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A dança no cinema: da lógica dos musicais à irracionalidade de gestos desmotivados1 1 Este artigo resulta de uma pesquisa que recebeu apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), processo: 2021/12417-0.

Dance in cinema: between the logic of musicals and the irrationality of unmotivated gestures

Resumo

Por meio de uma análise panorâmica da presença da dança no cinema, desde os primórdios até a produção contemporânea, percebemos que ela pode emergir ora como parte integrante e estruturante do filme, no gênero musical, ora como um elemento contrastante e disruptivo, em filmes não musicais. Ao esboçarmos uma estética da movimentação dos corpos em obras audiovisuais, partimos do pressuposto de que o cinema sonoro de certo modo silencia a dinâmica corporal na tela ao concentrar seu foco na fala e no sentido das palavras, eliminando ou reduzindo consideravelmente toda a potência (plástica, mas também semântica) contida na incrível retórica expressiva dos corpos. Será que a dança, abrigo natural de certa pulsão gestual irracional, pode servir, como propunha Béla Balázs, para que sejamos atingidos por um filme de maneira direta e inequívoca, como se fosse uma música?

Palavras-chave
cinema e dança; cinema musical; Béla Balázs; Jean-Luc Godard

Abstract

Through a panoramic analysis of the presence of dance in cinema, from the beginning to the contemporary production, we realize that it can emerge sometimes as an integral and structuring part of the film, in the musical genre, and sometimes as a contrasting and disruptive element, in non-musical films. While sketching an aesthetic of corporeal movements in audiovisual works, we assume that sound cinema, in a way, silences the body dynamics on the screen, by focusing on speech and the meaning of words, eliminating or considerably reducing all the visual and semantic powers contained in the incredible expressive rhetoric of bodies. Can dance, the natural shelter of a certain irrational gestural impulse, serve, as Béla Balázs proposed, to make us be affected by a film in a direct and unequivocal way, as if it were music?

Keywords
film and dance; musical films; Béla Balázs; Jean-Luc Godard

No final do século XIX, o cinema finalmente solucionaria, pelo menos até certo ponto, um problema que assombrava a dança desde sempre: como conservar ou eternizar uma arte que encontra na efemeridade uma de suas características primordiais? De fato, houve inúmeras tentativas de reter obras coreográficas através do tempo com o auxílio de desenhos, pinturas, notações ou fotografias. Porém, em todos esses casos, ficava de fora algo tão essencial para a dança quanto o som para a música: sua mobilidade. Somente com o advento do cinema e suas imagens em movimento tornou-se possível registrar momentos vivos da dança em sua dinâmica natural, incluindo seus desdobramentos, nuances e pausas provisórias. Ficavam para trás as imagens congeladas ofertadas até então pela pintura e pela fotografia — cujos movimentos eram, quando muito, apenas sugeridos por meio de contorções, borrões, profusões de traços, figuras desfocadas ou superposições —, em favor de outras que conseguiam dar vazão à fluidez das formas e à progressão temporal próprias da arte coreográfica — que, assim como a música e o cinema, trabalha na duração.

Contudo, outro problema surgia então, este mais afeito à natureza do próprio cinema: aquilo que se vê na tela não é exatamente a dança dos palcos e da vida, mas rastros de sua existência, como fantasmas de luz que repetem sem cessar movimentos agora mortos, passados, esquecidos. Assim, esses registros fílmicos vinham, a um só tempo, perpetuar e deturpar a dança — uma vez que, a fim de resguardar seu aspecto movente, eles acabavam por sacrificar sua natureza efêmera. O que nos leva a crer que não se trata, nesse caso, da dança propriamente dita, mas de seu registro, sua representação ou sua transmutação, pelo cinema, em outra coisa: um amálgama de momentos congelados e movimentos revividos que só se torna possível graças ao aspecto comum que ambos, cinema e dança, compartilham. Ou seja, a manipulação expressiva do movimento, ora de maneira mais intuitiva e selvagem, ora de modo mais esquemático e controlado.

Já em 1894, nos primeiros anos de existência do cinema, William Dickson registrava para Thomas Edison a pioneira Ruth St. Denis dançando ao ar livre com uma longa saia e a jovem Annabelle Moore executando sua Dança da borboleta. Em 1896, Georges Méliès filmaria a então célebre Loie Fuller executando sua Dança serpentina — número que seria registrado no mesmo ano pelos irmãos Lumière com uma dançarina não identificada e por Alice Guy, em 1897, com a dançarina Bob Walter. Em 1903, Edwin Porter incluiria uma longa cena de dança em seu filme O grande roubo do trem, para a mesma companhia de Edison, enquanto uma dançarina exótica, conhecida pela alcunha de Princesa Rajah, seria eternizada em 1904 por A.E. Weed, para a companhia American Mutoscope and Biograph, executando uma espécie de dança do ventre, durante a qual balançava e sustentava no alto, com os próprios dentes, uma cadeira.

Esses e outros exemplos iniciais tinham em comum o fato de que a dança aparecia em total coesão com a lógica do chamado primeiro cinema, ou seja, como uma atração ofertada ao olhar do espectador de maneira frontal, como no teatro de variedades, pois não é a câmera que se move, e sim as dançarinas diante dela. Logo, toda a complexidade da coreografia e das possíveis interações entre os corpos representados e a câmera era desprezada em favor de uma absoluta concentração no seu aspecto espetacular mais superficial. Como observa Elizabeth Kendall:

Tanto o cinema quanto a dança, nos Estados Unidos, foram concebidos por seus criadores a partir de um profundo senso de continuidade rítmica. [...] os filmes fizeram surgir uma linguagem particularmente americana, consciente do movimento, moderna e fluida. Ela incluía a dança. As cenas de dança conseguiam controlar o ritmo e o andamento, ao aludir a emblemáticos estados mentais modernos [...] A utilização da dança em filmes silenciosos garantia-lhe um lugar na consciência da nação, mas custava-lhe a própria identidade. Os filmes tornavam a dança uma presença, um estado de espírito, em lugar de uma arte coreográfica com regras [e, logo,] diretores de cinema com incrível intuição para o movimento [...] empregaram a dança para seus próprios fins.

(KENDALL apud BROOKS, 2002BROOKS, V. From Méliès to streaming video: a century of moving dance images. In: MITOMA, J. (ed.), Envisioning dance: on film and video. Londres, Nova York: Routledge, 2002. p. 54-60., p. 55, tradução nossa).

