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Estressores psicossociais ocupacionais e sofrimento mental em trabalhadores de saúde na pandemia de COVID-19

RESUMO

Objetivo

Analisar os fatores associados ao sofrimento mental de trabalhadores de saúde que atuavam na assistência a pacientes com diagnóstico suspeito ou confirmado de doença pelo coronavírus 2019 (COVID-19).

Métodos

Estudo transversal analítico de abrangência nacional, realizado no segundo trimestre de 2020. Participaram 437 profissionais de saúde que preencheram formulário eletrônico sobre dados sociodemográficos, aspectos ocupacionais, características psicossociais do trabalho e sofrimento mental. Foi realizada regressão logística múltipla para analisar as covariáveis associadas ao sofrimento mental.

Resultados

Predominaram trabalhadores da equipe de enfermagem (65,0%), do sexo feminino (71,0%), da região Sudeste do país (68,6%) e sem morbidades (36,2%). A prevalência de sofrimento mental foi de 61,6%. O trabalho de alta exigência psicossocial foi informado por 24% dos participantes e a percepção de baixo apoio dos colegas de trabalho foi relatada por 52,9%. O modelo de regressão múltiplo final demonstrou que o sofrimento mental estava associado a: sexo feminino (razão de chance - RC: 1,93; IC95%: 1,22-3,07), idade até 40 anos (RC: 1,64; IC95%: 1,07-2,52), jornada semanal de trabalho igual ou superior a 60 horas (RC: 1,87; IC95%: 1,15-3,11), trabalho de alta exigência (RC: 2,45; IC95%: 1,41-4,40) e baixo apoio dos colegas (RC: 3,47; IC95%: 2,26-5,38).

Conclusão

Seis em cada dez participantes apresentavam quadro de sofrimento mental associado tanto a características individuais, quanto a fatores relacionados ao trabalho realizado durante a pandemia. É urgente a necessidade de mapear os serviços que tenham tais características, para delinear ações de promoção da saúde mental e prevenção do desgaste emocional nos diversos níveis de atenção em saúde.

Infecções por coronavírus; COVID-19; Pessoal de saúde; Transtornos mentais; Saúde do trabalhador; Epidemiologia

ABSTRACT

Objective

To analyze the factors associated with mental distress among health workers who cared for patients with a suspected or confirmed diagnosis of coronavirus disease 2019 (COVID-19).

Methods

A cross-sectional analytical study of national scope, carried out between in the second quarter of 2020. A total of 437 health professionals, who filled out an electronic form about sociodemographic data, occupational aspects, psychosocial characteristics of work and mental distress. Multiple logistic regression was performed to analyze the covariables associated with mental distress.

Results

There was a predominance of workers on the nursing team (65.0%), female (71.0%), from Southeastern region of the country (68.6%) and with no morbidities (36.2%). The prevalence of mental distress was 61.6%. Job strain was reported by 24% of participants, and the perception of low support from coworkers was described by 52.9%. The final multiple regression model showed that mental distress was associated with females (odds ratio - OR: 1.93; 95%CI: 1.22-3.07), age up to 40 years (OR: 1.64; 95%CI: 1.07-2.52), weekly working hours equal or over 60 hours (OR: 1.87; 95%CI: 1.15-3.11), job strain (OR: 2.45; 95%CI: 1.41-4.40) and low support from co-workers (OR: 3.47; 95%CI: 2.26-5.38).

Conclusion

Six out of ten participants presented mental distress, which was associated to both individual characteristics and factors related to the work carried out during the pandemic. There is an urgent need to map services that have such characteristics, to outline actions to promote mental health and prevent emotional distress at different levels of health care.

Coronavirus infections; COVID-19; Health personnel; Mental disorders; Occupational health; Epidemiology

