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Estabilidade dinâmica de pessoas com AVE durante o movimento de cabeceio simulado em um jogo digital

Estabilidad dinámica de personas con ACV durante el movimiento de cabeceo simulado en un juego digital

RESUMO

A estabilidade postural é um objetivo de tratamento na fisioterapia que pode ser alcançado por meio de exercícios de transferência de peso bilateral. Os jogos digitais surgem como alternativa para execução desses exercícios, mas sua avaliação ainda necessita de aprimoramento. Propõe-se aqui o uso de variáveis biomecânicas para verificar o comportamento da estabilidade postural dinâmica durante um movimento de cabeceio, simulado por um jogo digital com diferentes exigências de velocidades. Para isso, 16 voluntários pós-acidente vascular encefálico (AVE) - 12 homens e 4 mulheres, com idade média de 56 anos - e 16 hígidos pareados por sexo e idade participaram da coleta experimental, na qual eles foram submetidos ao jogo digital “cabeceio”, que tem cinco níveis de velocidade, do mais lento ao mais rápido, com duração de 30 segundos cada. A partir dos sinais cinemáticos foi possível calcular os indicadores de interesse, a área da base de suporte e a margem de estabilidade, definida como a menor distância entre as bordas da base de suporte e a projeção vertical do centro de massa (CM) extrapolado, que considera a velocidade do CM. Os valores da base de suporte não apresentaram diferenças entre os níveis de velocidade do jogo, mas sim entre grupos. A margem de estabilidade não diferiu entre níveis e grupos. Os níveis de velocidade do jogo, possivelmente, não estimularam os voluntários a buscar estratégias diferentes para manter a estabilidade, como dar um passo, mas os fizeram adotar bases de suporte diferentes, sendo que indivíduos com AVE adotaram uma base de suporte menor do que a dos hígidos.

Descritores:
AVC; Postura; Reabilitação; Equilíbrio Postural; Jogos de Vídeo

RESUMEN

La estabilidad postural es el objetivo del tratamiento en fisioterapia que puede lograrse mediante ejercicios de traslado de peso bilateral. Los juegos digitales son una alternativa para realizar estos ejercicios, pero aún necesita mejorar su evaluación. Se propone el uso de variables biomecánicas para verificar el comportamiento de estabilidad postural dinámica durante el movimiento de cabeceo, simulado por un juego digital con diferentes requerimientos de velocidad. Para ello, 16 voluntarios pos-accidente cerebrovascular (ACV) -12 hombres y 4 mujeres, con edad media de 56 años- y 16 individuos sanos pareados por sexo y edad participaron de la recolección experimental, en la que fueron sometidos al juego digital “cabeceo”, que cuenta con cinco niveles de velocidad, del más lento al más rápido, con una duración de 30 segundos cada uno. A partir de las señales cinemáticas fue posible calcular los indicadores de interés, el área de base de apoyo y el margen de estabilidad, definido como la menor distancia entre los bordes de la base de apoyo y la proyección vertical del centro de masa (CM) extrapolado, que considera la velocidad del CM. Los valores de la base de apoyo no mostraron diferencias entre niveles de velocidad de juego, pero sí entre grupos. El margen de estabilidad no difirió entre niveles y grupos. Los niveles de velocidad de juego posiblemente no animaron a los voluntarios a buscar diferentes estrategias para mantener la estabilidad, como dar un paso, pero les hicieron adoptar diferentes bases de apoyo, llevando a los individuos con ACV a emplear una base de apoyo menor que la de los individuos sanos.

Palabras clave:
ACV; Postura; Rehabilitación; Equilibrio Postural; Juegos de Video

ABSTRACT

Postural stability is a goal of physical therapy treatment which can be achieved by bilateral weight transfer exercises. Digital games come as an alternative to performing these exercises, and their evaluation still needs improvement. We proposed using biomechanical variables to assess postural stability behavior. We aimed to investigate dynamic postural stability during soccer headers simulated by a digital game with different speed requirements. For this, 16 post-stroke volunteers (12 men and 4 women with a mean age of 56 years) and 16 healthy volunteers, paired by sex and age, participated in the experimental collection, in which they were subjected to the digital game “Cabeceio” (Soccer Heading), which has five speed levels, from slowest to the fastest, lasting 30 seconds each. From the kinematic signals, we could estimate our indicators of interest: the area of the base of support and the margin of stability, the latter defined as the smallest distance between the edges of the base of support and the vertical projection of the extrapolated CM, considering CM speed. The values of the base of support failed to differ between game speed levels, but did so between groups. The margin of stability failed to differ between levels and groups. The speed levels of the game possibly failed to encourage volunteers to pursue different strategies to maintain dynamic stability, such as taking a step. Although they maintained different support bases, post-stroke individuals adopted a smaller base of support than healthy ones.