Assim, a dança parecia funcionar, nos primórdios do cinema, muito mais como um elemento catalisador no interior dos planos — conferindo dinamismo a imagens que ainda tendiam a mimetizar a cena teatral clássica com certa fixidez e limitações espaciais e de movimento - do que como uma forma de arte autônoma, podendo contribuir com suas singularidades e contribuições específicas. Ela servia, então, de adorno visual e gatilho emocional para as imagens silenciosas, algo semelhante ao que ocorreria com a música após o advento do cinema sonoro. Mas isso não impedia que, na ausência de som e de mobilidade da câmera, a dança conseguisse, de certo modo, assegurar um maior preenchimento espacial do quadro graças a figuras que por vezes davam as costas à câmera - em um giro ou em uma ciranda, por exemplo - ou se lançavam em direções e posições pouco usuais, ocupando áreas do quadro fílmico - como as diagonais enviesadas ou as laterais ― normalmente negligenciadas pelos personagens não dançantes das narrativas cinematográficas. Ou seja, a dança conseguia, num duplo movimento, inspirar, impulsionar, dinamizar as imagens ainda demasiado estáticas do cinema silencioso, mas também ampliar a configuração do espaço fílmico, tornando-o mais complexo e multifacetado.

Esse último aspecto será percebido com maior clareza um pouco mais tarde, quando D. W. Griffith convida Ruth St. Denis para coreografar dançarinos de sua escola no segmento babilônico de Intolerância (1916), no qual movimentos coordenados de grua e carrinho conferem uma dinâmica particular, e bastante inovadora para a época, à relação entre os dançarinos e a câmera — que sobe e desce em um elevador posicionado sobre um vagão de trem que, por sua vez, avança e recua sobre trilhos. Esses planos, ainda hoje impressionantes, exigiam do espectador a tarefa inabitual de varrer toda a extensão da tela com o olhar a fim de apreciar, de uma só vez, alguns dos detalhes arquitetônicos do monumental palácio, além da multidão espalhada pelo cenário em diferentes ações e agrupamentos, alguns deles efetuando uma dança nos degraus e na base da larga escadaria. A possível dispersão do olhar em meio a essa profusão de elementos em quadro seria em parte suprimida pelo magnetismo exercido pelos movimentos coreografados dos dançarinos combinados à condução proposta pela movimentação da câmera e pelo ritmo da montagem.

Cerca de uma década mais tarde, na sequência de dança da androide Maria, em Metrópolis (1927), em lugar de planos abertos e cenários ostensivos com multidões, Fritz Lang opta por planos fechados em um ou poucos personagens que se encontram em cenários claustrofóbicos e sombrios, contribuindo assim para o destaque dado à enigmática figura que parece emergir das profundezas, inicialmente como um ser de luz. Dois elementos ressaltam nessa sequência: por um lado, os efeitos visuais (retroiluminação, fusões e sobreposições) e, por outro, uma montagem eletrizante, ambos servindo para intensificar tanto o frenesi dos movimentos da dança quanto seu efeito hipnótico sobre os homens que compõem a elite local — reduzidos, em dado momento, a uma série de olhos preenchendo a tela. Contudo, tanto no filme de Lang quanto no de Griffith a dança aparece ainda como um elemento pontual, excepcional e até certo ponto alheio às estruturas narrativas em jogo nessas obras, diferindo de outros filmes do período silencioso que já encontravam na dança seu principal foco de atenção e, por essa razão, trocavam uma trama linear por uma sucessão de movimentos abstratos mais condizentes com o universo da dança.

Esse é o caso de Oramunde (1933), curta-metragem realizado pelo artista plástico Emlen Etting em um cenário natural de floresta e rochedos à beira- mar, no qual uma misteriosa e solitária figura inteiramente envolta em um longo véu branco dança em diálogo com o mar e com a paisagem que a rodeia. O filme propõe uma espécie de meditação sobre a personagem algo fantasmagórica que erra por entre árvores, cavernas, rochas, relva e névoa, até que a desolação da paisagem — que reflete a própria desolação da personagem com rasgos em seu véu, cujas pontas prendem-se de quando em quando às pedras — pareça guiá-la até as margens de um lago, onde ela embarca em uma canoa conduzida por uma figura masculina encapuzada. Esse corpo sem rosto, cuja silhueta tem a extensão do véu que porta, conta menos a história de uma personagem literária ou teatral do que a trajetória de uma forma vertical - e às vezes contorcida - que desfila ou desliza pela horizontalidade da paisagem e pelos planos do filme.

Figuras 1 e 2
Fotogramas de Oramunde.

Um traço comum à maioria dos exemplos de representação da dança, nas primeiras décadas do cinema, é a quase total ausência do balé clássico contraposta à presença predominante da dança moderna - que raramente cede lugar a danças populares ou folclóricas. O que atesta a vocação moderna do cinema, fruto dos avanços tecnológicos do final do século XIX, que não apenas reproduzia de modo mais frequente e desenvolto a movimentação intensa e inquieta das grandes cidades por onde passava e o cotidiano banal das pessoas comuns, temas caros aos pintores impressionistas, como também se identificava, no campo das artes, muito mais com as vanguardas do que com suas vertentes mais clássicas, inclusive na dança. Ou seja, o cinema surgia, por assim dizer, assumindo-se como um contemporâneo de Paul Cézanne, Auguste Renoir e Édouard Manet, mas também de Isadora Duncan, Loie Fuller e Ruth St. Denis.

Figuras 3
Les joueurs de cartes (1890-92), de Paul Cézanne.2 2 Disponível em: <www.metmuseum.org/pt/art/collection/search/435868>. Acesso em: 29 nov. 2022.
Figuras 4
Fotograma de Partie d’écarté (1896) dos irmãos Lumière.

Béla Balázs destacou, em um texto de 1924, a incrível capacidade desse novo meio expressivo, o cinema, de se comunicar com o espectador de maneira direta, assim como a música, sem a necessidade de uma mediação:

O movimento expressivo, o gesto, é a língua materna inerente à raça humana. Apenas começamos a lembrar e a reaprender essa língua. Ela ainda é desajeitada, primitiva e muito distante dos refinamentos da arte da palavra. Contudo, já começa a ser capaz de às vezes expressar coisas que escapam aos artistas do verbo. Quanto do pensamento humano permaneceria sem expressão se não tivéssemos a música! A agora emergente arte das expressões faciais e dos gestos trará igualmente à superfície conteúdos submersos. Embora essas experiências humanas não partam de conteúdos racionais, conceituais, nem por isso são vagas ou borradas, mas claras e inequívocas como a música. Assim, o homem interior também ficará visível [...] Quando negligenciarmos o corpo como meio expressivo, perderemos mais do que o mero poder corporal de expressão.

(BALÁZS, 1952BALÁZS, B. Theory of the film. Londres: Dennis Dobson, 1952., p. 42, tradução nossa).

