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Análise comparativa do custo de redes de abastecimento de água em setores urbanos verticais e horizontais

Comparative analysis of the cost of water supply networks in vertical and horizontal urban sectors

RESUMO

Em razão do custo elevado de implantação das redes de distribuição de água em relação ao sistema de abastecimento, estudos referentes ao que influencia esse custo tornam-se essenciais. Parte significativa dele refere-se à complexidade na espacialização da rede e nas formas de ocupação territorial das áreas urbanas. No presente trabalho, os custos de implantação das redes de abastecimento de água dos setores urbanos com predominância de construções verticais são comparados com os de construções horizontais. Para o dimensionamento das redes, em concordância com as condições de vazão e pressão necessárias, utilizou-se o modelo computacional The Environmental Protection Agency Network (EPANET). Os custos foram baseados no Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil. Observou-se que a rede implantada em áreas urbanas verticais apresentou custo 13,4% superior ao da mesma área com construções horizontais, mas ao mesmo tempo abastece um número de habitantes 13 vezes superior ao das áreas horizontais.

Palavras-chave:
sistema de abastecimento de água; construção vertical e horizontal; setor urbano residencial; análise de custo

ABSTRACT

Due to the high cost of implementing water distribution networks regarding the water supply system, studies related to the impact of this cost become essential. A significant part of this cost refers to the complexity of the network spatialization and the kinds of land use in urban areas. In the present work, the costs of implementing water supply networks in urban sectors of mainly vertical constructions are compared to those of horizontal constructions. For the design of the networks, the EPANET computer model was used, following the necessary discharge and pressure conditions. The costs were based on the National System of the Civil Construction Cost and Index Research. It was observed that the cost of the network implemented in urban vertical areas was 13.4% higher than the one in horizontal areas, but that, at the same time, it supplied water for a number of inhabitants 13 times higher than in horizontal areas.

Keywords:
water supply system; vertical and horizontal construction; urban residential sector; cost analysis

INTRODUÇÃO

O sistema de abastecimento de água (SAA) é um conjunto de infraestruturas, equipamentos e instalações que têm como finalidade prover água, atendendo a requisitos técnicos de quantidade e qualidade adequadas ao consumo humano (ORELLANA, 2018ORELLANA, A.; MARTIM, A.L.S.S.; ZUFFO, A.C.; DALFRÉ FILHO, J.G. Contribuição ao planejamento de reabilitação de redes de distribuição de água. Ribagua, v. 5, n. 2, 7p. 9 - 91, 2018.). De acordo com Tsutiya (2006TSUTIYA, M.T. Abastecimento de água. São Paulo: Departamento de Engenharia Hidráulica e Sanitária da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, 2006.), o objetivo de um SAA é propiciar água de boa qualidade ao usuário, com quantidade e pressão adequadas para o seu funcionamento. Assim, o SAA deve atender aos padrões de eficiência necessários para garantir o abastecimento da população de determinada região. Além disso, a vazão de captação deve ser baseada nos dados hidrológicos da região a fim de verificar se ela atende à demanda de projeto, principalmente em períodos críticos (ZHOU et al., 2002ZHOU, S.L. et al. Forecasting operational demand for an urban water supply zone. Journal of Hydrology, v. 259, n. 1 - 4, p. 189-202, 2002.), sem oferecer risco de interrupção de funcionamento para a rede de abastecimento. Os dados hidrológicos também subsidiam as estimativas dos custos ambientais e de escassez hídrica, que muitas vezes são ignorados para o cálculo das tarifas, comprometendo a sustentabilidade do SAA (GOMES; FIGUEIREDO JUNIOR, 2007GOMES, H.P. Sistema de abastecimento de água: dimensionamento econômico. João Pessoa: Universidade Federal da Paraíba, 2002.). Os equipamentos também devem ser dimensionados para atender à vida útil do SAA.

Segundo Sarzedas (2009SARZEDAS, G.L. Planejamento para a substituição de tubulações em sistemas de abastecimento de água-aplicação na rede de distribuição de água da Região Metropolitana de São Paulo. 2009. Dissertação (Mestrado em Engenharia) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2009.), a rede de abastecimento de água deve atender simultaneamente aos indicadores de desempenho hidráulico, qualidade de água e confiabilidade do serviço. Além disso, a literatura clássica apresenta o dimensionamento das redes de abastecimento de água baseado na demanda dos usuários, em que o atendimento às pressões e velocidades, em conformidade, devem respeitar um intervalo normativo (FEREREIRA; LUVIZOTTO JR., 2019FERREIRA, C.D.; LUVIZOTTO JR., E. Desenvolvimento de ferramenta integrada ao EPANET para auxiliar a análise da confiabilidade mecânica em projetos de rede de abastecimento de água. Revista DAE, v. 67, n. 215, 2019.). Todavia, na última década, algumas pesquisas propõem levar em consideração a qualidade da água distribuída e a confiabilidade do sistema (MARTINS, 2014MARTINS, V.R.A. Análise de perdas de água dos sistemas de captação, tratamento e adução dos subsistemas de abastecimento de água de Andorinhas, Queimadela e Rabagão. 2014. Dissertação (Mestrado em Tecnologia do Ambiente) - Universidade do Minho, Braga, Portugal, 2014.; NASCIMENTO et al., 2016NASCIMENTO, R.S.D.; CURI, R.C.; CURI, W.F.; OLIVEIRA, R.D.; SANTANA, C.F.D.D.; MEIRA, C.M.B.S. Simulação de alterações numa ETA convencional de porte médio para a produção de água segura. Revista Brasileira de Recursos Hídricos, v. 21, n. 2, p. 439 - 450, 2016.).

