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Percepção de profissionais de equoterapia sobre a prática com idosos

Resumo

Introdução

A equoterapia é um método terapêutico recentemente regulamentado no Brasil. Não obstante, há anos vem sendo estudado, sobretudo com foco em crianças e adolescentes. Considerando o aumento do número de idosos na população brasileira, investigações com enfoque em pessoas na velhice são cada vez mais necessárias.

Objetivo

Analisar as percepções de profissionais de equoterapia sobre sua prática com idosos.

Métodos

Trata-se de uma pesquisa qualitativa e transversal, em que os participantes responderam a um questionário online composto por questões demográficas e relacionadas à equoterapia com idosos. Os dados foram analisados por meio de estatística descritiva e da análise de conteúdo temática.

Resultados

Participaram 25 profissionais (23-57 anos), graduados, que trabalhavam há pelo menos dois anos com equoterapia (média = 6,64; desvio padrão = 5,39 anos). Essa amostra foi composta majoritariamente por profissionais do sexo feminino (72%) e fisioterapeutas (48%). Do total, 60% relataram já terem atendido pelo menos um praticante idoso. Entre aqueles que nunca trabalharam com esse público, 90% desejam atendê-lo. Todos os profissionais consideram que a equoterapia pode ser benéfica na velhice, reduzindo sintomas depressivos e promovendo variáveis psicossociais (por ex., socialização) e físicas (por ex., equilíbrio). Apesar dos benefícios, os profissionais mencionaram desafios, como dificuldades do praticante (por ex., medo), do local de trabalho (por ex., falta de equipe qualificada) e baixa demanda.

Conclusão

A equoterapia é considerada pelos participantes um método que contribui para melhorar aspectos biopsicossociais de idosos, porém estes profissionais enfrentam desafios na prática, dificul-tando ou impedindo que atendam pessoas na velhice.

Idoso; Terapia assistida por cavalos; Assistência ao paciente

Abstract

Introduction

Riding therapy is a therapeutic method recently regulated in Brazil. Nevertheless, it has been studied for years, especially focusing on children and adolescents. Considering the growing number of elderly in the Brazilian population, investigations focusing on older people are increasingly necessary.

Objective

To analyze the perceptions of equine therapy professionals about their practice with the elderly.

Methods

This was a qualitative and cross-sectional research, in which the participants answered an online questionnaire, composed of demographic questions and questions related to horseback riding with the elderly. Data were analyzed using descriptive statistics and thematic content analysis.

Results

Twenty-five professionals (23-57 years old), graduates, who had worked for at least two years with hippotherapy (mean = 6.64; standard deviation = 5.39 years) participated. This sample was composed mostly of female professionals (72%) and physical therapists (48%). Of the total, 60% reported having already assisted at least one elderly practitioner. Among those who had never worked with this public, 90% wished to do so. All professionals considered that horseback riding can be beneficial in old age, reducing depressive symptoms and promoting psychosocial (e.g., socializing) and physical (e.g., balance) variables. Despite the benefits, professionals mentioned challenges, such as difficulties of the practitioner (e.g., fear), problems with the workplace (e.g., lack of qualified staff), and low demand.

Conclusion

Hippotherapy professionals consider riding therapy a method that contributes to improving biopsychosocial aspects of the elderly. However, they face challenges in this practice, hindering or preventing them from serving older people.

Aged; Equine-assisted therapy; Patient care

Introdução

O contato humano-animal como forma de tratamen-to e cura para os seres humanos é utilizado desde a antiguidade.11. Capote PSO, Costa MPR. Terapia assistida por animais (TAA): aplicação no desenvolvimento psicomotor da criança com deficiência intelectual. São Carlos: EduFSCar; 2011. 95 p. https://books.scielo.org/id/8yg45
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, 22. Dotti J. Terapia e animais. 1 ed. São Paulo: Noética; 2005. 294 p. Atualmente, diversos estudos evidenciam que a presença de animais, seja com foco terapêutico ou no simples contato lúdico, auxilia na melhora do humor, da socialização e do bem-estar físico e psicológico do praticante.33. Costa LPD, Kellermann M, Peranzoni VC, Rodrigues MCG, Arruda AC, Silva CN. A eficácia biopsicossocial das terapias assistidas por animais: cinoterapia e equoterapia. Rev Di@logus. 2018;7(2):51-62. https://tinyurl.com/yc3pbc2d
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, 44. Ferreira APS, Gomes JB. Levantamento histórico da terapia assistida por animais. Rev Multidiscip Pey Këyo Cient. 2017;3(1):71-92. https://tinyurl.com/yemcrnp2
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Um dos animais mais utilizados na terapia assistida por animais é o cavalo.44. Ferreira APS, Gomes JB. Levantamento histórico da terapia assistida por animais. Rev Multidiscip Pey Këyo Cient. 2017;3(1):71-92. https://tinyurl.com/yemcrnp2
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A terapia com equinos possui diversas terminologias, como “tratamento fisioterapêutico baseado nos movimentos do cavalo”, “equoterapia”, “fisioterapia e terapia assistida por equinos”, “equitação terapêutica”, entre outros.55. Wood WH, Fields BE. Hippotherapy: a systematic mapping review of peer-reviewed research, 1980 to 2018. Disabil Rehabil. 2019;43(10):1463-87. https://doi.org/10.1080/09638288.2019.1653997
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Isso dificulta um padrão no atendimento, na especialização dos profissionais e no avanço das pesquisas.66. Wood W, Alm K, Benjamin J, Thomas L, Anderson D, Pohl L, et al. Optimal terminology for services in the United States that incorporate horses to benefit people: a consensus document. J Altern Complement Med. 2021;27(1):88-95. https://doi.org/10.1089/acm.2020.0415
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Esse entendimento já está presente há pelo menos uma década, quando Craig et al.77. Craig P, Dieppe P, Macintyre S, Michie S, Nazareth I, Petticrew M. Developing and evaluating complex interventions: The new medical research council guidance. Int J Nurs Stud. 2013; 50(5):587-92. https://doi.org/10.1016/j.ijnurstu.2012.09.010
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afirmaram que o progresso científico é prejudicado quando não há um termo claro para nomear diferentes serviços. Assim, os autores ressaltam a importância de ter-se essa terminologia bem descrita para que a intervenção seja desenvolvida cientificamente, com eficácia e confiança.