Keywords:
Stroke; Posture; Rehabilitation; Postural Balance; Video Games

INTRODUÇÃO

O acidente vascular encefálico (AVE) é considerado a afecção que mais ocasiona incapacidades funcionais no mundo ocidental, resultando em comprometimentos sensoriais, cognitivos, de linguagem, percepção e, mais notoriamente, motores11. Terranova TT, Albieri FO, Almeida MD, Ayres DVM, Cruz SF, Milazzotto MV, et al. Chronic cerebral vascular accident: rehabilitation. Acta Fisiatrica. 2012;19(2):50-9. doi: 10.5935/0104-7795.20120011.
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, tal como a hemiparesia, caracterizada pela perda parcial da função motora no hemídio oposto à lesão encefálica22. Tyson SF, Hanley M, Chilala J, Selley A, Tallis RC. Balance disability after stroke. Phys Ther. 2006;86(1):30-8. doi: 10.1093/ptj/86.1.30.
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. Esses déficits afetam diretamente as habilidades do controle postural para manter qualquer postura33. Pollock AS, Durward BR, Rowe PJ, Paul JP. What is balance? Clin Rehabil. 2000;14(4):402-6. doi: 10.1191/0269215500cr342oa.
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, potencializando, assim, o risco de quedas dos indivíduos acometidos22. Tyson SF, Hanley M, Chilala J, Selley A, Tallis RC. Balance disability after stroke. Phys Ther. 2006;86(1):30-8. doi: 10.1093/ptj/86.1.30.
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.

A melhora do controle postural é, portanto, um dos principais objetivos de tratamento da fisioterapia, que emprega uma variedade de exercícios que priorizam a repetição de tarefas funcionais em graus de dificuldade progressivos a fim de favorecer o processo de neuroplasticidade44. Kong KH, Loh YJ, Thia E, Chai A, Ng CY, Soh YM, et al. Efficacy of a virtual reality commercial gaming device in upper limb recovery after stroke: a randomized, controlled study. Top Stroke Rehabil. 2016;23(5):333-40. doi: 10.1080/10749357.2016.1139796.
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. Porém, de acordo com relatos de fisioterapeutas, manter a motivação dos pacientes por longos períodos de terapia pode ser difícil, sendo necessário utilizar recursos que desafiem cada vez mais suas capacidades55. Putnam C, Cheng J, Seymour G. Therapist perspectives: Wii active videogames use in inpatient settings with people who have had a brain injury. Games Health J. 2014;3(6):366-70. doi: 10.1089/g4h.2013.0099.
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Com o avanço da tecnologia, sistemas de jogos digitais passaram a ser considerados como uma alternativa interessante66. Kato PM. Video games in health care: closing the gap. Rev Gen Psychol. 2010;14(2):113-21. doi: 10.1037/a0019441.
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, já que sua principal vantagem é proporcionar maior motivação e engajamento à prática de tarefas repetitivas77. Rosas R, Nussbaum M, Cumsille P, Marianov V, Correa M, Flores P, et al. Beyond Nintendo: design and assessment of educational video games for first and second grade students. Comput Educ. 2003;40(1):71-94. doi: 10.1016/S0360-1315(02)00099-4.
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. Evidências mostram que o uso de jogos digitais tem contribuído para diferentes finalidades, como para a melhora do equilíbrio88. Cho KH, Lee KJ, Song CH. Virtual-reality balance trainning with a video-game system improve dynamic balance in chronic stroke patients. Tohoku J Exp Med. 2012;228(1):69-74. doi: 10.1620/tjem.228.69.
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, mobilidade99. Saposnik G, Teasell R, Mamdani M, Hall J, Mcllroy W, Cheung D, et al. Effectiveness of virtual reality using Wii gaming technology in stroke rehabilitation: a pilot randomized clinical trial and proof of principle. Stroke. 2010;41(7):1477-84. doi: 10.1161/STROKEAHA.110.584979.
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, funcionalidade1010. Sena CG, Saes MO, Brod M, Pitzer Neto VE. Eficácia do tratamento fisioterápico para o controle de tronco em indivíduos acometidos pelo acidente vascular encefálico. Rev Insp Mov Saude. 2013;5(6):16-9. e marcha1111. Walker ML, Ringleb SI, Maihafer GC, Walker R, Crouch JR, Van Lunen B, et al. Virtual reality-enhanced partial body weight-supported treadmill training poststroke: feasibility and effectiveness in 6 subjects. Arch Phys Med Rehabil. 2010;91(1):115-22. doi: 10.1016/j.apmr.2009.09.009.
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Resultados como os supracitados geralmente são mensurados por meio de testes clínicos e escalas funcionais. Entretanto, pesquisas feitas dessa forma estão sujeitas a algumas limitações, como a subjetividade das escalas, cuja precisão está diretamente relacionada à aplicação de um profissional experiente1212. Rahman HA, Khor KX, Yeong CF, Su ELM, Narayanan ALT. The potential of iRest in measuring the hand function performance of stroke patients. Biomed Mater Eng. 2017;28(2):105-16. doi: 10.3233/BME-171660.
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, e avaliações realizadas apenas em momentos pré e pós-intervenção, que não fornecem informações mais detalhadas sobre as estratégias motoras empregadas nas tarefas.