Um dos principais métodos para se avaliar a eficiência de um sistema de abastecimento de água é verificar se ele atende a todos os pontos propostos, com as vazões e pressões mínimas necessárias. A Norma Técnica Brasileira (NBR 12218) da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT, 1994ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. ABNT NBR 12218. Projeto de rede de distribuição de água para abastecimento público. Rio de Janeiro: ABNT, 1994.) estabelece que a rede de distribuição do SAA deve destinar água potável aos consumidores de forma contínua, em quantidade e pressão recomendadas. Diversos fatores podem fazer com que um sistema seja ineficiente para atender a todos os pontos da rede com esses quesitos, entre eles: escolha inadequada de um manancial, sem vazão necessária para abastecimento; erro no dimensionamento das tubulações e equipamentos, limitando a vazão no caso de perdas de pressão no SAA; vazamentos e perdas por falta de manutenção necessária.

Além de todas essas particularidades, uma rede de distribuição deve atender, com os padrões mínimos de funcionamento, a todas as regiões, incluindo as que possuem características diferenciadas: maior ou menor densidade geográfica, declividade acentuada ou não, distância dos centros produtores, sazonalidade de vazões de demanda, entre outras. Dessa forma, a rede de distribuição é considerada a parte mais complexa do SAA, pois depende totalmente da geometria espacial da região a ser abastecida. Isso faz com que as redes de distribuição de água sejam únicas, com características distintas umas das outras.

Boian et al. (2019) discutem os diversos modelos hidráulicos utilizados para os cálculos de vazão e diâmetro e para a caracterização da estrutura física dos sistemas de abastecimento. A tentativa de tornar esses parâmetros conhecidos é chamada de calibração e objetiva reproduzir o desempenho da rede em uma modelagem computacional.

Neste estudo, para a simulação dos diâmetros necessários a fim de atender a cada região, foi utilizado o modelo computacional EPANET, versão 2.0, para o cálculo dos diâmetros ideais de cada trecho da rede, a fim de maximizar a eficiência e minimizar o custo do SAA. Esse modelo computacional (ROSSMAN, 2000ROSSMAN, L. User’s manual. Water Supply and Water Resources Division National Risk Management Research Laboratory Cincinnati, OH 45268. Cincinnati, EUA, 2000.) foi desenvolvido pela Agência de Proteção Ambiental Americana (EPA) e vem sendo utilizado para diversas simulações que envolvem a distribuição de água nos SAA (BARROSO; GASTALDINI, 2010BARROSO, L.B.; GASTALDINI, M.C.C. Redução de vazamentos em um setor de distribuição de água de Santa Maria - RS. Revista Brasileira de Recursos Hídricos, v. 15, n. 2, p. 27-36, 2010.; MARTINS, 2014MARTINS, V.R.A. Análise de perdas de água dos sistemas de captação, tratamento e adução dos subsistemas de abastecimento de água de Andorinhas, Queimadela e Rabagão. 2014. Dissertação (Mestrado em Tecnologia do Ambiente) - Universidade do Minho, Braga, Portugal, 2014.; SOARES et al., 2004SOARES, A.K.; CHEUNG, P.B.; REIS, L.F.R.; SANDIM, M.P. Avaliação das perdas físicas de um setor da rede de abastecimento de água de Campo Grande - MS via modelo inverso. Engenharia Sanitária e Ambiental, v. 9, n. 4, p. 312 - 321, 2004.). Para Martins (2014MARTINS, V.R.A. Análise de perdas de água dos sistemas de captação, tratamento e adução dos subsistemas de abastecimento de água de Andorinhas, Queimadela e Rabagão. 2014. Dissertação (Mestrado em Tecnologia do Ambiente) - Universidade do Minho, Braga, Portugal, 2014.) e Odan (2013ODAN, F.K. Estudo de confiabilidade aplicado à otimização da operação em tempo real de redes de abastecimento de água. 2013. Tese (Doutorado em Engenharia Hidráulica e Saneamento) - Escola de Engenharia de São Carlos da Universidade de São Paulo, São Carlos, 2013.), é um dos programas mais eficientes para a simulação da qualidade da água e do comportamento hidráulico em condutos forçados, possibilitando verificar o nível dos reservatórios, as vazões e as pressões dos nós da tubulação, bem como o cruzamento de informações nas interfaces gráficas.

Para Kleiner et al. (2001KLEINER, Y.; ADAMS, B.J.; ROGERS, J.S. Water distribution network renewal planning. Journal of Computing in Civil Engineering, v. 15, n. 1, p. 15 - 26, 2001.), a rede de distribuição de água é tipicamente o componente mais caro de um SAA. O suprimento de água envolve custos de capital significativos, com sistemas de abastecimento que demandam investimento da engenharia em função da sua escala operacional, que é totalmente relacionada às redes de distribuição (ABBOT et al., 2012ABBOTT, M.; COHEN, B.; WANG, W.C. The performance of the urban water and wastewater sectors in Australia. Utilities Policy, v. 20, n. 1, p. 52-63, 2012.). Adicionalmente aos custos diretos e inerentes à obra e aos materiais, a implantação de uma rede de abastecimento gera impactos na área urbana de entorno, tais como poluição do ar com material particulado, poluição sonora, aumento do tráfego de veículos. Muitos desses efeitos geram custos indiretos, geralmente pouco tangíveis (i.e. os custos sociais), além daqueles diretamente relacionados à obra, entre os quais os de escavação, escoramento, assentamento, reaterro e recomposição de pavimento da referida intervenção (RODRIGUES, 2020RODRIGUES, P.S.; MOTTA, S.L.; OBRACZKA, M. Cost comparison of sewer construction technologies. Revista DAE, v. 68, n. 222, 2020.).Cada detalhe do sistema (i.e. topografia local, extensão, dimensão dos elementos) representa um custo adicional, tanto para a rede como para todo o SAA.