Alguns pontos chamam a atenção nesse prognóstico: 1º) a ênfase dada aos gestos ou movimentos expressivos em detrimento da palavra (em relação a filmes do período silencioso que dispensariam, por exemplo, a necessidade de cartelas explicativas); 2º) a aproximação entre o cinema, por causa desses mesmos gestos corpóreos, e a música (sem nenhuma alusão à dança) graças a seu caráter imediato e instintivo, pelo qual a emoção predomina sobre a razão; 3º) a revelação de uma interioridade humana invisível, que seria tornada visível no cinema por meio do corpo, sendo este tomado como meio de expressão a não ser negligenciado. Sabemos, no entanto, que a total adesão do cinema de cunho mais comercial à sonorização de filmes e salas de exibição, a partir do final dos anos 1920, naturalmente reservará tanto à palavra o papel central na condução da narrativa quanto à verborragia dos personagens a ação predominante no interior de tramas movidas por uma lógica racional de causa e efeito. Por isso, o corpo como meio de expressão que extrapola o visível pelo viés de certa irracionalidade (ou pelo menos da não funcionalidade) dos gestos — descolado, portanto, da palavra tomada de um caráter mais racionalizante — só conseguirá emergir em obras que se abram, ainda que por breves instantes, ao inesperado de uma ação, de um gesto desmotivado, descompromissado, insensato, estilizado. A dança, abrigo natural desse tipo de pulsão gestual, aparecerá no cinema como uma potente válvula de escape, sinalizando aquilo que almejava Balázs: que sejamos atingidos, tomados por um filme de maneira clara, direta e inequívoca, como se fosse uma música.

A lógica (ilógica) dos musicais

O registro sobretudo neutro, distanciado e estático da dança, oferecido inicialmente pelo primeiro cinema, foi se tornando cada vez mais estilizado com o avanço das décadas seguintes. Essa estilização cristalizou-se rapidamente com o gênero musical hollywoodiano, que se caracterizava, via de regra, por uma narrativa linear pontuada, de quando em quando, por números musicais, que, por sua vez, podiam ser apenas dançados ou também cantados.4 4 Jerome Delamater (1981, p. 16) distingue os filmes musicais que enfatizavam o canto — às vezes em detrimento da dança, inspirados pelas operetas e tendendo a ser mais empostados e nostálgicos de um passado romântico — daqueles que privilegiavam a dança — derivados do teatro de revista e das comédias musicais, sendo, portanto, mais leves, rápidos e modernos. O núcleo narrativo, não raro, apresentava um caráter metalinguístico, já que boa parte dos filmes tratava da montagem de um espetáculo para os palcos ou para as telas - o que justificava, pelo menos em parte, as irrupções de números musicais mirabolantes que, de outro modo, destoavam drasticamente do realismo predominante no restante das obras. Esses musicais de bastidores conseguiam, assim, a façanha de integrar os números musicais de maneira mais orgânica ao restante da narrativa, ao mesmo tempo que as canções e as danças faziam a trama avançar - o que acabaria contribuindo, de algum modo, para a própria “evolução da dança como código cinematográfico” (DELAMATER, 1981DELAMATER, J. Dance in the Hollywood musical. Ann Arbor, Londres: UMI Research Press, 1981., p. 17, tradução nossa). As primeiras produções do gênero, ainda no final dos anos 1920, satisfaziam suas necessidades atraindo cantores, dançarinos e atores da Broadway para reproduzir suas performances teatrais a fim de serem filmadas por uma câmera fixa, situada na posição da plateia - o que esgotaria muito rapidamente o entusiasmo de um público ávido por algo diferente daquilo que se podia ver nos teatros nova-iorquinos.5 5 “[...] 1929 foi o primeiro ano em que muitos filmes realmente musicais foram lançados, e The Blue Book of Hollywood Musicals lista 52 em cartaz naquele ano. Em 1930 foram lançados 67, mas em 1931, apenas 17” (DELAMATER, 1981, p. 17). Surge, então, a necessidade de fazer algo diferente, algo que só o cinema poderia oferecer com recursos próprios e profissionais mais afeitos a esse meio de produção, com técnica e estética específicas.

O gênero musical alcançou seu apogeu em Hollywood entre as décadas de 1930 e 1950, tornando célebres nomes como Busby Berkeley, por suas coreografias extravagantes e visualmente impressionantes, ou Fred Astaire, Ginger Rogers, Gene Kelly e Cyd Charisse, por suas performances virtuosísticas. No caso de Berkeley, a experiência adquirida ao coordenar centenas de soldados em treinamentos coreografados durante a Primeira Guerra Mundial o levaria a coreografar musicais na Broadway, ainda nos anos 1920, antes de dirigir sequências de dança em musicais de sucesso em Hollywood nos anos 1930, passando rapidamente a dirigir os próprios filmes. Embora não viesse do meio cinematográfico, e até mesmo por essa razão, Berkeley não hesitou em quebrar as convenções da época6 6 Por exemplo, em vez de filmar uma cena musical com grande número de pessoas usando três ou quatro câmeras para que os planos fossem selecionados mais tarde, na montagem, como era de praxe, ele o fazia com apenas uma câmera, pois, em suas próprias palavras, “minha ideia era preparar cada plano e montar na câmera” (apud DELAMATER, 1981, p. 30). , inovando ao realizar cenas extremamente complexas com procedimentos originais e adotando posicionamentos, ângulos e movimentos de câmera inusitados (do alto, de baixo, invertendo o sentido do fluxo das imagens etc.).7 7 “Logo percebi que no teatro seus olhos podem ir aonde você quiser, mas no cinema a única maneira de entreter a plateia é através do olho singular da câmera. Mas com esse olho singular eu conseguia chegar aonde eu quisesse. Você não encontraria nenhum dos meus sets em um palco de verdade [...]” (apud DELAMATER, 1981, p. 29-30). Berkeley notabilizou-se pelo excesso de preciosismo e exuberância em números musicais que, apesar de inspirados diretamente pelo teatro de revista - com verdadeiros exércitos de bailarinas e envolvendo escadarias, passarelas, plataformas giratórias e mesmo ambientes aquáticos -, eram concebidos como verdadeiros espetáculos para as telas, capazes de atingir a abstração gráfica quando filmados do alto e “tendendo a privilegiar a experiência visual em detrimento da expressão corporal” (DODDS, 2001DODDS, S. Dance on screen: genres and media from Hollywood to experimental art. Nova York: Palgrave Macmillan, 2001., p. 6, tradução nossa). Nesse sentido, pode-se afirmar, concordando com Delamater (1981, p. 27)DELAMATER, J. Dance in the Hollywood musical. Ann Arbor, Londres: UMI Research Press, 1981., que Berkeley contribuiu menos para a dança em si do que para o uso estético do movimento nos filmes musicais, em particular, e no cinema, de modo geral.

O efeito caleidoscópico obtido pelas tomadas aéreas de Berkeley, sua marca registrada, pode ser conferido, por exemplo, na famosa sequência que acompanha a canção By a waterfall no filme Belezas em revista (1933), durante a qual dezenas de bailarinas anônimas realizam impressionantes acrobacias em piscinas e tobogãs, abstraindo completamente o suposto palco de um teatro. A evidente objetificação dos corpos,8 8 Para uma crítica feminista dessa objetificação dos corpos femininos nas coreografias de Busby Berkeley, ver: FISCHER, 1981. que se tornam pouco mais do que peças num grande tabuleiro, é nuançada, contudo, por outro traço distintivo de Berkeley: os travellings que, vez por outra, fazem desfilar em close os rostos sorridentes das bailarinas, talvez numa tentativa, ainda que vã, de individualizá-las.9 9 Convém aqui lembrarmos da análise aguda de Siegfried Kracauer sobre o espetáculo de uma companhia estadunidense de teatro de revista, cuja estética aparece como fruto perverso do sistema capitalista no ensaio “O ornamento da massa” (1927): “Este produto das fábricas americanas de distração já não é mais constituído por garotas individuais, mas por complexos indissolúveis de garotas, cujos movimentos são demonstrações matemáticas” (KRACAUER, 2009, p. 92).

