante que você aprende cedo é: jogue fora o livro dos marcos do desenvolvimento, porque ele não vai ajudá-la, vai apenas deprimi-la. Você vai ser seu próprio calendário, em sua própria temporalidade. Rayna observou isso em seu livro. Os momentos realmente difíceis são aqueles quando você vai a uma reunião de família e todos estão falando sobre o Bar Mitzvah de seus filhos, ou suas formaturas ou qualquer outra coisa, e você está em uma temporalidade realmente diferente e os resultados são desconhecidos. Alguns de nossos colegas mais jovens nos convidam para chás de bebê e o ritual é cada um contar sua história sobre como foi ter o seu bebê, e eu sempre digo para não perguntarem isso. Eles podem dizer “por favor, por favor!” E você diz “ok, eu avisei”. Então todos ficam muito quietos. Esse é um momento terrível. A rotinização do parentesco significa que você tem que inventar um imaginário diferente para o qual você produza alegria, como você gerencia todas as rotinas domésticas. Meu marido e eu ainda nos levantamos no meio da noite, para ajeitar os aparelhos médicos ou dar os remédios. Eu posso imaginar que as pessoas não querem ouvir que seu filho ainda estará com você aos 32 anos e você vai se levantar à noite, como quando eles eram uma criança. Você não quer ouvir essa parte. Também é muito difícil ser capaz de explicar às pessoas o tipo de alegria existencial que você tem, apenas o reconhecimento e alegria, isso é muito diferente. Vou dizer que as redes sociais fizeram uma enorme diferença. É muito interessante porque é aí que você ouve uma enorme quantidade de apoio.

Rayna Rapp: Isso é um eufemismo.

Faye Ginsburg: É muito interessante. É lá que você escuta uma grande quantidade de apoio. Porque você também faz uma curadoria do mundo social que responde a você. É interessante porque não é necessariamente o mesmo tipo de comunidade em que você vive presencialmente. Você também vive nessas comunidades, mas esse não é o único lugar onde você pode reunir um tipo de mundo social e eu acho que isso tem sido muito importante. Uma das coisas sobre as quais temos escrito é sobre o público de pessoas com deficiência nas artes, como o primeiro movimento foi desenvolver modos para garantir acessibilidade para cegos, surdos, autistas, e pessoas com demência. Existem muitos modos criativos para fazer com que espaços culturais possam ser acessados por essas pessoas. Uma das coisas que são feitas é algo chamado narrativas sociais, que são uma espécie de storyboards com fotografias e pequenos comentários no fundo, destinados especialmente para pessoas com transtornos de ansiedade ou autismo. Eles trazem informações como: “Quando você vem ao Museu, você vai ter que atravessar uma rua muito movimentada e que se parece com esta aqui. Quando você chegar lá, um guarda vai querer olhar em sua bolsa. Ele está lá para ter certeza de que todos estão seguros.” Essas são coisas que a maior parte das pessoas sequer pensam sobre.

Rayna Rapp: Bem, estamos falando sobre não ser capaz de imaginar as trajetórias completas de uma visita a um museu.

Helena Fietz: Isso me leva a outra questão que é essa tensão subjacente entre grupos de pais e grupos cada vez mais presentes no Brasil formados por autodefensores, em especial por pessoas autistas, com síndrome de Down ou deficiência intelectual. Vocês encontraram essa tensão no seu trabalho?

Faye Ginsburg: Essa tensão é também histórica.