Wood e Fields55. Wood WH, Fields BE. Hippotherapy: a systematic mapping review of peer-reviewed research, 1980 to 2018. Disabil Rehabil. 2019;43(10):1463-87. https://doi.org/10.1080/09638288.2019.1653997
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também reforçam a necessidade de os profissionais que atuam com terapia com equinos desenvolverem uma teoria para capacitação na área. Os autores assinalam que a equoterapia precisa ser definida e apresentada para o público, por meio da prática e da pesquisa, como uma ferramenta terapêutica que envolve o movimento de cavalos treinados a fim de promover benefícios ao praticante.55. Wood WH, Fields BE. Hippotherapy: a systematic mapping review of peer-reviewed research, 1980 to 2018. Disabil Rehabil. 2019;43(10):1463-87. https://doi.org/10.1080/09638288.2019.1653997
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No Brasil, o termo mais utilizado é equoterapia e refere-se à prática de reabilitação que tem o cavalo como mediador, podendo ser utilizada com pessoas de todas as idades.88. Associação Nacional de Equoterapia. Apostila Curso Básico Equoterapia. Brasília: ANDE BRASIL; 2020. 97 p. Ela trabalha o praticante de forma global, estimulando a conscientização corporal, o desenvolvimento do equilíbrio e do tônus muscular, a melhora da coordenação motora, da atenção, da autoconfiança e da autoestima.99. Wibelinger LM, Silveira MM. Equoterapia: qualidade de vida para o idoso sobre o cavalo. Rev Kairós Gerontol. 2011;14(1):181-93. https://revistas.pucsp.br/index.php/kairos/article/view/6935
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Além desses aspectos, pode ser utilizada como tratamento complementar para dificuldades emocionais, traumas e doenças mentais.55. Wood WH, Fields BE. Hippotherapy: a systematic mapping review of peer-reviewed research, 1980 to 2018. Disabil Rehabil. 2019;43(10):1463-87. https://doi.org/10.1080/09638288.2019.1653997
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A equoterapia foi regulamentada recentemente no Brasil, por meio da Lei Nº 13.830.1010. Brasil. Lei nº13.830, de 13 de maio de 2019. Dispõe sobre a prática da equoterapia. Brasília: Diário Oficial da União; 2019 May 14. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13830.htm
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Não obstante, há pelo menos três décadas, uma entidade civil, sem fins lucrativos e de caráter filantrópico, assistencial e terapêutico, intitulada Associação Nacional de Equoterapia (ANDE-BRASIL), contribui para divulgar essa prática em contexto nacional.

Para a ANDE-BRASIL,88. Associação Nacional de Equoterapia. Apostila Curso Básico Equoterapia. Brasília: ANDE BRASIL; 2020. 97 p. a equoterapia utiliza uma abordagem interdisciplinar que envolve a participação de profissionais da saúde, educação e equitação. Três profissionais compõem a equipe mínima de um centro de equoterapia: um fisioterapeuta, um psicólogo e um profissional de equitação. O atendimento é precedido de diagnóstico, indicação médica e/ou avaliações de profissionais das áreas da saúde ou educação, visando planejar um atendimento individualizado.88. Associação Nacional de Equoterapia. Apostila Curso Básico Equoterapia. Brasília: ANDE BRASIL; 2020. 97 p.

Embora a equoterapia possa ser utilizada com pes-soas desde a infância até a velhice,88. Associação Nacional de Equoterapia. Apostila Curso Básico Equoterapia. Brasília: ANDE BRASIL; 2020. 97 p. muitas pesquisas sobre essa prática são conduzidas tendo como enfoque crianças e/ou adolescentes.1111. Marinho JRS, Zamo, RS. Terapia assistida por animais e transtornos do neurodesenvolvimento. Estud Pesqui Psicol. 2017;17(3):1063-83. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1808-42812017000300015
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Tendo isso em vista, Matarazo1212. Matarazo JB. Equoterapia com idosos: resultados de pes-quisas e percepções de profissionais [master´s thesis]. Brasília: Universidade Católica de Brasília; 2021. 79 p. https://bdtd.ucb.br:8443/jspui/handle/tede/2892
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realizou uma revisão sistemática da literatura sobre equoterapia com idosos a fim de conhecer o estado da arte dessas publicações. Dos 38 artigos analisados pela autora, apenas 31,57% foram reali-zados exclusivamente com idosos e 92,10% desses demonstraram benefícios.1212. Matarazo JB. Equoterapia com idosos: resultados de pes-quisas e percepções de profissionais [master´s thesis]. Brasília: Universidade Católica de Brasília; 2021. 79 p. https://bdtd.ucb.br:8443/jspui/handle/tede/2892
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Observa-se, portanto, uma necessidade de mais estudos sobre essa terapia complementar com praticantes de outras fases do curso de vida, como adultos e idosos.