Figuras 5 e 6
Fotogramas de Belezas em revista.

Fred Astaire, por outro lado, notabilizou-se pela individualização do dançarino com sua capacidade de executar verdadeiras façanhas com aparência de uma facilidade extrema, graças a um estilo despojado, gracioso e em sintonia com o banal, o cotidiano e o ambiente à sua volta, tal como sugeriu Gilda de Mello e Souza:

A estética de Fred Astaire, ao contrário da estética do balé tradicional, não pressupõe estruturas fechadas, incomunicáveis, diversas das formas do mundo exterior. Aqui, o bailarino não se destaca em nada do que o circunda, não se diferencia na vestimenta, na gesticulação, na dinâmica corporal, na relação com os objetos, que são os do cotidiano: sapatos, bengala, instrumentos de orquestra, mobiliário, além das divisões do espaço do quarto, da sala, do parque, do navio. [...] [Astaire] reduz o corpo a um suporte do gesto, não mobilizando em nenhum momento a beleza muscular, a plástica corporal, como fazem o balé clássico e Gene Kelly. [...] Ele é o grande dançarino da vida moderna. [...] Fred Astaire não pretende vencer a gravidade. [...] Poderíamos dizer que, quando há o salto, é como se não houvessem as pernas, pois o que apreendemos é o arabesco das abas da casaca em pleno voo, a nitidez gráfica do desenho, o preto no branco. [...] gesto puro, graça pura, arte pura, libertando-se dos cacoetes da mocidade para se tornar na dança um desenhista, um dançarino gráfico, puro arabesco sem cor.

(MELLO, SOUZA, 2005MELLO E SOUZA, G. de. Notas sobre Fred Astaire. In: A ideia e o figurado. São Paulo: Duas Cidades, Editora 34, 2005. p. 171-177., p. 171-177).

Eis uma descrição que aponta novamente para o fato de a dança aparecer, no cinema, como instrumento de poética visual: dessa vez, no uso do corpo como um pincel a desenhar formas no ar. Porém, ao contrário da estilização exuberante de Busby Berkeley - exacerbada pelas tomadas aéreas dos agrupamentos de dançarinas e pela profusão de planos reunidos em uma montagem de atrações de tirar o fôlego -, Astaire atém-se ao uso quase sistemático do plano-sequência como modo de privilegiar a fluidez do fraseado coreográfico e a integridade do corpo do dançarino. Na cena ao som da canção Night and day de A alegre divorciada (1934), por exemplo, Fred Astaire e Ginger Rogers partem de movimentos e gestos triviais que, aos poucos, vão se transmutando em dança. Contudo, a coreografia que acompanha a cena é filmada sempre a uma distância ideal para que os corpos dos atores- dançarinos se mantenham inteiramente em quadro, a fim de evitar qualquer intervenção maior por parte do cinema.10 10 Exceto por dois planos discretamente captados de posições inusitadas: um através de uma janela com a persiana entreaberta e o outro por debaixo de uma mesinha lateral. Ao contrário, o resultado remete mais à exacerbação de um sentido de teatralidade - reforçado, em grande parte, pela frontalidade da câmera em relação a esses corpos vistos em sua integralidade -, ancorado na ideia do performer como autor.11 11 Tal como sugere Delamater (1981, p. 51-52): “A série de filmes com Astaire-Rogers configura um exemplo de uma possível teoria do performer como autor, já que cada obra é dominada pelo estilo de suas estrelas. As narrativas, as canções e os ritmos visuais parecem resultar diretamente de seus pés ligeiros e de suas personas tranquilas. Cada um dos filmes é, consequentemente, semelhante aos demais, sendo uma variação das fórmulas dos filmes precedentes”.

Figura 7
O corpo como pincel em fotograma de A alegre divorciada.

Mas, enquanto Fred Astaire contentava-se em ser apenas a estrela que dança,12 12 Embora interferisse, com certa frequência e sem ser creditado, tanto nas coreografias quanto no arranjo das músicas. Gene Kelly, por sua vez, não só dançava, cantava e atuava como também coreografava e dirigia vários dos filmes nos quais aparecia. De formação esportiva, seu corpo atlético contrastava com a figura franzina de Astaire, além de também destoar do estilo aristocrático deste último (que frequentemente vestia terno, fraque ou smoking e cartola) ao adotar roupas casuais e um estilo mais sensual e despojado, atraindo assim a identificação por parte de pessoas comuns. Ao estabelecer analogias com as artes plásticas, Kelly encarava o cinema e a dança como artes, a priori, incompatíveis:

Parece haver um equívoco comum de que a dança e o cinema seriam adequados um ao outro... mas eles não são. A dança é uma forma de arte tridimensional, enquanto o cinema é bidimensional. Eu compararia a dança à escultura e o cinema à pintura. Portanto, as dificuldades que encontramos ao transferir uma dança para o cinema são simplesmente as mesmas de inserir uma forma de arte tridimensional em uma tela bidimensional.

(KELLY apud JOHNSON, 1956JOHNSON, A. The tenth muse in San Francisco – 4. In: Sight and sound, n. 26, p. 46-47, 1956., p. 46-47, tradução nossa).

A fim de enfrentar tamanho desafio, seu trabalho consistirá em buscar, progressivamente e como um princípio regente, uma coreografia totalizante do filme, ou seja, não apenas integrando os números musicais de maneira orgânica à narrativa realista que os emoldura, como se brotassem naturalmente dela, mas sobretudo ao coreografar a totalidade do mundo pró-fílmico para o aparato cinematográfico: a movimentação dos atores (dançando ou não), da câmera, dos objetos no cenário e dos planos na montagem (ver DELAMATER, 1981DELAMATER, J. Dance in the Hollywood musical. Ann Arbor, Londres: UMI Research Press, 1981., p. 163-164). Nesse sentido, Kelly explorará de maneira eclética os vários recursos tanto cinematográficos - por exemplo, ao evitar que a câmera se mova na mesma velocidade que os atores, neutralizando assim nossa percepção dos movimentos, ou ao enfatizar a ilusão de profundidade espacial - quanto coreográficos — indo do sapateado à dança moderna e ao jazz, passando pelo balé clássico e pelas danças populares e de salão -, além de empregar seu corpo como uma espécie de cinzel que se propõe a entalhar a bidimensionalidade da tela de cinema com sua dança escultórica.