Okumura e Ramírez (2012OKUMURA, D.B.; RAMÍREZ, L.R.L. Estudo de Concepção da Rede de Abastecimento de Água para a Vila Joaniza/Ilha do Governador. 2012. Monografia (Graduação em Engenharia Civil) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2012.) calcularam o custo para diversos projetos de implementação de rede de abastecimento de água para atender à comunidade de Vila Joaniza, localizada na Ilha do Governador, no Rio de Janeiro. De acordo com as normas vigentes, dois casos foram utilizados para a verificação do sistema com maior viabilidade técnica e econômica para a região. Para a primeira concepção, planejou-se a instalação de dois reservatórios elevados e um apoiado. Para a segunda concepção, o abastecimento da região dependia somente de uma adutora com diâmetro nominal de 600 mm (DN 600), sem a utilização de reservatórios. Utilizando-se dos valores de custo padrão da concessionária local, a primeira concepção foi orçada em R$ 4.171.742,00, e a segunda, em R$ 2.843.871,33. Ambas incluíam o custo das tubulações e acessórios, de assentamento, ligações prediais e reposição de pavimentos, mas só a primeira continha o custo de implantação dos reservatórios.

Outro estudo realizado, por Leite et al. (2016LEITE, A.M.; ERICH K.; AKUTSU, J. Análise comparativa dos custos de implantação de redes simples e duplas para distribuição de água empregando tubos de PVC. Revista Nacional de Gerenciamento de Cidades, v. 4, n. 24, 2016.), comparou os custos de implantação de redes simples e duplas para a distribuição de água empregando tubos de policloreto de vinila (PVC). Em São Paulo, com base na utilização dos valores estabelecidos pelo Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil (SINAPI), disponibilizados pela Caixa Econômica Federal (CEF, 2019CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil (SINAPI). Catálogo de Composições - SP. São Paulo: Caixa Econômica Federal, 2019.), os custos para o assentamento da rede simples foram estimados em R$ 29,93/m para o DN 50, em R$ 39,81/m para o DN 75 e em R$ 54,68/m para o DN 100. Para a rede dupla, com a mesma base de valores, os custos para assentamento da rede foram estimados em R$ 57,94/m para o DN 50, em R$ 77,72/m para o DN 75 e em R$ 107,49/m para o DN 100. Já para cada ligação predial, foram calculados os custos de R$ 161,17/m para o DN 50, de R$ 168,61/m para o DN 75 e de R$ 179,07/m para o DN 100 na rede simples e os de R$ 133,07/m para o DN 50, de R$ 140,51/m para o DN 75 e de R$ 150,97/m para o DN 100 da rede dupla.

Com base nos estudos de Okumura e Ramírez (2012OKUMURA, D.B.; RAMÍREZ, L.R.L. Estudo de Concepção da Rede de Abastecimento de Água para a Vila Joaniza/Ilha do Governador. 2012. Monografia (Graduação em Engenharia Civil) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2012.) e Leite et al. (2016LEITE, A.M.; ERICH K.; AKUTSU, J. Análise comparativa dos custos de implantação de redes simples e duplas para distribuição de água empregando tubos de PVC. Revista Nacional de Gerenciamento de Cidades, v. 4, n. 24, 2016.), observa-se que a solução técnica e o traçado de rede adotados interferem significativamente no resultado financeiro da obra. Ou seja, redes diferentes que atendam de forma satisfatória à mesma região podem possuir custos inerentes de implantação muito distintos.

Em regiões urbanas, a concentração populacional encontra-se muito correlacionada com a verticalização. Esta, nas cidades, é um processo contemporâneo urbano que caracteriza a transformação das construções urbanas para um padrão cada vez mais vertical, ou seja, com a criação de edificações mais altas e com mais pavimentos. Entre os diversos fatores que podem estimular uma área urbana a ter expansão vertical mais acentuada está o crescimento populacional, pois busca-se melhor aproveitar a infraestrutura regional para a ocupação territorial. No entanto, no contexto do planejamento urbano, a avaliação da adequação da área territorial para fins de expansão deve abordar os processos de ocupação verticais e horizontais, de modo que a infraestrutura básica atenda a todas as especificidades técnicas operacionais (ABBOT, 2012ABBOTT, M.; COHEN, B.; WANG, W.C. The performance of the urban water and wastewater sectors in Australia. Utilities Policy, v. 20, n. 1, p. 52-63, 2012.; YAN, 2018YAN, Y.; ZHOU, R.; YE, X.; ZHANG, H.; WANG, X. Suitability evaluation of urban construction land based on an approach of vertical-horizontal processes. International Journal of Geo-Information, v. 7, n. 5, p. 198, 2018.).