Rayna Rapp: Nas décadas de 1930 e 1940, os pais contrários à institucionalização se sentiam muito isolados, muito sozinhos, e eram muito estigmatizados. Algumas famílias tinham muitos recursos e começam a se reunir e falar sobre o que seria necessário para que seus filhos prosperassem e sobrevivessem sem colocá-los em instituições. Sem escondê-los. Esse movimento, o movimento dos pais, foi uma espécie de história oculta por um longo tempo. Após a desinstitucionalização, na década de 1970 até os anos 1980, que pelo menos nos EUA foi um momento importante, algumas pessoas com deficiência voltam a suas comunidades, algumas passam a crescer em suas famílias, escolas, templos religiosos, e começam a assumir esse protagonismo no movimento pelos direitos das pessoas com deficiência. Há um tipo extremo de antagonismo que acontece entre alguns pais e algumas pessoas em organizações de autistas, no início dos anos 1990, porque os pais ainda estão falando pelos jovens adultos que querem falar por si. O estereótipo é que os pais querem curar e os autistas querem serviços e aceitação para serem quem eles são, não uma maneira de corrigi-los ou mudá-los. Esse é um conjunto de tensões. Mas há muitos lugares onde pessoas com deficiência se tornam líderes e para muitos pais isso é um grande alívio, ver seus filhos terem uma vida tão plena em que eles são ativistas para si mesmos e para os outros. Eles podem admirar seu trabalho com seus filhos e com as organizações que talvez eles tenham iniciado se transformarem em algo muito mais apropriado para o momento presente.

Faye Ginsburg: Em nossa pesquisa não há muito essa tensão. Minha filha falava em público desde os 10 anos e agora ela não quer mais fazê-lo. Nós temos um grande Dia Internacional da Disautonomia, e ela não quer ir. Ela está cansada de falar sobre isso. Isso muda ao longo do ciclo de vida. Uma das coisas que eu me lembro é como, quando fizemos pesquisa com os primeiros grupos de pais, eles colocavam um anúncio no jornal para encontrar outras pessoas. Com Bernie Rimland, autista, as pessoas tiravam a última página de seu livro sobre autismo e escreviam para ele. É fascinante como a gente desconsidera o quanto as redes sociais facilitaram as coisas. Mas os impulsos eram semelhantes. É claro, tentar localizar outras pessoas que pensassem parecido e que dissessem “nós precisamos mudar isso”.

Rayna Rapp: Voltamos à sobrevivência não planejada. Mais e mais pessoas estão vivendo com deficiência até a idade adulta, e depois na meia-idade e na velhice. Se você voltar para os anos 1970 e 1980, a expectativa de vida de uma pessoa com Down era algo entre 10 e 15 anos. Agora, as pessoas estão vivendo entre 40 e 50 anos. À medida que essas trajetórias mudam, o que significa que as possibilidades de autorrepresentação são muito diferentes agora do que eram naquele período que Faye estava descrevendo para você, nos anos 1940 e 1950, quando essas crianças não eram susceptíveis de sobreviver sem que seus pais se tornassem seus ferozes defensores. E esse é um momento muito diferente do que agora. Escrevemos que a antropologia está atrasada para se sentar à mesa. Rosemary Garland-Thompson, que é uma das grandes intelectuais da deficiência, escreveu um artigo em 2013 chamado “Disability studies: a field emerged” [ “Estudos de deficiência: um campo que existe” ]. Ou seja, não é um campo emergente, ele está aqui e isso é muito importante. Tem uma história e um legado que refletem a mudança dos direitos da deficiência no nível individual para a Justiça Defiça [Disability Justice] no nível social. Mas a antropologia tem chegado muito tarde à mesa. E podemos fazer muitas perguntas sobre o porquê. Estamos muito contentes que mais uma vez a Wenner-Gren Foundation apoiou nosso trabalho e uma conferência internacional que realizamos em um local com acessibilidade para todes.

Faye Ginsburg: Quando escrevemos o ensaio “Disability worlds”,7 7 Ginsburg e Rapp (2013). para a Annual Review of Anthropology, o nosso objetivo era reapresentar a literatura. Houve esses trabalhos muito importantes, mas demorou um pouco para que as pessoas pensassem sobre a deficiência enquanto um tópico significativo para a antropologia. Mesmo que a deficiência seja, como argumentamos nesse artigo, a forma mais fundamental de diferença humana no planeta que é compartilhada em todos os lugares. Uma de nossas teorias tem sido que muitas pessoas são atraídas pela antropologia porque parece que você deve ser muito intrépido e aventureiro, por isso ela é um tanto capacitista, de muitas maneiras, seja no Brasil ou nos EUA ou onde quer que esteja localizada. Por cerca de cinco anos, tivemos como objetivo mostrar para as pessoas nas reuniões anuais da AAA que a deficiência é uma questão incrivelmente excitante intelectualmente para pensarmos sobre. Tantos temas centrais para a antropologia, como parentesco, ciclo de vida, temporalidade, estratificação, tantas coisas que precisam ser abordadas. Não sei se estamos dando conta de fazer isso.