Pesquisas centradas em abordagens biomecânicas, por outro lado, possibilitam obter dados quantitativos registrados durante a manutenção de posturas ou a execução de movimentos. A partir do uso de recursos de cinemetria, é possível obter o centro de massa e, mediante uso de plataformas de força, o centro de pressão, por exemplo. Embora diferentes medidas possam ser obtidas por meio desses recursos, dentro da cinemática a projeção vertical do centro de massa (CM) é a variável mais utilizada para investigar o controle postural de indivíduos hígidos1313. Orihuela-Espina F, Castillo IF, Palafox L, Pasaye E, Sánchez-Villavicencio I, Leder R, et al. Neural reorganization accompanying upper limb motor rehabilitation from stroke with virtual reality-based gesture therapy. Top Stroke Rehabil. 2013;20(3):197-209. doi: 10.1310/tsr2003-197.
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e de indivíduos com desordens neurológicas1414. Nijboer TCW, Olthoff L, Van der Stigchel S, Visser-Meily JMA. Prism adaptation improves postural imbalance in neglect patients. Neuroreport. 2014;25(5):307-11. doi: 10.1097/WNR.0000000000000088.
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. Por isso, nos dedicamos a estudá-la.

Em análises da estabilidade postural, geralmente os limites da base de suporte (BS) são correlacionados à projeção do CM (pCM) no plano horizontal1515. de Vries AW, Faber G, Jonkers I, Van Dieen JH, Verschueeren SM. Virtual reality balance training for elderly: similar skiing games elicit different challenges in balance training. Gait Posture. 2018;59:111-6. doi: 10.1016/j.gaitpost.2017.10.006.
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. Por exemplo, em um estudo que analisou o deslocamento da pCM dentro da BS, indivíduos com a doença de Parkinson exploraram menos os limites de estabilidade em comparação a indivíduos hígidos, o que sugeriu um controle postural mais debilitado1616. Horak FB, Dimitrova D, Nutt JG. Direction-specific postural instability in subjects with Parkinson's disease. Exp Neurol. 2005;193(2):504-21. doi: 10.1016/j.expneurol.2004.12.008.
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.

Para analisar a estabilidade postural em tarefas dinâmicas, foi proposto o indicador chamado margem de estabilidade (MdE)1717. Hof AL, Gazendam MGJ, Sinke WE. The condition for dynamic stability. J Biomechan. 2005;38(1):1-8. doi: 10.1016/j.jbiomech.2004.03.025.
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, que considera não apenas a posição da pCM em relação à BS, mas também sua velocidade, indicando se o CM do indivíduo está se deslocando para fora ou para dentro da BS.