Dessa forma, o conhecimento apurado sobre quais critérios devem ser adotados e como eles influenciam o custo de implantação das redes de abastecimento é indispensável para a etapa de planejamento de um SAA. Sabendo-se que esse custo se relaciona de forma significativa à complexidade da disposição espacial dos pontos de abastecimento, o presente estudo traz o comparativo entre os custos de implantação de uma rede em um setor de urbanização residencial vertical (com incidência de edifícios que possuem número elevado de pavimentos e alta densidade demográfica) e um setor de urbanização horizontal (com baixa densidade demográfica).

MATERIAIS E MÉTODOS

A análise comparativa dos custos de uma rede de abastecimento de água foi realizada com parâmetros baseados na região do Taquaral, município de Campinas, localizado no Estado de São Paulo (Figura 1). O uso e ocupação territorial dessa região é urbano e bem consolidado. A população local (Primavera, Parque Taquaral, Taquaral, Jardim Nossa Senhora Auxiliadora) é de 28.845 habitantes. A região escolhida vem-se destacando recentemente pela crescente verticalização dos novos empreendimentos.

Figura 1.
Localização do bairro Taquaral em Campinas, São Paulo, Brasil.

Para o desenvolvimento do estudo foram definidos dois tipos de delimitação de lotes, para a mesma área total. O procedimento foi realizado utilizando-se o software Google Earth. O primeiro tipo de delimitação representa o conjunto de lotes de um setor com urbanização vertical, e o outro, um setor com urbanização horizontal, ambos baseados no padrão observado na área de estudo. As quadras padronizadas foram dimensionadas para a posterior simulação dos custos da rede do SAA, no que se refere à densidade populacional. Para isso, compararam-se os dados entre os setores urbanos vertical e horizontal.

Para tanto, o dimensionamento das redes de abastecimento foi realizado de acordo com as normas técnicas da ABNT referentes aos SAA, de modo que todos os pontos críticos tiveram pressão e vazão suficientes para o seu funcionamento, tendo sido empregado o EPANET. No entanto, deve-se lembrar que o modelo EPANET se limita à simulação do comportamento hidráulico da rede e não ao seu dimensionamento. Dessa forma, ao longo do estudo, o dimensionamento hidráulico foi realizado de forma iterativa, com alterações pontuais. Cada resultado obtido era então simulado no EPANET, buscando-se a melhor solução para a implantação da rede do SAA, de forma a atender ao escopo do estudo. Essa metodologia pode resultar em várias soluções hidraulicamente possíveis, não considerando a melhor alternativa para a minimização dos custos de investimento e a operação do SAA (GOMES; SILVA, 2006GOMES, H.P.; SILVA, J.G. Dimensionamento econômico de sistemas de distribuição de água, considerando variáveis as condições de contorno do projeto. Revista Brasileira de Recursos Hídricos, Porto Alegre, v. 11, n. 2, p. 99 -110, 2006.). Para essa finalidade, a versão brasileira do EPANET inclui a interface LENHSNET (SALVINO, 2009SARZEDAS, G.L. Planejamento para a substituição de tubulações em sistemas de abastecimento de água-aplicação na rede de distribuição de água da Região Metropolitana de São Paulo. 2009. Dissertação (Mestrado em Engenharia) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2009.), a qual é capaz de dimensionar e otimizar a rede.

Delimitação dos lotes e quadras

Na área de estudo na região do Taquaral, verifica-se discrepância entre as quadras que possuem edifícios multifamiliares (com muitos pavimentos) (Figura 2A) e quadras que apresentam somente edifícios unifamiliares (com poucos pavimentos) (Figura 2B).

Figura 2.
Quadras de referência para o estudo na região do Taquaral, Campinas: (a) setor vertical e (b) setor horizontal.

Para comparar os custos de implementação da rede de abastecimento de água evitando diferentes traçados que afetem a comparação, as duas regiões foram definidas com a mesma área e distribuição de quadras; e essa área será distribuída a fim de replicar a área correspondente do bairro do Taquaral, definida em 600.000 m2. A quadra do setor horizontal foi definida com base na quadra da Figura 2B. Com o auxílio do software Google Earth (GOOGLE, 2019GOOGLE. Google Earth. Campinas, 2019. Disponível em: <http://earth.google.com/>. Acesso em: 20 mar. 2019.
http://earth.google.com/...
), mediu-se área equivalente a 6.600 m2. No intuito de regularizar o quarteirão, as dimensões adotadas foram de 44 m de largura e 150 m de comprimento.

O lote padrão dessa quadra horizontal foi baseado em parâmetros da mesma quadra pouco densa (Figura 2B). Ainda com o auxílio do Google Earth (GOOGLE, 2019GOOGLE. Google Earth. Campinas, 2019. Disponível em: <http://earth.google.com/>. Acesso em: 20 mar. 2019.
http://earth.google.com/...
), foi possível verificar a dimensão mais comum dos lotes (12,5 m x 22,0 m), o número de lotes total da quadra (24 lotes) e a largura da rua na região (10 m). Com essas referências, a quadra horizontal padrão foi adotada conforme a Figura 3.

Figura 3.
Quadra horizontal padrão adotada para o estudo.

Regularizando essa quadra na região total do Taquaral (600.000 m2), obtêm-se 70 quadras dispostas em uma grade de 7 x 10. De acordo com os dados do IBGE (2019INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Cidades. Rio de Janeiro, 2019. Disponível em: <https://cidades.ibge.gov.br>. Acesso em: 20 jun. 2019.
https://cidades.ibge.gov.br...
), adotou-se para cada unidade habitacional do setor horizontal o valor de 2,64 habitantes. Considerando-se o padrão adotado de 24 lotes por quadra e 70 quadras na região, a população total da região de estudo corresponde a 4.436 habitantes residindo em 1.680 unidades habitacionais.