INTRODUÇÃO

O estado de emergência global decretado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), em março de 2020, devido à doença pelo coronavírus 2019 (COVID-19) causada pelo coronavírus da síndrome respiratória aguda grave 2 (SARS-CoV-2), um agente etiológico de rápida propagação e causador de grave doença,(11. World Health Organization (WHO). Naming the coronavirus disease (COVID-19) and the virus that causes it. Geneva: WHO; 2020 [cited 2020 Nov 11]. Available from: https://www.who.int/emergencies/diseases/novel-coronavirus-2019/technical-guidance/naming-the-coronavirus-disease-(covid-2019)-and-the-virus-that-causes-it
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,22. Pan American Health Organization (PAHO). WHO characterizes COVID-19 as a pandemic. Washington (DC): PAHO; 2020 [cited 2020 Nov 11]. Available from: https://www.paho.org/en/news/11-3-2020-who-characterizes-covid-19-pandemic
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) trouxe repercussões não somente às pessoas afetadas pela doença, mas também aos trabalhadores da saúde, responsáveis por essa assistência. A contaminação e o adoecimento dos profissionais envolvidos no atendimento dos pacientes são realidades na pandemia, inclusive com o registro de 364 casos de óbito de trabalhadores da saúde por essa infecção até a 49ª semana epidemiológica de 2020 no Brasil.(33. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Boletim epidemiológico especial: doença pelo coronavírus COVID-19. Semana epidemiológica 49 (29/11 a 05/12/2020). Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2020 [citado 2020 Dez 14]. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/media/pdf/2020/dezembro/11/boletim_epidemiologico_covid_40-1.pdf
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) Nesse sentido, urge a necessidade de acompanhamento desses grupos com maior potencial de adoecimento, a partir da atuação em setores específicos, como a linha de frente de cuidado com a saúde.(44. Nguyen LH, Drew DA, Graham MS, Joshi AD, Guo CG, Ma W, Mehta RS, Warner ET, Sikavi DR, Lo CH, Kwon S, Song M, Mucci LA, Stampfer MJ, Willett WC, Eliassen AH, Hart JE, Chavarro JE, Rich-Edwards JW, Davies R, Capdevila J, Lee KA, Lochlainn MN, Varsavsky T, Sudre CH, Cardoso MJ, Wolf J, Spector TD, Ourselin S, Steves CJ, Chan AT; Coronavirus Pandemic Epidemiology Consortium. Risk of COVID-19 among front-line health-care workers and the general community: a prospective cohort study. Lancet Public Heal. 2020;5(9):e475-83.)

Os serviços de atendimento dos pacientes sofreram mudanças organizacionais e ambientais abruptas, culminando na alteração de suas rotinas. A intensificação do trabalho foi desvelada como uma das principais características desse processo, em especial quanto às atividades de assistência à saúde, nos diversos níveis de atenção. A superlotação das unidades, a falta de equipamentos para cuidados e de leitos para internação são problemas na organização do trabalho que impactaram na saúde das equipes, nesse contexto pandêmico.(55. Liu Y, Li J, Feng Y. Critical care response to a hospital outbreak of the 2019-nCoV infection in Shenzhen, China. Crit Care. 2020;24(1):56.,66. Shaukat N, Ali DM, Razzak J. Physical and mental health impacts of COVID-19 on healthcare workers: a scoping review. Int J Emerg Med. 2020;13(1):40. Review.) Os estressores psicossociais no trabalho podem desencadear emoções negativas dos profissionais de linha de frente contra a epidemia, requerendo estratégias de enfrentamento para a manutenção de sua saúde mental.(77. Sun N, Wei L, Shi S, Jiao D, Song R, Ma L, et al. A qualitative study on the psychological experience of caregivers of COVID-19 patients. Am J Infect Control. 2020;48(6):592-8.) Deve-se, então, refletir sobre as diferentes possibilidades de adoecimento dos trabalhadores de saúde, para além do diagnóstico de COVID-19.

Nessa perspectiva, o reconhecimento do estado de vulnerabilidade, aliado às incertezas vivenciadas no período pandêmico, pode exercer influência negativa no bem-estar dos profissionais de saúde.(77. Sun N, Wei L, Shi S, Jiao D, Song R, Ma L, et al. A qualitative study on the psychological experience of caregivers of COVID-19 patients. Am J Infect Control. 2020;48(6):592-8.) Aqueles que estão em contato direto e frequente com pacientes com suspeita ou confirmação de infecção tendem a apresentar maior risco de sobrecarga psicológica,(88. Zerbini G, Ebigbo A, Reicherts P, Kunz M, Messman H. Psychosocial burden of healthcare professionals in times of COVID-19 - a survey conducted at the University Hospital Augsburg. Ger Med Sci. 2020;18:Doc05.) e desenvolvimento tanto de quadros depressivos, quanto ansiosos.(77. Sun N, Wei L, Shi S, Jiao D, Song R, Ma L, et al. A qualitative study on the psychological experience of caregivers of COVID-19 patients. Am J Infect Control. 2020;48(6):592-8.,99. Pappa S, Ntella V, Giannakas T, Giannakoulis VG, Papoutsi E, Katsaounou P. Prevalence of depression, anxiety, and insomnia among healthcare workers during the COVID-19 pandemic: a systematic review and meta-analysis. Brain Behav Immun. 2020;88:901-7. Erratum in: Brain Behav Immun. 2021;92:247.,1010. Choudhury T, Debski M, Wiper A, Abdelrahman A, Wild S, Chalil S, et al. COVID-19 pandemic: looking after the mental health of our healthcare workers. J Occup Environ Med. 2020;62(7):e373-6.) Dados do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) indicam que nos últimos anos tais diagnósticos são os motivos mais frequentes de incapacidade laborativa por doenças psiquiátrica entre trabalhadores no Brasil. Desse modo, o reconhecimento precoce de sinais de sofrimento psicológico pode auxiliar no direcionamento para suporte e cuidados adequados, a fim de proteger a saúde física e mental desse grupo.(1010. Choudhury T, Debski M, Wiper A, Abdelrahman A, Wild S, Chalil S, et al. COVID-19 pandemic: looking after the mental health of our healthcare workers. J Occup Environ Med. 2020;62(7):e373-6.)