Além de estudos sobre eficácia, como os analisados por Matarazo,1212. Matarazo JB. Equoterapia com idosos: resultados de pes-quisas e percepções de profissionais [master´s thesis]. Brasília: Universidade Católica de Brasília; 2021. 79 p. https://bdtd.ucb.br:8443/jspui/handle/tede/2892
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também têm sido conduzidas pesquisas qualitativas sobre a percepção de praticantes com paralisia cerebral,1313. Debuse D, Gibb C, Chandler C. Effects of hippotherapy on people with cerebral palsy from the users' perspective: a qualitative study. Physiother Theory Pract. 2009;25(3):174-192. https://doi.org/10.1080/09593980902776662
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cuidadores,1414. Nunes AP, Caberlon CF. A percepção dos pais quanto ao tratamento de equoterapia. Rev Inspirar. 2018;16(2):15-19. https://www.inspirar.com.br/wp-content/uploads/2018/04/revista-inspirar-ms-46-587-2018.pdf
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estudantes de gradu-ação1515. Rocha IU, Delgado AG, Silva CF, Silva AA, Barreira APB, Oliveira VM, Santos TM. Percepção dos discentes de Medicina Veterinária (UFRRJ) sobre a equoterapia. Rev Cienc Ext. 2020; 16:21-35. https://ojs.unesp.br/index.php/revista_proex/article/view/2659
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e psicólogos1616. Wilson K, Buultjens M, Monfries M, Karimi L. Equine-assisted psychotherapy for adolescents experiencing depression and/or anxiety: A therapist’s perspective. Clin Child Psychol Psychiatry. 2017;22(1):16-33. https://doi.org/10.1177/1359104515572379
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sobre terapias com cavalo. No que se refere ao primeiro estudo, foi investigada a percepção de pais, ou dos próprios praticantes com paralisia cerebral, sobre os efeitos da equoterapia.1313. Debuse D, Gibb C, Chandler C. Effects of hippotherapy on people with cerebral palsy from the users' perspective: a qualitative study. Physiother Theory Pract. 2009;25(3):174-192. https://doi.org/10.1080/09593980902776662
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Para tanto, participaram do estudo 17 pessoas com idade entre 4 e 63 anos. Foram identificados os benefícios de normalização do tônus muscular, melhora do controle de tronco e da marcha, e aumento da autoconfiança e autoestima.1313. Debuse D, Gibb C, Chandler C. Effects of hippotherapy on people with cerebral palsy from the users' perspective: a qualitative study. Physiother Theory Pract. 2009;25(3):174-192. https://doi.org/10.1080/09593980902776662
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De forma semelhante, Nunes e Caberlon1414. Nunes AP, Caberlon CF. A percepção dos pais quanto ao tratamento de equoterapia. Rev Inspirar. 2018;16(2):15-19. https://www.inspirar.com.br/wp-content/uploads/2018/04/revista-inspirar-ms-46-587-2018.pdf
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também investigaram as percepções de pais (cuidadores) de crianças com paralisia cerebral sobre o tratamento de seus filhos com equoterapia. Observou-se que os participantes reconhecem benefícios biopsicossociais dessa prática para as crianças, sendo que, quando questionados sobre o que observaram de mudanças após o início tratamento, relataram melhora acentuada do equilíbrio e do controle cervical e de tronco.1414. Nunes AP, Caberlon CF. A percepção dos pais quanto ao tratamento de equoterapia. Rev Inspirar. 2018;16(2):15-19. https://www.inspirar.com.br/wp-content/uploads/2018/04/revista-inspirar-ms-46-587-2018.pdf
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Outro estudo teve como objetivo avaliar a percepção e o conhecimento sobre equoterapia de discentes de um curso de medicina veterinária.1515. Rocha IU, Delgado AG, Silva CF, Silva AA, Barreira APB, Oliveira VM, Santos TM. Percepção dos discentes de Medicina Veterinária (UFRRJ) sobre a equoterapia. Rev Cienc Ext. 2020; 16:21-35. https://ojs.unesp.br/index.php/revista_proex/article/view/2659
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Constatou-se que os participantes consideram que a equoterapia proporciona muitos benefícios para seus praticantes, sendo indicada para pessoas autistas, com deficiências ou portadoras de síndrome de Down. Depreende-se, portanto, que os estudantes possuem conhecimento limitado sobre a finalidade e aplicabilidade dessa prática.1515. Rocha IU, Delgado AG, Silva CF, Silva AA, Barreira APB, Oliveira VM, Santos TM. Percepção dos discentes de Medicina Veterinária (UFRRJ) sobre a equoterapia. Rev Cienc Ext. 2020; 16:21-35. https://ojs.unesp.br/index.php/revista_proex/article/view/2659
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Wilson et al.1616. Wilson K, Buultjens M, Monfries M, Karimi L. Equine-assisted psychotherapy for adolescents experiencing depression and/or anxiety: A therapist’s perspective. Clin Child Psychol Psychiatry. 2017;22(1):16-33. https://doi.org/10.1177/1359104515572379
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examinaram a perspectiva de psicó-logos que trabalham com psicoterapia assistida por equinos sobre seus benefícios em adolescentes com depressão e/ou ansiedade. Os participantes identifi-caram uma série de melhorias nos praticantes, como aumento da confiança, autoestima e assertividade e melhora na regulação emocional e no autocontrole.1616. Wilson K, Buultjens M, Monfries M, Karimi L. Equine-assisted psychotherapy for adolescents experiencing depression and/or anxiety: A therapist’s perspective. Clin Child Psychol Psychiatry. 2017;22(1):16-33. https://doi.org/10.1177/1359104515572379
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Constata-se, uma vez mais, o enfoque sobre equote-rapia com crianças e adolescentes, negligenciado as outras fases do curso de vida. A fim de diminuir, ainda que parcialmente, essa carência na literatura científica, sobretudo nacional, este estudo traz uma discussão sobre equoterapia com praticantes idosos a partir da percepção dos profissionais.