Para estabelecer o lote padrão no setor vertical, foi necessário avaliar o Plano Diretor de Campinas, que define o coeficiente de aproveitamento máximo (CAM) do lote. No bairro Taquaral há três coeficientes diferentes. Dessa forma, foi adotado o valor de CAM = 2, que corresponde à maior área da região do Taquaral, de acordo com o Plano Diretor de Campinas (CAMPINAS, 2018). Seguindo essa heterogeneidade a respeito do CAM, foi utilizada uma edificação real, com CAM equivalente a 2, da construtora Valadares Gontijo (Empreendimento Prima Vista) como parâmetro. Ela possui apartamentos em oito pavimentos, com quatro apartamentos por pavimento.

A quadra do setor vertical (Figura 4) foi adotada com a mesma área do setor horizontal, de 6.600 m2. Assim, as dimensões empregadas foram de 30 m de largura por 22 m de comprimento (respeitando-se a área de ocupação do empreendimento Prima Vista).

Figura 4.
Quadra vertical padrão adotada para o estudo.

Contextualizando essa quadra na região do Taquaral (600.000 m2), o setor vertical também possui 70 quadras na região. Cada quadra possui dez lotes e 32 unidades habitacionais por lote (na média regional de oito pavimentos por edifício e quatro apartamentos por pavimento). Assim, admitindo-se os mesmos 2,64 habitantes por domicílio, obteve-se população total de 59.136 habitantes, residindo em 22.400 unidades habitacionais.

Dimensionamento da rede

Para o dimensionamento da rede do SAA, a vazão de projeto adotada foi de 17,90 L.s−1 para o setor horizontal e de 238,613 L.s−1 para o setor vertical. As tubulações foram escolhidas considerando-se os coeficientes de rugosidade dos materiais (C — coeficiente de Hazen-Williams) e as respectivas perdas de carga. O traçado planejado foi para uma rede malhada, de acordo com a metodologia proposta por Tsutiya (2006TSUTIYA, M.T. Abastecimento de água. São Paulo: Departamento de Engenharia Hidráulica e Sanitária da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, 2006.).

As alternativas de tubulação utilizadas pelo EPANET para a iteração foram: tubos PVC de DN 50 a 100 mm e tubo PVC DEFoFo de DN 150 a 300 mm, para a rede de água. No que se refere ao coeficiente de rugosidade, fator muito importante para o dimensionamento, adotou-se o valor para o PVC de C = 150, com base nos estudos de Porto (2006PORTO, R.M. Hidráulica Básica. 4. ed. São Carlos: Escola de Engenharia de São Carlos/Universidade de São Paulo, 2006.).

A definição do traçado da rede garante o abastecimento de toda a região, adotando-se uma rede malhada que, conforme Tsutiya (2006TSUTIYA, M.T. Abastecimento de água. São Paulo: Departamento de Engenharia Hidráulica e Sanitária da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, 2006., p. 391):

são constituídas por tubulações principais que formam anéis ou blocos, de modo que, pode-se abastecer qualquer ponto do sistema por mais de um caminho.

Dessa forma, é possível abastecer um ponto específico da região por meio de mais de uma fonte, o que torna a manutenção de um trecho muito menos impactante para outros pontos dessa região, fazendo desse tipo de traçado uma escolha positiva para regiões de grande demanda, sempre que possível.

A rede malhada definida acompanha todo o viário das regiões e considera como nós da rede cada cruzamento dessas vias. Como a região verticalizada e a região horizontalizada respeitam as mesmas dimensões e distribuições, o traçado será o mesmo para os dois casos. Esse traçado pode ser visto (em vermelho) na Figura 5, com 16.640 m e 88 nós (oito ruas na direção norte-sul e 11 ruas na direção leste-oeste).

Figura 5.
Pressões e velocidades da rede na região horizontal.

A consideração da diferença de cotas no terreno e da área de influência para cada nó aumenta a precisão da modelagem, pois interfere diretamente na declividade das tubulações e, consequentemente, na velocidade e na pressão da água. No EPANET, o consumo de cada nó é calculado por meio da multiplicação do consumo médio por habitação pelo número de habitações na área de influência de cada nó. Em uma situação real, essas áreas de influência são diferentes para cada nó. No entanto, neste estudo, tomou-se como hipótese a comparação de custos entre as duas regiões estudadas, isolando-se as demais variáveis que influenciariam nos resultados.

Com base na vazão de projeto da região horizontal de 17,899 L.s−1, considerando-se os 88 nós nesse traçado e supondo-se equilíbrio de demanda, determinou-se que o consumo médio por nó dessa rede é de 0,203 L.s−1. Na simulação de alguns cenários, feita para se obterem os menores diâmetros possíveis para abastecer a região horizontal (de forma eficiente e com baixo custo), foi possível obter os valores de pressão e velocidade vistos na Figura 5.