Helena Fietz: No Brasil, o primeiro grupo de trabalho sobre deficiência na Reunião Brasileira de Antropologia (RBA) aconteceu em 2014, organizado por Adriana Dias, que é uma estudiosa da e com deficiência, e desde então ela e outras pessoas como Anahí Guedes de Mello, que também é antropóloga e uma mulher com deficiência, têm sido pioneiras nesse campo de antropologia da deficiência no Brasil, reunindo cada vez mais antropólogos de diferentes departamentos, formando comitês para promover mais acessibilidade em universidades e eventos.

Faye Ginsburg: Vemos isso a cada geração. As pessoas cresceram com uma atmosfera muito mais rica sobre a deficiência. As pessoas estão experimentando e entendendo seu valor.

Helena Fietz: Eu sei que como mães de pessoas com deficiência, vocês estiveram engajadas com o ativismo ao longo dos anos. Eu estava me perguntando sobre como suas experiências como ativistas impactam suas pesquisas e, por outro lado, como seus trabalhos acadêmicos têm afetado seus ativismos e, por que não, práticas maternas?

Rayna Rapp: Estamos falando desse modo durante esse tempo todo.

Faye Ginsburg: Acho que eu fui ativista antes de me tornar uma estudiosa. Como em muitas pesquisas feministas, é difícil descolar os estudos de outras formas de conhecimento e, certamente, ativismo e ativistas são uma parte disso. Há tantos insights que eu nunca teria tido se não fosse mãe. Por causa do Teo, Rayna tornou-se muito ativa em um grupo incrível chamado Eye to Eye, de pessoas com dislexia e outras deficiências [learning disabilities]. Meu grande momento “eureca” foi sobre a transição de seus direitos escolares e de educação para os da idade adulta. Por que eu estava correndo por aí tentando descobrir onde eu encontro essa transição para a minha filha? Encontrei um relatório, apresentado por um grupo de ativistas, chamado Transitioning to nowhere. Você se lembra disso, certo, Rayna? Eu andei pelo corredor até o seu escritório, tipo: “Eu não estou louca! Não existe nada mesmo!”

Rayna Rapp: E eu vou dizer outra coisa, que é que nós duas estávamos interessadas em ativismo social e ação social muito antes de nos interessarmos pelas questões da reprodução e da deficiência. Certamente, Faye está descrevendo um período específico e o ativismo mudou desde então. Eu fiz parte dessa geração que criou o women’s studies, um projeto muito utópico. Nós pensamos que teríamos solidariedade e irmandade com todas as funcionárias da cozinha de nossas universidades. Como se fosse assim, certo? Mas women’s studies tornaram-se gender studies, depois sexuality and gender studies, depois estudos LBGTQ, estudos de interseccionalidade, e assim por diante. São décadas de trabalho por parte de muitos ativistas. Acho que nós duas crescemos com isso e com a sensação de que não há problema em não saber. Isso é parte do que Faye está falando, ser uma ativista antes e enquanto você é uma acadêmica. Você admite que só entende parte do mundo e que precisa entender outras coisas se quiser intervir e provocar uma mudança efetiva. E essa é uma orientação bastante diferente. Antigamente, e eu estou falando de anos antes da Faye começar a vida acadêmica, a suposição era que a academia era diferente. E que, ainda que você tivesse uma crítica sobre a objetividade ou objetivismo, não era o mesmo do que deixar essas questões sobre intervenção ativa e mudança entrarem em sua pesquisa. Essas coisas foram se desenvolvendo em nossas vidas individuais, e continuam a se desenvolver na vida de nossos alunos, e nunca é fácil. E o que quer que eles estejam enfrentando é um pouco diferente do que enfrentamos.