A escolha por esse agrupamento etário justifica-se, sobretudo, por duas razões. Primeira, o envelhecimento é um processo que provoca diversas alterações no corpo, como enfraquecimento do tônus muscular e dos ossos, mudanças posturais, alterações nos reflexos de proteção, enrijecimento das articulações, redução da mobilidade corporal, modificação do equilíbrio e da marcha e aumento do risco de quedas e da probabilidade de morte.1717. Freire SA, Resende MC. Estudos e intervenções para a promoção da velhice satisfatória. Psicol Am Lat. 2008;14. https://tinyurl.com/38vhdz2h
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, 1818. Marchi Netto LF. Aspectos biológicos e fisiológicos do envelhecimento humano e suas implicações na saúde do idoso. Pensar Prat. 2006;7(1):75-84. https://doi.org/10.5216/rpp.v7i1.67
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Além dessas, o envelhecimento e a velhice também são marcados por mudanças psicológicas e sociais importantes.1919. Gomes JB, Reis LA. Descrição dos sintomas de ansiedade e de depressão em idosos institucionalizados no interior da Bahia, Brasil. Rev Kairós. 2016;19(1):175-91. https://revistas.pucsp.br/index.php/kairos/article/view/31961
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A segunda razão se refere ao perfil etário da população brasileira, que está se alterando. Observa-se um aumento acentuado no número de idosos, de modo que a estimativa para 2030 é que pessoas com 60 anos ou mais sejam a maioria quando comparadas àquelas com até 29 anos.2020. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Síntese de indicadores sociais: uma análise das condições de vida da população brasileira. Rio de Janeiro: IBGE; 2015. 137 p. https://drive.google.com/file/d/1q8oI_T9JpleU9AipnpxlRQd21CSNGqgN/view
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Desta forma, a partir do contexto apresentado, este estudo teve como objetivo geral conhecer a percepção de profissionais de equoterapia sobre essa prática com idosos. Especificamente, almejou-se conhecer a formação dos profissionais, sua experiência com praticantes na velhice, as demandas de idosos que buscam por esse tipo de tratamento, os benefícios e desafios que identificam no trabalho com pessoas na velhice e o interesse em continuar atendendo (ou começar a atender) esse público.

Métodos

Trata-se de um estudo transversal, exploratório, com delineamento quantitativo e qualitativo, realizado a partir de informações coletadas com profissionais de equoterapia brasileiros. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade Católica de Brasília (CAAE: 39650820.8.0000.0029).

Participantes

A amostra deste estudo foi obtida por conveniência e foi composta por profissionais de equoterapia. Optou-se por não restringir a participação a uma única formação, pois a equipe de equoterapia é formada por profissionais de diferentes áreas do saber.

Os critérios de inclusão adotados foram possuir nível superior e trabalhar há pelo menos dois anos com equoterapia no Brasil. Acredita-se que esses critérios contribuíram para que os participantes tivessem alguma experiência com essa prática em contexto nacional. Não responder ao questionário de forma completa ou realizá-lo fora do prazo disponibilizado constituíram critérios de exclusão.

Considerando tais critérios, apenas um dos respon-dentes não foi incluído no estudo, pois trabalhava com equoterapia há apenas um ano. A amostra final deste estudo foi composta por 25 profissionais.

Instrumentos

Para a realização deste estudo foi utilizado um questionário semiestruturado, desenvolvido pelas pesquisadoras, e respondido de forma online por meio da plataforma Google Forms. Inicialmente o instrumento continha o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. A partir do aceite para participar, o profissional acessava o questionário, o qual foi dividido em duas partes: caracterização da amostra e percepção sobre equoterapia com idosos.

Na primeira seção foram coletadas informações demográficas como idade, sexo, formação profissional, tempo de trabalho com equoterapia e região do país em que atua. Já a segunda parte foi composta por questões que englobam a experiência do profissional de equoterapia com o público idoso, as demandas, os benefícios e os desafios percebidos com o uso dessa prática com pessoas na velhice. Caso o participante nunca tivesse atendido idosos, as questões envolviam suas percepções sobre os benefícios e desafios que acredita existirem na prática com este público.

Procedimento

Após aprovação do CEP, deu-se início à divulgação do estudo. Inicialmente ela ocorreu por meio da rede social das pesquisadoras e, posteriormente, pela estratégia de “bola de neve”, em que os profissionais respondentes compartilhavam o endereço eletrônico da investigação com outros potenciais participantes.