Pelo fato de o diâmetro mínimo (50 mm) ter dimensão superior à necessária em alguns trechos, determinados valores de velocidade não corresponderam ao mínimo previsto na norma. Contudo, todas as pressões desse sistema respeitaram os valores máximos e mínimos previstos, com uma perda de carga entre o ponto com maior pressão e o com menor pressão de 9,56 m.c.a. Esses valores de velocidade e pressão foram obtidos com a configuração de diâmetros em todas as seções com 50 mm, exceto nas três seções de alimentação do primeiro nó, as quais apresentam tubos de 75 mm.

Para a região vertical, com a vazão de projeto de 238,613 L.s−1 e considerando-se 88 nós nesse traçado, chegou-se ao consumo médio, por nó, de 2,712 L.s−1. Com o mesmo processo da região vertical de simular cenários e sempre iterar para se obterem os menores diâmetros possíveis que abasteceriam a região eficientemente e com baixo custo, foi possível chegar aos valores de pressão e velocidade vistos na Figura 6.

Figura 6.
Pressões e velocidades da rede na região vertical.

Nesse dimensionamento, os valores de velocidade máximo e mínimo foram atendidos na maioria dos trechos. Somente o trecho mais extremo da adutora obteve velocidade de 0,57 m.s−1, o que não obedece ao critério mínimo da norma NBR 12218 (ABNT, 1994ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. ABNT NBR 12218. Projeto de rede de distribuição de água para abastecimento público. Rio de Janeiro: ABNT, 1994.), valor muito próximo ao limite mínimo de 0,6 m.s−1. As pressões desse sistema também respeitaram os valores máximos e mínimos previstos em norma, apesar de que, para esse caso, foi necessária uma pressão inicial maior fornecida pela adutora. Esse sistema obteve uma perda de carga, entre o ponto com mais pressão e aquele com menos pressão, de 34,89 m.c.a. Esses valores de velocidade e pressão foram obtidos com a configuração de diâmetros observada na Figura 7.

Figura 7.
Diâmetros das tubulações da rede na região vertical.

Para evitar que pontos de velocidade baixa ou nula ocasionem riscos à saúde pública e custos desnecessários, um diâmetro mínimo foi adotado para essas regiões, pois a supressão de alguns trechos não geraria a rede malhada. Mesmo nos trechos em que o EPANET apresentou vazão residual (i.e. vazão próxima a nula), duas conexões foram distribuídas em cada ramal de 12 m (que corresponde à largura do lote padrão). Ressalta-se que outros dimensionamentos seriam possíveis para a otimização da rede. Entretanto, manteve-se o objetivo de comparação direta entre as duas condições propostas para o estudo, referentes aos setores H e V.

Custos da rede

Para o cálculo do custo da rede de abastecimento, foram utilizados os dados do SINAPI (CEF, 2019CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil (SINAPI). Catálogo de Composições - SP. São Paulo: Caixa Econômica Federal, 2019.) para a Região Metropolitana de São Paulo. Esse sistema representa uma das principais fontes de custos da construção civil no país. Também foram utilizados dados da Secretaria Municipal de Infraestrutura Urbana e Obras da Prefeitura de São Paulo (SÃO PAULO, 2019SÃO PAULO. Tabela de Custos: infraestrutura urbana. São Paulo: Secretaria de Infraestrutura Urbana e Obras, 2019. Disponível em: <https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/obras/tabelas_de_custos/>. Acesso em: 28 out. 2019.
https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/...
). A análise de custo da rede restringiu-se aos custos de serviços associados à implantação da rede: remoção do asfalto, escavação, transporte da tubulação, assentamento da tubulação e reaterro e recomposição do pavimento, além dos custos do material utilizado (tubulação).

Os custos da rede foram calculados de forma linear, considerando-se a escavação e o assentamento da tubulação (i.e. para todos os diâmetros), com os dados do SINAPI (CEF, 2019CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil (SINAPI). Catálogo de Composições - SP. São Paulo: Caixa Econômica Federal, 2019.) para a região de São Paulo, e a remoção de pavimento asfáltico, de acordo com São Paulo (2018SÃO PAULO. IR 01 - Instrução de reparação de pavimentos flexíveis danificados por abertura de valas. São Paulo: Secretaria de Infraestrutura Urbana e Obras, 2018.).

Os custos relacionados à implantação da rede do SAA envolvem essencialmente: o material aplicado e os serviços realizados; sendo assim, o custo total está diretamente associado aos diâmetros da tubulação. Maior diâmetro implica maior custo das tubulações e exige mais serviços de assentamento. Dessa forma, serão calculados os custos lineares da implementação de uma rede para cada diâmetro de tubulação e, então, será possível entender o custo da rede total. Com o auxílio da tabela disponibilizada pelo SINAPI (CEF, 2019CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil (SINAPI). Catálogo de Composições - SP. São Paulo: Caixa Econômica Federal, 2019.) para a região de São Paulo, conseguimos estimar o custo de assentamento e escavação para cada tipo de tubulação. Esses custos e seus respectivos códigos podem ser vistos na Tabela 1, que apresenta preços para o assentamento e a escavação de tubo de policloreto de vinila ponta-bolsa-anel (PVC PBA) para rede de água, DN indicado, junta elástica integrada, instalado em local com nível alto de interferências (que não inclui fornecimento). De acordo com o caderno técnico da SINAPI (CEF, 2019CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil (SINAPI). Catálogo de Composições - SP. São Paulo: Caixa Econômica Federal, 2019.), as composições da Tabela 1 não incluem os valores referentes ao material de tubos e conexões de PVC PBA atrelado à instalação nem os valores de levantamento (remoção) ou de reposição de pavimento.

Tabela 1.
Custos de assentamento e escavação.