Nesse contexto, este trabalho se dedica a investigar a estabilidade postural dinâmica durante um movimento de cabeceio, simulado por um jogo digital com diferentes exigências de velocidade. O movimento foi escolhido por estimular a transferência de peso bilateral, um exercício empregado na fisioterapia para alcançar a estabilidade postural em pessoas com AVE. Elegeu-se a MdE para investigar a estabilidade dinâmica e testou-se a hipótese de que indivíduos com AVE apresentam menor margem de estabilidade em relação a indivíduos hígidos.

METODOLOGIA

Participantes

A amostra foi composta por 16 indivíduos pós-AVE recrutados das listas de pacientes de hospitais de reabilitação na cidade de Curitiba (PR) e 16 indivíduos hígidos recrutados entre as pessoas da comunidade acadêmica durante o mesmo período. Todos os participantes do estudo assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.

Os critérios de inclusão dos voluntários pós-AVE foram: apresentar tempo de evolução pós-AVE acima de quatro semanas, incluindo pessoas na fase subaguda e crônica1818. O'Sullivan SB, Schmitz TJ. Fisioterapia: avaliação e tratamento. Barueri: Manole; 2010.; idade igual ou superior a 20 anos completos; capazes de deambular ao menos seis metros sem assistência humana, sendo permitida a utilização de órteses ou dispositivos auxiliares. Já os critérios para os voluntários hígidos foram: apresentar sexo e faixa etária pareadas com os participantes do grupo pós-AVE; e alcançar a pontuação máxima na escala de equilíbrio de Berg. As características da amostra são apresentadas na Tabela 1.

Tabela 1
Caracterização da amostra

Para caracterizar a condição clínica dos voluntários pós-AVE foram utilizados testes e escalas funcionais que avaliaram os déficits que podem influenciar o controle postural desses indivíduos. O equilíbrio estático e dinâmico foi avaliado por meio das escalas de Berg e do Mini-Balance Evaluation Systems Test (MiniBESTest); o grau de espasticidade dos flexores plantares, adutores de quadril, flexores de cotovelo e flexores de punho do hemídio parético foi mensurado pela escala modificada de Ashworth; o estágio de recuperação motora de braço, punho, membro inferior e tornozelo foi avaliado pela escala de Brunnstrom; e a percepção de cansaço pela escala de Borg. As características clínicas do grupo pós-AVE são apresentadas na Tabela 2.

Tabela 2
Caracterização clínica do grupo pós-AVE

Procedimentos experimentais

Os voluntários pós-AVE compareceram ao Laboratório de Motricidade Humana (LaMH) do Programa de Pós-graduação em Tecnologia em Saúde da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) por dois dias, com intervalo de, no máximo, cinco dias entre as visitas. O primeiro dia foi dedicado à avaliação e à familiarização dos voluntários. O segundo dia foi destinado à coleta experimental com o jogo digital, dentro do qual os voluntários tiveram seus segmentos corporais delimitados por marcadores refletivos. Após isto, eles foram orientados a permanecer em pé sobre uma faixa de papel kraft, para que o contorno de seus pés fosse desenhado com caneta. Em seguida, o papel foi retirado e os voluntários foram posicionados a dois metros de um suporte com a tela de um televisor LG de 49’ a 140cm do chão e um sensor Kinect® a 95cm do solo. Antes de jogar, foi demonstrado o movimento do jogo digital. Os voluntários hígidos realizaram apenas a etapa experimental.

O jogo digital utilizado neste estudo, denominado Cabeceio, estimula a inclinação de tronco látero-lateral com a finalidade de promover a transferência de peso sobre o membro inferior parético, enquanto simula o movimento de cabecear uma bola em um cenário de campo de futebol por meio do dispositivo da Microsoft Kinect®. Esse jogo contém cinco níveis de velocidade, que correspondem à: (1) muito lenta; (2) lenta; (3) moderada; (4) rápida e (5) muito rápida, que controlam a frequência com que bolas são lançadas. No nível 1 são lançadas 6 bolas, no nível 2 são 8, no nível 3 são 10, no nível 4 são 15 e no nível 5 são 18 bolas, lançadas a cada 2,7s. Os voluntários executaram cada um dos cinco níveis de velocidade progressivamente pelo período de 30s.