OBJETIVO

Analisar os fatores associados ao sofrimento mental de trabalhadores de saúde que atuavam na assistência a pacientes com diagnóstico suspeito ou confirmado de COVID-19.

MÉTODOS

Estudo transversal analítico, realizado entre abril e junho de 2020, contemplando dados da primeira fase da pesquisa intitulada Potenciais de Desgaste e Fortalecimento dos Trabalhadores de Saúde Atuantes nos Cenários de Atendimento à Doença por Coronavírus 2019 (COVID-19), desenvolvido na Faculdade de Enfermagem da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (FE-UERJ) e instituições parceiras.

A amostra foi composta por conveniência, considerando-se as limitações de acesso presencial dos sujeitos de pesquisa e das instituições no momento crítico do aumento de casos atendidos no Brasil. Foram convidados profissionais de saúde de diversas áreas, atuantes em todos os níveis de atenção, na linha de frente do cuidado com pacientes com COVID-19. O convite ocorreu por divulgação virtual, via e-mail e redes sociais, que incluiu o endereço da página eletrônica com formulário para coleta de dados sociodemográficos (sexo, idade e região do país onde residia/trabalhava), ocupacionais (profissão, nível de atenção, complexidade de assistência à saúde, caracterização de vínculo institucional, jornada semanal de trabalho e fatores psicossociais do trabalho) e clínicos (morbidades clínicas e sofrimento mental).

Para avaliar as características psicossociais do trabalho, foi utilizada a versão validada para o português da Job Stress Scale (JSS),(1111. Alves MG, Chor D, Faerstein E, Lopes Cde S, Werneck GL. Short version of the “job stress scale”: a Portuguese-language adaptation. Rev Saude Publica. 2004;38(2):164-71.) baseada no modelo que discute a percepção do trabalhador quanto à interface entre as demandas qualiquantitativas do trabalho, o controle/a latitude de decisão para cumprimento das tarefas e o apoio oferecido por supervisores e colegas.(1212. Araújo TM, Graça CC, Araújo E. Estresse ocupacional e saúde: contribuições do modelo demanda-controle. Cien Saude Colet. 2003;8(4):991-1003.) O questionário contém 17 itens, com quatro opções de resposta em escala do tipo Likert para avaliar as três dimensões.(1111. Alves MG, Chor D, Faerstein E, Lopes Cde S, Werneck GL. Short version of the “job stress scale”: a Portuguese-language adaptation. Rev Saude Publica. 2004;38(2):164-71.)

Na avaliação do sofrimento mental, foi utilizada a versão validada para o português falado no Brasil do Self-Reporting Questionnaire (SRQ-20), desenvolvido pela World Health Organization (WHO) para fins de triagem de transtornos mentais.(1313. Mari JJ, Williams P. A validity study of a psychiatric screening questionnaire (SRQ-20) in primary care in the city of Sao Paulo. Br J Psychiatry. 1986;148:23-6.,1414. World Health Organization (WHO). A user’s guide to the Self Reporting Questionnaire (SRQ). Geneva: WHO; 1994 [cited 2020 Nov 11]. Available from: https://apps.who.int/iris/bitstream/handle/10665/61113/WHO_MNH_PSF_94.8.pdf?sequence=1&isAllowed=y
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) São 20 perguntas sobre sintomas de depressão, ansiedade e estresse, com resposta dicotômica (sim/não), sendo considerado quadro de sofrimento mental quando há sete ou mais respostas positivas, independentemente do sexo do participante.(1515. Gonçalves DM, Stein AT, Kapczinski F. Avaliação de desempenho do Self-Reporting Questionnaire como instrumento de rastreamento psiquiátrico: um estudo comparativo com o Structured Clinical Interview for DSM-IV-TR. Cad Saude Publica. 2008;24(2):380-90.)

Os dados numéricos foram apresentados por meio de estatística descritiva (frequências, médias e desvio padrão) e foram categorizadas para análise. As variáveis independentes categóricas foram submetidas ao teste do χ22. Pan American Health Organization (PAHO). WHO characterizes COVID-19 as a pandemic. Washington (DC): PAHO; 2020 [cited 2020 Nov 11]. Available from: https://www.paho.org/en/news/11-3-2020-who-characterizes-covid-19-pandemic
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com o desfecho sofrimento mental. As variáveis cujo valor de p fossem iguais ou menores que 0,20 foram selecionadas para o modelo de regressão logística múltiplo, construído com inclusão das variáveis conforme a ordem crescente do valor de p. Foi utilizado o método de stepwise forward mantendo na modelagem as variáveis associadas ao desfecho (p≤0,05), apresentando razão de chance (RC) da regressão univariada e múltipla, assim como o intervalo de confiança de 95% (IC95%). Os dados foram tabulados em planilhas do Microsoft® Excel® para Office 365 MSO, versão 16.0.12527.20986, e analisados com auxílio do software estatístico R, versão 1.2.5033.