A coleta de dados ocorreu durante o mês de dezembro de 2020. Para chegar ao tamanho final da amostra, adotou-se a estratégia de amostragem por saturação; ou seja, interrompeu-se o recrutamento de novos participantes quando, na avaliação das pesquisadoras, observou-se repetição nos dados.2121. Glaser BG, Strauss AL. The discovery of grounded theory: strategies for qualitative research. 1 ed. New York: Aldine de Gruyter; 1967. 284 p.

Análise dos dados

Os dados quantitativos foram analisados por meio de estatística descritiva como média (M), desvio-padrão (DP), porcentagem e frequência (f). Já os dados quali-tativos, por meio da análise de conteúdo temática de Bardin.2222. Bardin L. Análise de conteúdo. 1st ed. São Paulo: Edições 70; 2016. 279 p. Para a análise de conteúdo, inicialmente realizou-se uma pré-análise das respostas dos parti-cipantes, seguida pela exploração do material e tratamento dos resultados, que ocorreu por meio do estabelecimento de porcentagens, frequência, inferências e interpretação. Desta forma, as categorias temáticas identificadas serão discutidas qualitativa e quantitativamente.

Resultados

Caracterização dos participantes

Participaram deste estudo 25 profissionais (P1 a P25) com idade entre 23 e 57 anos (M = 40,32; DP = 8,95) e tempo médio de trabalho com equoterapia de 6,64 anos (DP = 5,39; 2-24 anos). A maioria dos participantes é do sexo feminino (72%; n = 18), fisioterapeuta (48%; n = 12) e atua nas regiões Sul (24%) ou Sudeste (40%) do Brasil ( Tabela 1 ).

Tabela 1
Caracterização dos profissionais participantes do estudo (n = 25)

Quanto à profissionalização, apenas um participante (4%) afirmou não ter realizado curso de formação, especialização ou afim em equoterapia ( Tabela 1 ). Dos 24 profissionais que participaram de alguma formação ou assemelhado, 79,17% (n = 19) afirmaram que um dos conteúdos abordados foi sobre a prática com idosos. Pouco mais da metade (60%; n = 15) dos participantes relatou já ter trabalhado com praticantes com 60 anos ou mais ( Tabela 1 ). Não obstante, três deles (20%) afirmaram ter atendido apenas um idoso; os demais (n = 12; 80%), entre um e aproximadamente 50 idosos.

Demandas, benefícios e desafios: percepção de profissionais que já atenderam idosos

Solicitou-se aos profissionais que relatassem, a partir de suas percepções, as demandas dos pacientes idosos que já atenderam. Entre as dez categorias indicadas, as mais frequentes foram: sequelas de acidente vascular cerebral (AVC) (40%; f = 6); doença de Parkinson (13,33%; f = 2); e transtorno de ansiedade (13,33%; f = 2) ( Tabela 2 ). Quando questionados em relação aos benefícios que identificam nos idosos que fazem equoterapia, os profissionais relataram com maior frequência melhora na socialização (33,33%; f = 5), no equilíbrio (33,33%; f = 5) e na autoestima (26,67%; f = 4) ( Tabela 2 ). Não obstante, benefícios como melhora da marcha, mobilidade e qualidade de vida, redução de sintomas depressivos e maior autonomia também foram mencionados ( Tabela 2 ).

Tabela 2
Demandas, benefícios e desafios percebidos por profissionais de equoterapia que atenderam idosos ( n = 15)

Ao serem questionados sobre o desejo em continuar atendendo idosos, a maioria dos profissionais (n = 14; 93,33%) respondeu que sim. A seguir são apresentados dois exemplos de relatos feitos pelos participantes ao complementarem sua afirmativa:

Sim. Tem boa evolução! (P6)

Sim. Porque esta terapia consegue superar os limites, reerguer a autoestima e promover uma melhor maneira de envelhecer com a prevenção de doenças. Além dos benefícios corpóreos. (P16)

Ressalta-se que um participante (6,67%; P10) afirmou não querer continuar trabalhando com praticantes idosos, uma vez que o foco de seu local de trabalho eram crianças.

Entre os desafios enfrentados no atendimento a idosos por meio da equoterapia, os profissionais citaram a limitação motora dos praticantes (26,67%; f = 4) e a insegurança dos idosos ao montarem o cavalo ou realizarem algum exercício sobre ele (20,01%; f = 3) ( Tabela 2 ).

Benefícios e desafios: percepção de profissionais que não atendem idosos

Como mencionado anteriormente, 40% (n = 10) da amostra afirmou não ter atendido idosos até o momento da pesquisa. Quando questionados sobre o motivo de não terem trabalhado com este público, quatro (40%) afirmaram trabalhar em centros destinados ao atendimento com crianças e/ou adolescentes e um (10%) relatou que a falta de indicações médicas reflete na inexistência de pacientes idosos onde trabalha. Os outros cinco (50%) participantes relataram não haver demanda ou procura pela equoterapia por parte desse público, como pode ser observado no relato a seguir:

Nunca surgiu nenhuma pessoa idosa que quisesse praticar equoterapia. Acredito que o desconhecimento desta possibilidade tanto dos profissionais da área da saúde quanto da sociedade acaba criando uma imagem de que equoterapia é para crianças e que idosos não vão aguentar montar no cavalo. (P7)

Entre os dez profissionais que não atenderam idosos, nove (90%) relataram interesse em trabalhar com esse público. As razões elencadas foram, em síntese, o fato de a prática ser uma terapia alternativa para pessoas na velhice, que pode contribuir para melhorar a qualidade de vida e auxiliar na recuperação de doenças físicas e psicológicas. Apenas um participante (P14) afirmou não querer ter pacientes idosos, por não considerar a montaria uma atividade segura. Não obstante, acrescentou que considera seguro o trabalho no solo.