Algo que se pode constatar, por exemplo, na sequência de abertura de Sinfonia de Paris (1951), quando o protagonista, até então apenas ouvido pelo espectador na narração de Kelly, é finalmente visto em seu minúsculo quarto parisiense. Ao levantar-se, ele inicia uma série de ações físicas coordenadas com precisão, usando todo o seu corpo para transformar o quarto em sala para o café da manhã: suspendendo a cama até o teto com o auxílio de cordas, girando, puxando e empurrando móveis e utensílios domésticos com as mãos e com os pés, tendo à boca um croissant. Apesar de não haver uma dança propriamente dita, fica evidente a coreografia de gestos, aliada a sutis movimentos de câmera, utilizada na reconfiguração do espaço em um plano sem cortes, em um verdadeiro trabalho de escultor de imagens. Outros exemplos aparecem em Cantando na chuva (1952): seja partindo de situações cotidianas — como na famosa cena com o guarda-chuva, em que ele chuta e corta as poças d’água com os pés, tendo por cúmplice a destreza da câmera e dos cortes — ou mesmo beirando o fantástico e a abstração — como na cena com Cyd Charisse e seu longo véu branco esvoaçante, que, movido pelo vento, dispara, qual lâmina diáfana e fluida, rasgando o amplo e profundo espaço púrpura nas várias direções, enquanto vela e desvela alternadamente o corpo do casal.

Figura 8
O corpo como cinzel em fotograma de Cantando na chuva.

Ao esboçarmos aqui, ainda que de maneira extremamente concisa, uma estética da movimentação dos corpos em obras audiovisuais, partimos do pressuposto de que o cinema sonoro de certo modo silencia a dinâmica corporal na tela — típica dos filmes burlescos de Mack Sennet, Charlie Chaplin e Buster Keaton, por exemplo — ao concentrar seu foco na fala e no sentido das palavras, eliminando ou reduzindo consideravelmente toda a potência (plástica, mas também semântica) contida na incrível retórica expressiva dos corpos, como bem notara Béla Balázs. Algo que os filmes musicais, por exemplo, com corpos inquietos e quebras no fluxo narrativo pela eclosão de números de dança, de certo modo recuperarão, ainda que apenas em momentos privilegiados. Martin Sutton esclarece:

O número funciona [assim] como uma interrupção narrativa, uma tangente fantástica que, ao mesmo tempo, frustra e libera o espectador [...] da crescente tensão entre trama realista e número espetacular [...] essas forças contraditórias localizadas, por um lado, no protagonista e nos números (liberdade) e, por outro lado, nas estratégias reconciliatórias e convencionais do roteiro (inibição).

(SUTTON, 1981SUTTON, M. Patterns of meaning in the musical. In: Altman, R. (ed.). Genre: the musical. Londres, Boston, Henley: Routledge & Kegan Paul, 1981. p. 190-196., p. 191, tradução nossa).

Cabe salientar que, para Sutton, o protagonista do filme musical é “um personagem em conflito com o ambiente que o cerca e sua natureza estática” (SUTTON, 1981SUTTON, M. Patterns of meaning in the musical. In: Altman, R. (ed.). Genre: the musical. Londres, Boston, Henley: Routledge & Kegan Paul, 1981. p. 190-196., p. 193). É notória essa característica contrastante do musical clássico, que o autor aproximará da psicanálise freudiana ao chamar a trama convencional e previsível de superego do texto fílmico, sujeito a uma ética definida socialmente, enquanto o número musical, ao proporcionar aos personagens (e ao espectador) “uma oportunidade de exercitar a imaginação e a liberdade pessoal”, funcionaria como o id do filme, um momento de desregramento e subversão.

Em um artigo de 1965, Allegra Fuller Snyder classifica os filmes de dança em três categorias: coreocinema - que resulta de uma interação mais profunda e efetiva entre o coreógrafo/dançarino e o operador de câmera/montador —, filmes como notação - que servem para fins de reconstituição de performances - e filmes documentais - com apelo mais popular na divulgação da dança (ver SNYDER, 1965SNYDER, A. F. Three kinds of dance film: a welcome clarification. In: Dance Magazine, v. 39, n. 9, p. 34-39, set. 1965,., p. 34-39). Os musicais tenderiam a se encaixar, em certa medida, na terceira categoria proposta pela autora, já que, embora sejam sempre filmes de ficção com momentos reservados para a espetacularização da dança, não deixam de configurar um registro, até certo ponto documental, das performances dos dançarinos. Ou seja, trata-se ainda, geralmente, da dança sendo registrada com pouca ou nenhuma intervenção do aparato cinematográfico, que, quando percebido, não chega a interferir de maneira relevante em sua manifestação — não podendo, portanto, ser categorizado como aquilo que Snyder denomina coreocinema.

Uma exceção pontual encontra-se no filme Amor sublime amor (1961), quando Maria, uma imigrante porto-riquenha, prepara-se para ir a seu primeiro baile nos Estados Unidos: depois de provar e aprovar o vestido branco de rendas com faixa vermelha na cintura, reforçando ao irmão a importância daquela noite, ela começa a girar com os braços abertos, simulando uma dança, até que sua figura se transforma gradualmente em uma mancha abstrata vermelha desfocada sobre fundo preto, rapidamente acompanhada por outras manchas igualmente vermelhas e rodopiantes, as quais vão se tornando, pouco a pouco, as pessoas que dançam no baile. Numa transição de cenas totalmente inabitual no cinema clássico hollywoodiano, flertando claramente com o cinema experimental, vemos, ainda que apenas por alguns segundos, uma dança de manchas e formas abstratas que muito pouco ou nada se assemelha ao restante do filme, às cenas clássicas de musicais ou a uma dança vista ao vivo.

Figuras 9 e 10
Fotogramas de Amor sublime amor.

A irracionalidade dos gestos desmotivados

No entanto, nem toda dança que aparece nos filmes se encaixa na lógica do gênero musical, seja ele hollywoodiano ou indiano. Existem danças ocasionais que despontam de maneira previsível e facilmente justificável no interior de narrativas convencionais, em total coesão com o mundo diegético da obra: em festas e feiras, bailes de formatura ou da terceira idade, boates, encontros românticos à luz de velas ou à luz da lua etc. Mas há, por outro lado, danças raras que eclodem de forma nada ordinária em filmes não musicais, a partir de uma curiosa poética de gestos desmotivados que não se justificam de modo plausível dentro da lógica narrativa dessas obras, surgindo antes como aparições disruptivas, arroubos súbitos e passageiros. É como se um sopro colocasse determinada personagem em movimento, sem razão aparente nem aviso prévio, seguindo uma lógica mais pulsional do que racional.