O protocolo de pesquisa seguiu as recomendações da resolução 510 de 2016 do Conselho Nacional de Saúde, além de suas resoluções complementares, sendo registrado na Plataforma Brasil sob o CAAE: 30599420.0.0000.0008 e aprovado pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), sob parecer 3.979.223. Todos os participantes acessaram virtualmente o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e aceitaram fazer parte da pesquisa.

RESULTADOS

O grupo que participou do estudo foi de 437 profissionais da saúde. Suas características são apresentadas na tabela 1. A maioria de participantes foi da equipe de enfermagem (65,0%), com média de idade de 38,4 anos (desvio-padrão - DP±10,0). O perfil da maioria dos participantes era sexo feminino (71,0%), morando e trabalhando na região Sudeste do país (68,6%) e sem morbidades (63,8%). A prevalência de sofrimento mental foi de 61,6%.

Tabela 1
Distribuição dos trabalhadores de serviços de saúde conforme características sociodemográficas, ocupacionais e clínicas – Brasil, 2020

A maioria possuía vínculo apenas na rede pública de saúde (70,1%), em uma única instituição (60,9%), com carga horária de 40 a 59 horas semanais (49,3%), regime contratual celetista (33,3%) e atuação mais frequente na Atenção Primária (31,5%).

Quanto às características psicossociais do trabalho, a alta exigência (job strain), com alto nível de demandas e baixo controle sobre o trabalho, foi informada por 24% dos participantes. A percepção de baixo apoio dos colegas de trabalho foi maioria (52,9%).

Foram selecionadas para modelagem da regressão logística as variáveis sexo, faixa etária, profissão, jornada semanal de trabalho, morbidades e características psicossociais do trabalho, incluindo apoio social.

No modelo múltiplo, foi observado que participantes do sexo feminino tiveram chance maior que 93,0% de relatar sofrimento mental, comparando com o sexo masculino; e aqueles de faixa etária inferior a 40 anos tiveram chance 64,0% maior de sofrimento mental, do que aqueles com 40 ou mais anos. Quanto às características da organização do trabalho, a jornada igual ou superior a 60 horas semanais aumentou em 87,0% a chance do desfecho entre os participantes do grupo. A chance do sofrimento mental no grupo estudado foi 2,45 vezes maior quando o trabalho foi caracterizado como de alta exigência, e 3,47 vezes maior quando houve percepção de baixo apoio social no trabalho (Tabela 2).

Tabela 2
Regressão logística univariada e múltipla para estudo dos fatores associados ao sofrimento mental entre profissionais de saúde – Brasil, 2020

DISCUSSÃO

A prevalência de sofrimento mental encontrada no presente estudo é superior à de outras pesquisas nacionais anteriores à pandemia causada pelo SARS-CoV-2, que analisaram amostras de profissionais da saúde de diferentes áreas e utilizaram o mesmo ponto de corte no SRQ-20, as quais indicaram variabilidade de prevalência entre 21% e 42,6% de sofrimento mental.(1616. Araújo TM, Mattos AI, Almeida MM, Santos KO. Psychosocial aspects of work and common mental disorders among health workers: contributions of combined models. Rev Bras Epidemiol. 2016;19(3):645-57.

17. Braga LC, Carvalho LR, Binder MC. Condições de trabalho e transtornos mentais comuns em trabalhadores da rede básica de saúde de Botucatu (SP). Cien Saude Colet. 2010;15(Suppl 1):1585-96.
-1818. Carvalho DB, Araújo TM, Bernardes KO. Transtornos mentais comuns em trabalhadores da Atenção Básica à Saúde. Rev Bras Saúde Ocup. 2016;41:e17.) A taxa mais elevada de casos encontrada no presente estudo pode ser explicada pelos aspectos inerentes ao contexto da pandemia de COVID-19 e por seus impactos em toda a sociedade e, particularmente, entre os trabalhadores da área da saúde.(66. Shaukat N, Ali DM, Razzak J. Physical and mental health impacts of COVID-19 on healthcare workers: a scoping review. Int J Emerg Med. 2020;13(1):40. Review.)