Para a remoção do asfalto, foi utilizada como base a tabela disponibilizada pela Secretaria Municipal de Infraestrutura Urbana e Obras da Prefeitura de São Paulo (SÃO PAULO, 2018SÃO PAULO. IR 01 - Instrução de reparação de pavimentos flexíveis danificados por abertura de valas. São Paulo: Secretaria de Infraestrutura Urbana e Obras, 2018.) referente à reparação de pavimentos flexíveis danificados por abertura de valas, em que, para uma vala longitudinal, a largura mínima reposição da capa de concreto asfáltico é de 3 m. A reposição do pavimento asfáltico varia de acordo com o diâmetro da tubulação a ser instalada (Figura 8).

Figura 8.
Larguras mínimas sugeridas para as valas de tráfego: (a) leve; (b) médio; (c) pesado.

Observou-se que as dimensões mínimas para a reconstrução do pavimento asfáltico, as quais influenciam no custo total, variam de acordo com o tráfego. Exemplificando, na Figura 8A é possível obter as dimensões para os casos de pavimentos com tráfego leve. Baseando-se nas dimensões de largura e espessura, é possível calcular o quantitativo de materiais a serem utilizados em uma vala linear, sendo brita graduada simples (BGS) com 1 m (linear) x largura da vala x 0,1 m (espessura); Binder com 1 m (linear) x mínimo entre largura da vala ou 0,6 m x 0,04 m (espessura); e, finalmente, o concreto asfáltico com 1 m (linear) x 3 m (largura da remoção) x 0,04 m (espessura).

RESULTADOS

Considerando-se a população de 4.436 habitantes para a região horizontal e de 59.136 habitantes para a região vertical; os fatores de demandak_1 e k_2 iguais a 1,2 e 1,5, respectivamente (GOMES, 2002GOMES, H.P. Sistema de abastecimento de água: dimensionamento econômico. João Pessoa: Universidade Federal da Paraíba, 2002.); e o consumo per capita de 193.68 litros/hab/dia, que se extrai da média da série histórica de consumo médio per capita da cidade de Campinas (SNIS, 2019), pode-se estimar o valor da vazão de consumo para ambas as regiões. Obtiveram-se: Q_(d-h) 17,899 L.s−1, para a região horizontal, e Q_(d-v): 238,613 L.s−1, para a região vertical. De acordo com a NBR 12218 (ABNT, 1994ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. ABNT NBR 12218. Projeto de rede de distribuição de água para abastecimento público. Rio de Janeiro: ABNT, 1994.), referente aos projetos de redes para SAA, a velocidade mínima permitida para o fluido foi de 0,6 m.s−1 e a máxima de 3,5 m.s−1. Para a pressão máxima, o valor foi limitado em 500 KPa. Já para a pressão mínima, o valor foi limitado em 100 KPa. Para o SAA, foi considerado o traçado com 88 nós, sendo para o setor horizontal o consumo médio, por nó, de 0,20 L.s−1 e, para o vertical, de 2,71 L.s−1. Com esse dimensionamento, os valores de velocidade máximo e mínimo foram atendidos em todos os trechos.

Com base nas informações apresentadas na metodologia, considerando-se que o asfalto mínimo a ser demolido para a construção da vala de assentamento da tubulação possui a largura de 3 m, obtivemos o custo linear de remoção do asfalto de R$ 9,51 por metro linear segundo o código 05-05-00, referente à demolição de capa asfáltica, que inclui carga no caminhão (SÃO PAULO, 2018SÃO PAULO. IR 01 - Instrução de reparação de pavimentos flexíveis danificados por abertura de valas. São Paulo: Secretaria de Infraestrutura Urbana e Obras, 2018.).

Os custos associados referentes a esses materiais são baseados nos valores de custo de infraestrutura disponibilizados por São Paulo (2019SÃO PAULO. Tabela de Custos: infraestrutura urbana. São Paulo: Secretaria de Infraestrutura Urbana e Obras, 2019. Disponível em: <https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/obras/tabelas_de_custos/>. Acesso em: 28 out. 2019.
https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/...
) e de acordo com a largura da vala para cada diâmetro a ser instalado segundo a metodologia proposta pela Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (SABESP, 1999). O último valor representativo considerado nesta análise é o custo da tubulação, que fornece o resultado final dos custos lineares, conforme o que está apresentado na Tabela 2.

Tabela 2.
Custos da instalação de tubulação.

Apesar de o custo total da rede (R$/m) ser obtido pela composição direta de insumos e serviços, verificou-se que há correlação entre o diâmetro e o custo final. Para isso, foram testados dois modelos, por meio de regressão linear e exponencial, conforme o que consta nas Figuras 9A e 9B, respectivamente. Comparando-se o coeficiente de determinação da regressão linear (R2 = 0,97) com o da regressão exponencial (R2 = 0,99), observou-se que o modelo foi melhor ajustado para a regressão exponencial.

Figura 9.
Correlação entre o custo final e o diâmetro: (a) regressão linear; (b) regressão exponencial. DN: diâmetro nominal.

Seguindo-se a metodologia apresentada, com lotes e quadras delimitados, foi possível dimensionar a rede do SAA para os dois setores. Com a rede dimensionada e com os custos unitários obtidos para cada tubulação, foi então finalmente calculado o custo da rede do SAA para cada um dos setores: horizontal (H) e vertical (V). Os valores calculados encontram-se na Tabela 3.