É o que ocorre, por exemplo, no filme Plataforma (2000), quando a personagem Yin Ruijuan, que trabalha como coletora de impostos na prefeitura de sua cidade, encontra-se de pé em seu escritório, absorta pela tarefa de regar uma planta ou organizar papéis, até ser súbita e progressivamente tomada pela canção romântica que começa a tocar no rádio. Inicialmente, ela apenas esboça um leve balanço do corpo de um lado para o outro, segurando alguns papéis que, em seguida, larga sobre a mesa a fim de passar, ainda que timidamente, ao espaço mais amplo do escritório, no qual se deixa embalar e conduzir pela melodia, expandindo aos poucos os pequenos movimentos e gestos até atingir o êxtase com piruetas e braços ao alto. A aparição repentina de uma dança tão graciosa quanto enérgica em meio ao comedimento da personagem e à sisudez de um ambiente altamente burocrático - sem falar na atitude sisuda da própria câmera, que se mantém fixa e distante ao longo de um plano que dura cerca de 3 minutos -, surpreende o espectador com a força de uma explosão. A cena é prolongada pela música, que estabelece uma ponte sonora, agora de forma não diegética, com dois planos complementares, ambos filmados em ambientes externos e em movimento: o primeiro, em travelling para trás, mostra a personagem, agora uniformizada, conduzindo sua motocicleta pelas ruas da cidade, enquanto o segundo, em travelling para a frente, acompanha a partida de seu companheiro de trupe teatral na caçamba de uma caminhonete. Como ressalta Cecília Mello:

A sequência é coreografada e transcorre entre diferentes pontos de vista, ao permitir que a individualidade de Ruijuan emerja através de sua dança, e ao reunir o casal infeliz em dois travellings conectados pelo som diegético e extradiegético. Ela resume, enfim, por meio do uso intermidiático da música pop pelo cinema, a tensão entre mobilidade e imobilidade, liberdade e repressão, o litoral e o interior, o antigo e o novo e, em última instância, entre o “nós” do comunismo e o “eu” da nova China

(MELLO, 2019MELLO, C. Pop music’s sonic memories. In: The cinema of Jia Zhangke: realism and memory in Chinese film. Londres, Nova York: Bloomsbury, 2019. p. 81-112., p. 97, tradução nossa).
Figuras 11, 12, 13 e 14
Fotogramas de Plataforma.

Esse encadeamento de movimentos conectados pela canção é motivado, de fato, pela dança da personagem no escritório, cujo gestual expansivo e livremente coreografado consegue, de certo modo, contagiar tanto a câmera quanto os deslocamentos das personagens nos dois planos seguintes. Algo semelhante ocorre no filme Sangue ruim (1986), mas em uma linha completamente distinta, já que se trata de um filme que, ao contrário de Plataforma, evita ao máximo o realismo ao carregar nas cores primárias e na forte estilização do conjunto de elementos que o compõem — do jogo dos atores aos cenários, dos (des)enquadramentos aos efeitos de montagem, dos gestos ternos àqueles violentos, das situações inverossímeis àquelas de uma poesia arrebatadora —, a fim de criar uma espécie de pastiche do gênero noir hollywoodiano por meio de um verdadeiro duelo formal entre, de um lado, a imposição obsessivamente racional e geometrizante (imóvel) do espaço e, de outro, a liberação gradual e desestabilizante (agitada) dos corpos em cena. O ápice desse duelo salta aos olhos particularmente em dois momentos: primeiro, na sequência noturna em que o personagem Alex, acompanhado pela canção Modern love e por uma câmera em disparado travelling lateral, lança-se em uma performance que mescla dor física abdominal a um andar claudicante, culminando em uma corrida convulsiva que acelera progressivamente ao longo da rua, pela calçada, ultrapassando sem cessar diferentes superfícies de fundo, que vão se tornando, uma após a outra, tão dinâmicas e cambiáveis quanto ele próprio — numa espécie de subversão da célebre grade cronofotográfica de Eadweard Muybridge, a qual servia justamente como baliza imóvel para os corpos que se moviam diante dela.

Figuras 15 e 16
Fotogramas de Sangue Ruim
Figuras 17
Woman dancing (fancy) (prancha 187 de Animal locomotion, 1887), de Muybridge.

Mais adiante no filme, algo desse efeito subversivo e potente — tanto por sua forma surpreendente e frenética quanto pela falta de um sentido racional ou de motivação narrativa — será reiterado pela cena final, quando a personagem Anna põe-se a correr desesperadamente na pista de decolagem de um aeroporto, após a morte de Alex, inicialmente acompanhada por seu amante Marc e pelo ruído de seus passos no asfalto (em um travelling lateral, seguido de plongée em grua), passando gradualmente a ocupar sozinha um plano frontal (em travelling para trás, seguido de contra-plongée), ao som de um trecho da Simple symphony (1934), de Benjamin Britten, no qual ela sorri, tocando a mancha de sangue de seu amado sobre a bochecha direita antes de estender os braços contra um céu cinzento, como um pássaro pairando em pleno voo, até que não apenas as linhas de sua blusa começam a vibrar, mas seu corpo inteiro — em parte, graças a uma manipulação na velocidade da imagem —, atingindo uma espécie de êxtase figural, em estado de pura instabilidade.

Figuras 18 e 19
Fotogramas de Sangue Ruim.

Esses exemplos ilustram, quase à perfeição, a meditação de Béla Balázs, previamente citada, na medida em que: 1º) enfatizam os gestos ou movimentos expressivos em detrimento da palavra; 2º) aproximam o cinema da música ao substituir uma razão causal narrativa por gestos a princípio desmotivados e sem sentido, cooptando o espectador diretamente pela emoção; 3º) revelam uma interioridade invisível das personagens que só se torna visível por intermédio do corpo, tomado então como meio de expressão de pleno direito, e graças ao aparato cinematográfico. Não à toa, em suas “Notas sobre o gesto”, Giorgio Agamben considera:

Se a dança é um gesto, é antes porque nada mais é do que a resistência e a exibição do caráter midiático dos movimentos corporais. O gesto é a exibição de uma medialidade, o tornar visível um meio como tal [...] assim, no gesto, é a esfera não de um fim em si, mas de uma medialidade pura e sem fim que se comunica aos homens. [...] O gesto é, nesse sentido, comunicação de uma comunicabilidade. Este não tem propriamente nada a dizer, porque aquilo que mostra é o ser-na-linguagem do homem como pura medialidade. Mas, assim como o ser-na-linguagem não é algo que possa ser dito em proposições, o gesto é, na sua essência, sempre gesto de não se entender na linguagem, é sempre gag no sentido próprio do termo, que indica, antes de tudo, algo que se coloca na boca para impedir a palavra, e também a improvisação do ator para superar uma falha de memória ou uma impossibilidade de falar. [...] O “mutismo” essencial do cinema (que não tem nada a ver com a presença ou ausência de banda sonora) é, como o mutismo da filosofia, exposição do ser-na-linguagem do homem: gestualidade pura.

(AGAMBEN, 2008AGAMBEN, G. Notas sobre o gesto. In: Artefilosofia, v. 3, n. 4, p. 13-14, 2008. Disponível em: <https://periodicos.ufop.br/raf/article/view/731>. Acesso em: 14 dez. 2022.
https://periodicos.ufop.br/raf/article/v...
, p. 13-14).