Estudo brasileiro de base populacional com mais de 45 mil participantes realizado no primeiro semestre de 2020 verificou que 40,4% dos participantes frequentemente se sentiam tristes ou deprimidos, e 52,6% se sentiam ansiosos ou nervosos.(1919. Barros MB, Lima MG, Malta DC, Szwarcwald CL, Azevedo RC, Romero D, et al. Report on sadness/depression, nervousness/anxiety and sleep problems in the Brazilian adult population during the COVID-19 pandemic. Epidemiol Serv Saude. 2020;29(4):e2020427.) Quanto aos trabalhadores da saúde, revisão sistemática de 13 estudos realizados durante a pandemia somando mais de 33 mil participantes na Ásia mensurou prevalência combinada de ansiedade em 23,2% e depressão em 22,8%.(99. Pappa S, Ntella V, Giannakas T, Giannakoulis VG, Papoutsi E, Katsaounou P. Prevalence of depression, anxiety, and insomnia among healthcare workers during the COVID-19 pandemic: a systematic review and meta-analysis. Brain Behav Immun. 2020;88:901-7. Erratum in: Brain Behav Immun. 2021;92:247.) Aqueles que estavam na linha de frente e envolvidos no atendimento direto do paciente com a infecção viral apresentavam maior risco de depressão, ansiedade, insônia e estresse.(2020. Lai J, Ma S, Wang Y, Cai Z, Hu J, Wei N, et al. Factors associated with mental health outcomes among health care workers exposed to Coronavirus Disease 2019. JAMA Netw Open. 2020;3(3):e203976.) Como o presente estudo brasileiro utilizou o questionário da WHO, que aborda sinais e sintomas psicoemocionais menos específicos, seu resultado pode gerar estimativa mais ampla do desgaste mental e, por tal motivo, é indicado para triagem nos serviços de saúde.(1414. World Health Organization (WHO). A user’s guide to the Self Reporting Questionnaire (SRQ). Geneva: WHO; 1994 [cited 2020 Nov 11]. Available from: https://apps.who.int/iris/bitstream/handle/10665/61113/WHO_MNH_PSF_94.8.pdf?sequence=1&isAllowed=y
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)

O predomínio de participantes do sexo feminino na amostra é compatível com dados globais que indicam maior frequência de mulheres na força de trabalho do setor da saúde (70%).(2121. Boniol M, McIsaac M, Xu L, Wuliji T, Diallo K, Campbell J. Gender equity in the health workforce: analysis of 104 countries. Health Workforce Working paper 1. March 2019. Geneva: World Health Organization; 2019 [cited 2020 Nov 11]. Available from: https://apps.who.int/iris/bitstream/handle/10665/311314/WHO-HIS-HWF-Gender-WP1-2019.1-eng.pdf?ua=1
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) Os dados do presente estudo demonstraram que a chance de sofrimento mental entre as trabalhadoras brasileiras foi duas vezes maior do que entre os homens. Na Ásia, as trabalhadoras de saúde apresentaram maior frequência de sintomas depressivos (26,9% versus 20,3%) e ansiosos (29,1% versus 20,9%),(99. Pappa S, Ntella V, Giannakas T, Giannakoulis VG, Papoutsi E, Katsaounou P. Prevalence of depression, anxiety, and insomnia among healthcare workers during the COVID-19 pandemic: a systematic review and meta-analysis. Brain Behav Immun. 2020;88:901-7. Erratum in: Brain Behav Immun. 2021;92:247.) além de quadros mais graves de transtornos mentais.(2020. Lai J, Ma S, Wang Y, Cai Z, Hu J, Wei N, et al. Factors associated with mental health outcomes among health care workers exposed to Coronavirus Disease 2019. JAMA Netw Open. 2020;3(3):e203976.) Essa diferença entre os sexos tem diversas explicações psicossociais relativas ao mundo do trabalho, como, por exemplo, menor remuneração da mulher e ocupação de cargos menos valorizados dentro do ramo da economia dos serviços de saúde.(2121. Boniol M, McIsaac M, Xu L, Wuliji T, Diallo K, Campbell J. Gender equity in the health workforce: analysis of 104 countries. Health Workforce Working paper 1. March 2019. Geneva: World Health Organization; 2019 [cited 2020 Nov 11]. Available from: https://apps.who.int/iris/bitstream/handle/10665/311314/WHO-HIS-HWF-Gender-WP1-2019.1-eng.pdf?ua=1
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) A questão da dupla jornada (trabalho-casa) pode ser um fator relevante para esse resultado, considerando o risco de aumento da carga de trabalho global nesse cenário de pandemia, com a intensificação das tarefas de trabalho e domiciliares.