A despeito de não terem atendido idosos, esses profissionais relataram benefícios que a equoterapia pode promover a pessoas na velhice. As mais frequentes foram melhora na socialização (70%; f = 7), em aspectos psicológicos e físicos (60%; f = 6) e na autoestima (50%; f = 5) ( Tabela 3 ).

Tabela 3
Benefícios e desafios percebidos por profissionais de equoterapia que não atendem idosos (n = 10)

Em relação aos desafios que consideram existir na prática da equoterapia com idosos, a maioria dos profissionais mencionou a dificuldade no deslocamento (40%; f = 4), aceitação/preconceito (40%; f = 4) e segurança (30%; f =3) ( Tabela 3 ). Alguns dos relatos feitos pelos participantes que exemplificam a percepção dos desafios para eles são:

Falta de equipe qualificada, custos altos para manutenção de animais e equipamentos adequados, dificuldade das famílias em levar o idoso para a terapia. (P1)

O principal desafio acredito que seria vencer a barreira do preconceito. (P7)

Mostrar que é uma terapia para todas as idades e não apenas para pessoas com deficiência. (P18)

Discussão

A equoterapia é um método de abordagem inter-disciplinar que envolve profissionais da saúde, educação e equitação, como representado na diversidade de formação dos participantes deste estudo.88. Associação Nacional de Equoterapia. Apostila Curso Básico Equoterapia. Brasília: ANDE BRASIL; 2020. 97 p. Reitera-se que além do profissional de equitação, alguns da área da saúde fazem parte da equipe mínima necessária para um centro de equoterapia.88. Associação Nacional de Equoterapia. Apostila Curso Básico Equoterapia. Brasília: ANDE BRASIL; 2020. 97 p. Isso pode explicar, ainda que parcialmente, o fato de aproximadamente 70% da amostra ser de profissionais da saúde, como fisioterapeutas, psicólogos, fonoaudiólogos e professores de educação física.

Em relação ao aprofundamento em equoterapia, quase todos os participantes afirmaram o ter realizado. Não obstante, em cerca de 20% das profissionalizações a prática com idosos não foi abordada. Apesar de este ser um resultado aparentemente bom, já que quase 80% dos cursos contemplaram a velhice, mostra-se preocupante, sobretudo atualmente, quando constata-se um envelhecimento populacional acentuado.

Além da mudança demográfica,2323. Agência IBGE Notícias. Estatísticas Sociais. 2020 [cited 2021 May 29]. Available from: https://tinyurl.com/wrjea3pw
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formações em equoterapia que não abordem a prática com pessoas na velhice podem influenciar a percepção dos profissionais a respeito de praticantes nessa fase. Cita-se como exemplo um dos participantes deste estudo (P14), que fez uma formação em equoterapia que não contemplava a velhice e que relatou não achar seguro a montaria para idosos, mas sim o “trabalho de solo”. Isso evidencia um desconhecimento de pesquisas sobre intervenções com idosos, bem como da amplitude de possibilidades na terapia com cavalos. A equoterapia contempla diversas modalidades, que não só a montaria. Na Equine Assisted Learning (EAL), por exemplo, o processo é realizado totalmente no solo, com a participação do cavalo.2424. Equine Assisted Growth and Learning Association. 2021 [cited 2021 Feb 1]. Available from: https://www.eagala.org/org
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Não obstante, assim como em outras fases do curso de vida, medidas de segurança devem sempre ser adotadas para que quaisquer riscos sejam minimizados. Além disso, os profissionais devem atentar-se às contraindicações à prática da equoterapia, independentemente da idade, como luxação e subluxação de quadril, osteoporose, epilepsia, medo excessivo, entre outros.88. Associação Nacional de Equoterapia. Apostila Curso Básico Equoterapia. Brasília: ANDE BRASIL; 2020. 97 p.

Essa carência na formação de profissionais de equoterapia pode ainda ter como consequência uma menor qualidade do atendimento disponibilizado aos idosos ou uma baixa oferta da prática para esse agrupamento etário. Em relação a este aspecto, constatou-se no presente estudo que 40% dos profissionais nunca atenderam praticantes com 60 anos ou mais. Em geral, é possível que o fato de terem atendido poucos ou nenhum idoso na equoterapia esteja relacionado com, entre outros fatores, a falta de conhecimento sobre a prática com idosos. Isso pode ser fomentado pela própria sociedade que, tendo conhecimento reduzido, busca menos por essa terapia complementar; pelos profissionais de saúde, que ao terem acesso a poucos estudos nacionais sobre a prática com idosos1212. Matarazo JB. Equoterapia com idosos: resultados de pes-quisas e percepções de profissionais [master´s thesis]. Brasília: Universidade Católica de Brasília; 2021. 79 p. https://bdtd.ucb.br:8443/jspui/handle/tede/2892
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e por vezes com baixa qualidade metodológica, fazem menos encaminhamentos; e pelos locais de trabalho, que podem ter pessoas de outras fases do desenvolvimento como enfoque. Este aspecto pode ser ilustrado pelo relato de um dos participantes (P12), que afirmou não realizar mais atendimentos a pessoas na velhice, uma vez que o foco do centro em que atua são crianças.