Faye Ginsburg: Eu vou dizer que eu acho que onde essas coisas se juntaram foi na criação de algo dentro da universidade. Uma das coisas que conseguimos fazer foi criar o Center for Disability Studies na NYU. Isso nos permitiu desenvolver uma presença na cidade junto a ativistas da/com deficiência. Tem sido ótimo para nós podermos usar nossa posição acadêmica para mostrar trabalhos, artistas e ativistas com deficiência. Ser capaz de construir algo assim é outro tipo de ativismo. Esse é um tipo de privilégio, podermos usar a universidade para construir esse trabalho em colaboração com as pessoas ao nosso redor. Na verdade, uma das coisas que nós esperamos desenvolver é uma espécie de projeto de arquivo para documentar a vida de pessoas que foram ativistas fundantes do Movimento pelos Direitos das Pessoas com Deficiência e o Movimento de Arte Defiça [Disability Arts Movement]. Muitos estão com 70 anos ou mais e vivem em Nova York. Eles querem nos dar seus registros e nós queremos realizar entrevistas com eles e criar um arquivo para futuros estudiosos. Essa tem sido uma forma interessante, de certo modo inesperada, pela qual nos engajamos em quebrar as barreiras entre a universidade e a cidade e o movimento das pessoas com deficiência ao nosso redor.

Helena Fietz: Para finalizar, voltando ao livro que vocês acabaram de escrever, mais de 30 anos após o início de sua parceria, vocês acham que seus cursos de vida como mães, ativistas e estudiosas afetaram como vocês pensaram sobre ele?

Faye Ginsburg: A resposta simples é sim. Nós pensamos tantas vezes que deveríamos ter escrito este livro dez anos atrás, mas é um livro muito diferente pelo que aprendemos sobre coisas como sobrevivência não planejada ou a arte defiça, por exemplo.

Rayna Rapp: Novas mobilizações políticas das organizações explicitamente por e para pessoas com deficiência surgiram. Todo o cenário que tentávamos mapear há 20 anos expandiu-se muito em complexidade. Isso é fabuloso e muito inspirador, mas ficar a par de tudo isso pode ser um tanto quanto desesperador. Há tanta coisa acontecendo. E o livro tenta alcançar tudo isso.

Faye Ginsburg: Eu diria também que nossa posicionalidade é complicada; nós somos não deficientes [abled-bodied], mas profundamente conectadas por parentesco, por sermos mães de filhos adultos com deficiência. Nós não tivemos essa conversa especificamente. Contudo, nós organizamos muitas coisas, convidamos tantas pessoas, construímos um Centro de Estudos sobre Deficiência, apoiamos alunos, ajudamos a conscientizar uma fundação sobre a necessidade de dar financiamento para isso. Não somos perfeitas, longe disso, mas acho que as pessoas respeitam o fato de nos esforçarmos para fazer as coisas acontecerem para as pessoas com deficiência.

Rayna Rapp: Claro, como você disse, esse é o privilégio de estar em uma universidade, você tem recursos. Então, conseguimos fazer um monte de coisas diferentes acontecerem em momentos diferentes.

Faye Ginsburg: Outras questões surgiram durante a pandemia. Por exemplo, muitas atividades passaram a acontecer online e muitas pessoas estão nos ligando e pedindo ajuda com questões de acessibilidade. Uma das pessoas que trabalham conosco, o ativista-acadêmico Kevin Gotkin, chama isso de “doulas da acessibilidade”. Adoro essa expressão, porque é exatamente isso. Não sei se Kevin inventou essa expressão ou se trouxe de outro lugar, mas é interessante. Como você dá à luz um mundo amigável à deficiência?

Helena Fietz: Eu quero agradecer muito a vocês. É muito bom vê-las novamente, e poder falar com vocês. Ler seus trabalhos pela primeira vez foi quase como “ah, não, elas estão fazendo isso há 20 anos, talvez eu devesse tentar outra coisa”. Mas à medida que a pesquisa progrediu, pensei “tá, acho que ainda tem espaço, ainda tem mais coisa para desenvolver nessas questões”. E essa entrevista deixou ainda mais evidente como realmente esse é um “campo que existe”, mas que a gente pode seguir agregando a ele.

Rayna Rapp: Há tanto espaço, e é tão encorajador para nós, sentir que somos parte de um movimento internacional interessado na política e intersecções entre reprodução e deficiência. Então, obrigada por seu interesse.

References

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    24 Out 2022
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2022

Histórico

  • Recebido
    29 Abr 2022
  • Aceito
    30 Maio 2022
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