Os participantes com menos de 40 anos tiveram maior chance de sofrimento mental, resultado este que está alinhado a dados pré-pandêmicos.(2222. Nascimento Sobrinho CL, Carvalho FM, Bonfim TA, Cirino CA, Ferreira IS. Condições de trabalho e saúde mental dos médicos de Salvador, Bahia, Brasil. Cad Saude Publica. 2006;22(1):131-40.,2323. Dilélio AS, Facchini LA, Tomasi E, Silva SM, Thumé E, Piccini RX, et al. Prevalência de transtornos psiquiátricos menores em trabalhadores da atenção primária à saúde das regiões Sul e Nordeste do Brasil. Cad Saude Publica. 2012;28(3):503-14.) Em estudo realizado no Reino Unido durante o surto global pelo SARS-Cov-2 não houve diferença entre as faixas etárias quanto aos sintomas psicológicos,(1010. Choudhury T, Debski M, Wiper A, Abdelrahman A, Wild S, Chalil S, et al. COVID-19 pandemic: looking after the mental health of our healthcare workers. J Occup Environ Med. 2020;62(7):e373-6.) mas, em cenários de surtos virais prévios, os trabalhadores mais jovens e aqueles com menos experiência eram mais predispostos a apresentar distúrbios psicoemocionais.(2424. Kisely S, Warren N, McMahon L, Dalais C, Henry I, Siskind D. Occurrence, prevention, and management of the psychological effects of emerging virus outbreaks on healthcare workers: rapid review and meta-analysis. BMJ. 2020;369:m1642. Review.) Uma hipótese para esse resultado seria a de que os trabalhadores com idade mais avançada e, provavelmente, com mais anos de profissão tenham desenvolvido estratégias que permitiram um enfrentamento menos traumático dos estressores pessoais e profissionais decorrentes do contexto da COVID-19.

Não foi encontrada diferença na frequência de desgaste mental entre as profissões dos participantes da pesquisa. Entretanto, revisão sistemática indicou que a equipe de enfermagem tinha maior frequência de quadros depressivos e ansiosos do que a equipe médica;(99. Pappa S, Ntella V, Giannakas T, Giannakoulis VG, Papoutsi E, Katsaounou P. Prevalence of depression, anxiety, and insomnia among healthcare workers during the COVID-19 pandemic: a systematic review and meta-analysis. Brain Behav Immun. 2020;88:901-7. Erratum in: Brain Behav Immun. 2021;92:247.) estudo chinês demonstrou sintomas mais graves no primeiro grupo.(2020. Lai J, Ma S, Wang Y, Cai Z, Hu J, Wei N, et al. Factors associated with mental health outcomes among health care workers exposed to Coronavirus Disease 2019. JAMA Netw Open. 2020;3(3):e203976.) Talvez a complexidade do contexto pandêmico brasileiro, com estressores coletivos do ambiente e da organização do trabalho, promova um impacto negativo equânime entre os profissionais, independentemente das questões específicas de cada uma das funções. Por exemplo, a indisponibilidade de equipamentos de proteção individual e a sobrecarga de trabalho,(2525. Mhango M, Dzobo M, Chitungo I, Dzinamarira T. COVID-19 risk factors among health workers: a rapid review. Saf Health Work. 2020;11(3):262-5. Review.) além do medo de ser contaminado, podem ser estressores psicológicos comuns e frequentes entre aqueles que estão na linha de frente do atendimento dos pacientes.(88. Zerbini G, Ebigbo A, Reicherts P, Kunz M, Messman H. Psychosocial burden of healthcare professionals in times of COVID-19 - a survey conducted at the University Hospital Augsburg. Ger Med Sci. 2020;18:Doc05.) O estudo qualitativo com profissionais de enfermagem na China demonstrou que a equipe apresentou sentimentos positivos e negativos durante a pandemia, sendo necessário o desenvolvimento de estratégias de enfrentamento individuais e coletivas para mitigar os impactos negativos do trabalho, a fim de manter seu desempenho profissional.(77. Sun N, Wei L, Shi S, Jiao D, Song R, Ma L, et al. A qualitative study on the psychological experience of caregivers of COVID-19 patients. Am J Infect Control. 2020;48(6):592-8.)

A revisão de Shaukat et al.,(66. Shaukat N, Ali DM, Razzak J. Physical and mental health impacts of COVID-19 on healthcare workers: a scoping review. Int J Emerg Med. 2020;13(1):40. Review.) relaciona o desgaste mental às condições psicossociais do trabalho de profissionais da saúde durante essa pandemia. Os dados do presente estudo brasileiro demonstram que as características psicossociais apresentaram importante associação com o sofrimento mental. A alta exigência no trabalho, com grande demanda qualiquantitativa de tarefas e baixa latitude de decisão para realizá-las, não foi a característica mais frequente entre os participantes, mas aumentou em quase 150% a chance do agravo em estudo. Na Alemanha, foi observado que o aumento na carga de trabalho e as mudanças organizacionais estiveram associados a esgotamento profissional e desgaste psicológico entre profissionais de saúde.(88. Zerbini G, Ebigbo A, Reicherts P, Kunz M, Messman H. Psychosocial burden of healthcare professionals in times of COVID-19 - a survey conducted at the University Hospital Augsburg. Ger Med Sci. 2020;18:Doc05.) Outros estudos realizados com trabalhadores da saúde antes da pandemia encontraram resultados similares quanto à associação entre estressores tóxicos do trabalho e sofrimento mental.(1616. Araújo TM, Mattos AI, Almeida MM, Santos KO. Psychosocial aspects of work and common mental disorders among health workers: contributions of combined models. Rev Bras Epidemiol. 2016;19(3):645-57.,1818. Carvalho DB, Araújo TM, Bernardes KO. Transtornos mentais comuns em trabalhadores da Atenção Básica à Saúde. Rev Bras Saúde Ocup. 2016;41:e17.) Além dos estressores comuns ao trabalho em serviços de saúde, provavelmente há características inerentes ao sistema de saúde público brasileiro, como tensão no trabalho, redução da disponibilidade de insumos e precarização nas relações trabalhistas, que podem ter sido agravadas pelo cenário de combate à COVID-19.(2626. Teixeira CF, Soares CM, Souza EA, Lisboa ES, Pinto IC, Andrade LR, et al. The health of healthcare professional coping with the Covid-19 pandemic. Cien Saude Colet. 2020;25(9):3465-74.)