Chama a atenção, no entanto, que nenhum dos profissionais mencionou trabalhar em um centro cujo enfoque fossem idosos. Essa realidade vivida pelos participantes é observada, também, nas pesquisas. Dos 20 artigos sobre equoterapia recuperados por Zamo e Trentini,2525. Zamo RS, Trentini CM. Revisão sistemática sobre avaliação psicológica nas pesquisas em equoterapia. Psicol Teor Prat. 2016;18(3):81-97. https://tinyurl.com/yrwx6f5x
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apenas três continham participantes idosos, e dos 78 recuperados por Wood e Fields,55. Wood WH, Fields BE. Hippotherapy: a systematic mapping review of peer-reviewed research, 1980 to 2018. Disabil Rehabil. 2019;43(10):1463-87. https://doi.org/10.1080/09638288.2019.1653997
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somente seis.

A pesquisa e a prática em equoterapia, sobretudo no Brasil, parecem, portanto, enfatizar as duas primeiras fases do curso de vida, especialmente a infância. É possível que o foco nessa etapa do desenvolvimento seja um objetivo a prioi do centro de equoterapia ou uma consequência da maior demanda de atendimentos por esse grupo. Reitera-se que o desconhecimento e a baixa divulgação dos resultados dessa prática com idosos pode impactar em uma menor procura, em menos encaminhamentos para os centros de equoterapia e em preços mais elevados, como pode ser observado no relato de um dos profissionais:

[...] a demanda maior da cidade/estado onde estou é para crianças TEA (transtorno do espectro autista) e as instituições de longa permanência (asilos) não possuem tanto interesse em diversificar as formas de atendimentos, devido à condição financeira dos idosos, o que torna-se uma dificuldade, visto que a pratica da equoterapia é uma terapia com custo elevado. (P15)

Aos serem questionados sobre as demandas de idosos que já atenderam, observa-se que os resultados obtidos nesta investigação estão em consonância com os de Matarazo.1212. Matarazo JB. Equoterapia com idosos: resultados de pes-quisas e percepções de profissionais [master´s thesis]. Brasília: Universidade Católica de Brasília; 2021. 79 p. https://bdtd.ucb.br:8443/jspui/handle/tede/2892
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A autora constatou, por meio de uma revisão sistemática da literatura sobre equoterapia com idosos, que pacientes com sequelas de AVC, esclerose múltipla, transtorno de estresse pós-traumático (TEPT), déficit de equilíbrio, Alzheimer ou outra demência e lesão medular têm constituído amostras de investigações nessa área. Ressalta-se que, dessas, somente TEPT não foi mencionado como demanda pelos participantes deste estudo. Não obstante, cumpre mencionar que em edições anteriores do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM), o TEPT fazia parte do grupo dos transtornos de ansiedade.2626. Araújo AC, Lotufo Neto F. A nova classificação americana para os transtornos mentais - o DSM-5. Rev Bras Ter Comport Cogn. 2014;16(1):67-82. https://tinyurl.com/5sy5ce7k
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Assim, é possível que alguns dos participantes deste estudo tenham referido o TEPT como transtorno de ansiedade.

Quanto aos benefícios percebidos pelos profissio-nais, tanto por quem já atendeu idosos quanto por aqueles que ainda não tiveram essa experiência, encontram-se a melhora no equilíbrio, qualidade de vida, autonomia, autoestima e socialização. Em geral, eles estão em consonância com os benefícios verificados por Matarazo.1212. Matarazo JB. Equoterapia com idosos: resultados de pes-quisas e percepções de profissionais [master´s thesis]. Brasília: Universidade Católica de Brasília; 2021. 79 p. https://bdtd.ucb.br:8443/jspui/handle/tede/2892
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Na revisão, a autora constatou que as variáveis mais analisadas foram equilíbrio, marcha, sintomas de TEPT, qualidade de vida, bem-estar físico e geral, depressão e ansiedade, com mais de 90% dos estudos evidenciando melhora nessas variáveis após a terapia com cavalos.

Segundo Wibelinger e Silveira,99. Wibelinger LM, Silveira MM. Equoterapia: qualidade de vida para o idoso sobre o cavalo. Rev Kairós Gerontol. 2011;14(1):181-93. https://revistas.pucsp.br/index.php/kairos/article/view/6935
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a equoterapia é um tratamento complementar importante para pessoas na velhice, pois o movimento do cavalo estimula o sistema vestibular, a consciência corporal, a concentração e o equilíbrio, prevenindo quedas e incapacidades funcionais e proporcionando bem-estar aos idosos. Esse método também auxilia na melhora da força muscular de membros inferiores, do equilíbrio e da marcha.2727. Agner VFC, Gonsalez AP. Benefícios da equoterapia em idosos: revisão de literatura. Rev Pesqui Fisioter. 2015;5(3):306-14. https://doi.org/10.17267/2238-2704rpf.v5i3.702
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Além dos benefícios, as dificuldades percebidas pelos profissionais no trabalho com pessoas na velhice também foram investigadas. Em geral, elas podem ser agrupadas em duas categorias: o idoso e o local de trabalho. Com relação à primeira, ela se subdivide em duas, isto é, dificuldades físicas (limitação motora) e psicológicas (insegurança para montar e medo da queda). Para lidar com esses dificultadores, entende-se que uma formação de qualidade em equoterapia e o conhecimento em gerontologia são essenciais. Ademais, a atuação de uma equipe interdisciplinar coesa pode contribuir para manejar desafios físicos e psicológicos. Há que se ter em mente que a equoterapia é uma prática cujo atendimento é individualizado, assim a montaria e os exercícios serão propostos de acordo com as demandas e possibilidades do indivíduo.8 Além disso, a equipe de mediadores é treinada para manter a segurança dos praticantes. No que se refere à segunda categoria, isto é, desafios envolvendo o local de trabalho, ressalta-se que é imprescindível que os centros de equoterapia disponham de estrutura física adequada para atender praticantes idosos, caso esse seja um de seus públicos-alvo.