Aquisição de dados

Para coleta de dados cinemáticos foi utilizado o sistema de captura de movimento Vicon Nexus 2.7 (Vicon Motion Systems LTD., 2018), composto por seis câmeras de radiação infravermelha, modelo Vicon® Bonita B10, com a frequência de aquisição de 100Hz. O modelo biomecânico adotado foi o plug-in-gait lower body, combinado com marcadores adicionais posicionados bilateralmente nos seguintes acidentes ósseos: falange distal do dedo médio, processo estilóide da ulna, epicôndilo lateral do úmero, acrômio e incisura jugular.

As medidas antropométricas dos pés foram extraídas dos desenhos de contorno dos pés feitas em papel kraft, que serviram para obter distâncias entre os pontos anatômicos do meio do calcanhar, ponta da falange distal do primeiro metatarso e ponta da falange distal do quinto metatarso.

Processamento dos sinais

O processamento dos dados cinemáticos foi feito em ambiente Matlab (R2016a, The Mathworks, Natick, USA). Os sinais de coordenadas dos marcadores e ângulos foram filtrados por um filtro Butterworth passa-baixa de segunda ordem com frequência de corte de 6Hz, conforme determinado a partir de uma análise de resíduos realizada previamente. O cálculo do CM foi feito com base no artigo de Tisserand et al.1919. Tisserand R, Robert T, Dumas R, Chèze L. A simplified marker set to define the center of mass for stability analysis in dynamic situations. Gait Posture. 2016;48:64-7. doi: 10.1016/j.gaitpost.2016.04.032.
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que propôs um modelo simplificado de nove segmentos corporais delimitados pelos marcadores nas posições anatômicas mencionadas e os percentis de massa de cada segmento corporal são aqueles descritos em Dumas, Chèze e Verriest2020. Dumas R, Chèze L, Verriest JP. Adjustments to McConville et al. and Young et al. body segment inertial parameters. J Biomechan. 2007;40(3):543-53. doi: 10.1016/j.jbiomech.2006.02.013.
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.

O cálculo do centro de massa extrapolado (xCM) foi realizado de acordo com a seguinte equação1616. Horak FB, Dimitrova D, Nutt JG. Direction-specific postural instability in subjects with Parkinson's disease. Exp Neurol. 2005;193(2):504-21. doi: 10.1016/j.expneurol.2004.12.008.
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:

x C M = p C M + ν g / l (I)

Onde: xCM é o centro de massa extrapolado, pCM é a projeção do CM no plano da BS, ν é a velocidade da pCM, g é a aceleração da gravidade e l é a distância entre o ponto médio das articulações do tornozelo e o ponto médio das articulações dos quadris.

O valor absoluto da MdE corresponde à menor distância vetorial entre o xCM e as fronteiras da BS1717. Hof AL, Gazendam MGJ, Sinke WE. The condition for dynamic stability. J Biomechan. 2005;38(1):1-8. doi: 10.1016/j.jbiomech.2004.03.025.
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. O valor da MdE é positivo se xCM estiver dentro da BS, e negativo se estiver fora dela.

Neste estudo, a BS foi definida de duas formas: (1) se os dois pés estavam no solo, a BS correspondia ao polígono formado pelas bordas externas dos pés e as linhas que unem seus vértices; e (2) se apenas um dos pés estavam no solo, a BS era representada pelo triângulo que delimita o pé. A partir das medidas em cm dos pés, foi realizado o cálculo dos ângulos de cada vértice, em função da bissetriz formada pela linha que liga os marcadores posicionados no meio do calcâneo e na cabeça do segundo metatarso, para referência ao longo do tempo (Figura 1).

Figura 1
Base de suporte (BS).

Por fim, foram obtidos os indicadores de interesse para este estudo: os valores médios, mínimos e máximos da área da BS e da MdE ao longo do tempo de jogo para cada nível de velocidade.