Outro exemplo dos estressores laborais é a longa jornada de trabalho. A carga horária semanal igual ou superior a 60 horas aumentou a chance de desgaste no grupo estudado. A mudança na organização de trabalho após o início da pandemia, com aumento da carga geral de trabalho, esteve associada a quadros de depressão (RC: 2,00; IC95%: 1,33-3,02) e ansiedade (RC: 2,24; IC95%: 1,50-3,36) entre trabalhadores da assistência à saúde, na China.(2727. Chen J, Liu X, Wang D, Jin Y, He M, Ma Y, et al. Risk factors for depression and anxiety in healthcare workers deployed during the COVID-19 outbreak in China. Soc Psychiatry Psychiatr Epidemiol. 2021;56(1):47-55.) Afinal, uma jornada de trabalho mais extensa, como a dos participantes deste estudo, aumenta o tempo em contato com aspectos negativos no trabalho, deteriorando a saúde física e emocional.(2828. Ayanian JZ. Mental health needs of health care workers providing frontline COVID-19 care. JAMA Health Forum. 2020;1(4):e200397.)

Em um cenário de risco de infecção, deve ser permanente o gerenciamento da efetividade das ações que protejam os trabalhadores do agente biológico.(66. Shaukat N, Ali DM, Razzak J. Physical and mental health impacts of COVID-19 on healthcare workers: a scoping review. Int J Emerg Med. 2020;13(1):40. Review.) Na Alemanha, os trabalhadores sugeriram ações para melhorar as condições de trabalho durante a pandemia, como adequação das equipes à demanda pelos serviços, clareza nas diretrizes de organização e planejamento e melhor comunicação das chefias com a equipe.(88. Zerbini G, Ebigbo A, Reicherts P, Kunz M, Messman H. Psychosocial burden of healthcare professionals in times of COVID-19 - a survey conducted at the University Hospital Augsburg. Ger Med Sci. 2020;18:Doc05.) A China, primeiro país acometido pela infecção, estabeleceu diretrizes(2929. Zhou Y, Zhou Y, Song Y, Ren L, Ng CH, Xiang YT, et al. Tackling the mental health burden of frontline healthcare staff in the COVID-19 pandemic: China’s experiences. Psychol Med. 2021;51(11):1955-6.) para controlar o impacto negativo da pandemia na saúde dos trabalhadores, como o equilíbrio entre horas de trabalho e de descanso, o fortalecimento de ações de segurança e a oferta de suporte para a saúde.

A percepção de boas relações entre os colegas de trabalho e seus superiores hierárquicos pode influenciar positivamente a saúde.(1212. Araújo TM, Graça CC, Araújo E. Estresse ocupacional e saúde: contribuições do modelo demanda-controle. Cien Saude Colet. 2003;8(4):991-1003.) Esse apoio social é capaz de modular e balancear contextos geradores de estresse, podendo fazer com que demandas sejam experimentadas como estímulo, o que resulta em um menor “custo de realização” da tarefa a ser executada.(3030. Frankenhauser M. A biopsychosocial approach to work life issues. Int J Health Serv. 1989;19(4):747-58. Review.) Nesse sentido, como observado no presente estudo e em outras pesquisas,(1616. Araújo TM, Mattos AI, Almeida MM, Santos KO. Psychosocial aspects of work and common mental disorders among health workers: contributions of combined models. Rev Bras Epidemiol. 2016;19(3):645-57.,1818. Carvalho DB, Araújo TM, Bernardes KO. Transtornos mentais comuns em trabalhadores da Atenção Básica à Saúde. Rev Bras Saúde Ocup. 2016;41:e17.) profissionais da saúde com percepção de baixo apoio social no trabalho apresentaram maior chance de sofrimento mental.(1616. Araújo TM, Mattos AI, Almeida MM, Santos KO. Psychosocial aspects of work and common mental disorders among health workers: contributions of combined models. Rev Bras Epidemiol. 2016;19(3):645-57.,1818. Carvalho DB, Araújo TM, Bernardes KO. Transtornos mentais comuns em trabalhadores da Atenção Básica à Saúde. Rev Bras Saúde Ocup. 2016;41:e17.) No cenário da pandemia, com o aumento da carga física e emocional no trabalho, aliado a um limitado acesso a serviços de suporte psicológico,(2828. Ayanian JZ. Mental health needs of health care workers providing frontline COVID-19 care. JAMA Health Forum. 2020;1(4):e200397.) torna-se compreensível a alta chance de sofrimento mental quanto menor for o suporte dos colegas.(88. Zerbini G, Ebigbo A, Reicherts P, Kunz M, Messman H. Psychosocial burden of healthcare professionals in times of COVID-19 - a survey conducted at the University Hospital Augsburg. Ger Med Sci. 2020;18:Doc05.,3131. Xiao H, Zhang Y, Kong D, Li S, Yang N. The effects of social support on sleep quality of medical staff treating patients with Coronavirus Disease 2019 (COVID-19) in January and February 2020 in China. Med Sci Monit. 2020;26:e923549.)