O cinema de Jean-Luc Godard, por exemplo, é atravessado, desde sempre, pela dança ou por lampejos de uma espécie de gestualidade pura. Mas essa presença, embora constante, ocorre com enormes variações: ela aparece primeiramente como simples articulação do movimento em motor da narrativa, mas pode se manifestar igualmente ao situar no gesto dos atores a mola propulsora do próprio movimento da câmera, da montagem e, enfim, do cinema. Na cena final de Acossado (1960) - na qual o personagem Michel Poiccard corre pela rua de maneira cambaleante, simulando o tiro que teria levado nas costas -, Godard já parece dialogar com a dança de seu tempo, uma dança que, como sustenta John Carnahan (2014)CARNAHAN, J. Jean-Luc Godard and contemporary dance: the Judson Dance Theater runs across Breathless. In: MORREY, D. et aliii (eds.). The legacies of Jean-Luc Godard. Waterloo: Wilfrid Laurier University Press, 2014. p. 37-49., aproxima-se muito daquela empreendida pelos dançarinos contemporâneos do Judson Dance Theater, de Nova York, ao aliar, e às vezes fazer equivaler, movimentos ordinários (antiespetaculares) e gestos voltados para a realização de tarefas banais (task-based) a referências consagradas, seja de posturas clássicas da dança, seja de ícones do cinema clássico.14 14 Nesse sentido, é particularmente interessante a comparação que o autor propõe (p. 37-43) entre Acossado e Trio A (1966), de Yvonne Rainer, no que diz respeito à não exclusão de referências externas: ao balé clássico, à dança afro-cubana, a Martha Graham e Merce Cunningham, no caso de Rainer; e aos filmes policiais americanos e a Humphrey Bogart, no caso de Godard. Desde seu primeiro longa, portanto, Godard parece basear a estruturação da cena (sua mise-en-scène) menos em ditames narrativos do que na expressão proporcionada pelo movimento, conforme sua declaração à revista Cahiers du cinéma:

Fiz apenas uma descoberta no cinema: como fazer para passar tranquilamente de um plano a outro partindo de dois movimentos diferentes, ou ainda, o que é mais difícil, de um plano em movimento a outro, estático. Eis algo que quase ninguém faz porque nunca pensam nisso; mas deve-se simplesmente retomar o movimento deixado pelo final do plano anterior. Desse modo, pode-se ligar um plano a qualquer outro; pode-se cortar de um carro a uma bicicleta, ou de um crocodilo a uma maçã, por exemplo. Se uma cena é montada formalmente [...] a partir daquilo que se encontra apenas na imagem, o significante e não o significado, deve-se esperar o momento em que a pessoa ou a coisa em movimento é coberta por outra ou a cruza, para só então mudar de plano. Senão, percebe-se o pulo. [...] Descobri essa técnica em Acossado e a tenho aplicado sistematicamente desde então.

(GODARD in BONTEMPS et aliii, 1967BONTEMPS, J. et aliii. Lutter Sur Deux Fronts: Conversation avec Jean-Luc Godard. In: Cahiers du cinéma, n. 194, p. 12-26, 66-70, out. 1967. Disponível em: <https://issuu.com/thallesmartins/docs/cahiers_du_cinema_-_1960-1968/310>. Acesso em: 14 dez. 2022.
https://issuu.com/thallesmartins/docs/ca...
, p. 16, tradução nossa).

Talvez por isso percebemos, ao longo de sua vasta filmografia, a constante predominância de uma disposição muito mais coreográfica do que teatral das cenas, nas quais a montagem, tão cara a seu cinema, é considerada em estreita relação com o que aparece nos planos, e não com um câmbio de ideias externas às imagens - como costumava ser o caso, por exemplo, em Eisenstein ou Rossellini. A respeito dessa postura godardiana de engajamento com o movimento, mais do que com a narrativa, Carnahan observa:

Como em coreografia, o movimento é a matéria-prima: um desenvolvimento ou uma fase do movimento é sua unidade; e o esquema visual, sua moldura. [...] Quando é o movimento que define o plano, o performer pode se comprometer com o movimento como um dançarino, e não como um ator que corre em direção à marca na qual será dita sua fala.

(CARNAHAN, 2014CARNAHAN, J. Jean-Luc Godard and contemporary dance: the Judson Dance Theater runs across Breathless. In: MORREY, D. et aliii (eds.). The legacies of Jean-Luc Godard. Waterloo: Wilfrid Laurier University Press, 2014. p. 37-49., p. 42, tradução nossa).

Não espanta, portanto, que o filme Uma mulher casada (1964) comece com um desfile de fragmentos dos corpos de uma mulher e seu amante - sobretudo pernas e mãos, mas também nucas e rostos -, ritmados pela montagem por meio de um balé de gestos afetuosos e da cadência criada por fragmentos musicais e fades para tela preta, havendo pouco ou nenhum raccord entre um plano e outro. Pois o universo diegético dos filmes de Godard parece respeitar não as leis da física, mas uma lógica (algo frankensteiniana) de desmembramentos e conjugações de fragmentos que dançam de acordo com o ritmo contido nas imagens, de um lado, e engendrado pela montagem, de outro. No caso desse filme, como o próprio artigo indefinido do título indica, o cineasta nos presenteia com fragmentos de corpos anônimos - de uma mulher e de um homem - em sua intimidade de pessoas quaisquer, genéricas, que ainda não conhecemos como personagens. Nesse misterioso jogo de corpos, que se coloca de certo modo entre a exterioridade (visível) dos atores e a interioridade (elusiva) das personagens, ficaríamos certamente relegados ao lado de fora, estrangeiros à obra e aos seres que a habitam - assim como sugere o amante na sequência inicial: “É como uma casa na qual nunca se entra” -, não fosse a inevitável emoção provocada pela gestualidade despropositada da cena.

Figura 20
Fotogramas de Uma mulher casada.
Figura 21
Fotogramas de Hand Movie. (1966, dir. Yvonne Rainer).

Se o cinema possui uma natureza coreográfica oculta ou pouco explorada, os filmes de Godard encontram-se entre as melhores provas disso. Seja, por exemplo, na impressionante sequência de Paixão (1982) em que personagens extraídos de diversas telas de Goya desfilam lado a lado em um estúdio, executando poses e gestos em uma mise-en-scène que confere não apenas tridimensionalidade e movimento aos originais pictóricos mas também, e sobretudo, contiguidade espacial, já que as várias telas atravessam-se, umas às outras, por meio do cinema. Ou ainda na maneira como ele dispõe os atores à beira de um lago em Infelizmente para mim (1993), num travelling lateral em que a câmera se vê imantada ao longo barco que atravessa a cena, no fundo do quadro, enquanto as personagens virtualmente imóveis compõem uma espécie de tableau vivant, limitando-se a poses hieráticas e a micromovimentos de olhos e cabeça.