Análise estatística

Os dados foram analisados no software IBM SPSS (versão 21.0). Por meio do teste de Shapiro-Wilk foi constatado que os dados não apresentam distribuição normal, optando-se assim por testes não paramétricos. Para comparação entre grupos, foi utilizado o teste de Mann-Whitney. Já para as comparações entre os níveis do jogo para cada grupo, utilizou-se o teste de Friedman e, quando identificado diferença, aplicou-se a correção de Bonferroni (post hoc - p<0,005). Para os demais testes foi assumido o intervalo de confiança de 95% (α=0,05).

RESULTADOS

Os valores da área da BS são apresentados na Figura 2. Não foi observada diferença significativa entre os níveis de velocidade, mas foram encontradas diferenças entre os grupos, indicando que os indivíduos pós-AVE adotaram uma BS menor do que os hígidos durante o jogo.

Figura 2
Valores da área da base de suporte (BS) em mm2.

Na Figura 3, são apresentados os valores da MdE, cujos resultados não apresentaram diferenças entre os níveis de velocidade e entre grupos, indicando que a menor distância entre o xCM e a BS permaneceu semelhante entre indivíduos pós-AVE e hígidos.

Figura 3
Valores da margem de estabilidade (MdE) em mm.

DISCUSSÃO

Neste estudo, observou-se que a área da BS não mudou entre os níveis de velocidade do jogo digital, mesmo que a velocidade com que as bolas eram lançadas aumentasse a cada nível. Uma possível justificativa para isso é o fato de que os voluntários pós-AVE e os hígidos podem não ter se sentido suficientemente desafiados a mudar a BS, por exemplo, levantando o pé, na tentativa de buscar uma estratégia para manter sua estabilidade postural dinâmica. As medidas da MdE também refletem esse comportamento.

Os valores da BS no grupo pós-AVE foram menores do que os do grupo dos hígidos (Figura 2). Supõe-se que os voluntários pós-AVE tiveram dificuldade em aumentar a área da BS durante o jogo em função do comprometimento causado pela hemiparesia e o padrão sinérgico extensor de membro inferior1818. O'Sullivan SB, Schmitz TJ. Fisioterapia: avaliação e tratamento. Barueri: Manole; 2010., que os fez assumir uma posição de “conforto” quando estavam em pé, mantendo os pés mais próximos e, por consequência, confiando mais no membro inferior não parético para manter a estabilidade.

As medidas da MdE são iguais nos dois grupos (Figura 3), rejeitando a hipótese do estudo. Considerando que, para manter a estabilidade na postura bípede, a projeção vertical do centro de massa (pCM) deve ser mantida dentro da BS e que valores menores da MdE indicam que o centro de massa extrapolado (xCM) está mais próximo aos limites da BS1717. Hof AL, Gazendam MGJ, Sinke WE. The condition for dynamic stability. J Biomechan. 2005;38(1):1-8. doi: 10.1016/j.jbiomech.2004.03.025.
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, esperávamos que os indivíduos pós-AVE exibissem esse comportamento, refletindo um controle postural pior em relação aos hígidos. O tamanho da área da BS ter sido menor no grupo pós-AVE, possivelmente, influenciou esse efeito.

CONCLUSÃO

Tanto os indivíduos pós-AVE como os hígidos mantiveram a área da BS e a MdE inalteradas no movimento de cabeceio em todos os níveis de velocidade do jogo digital. Entretanto, na comparação entre grupos, os voluntários pós-AVE apresentaram valores da área da BS menores do que os voluntários hígidos.

AGRADECIMENTOS

Este estudo foi financiado em parte pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) - Código Financeiro 001. Os autores agradecem aos voluntários que concordaram em participar deste estudo, a Marcos P.R. de Castro que programou o jogo digital e a todos os integrantes do grupo de pesquisa que colaboraram para o seu desenvolvimento.

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  • 1
    Estudo realizado no Laboratório de Motricidade Humana (LaMH) do Programa de Pós-graduação em Tecnologia em Saúde, Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) - Curitiba (PR), Brasil.
  • Fonte de financiamento: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes)
  • 4
    Aprovado pelo Comitê de Ética: n. 2.919.827.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Mar 2022
  • Data do Fascículo
    Oct-Dec 2021

Histórico

  • Recebido
    13 Ago 2019
  • Aceito
    22 Nov 2021
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