Nesse contexto pandêmico, as recomendações chinesas incluem o apoio presencial para lidar com a carga psicológica e a oferta de serviços de telessaúde.(2929. Zhou Y, Zhou Y, Song Y, Ren L, Ng CH, Xiang YT, et al. Tackling the mental health burden of frontline healthcare staff in the COVID-19 pandemic: China’s experiences. Psychol Med. 2021;51(11):1955-6.) Portanto, além da melhoria das condições de trabalho, há ganhos ao se organizarem equipes que ofereçam acolhimento, suporte e intervenções coletivas e individuais aos trabalhadores.(66. Shaukat N, Ali DM, Razzak J. Physical and mental health impacts of COVID-19 on healthcare workers: a scoping review. Int J Emerg Med. 2020;13(1):40. Review.,3131. Xiao H, Zhang Y, Kong D, Li S, Yang N. The effects of social support on sleep quality of medical staff treating patients with Coronavirus Disease 2019 (COVID-19) in January and February 2020 in China. Med Sci Monit. 2020;26:e923549.) Podem ser desenvolvidas estratégias para minimizar o medo diante do risco de adoecer ou de infectar conhecidos, o convívio com a dor e a morte de pacientes e colegas de trabalho e outras questões que causam desgastes, como as condições precárias do trabalho ilustradas nos resultados desta pesquisa. É importante que tais ações sejam implantadas em caráter preventivo a todos os trabalhadores e institucionalizadas enquanto política organizacional permanente de saúde e segurança no trabalho.

Considerando que este estudo é pioneiro na avaliação da saúde mental de trabalhadores e dos estressores psicossociais no trabalho durante a pandemia da COVID-19, com escalas psicométricas validadas e técnica estatística de controle de variáveis de confundimento, há limitações que devem ser levadas em consideração ao se extrapolarem seus resultados: houve a participação de indivíduos com melhor acesso às ferramentas tecnológicas e de conectividade à internet; apesar da abrangência nacional, há um descompasso entre a distribuição demográfica do país e o local de moradia dos participantes; o maior interesse pela pesquisa de pessoas com sinais e sintomas de sofrimento mental e a impossibilidade de avaliar perdas; o uso de questionários autorreferidos, que podem ser impactados pela repercussão cognitiva dos quadros clínicos dos participantes; e o delineamento transversal do estudo, que não permite inferir causalidade entre o desfecho e as covariáveis.

CONCLUSÃO

O sofrimento mental esteve presente em seis a cada dez trabalhadores de serviços de saúde engajados no atendimento de pacientes durante a pandemia de COVID-19 que participaram do estudo. Fatores individuais influenciam no aumento de chance do desgaste mental, como sexo feminino e idade inferior a 40 anos.

As características psicossociais do trabalho tiveram forte associação com o desfecho, como a percepção do trabalho de alta exigência, a jornada semanal de trabalho igual ou superior a 60 horas e o baixo apoio dos colegas de trabalho. Assim, é urgente a necessidade de mapear os serviços de saúde que tenham essas características para delineamento de ações de promoção da saúde mental e prevenção do desgaste emocional nos diversos níveis de atenção.

Considerando o impacto dos aspectos do contexto e do conteúdo do trabalho encontrados neste grupo, é mandatória uma política nacional para avaliação e mitigação do risco psicossocial laboral. A implantação de estratégias que protejam os profissionais da saúde dos quadros psicossomáticos pode auxiliar no controle das repercussões negativas permanentes no bem-estar emocional, e na qualidade de vida dos trabalhadores.

Por fim, sugerem-se pesquisas adicionais de delineamento longitudinal e com amostras representativas de cada região do país, para aprofundar a discussão nacional sobre o impacto do trabalho na saúde do trabalhador e que possibilitem a indicação de intervenções eficazes.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Nov 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    4 Nov 2020
  • Aceito
    14 Jan 2021
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