De fato, não se costuma seguir uma história em Godard, mas a movimentação - e, por que não dizer?, a dança - de corpos, de planos e da própria câmera. Daí talvez o tédio e a confusão que inspiram vários de seus filmes, mas também o caráter lírico, epifânico que acompanha tantas cenas. Pois, diferentemente do balé clássico, que segundo ele “busca a imobilidade no movimento”, o repouso do gesto em seus filmes, como aliás no cinema em geral, “em vez de ser o ponto de chegada, é o ponto de partida do movimento” (GODARD, 1958GODARD, J. L. Voyez comme on danse. In: Cahiers du cinéma, n. 85, p. 49-51, jul. 1958., p. 51, tradução nossa). O gesto em Godard assume, talvez mais do que em qualquer outro cineasta depois de Chaplin e Eisenstein, o caráter de gestus brechtiano, pois ele é quase sempre físico, e não psicológico ou metafísico. É o que se percebe, particularmente, em dois momentos de Salve-se quem puder (a vida) (1980): primeiramente, na sequência da inusitada máquina sexual, da qual participa a prostituta Isabelle, e na cena em que Paul se lança de maneira abrupta sobre a desavisada Denise, que se encontrava sentada à mesa da cozinha, arrastando-a violentamente ao chão, junto com toda a louça, numa espécie de abraço mortal em câmera lenta. Vemos que, em seus filmes, e particularmente naqueles a partir deste último, mais que os atores e os corpos, é o cinema inteiro que dança: em acordes verdadeiramente coreografados entre os seres, as coisas, a luz, as sombras, as lentes, as vozes, os fragmentos musicais, os grafismos, os planos, as nuvens, o mar, as máquinas de filmar, a manipulação da velocidade, o fazer e o desfazer sucessivo das sobreposições e das incrustações de imagens, até o ponto em que se delega ao próprio espectador, em Adeus à linguagem (2014), ainda que por apenas alguns instantes e graças ao uso incomum que se faz do 3D, a escolha da imagem a ser vista ao se abrir ou fechar o olho esquerdo ou direito.

  • 1
    Este artigo resulta de uma pesquisa que recebeu apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), processo: 2021/12417-0.
  • 2
    Disponível em: <www.metmuseum.org/pt/art/collection/search/435868>. Acesso em: 29 nov. 2022.
  • 3
    Disponível em: catalogue-lumiere.com/partie-decarte/. Acesso em: 29 nov. 2022.
  • 4
    Jerome Delamater (1981, p. 16)DELAMATER, J. Dance in the Hollywood musical. Ann Arbor, Londres: UMI Research Press, 1981. distingue os filmes musicais que enfatizavam o canto — às vezes em detrimento da dança, inspirados pelas operetas e tendendo a ser mais empostados e nostálgicos de um passado romântico — daqueles que privilegiavam a dança — derivados do teatro de revista e das comédias musicais, sendo, portanto, mais leves, rápidos e modernos.
  • 5
    “[...] 1929 foi o primeiro ano em que muitos filmes realmente musicais foram lançados, e The Blue Book of Hollywood Musicals lista 52 em cartaz naquele ano. Em 1930 foram lançados 67, mas em 1931, apenas 17” (DELAMATER, 1981DELAMATER, J. Dance in the Hollywood musical. Ann Arbor, Londres: UMI Research Press, 1981., p. 17).
  • 6
    Por exemplo, em vez de filmar uma cena musical com grande número de pessoas usando três ou quatro câmeras para que os planos fossem selecionados mais tarde, na montagem, como era de praxe, ele o fazia com apenas uma câmera, pois, em suas próprias palavras, “minha ideia era preparar cada plano e montar na câmera” (apud DELAMATER, 1981DELAMATER, J. Dance in the Hollywood musical. Ann Arbor, Londres: UMI Research Press, 1981., p. 30).
  • 7
    “Logo percebi que no teatro seus olhos podem ir aonde você quiser, mas no cinema a única maneira de entreter a plateia é através do olho singular da câmera. Mas com esse olho singular eu conseguia chegar aonde eu quisesse. Você não encontraria nenhum dos meus sets em um palco de verdade [...]” (apud DELAMATER, 1981DELAMATER, J. Dance in the Hollywood musical. Ann Arbor, Londres: UMI Research Press, 1981., p. 29-30).
  • 8
    Para uma crítica feminista dessa objetificação dos corpos femininos nas coreografias de Busby Berkeley, ver: FISCHER, 1981FISCHER, L. The image of woman as image: the optical politics of Dames. In: ALTMAN, R. (ed.). Genre: the musical. Londres, Boston, Henley: Routledge & Kegan Paul, 1981. p. 70-84..
  • 9
    Convém aqui lembrarmos da análise aguda de Siegfried Kracauer sobre o espetáculo de uma companhia estadunidense de teatro de revista, cuja estética aparece como fruto perverso do sistema capitalista no ensaio “O ornamento da massa” (1927): “Este produto das fábricas americanas de distração já não é mais constituído por garotas individuais, mas por complexos indissolúveis de garotas, cujos movimentos são demonstrações matemáticas” (KRACAUER, 2009KRACAUER, S. O ornamento da massa: ensaios. São Paulo: Cosac Naify, 2009., p. 92).
  • 10
    Exceto por dois planos discretamente captados de posições inusitadas: um através de uma janela com a persiana entreaberta e o outro por debaixo de uma mesinha lateral.
  • 11
    Tal como sugere Delamater (1981, p. 51-52): “A série de filmes com Astaire-Rogers configura um exemplo de uma possível teoria do performer como autor, já que cada obra é dominada pelo estilo de suas estrelas. As narrativas, as canções e os ritmos visuais parecem resultar diretamente de seus pés ligeiros e de suas personas tranquilas. Cada um dos filmes é, consequentemente, semelhante aos demais, sendo uma variação das fórmulas dos filmes precedentes”.
  • 12
    Embora interferisse, com certa frequência e sem ser creditado, tanto nas coreografias quanto no arranjo das músicas.
  • 13
    Disponíveis em: <www.moma.org/collection/works/44243>. Acesso em: 29 nov. 2022.
  • 14
    Nesse sentido, é particularmente interessante a comparação que o autor propõe (p. 37-43) entre Acossado e Trio A (1966), de Yvonne Rainer, no que diz respeito à não exclusão de referências externas: ao balé clássico, à dança afro-cubana, a Martha Graham e Merce Cunningham, no caso de Rainer; e aos filmes policiais americanos e a Humphrey Bogart, no caso de Godard.
  • 15
    Disponível em: <www.moma.org/collection/works/125928>. Acesso em: 29 nov. 2022.

Referências

  • AGAMBEN, G. Notas sobre o gesto. In: Artefilosofia, v. 3, n. 4, p. 13-14, 2008. Disponível em: <https://periodicos.ufop.br/raf/article/view/731>. Acesso em: 14 dez. 2022.
    » https://periodicos.ufop.br/raf/article/view/731
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  • BONTEMPS, J. et aliii Lutter Sur Deux Fronts: Conversation avec Jean-Luc Godard. In: Cahiers du cinéma, n. 194, p. 12-26, 66-70, out. 1967. Disponível em: <https://issuu.com/thallesmartins/docs/cahiers_du_cinema_-_1960-1968/310>. Acesso em: 14 dez. 2022.
    » https://issuu.com/thallesmartins/docs/cahiers_du_cinema_-_1960-1968/310
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Maio 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    19 Set 2022
  • Aceito
    12 Dez 2022
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