Tabela 3.
Custos da rede do sistema de abastecimento de água.

Verifica-se que o custo total da implantação das redes do SAA no setor H é de R$ 2.705.183,40 e, no setor V, é de R$ 3.070.082,88; ou seja, o SAA no setor vertical abastece o correspondente a 13,33 vezes o total de pessoas do setor horizontal. Comparativamente, o custo total do setor V supera em apenas R$ 364.899,48 (i.e. 13,5%) o valor do setor H.

Quanto ao custo/habitante, as relações são de R$ 609,83/habitante abastecido pela rede do setor horizontal (R$ 2.705.183,40 para 4.436 pessoas) e de R$ 51,92/habitante abastecido pela rede do setor V (R$ 3.070.082,88 para abastecer 59.136 pessoas).

No setor H, a relação custo/habitante é 11,75 vezes superior à do setor V. Isso acontece pelo fato de a diferença entre os custos das tubulações mais representativas do SAA ser menor, ou seja, tubulações de maior diâmetro são mais econômicas no atendimento, considerando o valor per capita atendido. Isso acontece porque a diferença entre os custos das tubulações mais representativas dos sistemas é baixa. Mais de 82,00% do setor V apresenta tubulações de 50 mm (as de menor custo) e de 75 mm (somente 8,84% mais caras que as de 50 mm). As tubulações que trazem maiores incrementos (i.e. superiores a 50,00% em relação ao custo mínimo da tubulação de 50 mm) são pouco representativas na rede do setor V (11,25 %). A Tabela 4 apresenta a distribuição de diâmetros nas redes e evidencia esse cenário.

Tabela 4.
Comparação entre tubulações e representatividades (*comparados a DN 50 mm)

Essa pequena diferença entre os custos apresentados na Tabela 5 ocorre em decorrência de os custos de demolição e reconstrução do asfalto possuírem valores mínimos elevados em função das normas e dos serviços relacionados, o que torna marginais as diferenças dos valores de material e assentamento das tubulações. Por fim, verifica-se que os serviços de assentamento e, principalmente, os custos relacionados ao asfalto são mais representativos para os menores diâmetros e menos representativos para os maiores diâmetros.

Tabela 5.
Representatividade de custos relacionados ao asfalto

CONCLUSÕES

Os resultados do estudo revelam a importância da análise dos custos associados à implementação de redes do SAA para os diferentes tipos de setores urbanos encontrados no Plano Diretor de cada município.

Com o auxílio do modelo computacional EPANET, foi possível dimensionar redes que minimizam a perda de carga total, do ponto de maior para o de menor pressão. Por fim, observou-se que, apesar de a rede do SAA no setor V atender a mais de 13 vezes o número de habitantes do setor H, o seu custo total é superior em apenas 13,4%, graças ao impacto dos custos da pavimentação na implementação da rede. Excluindo-se esse custo da pavimentação, a diferença especificamente relacionada às redes é mais significativa, em 146,83%, complementando o contexto já estabelecido de que o custo do tratamento do pavimento pode representar 91% do custo total de implementação. Esses encargos relacionados à pavimentação podem se tornar impeditivos para possíveis reformas e mudanças na rede de abastecimento de água em municípios com recursos limitados.

Os custos elevados associados à pavimentação (em alguns casos até mais altos que os da tubulação) ressaltam a atenção que deve ser dada ao projeto hidráulico. Escolher tubulações de menor diâmetro com o objetivo de minimizar o custo pode não ser viável em longo prazo, pressupondo-se possíveis mudanças no consumo e na demanda de água. Isso porque a diferença entre escolher o diâmetro imediatamente maior (entre os estudados) pode custar, no máximo, R$ 106,15/m de diferença, porém caso ocorra aumento no consumo e seja necessário refazer parte do sistema, somente o custo referente ao pavimento asfáltico é de no mínimo R$ 147,86/m.

Avaliando-se proporcionalmente ao número de habitantes atendido, ou seja, o custo per capita para o setor V é de R$ 51,92/habitante, ao passo que para o setor H esse custo é de R$ 609,83/habitante. Com discrepância, municípios menos populosos e menos densos terão mais dificuldade de arcar com esses custos, dado que a arrecadação de recursos é menor, mas o custo total não tão distante (13,5% de diferença entre o custo total do setor V em relação ao setor H). Esse custo, entre outros que correspondem à infraestrutura do município, exemplifica o quanto é importante para a gestão do município facilitar e incentivar uma concentração saudável da população em áreas que propiciem a integração de sistemas, entre eles a rede do SAA. O incentivo pode ocorrer por meio de mudanças estratégicas no Plano Diretor.

Quando é levada em conta a perda de carga, embora a rede do setor H tenha apresentado perda total de 95,6 KPa e a rede do setor V perda de 348,9 KPa, não foram considerados neste estudo os custos energéticos de pressurização das redes do SAA, supondo-se que se encontram abaixo de 500 KPa.

Finalmente, em uma situação real, os diâmetros da tubulação de uma rede de SAA devem ser cuidadosamente escolhidos conforme o traçado da rede, o material, o consumo, os limites de pressões e velocidades, de forma otimizada, prevendo-se a expansão posterior da rede.

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  • Financiamento: nenhum.
  • 3
    Reg. ABES: 20210058

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Jun 2022
  • Data do Fascículo
    May-Jun 2022

Histórico

  • Recebido
    02 Mar 2021
  • Aceito
    09 Set 2021
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