Diferentemente dos profissionais que já atenderam idosos, aqueles que nunca trabalharam com praticantes dessa idade elencaram desafios que ultrapassam as duas categorias mencionadas, sobretudo no que se refere à dificuldade de deslocamento do idoso até os centros de equoterapia e ao preconceito existente sobre a prática com idosos. No que se refere ao primeiro aspecto, sabe-se que muitas vezes o idoso depende de terceiros para realizar seu deslocamento a outros locais. Assim, reforça-se a importância do compromisso dos cuidadores para o acompanhamento até o local da terapia; caso contrário, é possível que haja abandono do tratamento. Essa é uma realidade vivida não somente com praticantes na velhice. Nunes e Caberlon,1414. Nunes AP, Caberlon CF. A percepção dos pais quanto ao tratamento de equoterapia. Rev Inspirar. 2018;16(2):15-19. https://www.inspirar.com.br/wp-content/uploads/2018/04/revista-inspirar-ms-46-587-2018.pdf
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por exemplo, alertam sobre a importância de os profissionais terem atenção aos cuidadores de crianças com paralisia cerebral, pois são quem, usualmente, têm responsabilidade na continuidade do tratamento.

Com relação ao preconceito, é possível que ele advenha de uma compreensão estigmatizada de terapias assistidas por animais, bem como relacionada à idade, isto é, etarismo (preconceito etário). Um dos participantes (P18) afirmou sobre a necessidade de que a equoterapia seja entendida como um método que pode ser utilizado por diferentes idades e não apenas por pessoas com deficiência. Esse relato está em consonância com os resultados de Rocha et al.1515. Rocha IU, Delgado AG, Silva CF, Silva AA, Barreira APB, Oliveira VM, Santos TM. Percepção dos discentes de Medicina Veterinária (UFRRJ) sobre a equoterapia. Rev Cienc Ext. 2020; 16:21-35. https://ojs.unesp.br/index.php/revista_proex/article/view/2659
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Dos 248 discentes investigados por estes autores, pouco mais de 67% acreditam que a principal indicação para essa terapia são pessoas autistas, com deficiências e portadores de síndrome de Down. Apenas três (1,21%) responderam que a equoterapia poderia ser aplicada em todas as pessoas, sendo que 16,13% não souberam informar e 15,32% não responderam.1515. Rocha IU, Delgado AG, Silva CF, Silva AA, Barreira APB, Oliveira VM, Santos TM. Percepção dos discentes de Medicina Veterinária (UFRRJ) sobre a equoterapia. Rev Cienc Ext. 2020; 16:21-35. https://ojs.unesp.br/index.php/revista_proex/article/view/2659
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Uma das maneiras de minimizar o preconceito sobre equoterapia, especialmente com idosos, é por meio da divulgação em massa de resultados de pesquisas sobre essa prática, conscientizando profissionais, sociedade em geral e governantes. Atualmente é um momento propício para isso, já que a equoterapia foi regulamente em 2019 como prática terapêutica.1010. Brasil. Lei nº13.830, de 13 de maio de 2019. Dispõe sobre a prática da equoterapia. Brasília: Diário Oficial da União; 2019 May 14. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13830.htm
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A despeito das contribuições do presente estudo, talvez o único nacional que avalia a percepção de profissionais sobre a equoterapia com idosos, ele apresenta limitações. Menciona-se, por exemplo, o tamanho reduzido da amostra, o fato de ela ter sido obtida por conveniência, a participação mais expressiva de fisioterapeutas e, majoritariamente, de profissionais de duas regiões do Brasil.

Conclusão

Em geral, os participantes deste estudo consideram a equoterapia uma prática que pode trazer benefícios biopsicossociais para praticantes idosos, como aqueles que sofrem com sequelas de AVC, demências e transtornos de ansiedade; contudo, isso não impede que desafios e dificuldades existam. Citam-se como exemplos os aspectos que envolvem o idoso, a equipe de trabalho, os centros de equoterapia e a oferta e demanda para o serviço com esse grupo. Cumpre destacar, ainda, que a maioria da amostra deseja trabalhar com idosos, porém nem todos os cursos em equoterapia que fizeram abordaram essa prática na velhice. Isso pode contribuir para aumentar as dificuldades experienciadas e, eventualmente, reduzir o desejo e a divulgação do trabalho com idosos.

Espera-se que este estudo estimule o desenvol-vimento de outras pesquisas que envolvam a temática equoterapia com idosos e a divulgação desse tema para a sociedade em geral, profissionais da saúde, governantes e gestores. Somente munidos de conhecimento científico sobre essa prática é que preconceitos poderão ser desfeitos, encaminhamentos realizados e decisões tomadas sobre sua aplicação.

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Editado por

Editora associada: Mariana Asmar Alencar Collares

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    28 Nov 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    13 Abr 2022
  • Revisado
    13 Jul 2022
  • Aceito
    30 Set 2022
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