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Desvios de conduta em publicações científicas

EDITORIAL

Desvios de conduta em publicações científicas

Sidney Glina

Editor responsável

No mês passado, participei do I Seminário do COPE - Committee on Publication Ethics (I SCOPE), realizado em Florianópolis (SC) durante o encontro da Associação Brasileira de Editores Científicos (ABEC). Foi o primeiro evento desse tipo realizado na América do Sul.

Para quem não conhece, o COPE foi fundado em 1997 por um grupo de periódicos do Reino Unido para discutir problemas éticos em publicações científicas. Hoje, ele conta com 7.000 membros em todo o mundo, criou um código de conduta e orienta editores sobre como se comportar em casos suspeitos de irregularidades éticas. Os guias de consulta do COPE podem ser acessados gratuitamente em www.publicationethics.org(1).

O trabalho do COPE e de entidades congêneres vem crescendo muito. Ao buscar no PubMed os unitermos "retraction of publications", no dia 8 de dezembro de 2012, obtive 2.911 artigos que sofreram retratações desde 1973.

Fang et al.(2) revisaram a causa de retratação de 2.047 artigos indexados no PubMed até 3 de maio de 2012 e encontraram que em 21,3% foi por erro, em 14,2% por duplicidade de publicação, em 9,8% por plágio e em 43,4% por fraude ou suspeita de fraude. Segundo esses autores, a porcentagem de artigos científicos que sofreu retratação por fraude aumentou dez vezes desde 1975.

Segundo ainda o método do levantamento desses autores(2), a origem dos trabalhos que sofreram retratação varia conforme sua causa. Estados Unidos, Alemanha, Japão e China são responsáveis por 75% das retratações por fraude. Já os retratados por plágio ou publicação em duplicidade vêm, em sua maioria, da Índia e da China. Esses últimos casos ocorrem mais frequentemente em jornais de baixo fator de impacto, enquanto os retidos por fraude têm maior relação com os jornais de alto fator de impacto.

Fanelli(3) publicou metaanálise que avaliou as publicações que investigaram o comportamento de pesquisadores quanto à fraude em pesquisa. No pool de publicações (18 citadas) cerca de 2% dos investigadores admitiram ter fabricado, falsificado ou alterado dados pelo menos uma vez, e até cerca de 34% admitiram ter feito práticas outras consideradas questionáveis. Quando perguntados sobre ter conhecimento de fraudes realizadas por colegas, cerca de 15% admitiram que sabiam dessas práticas.

Esses dados mostram que mesmo a Ciência está muito longe de não ser contaminada por comportamentos antiéticos.

Plágio e duplicidade de publicações têm seus dias contados em razão do surgimento de tecnologia que identifica essas práticas, que são mais comuns em países em desenvolvimento(2,4). Entretanto, a fraude em pesquisa pode estar sendo estimulada.

Provavelmente, não é por acaso que as fraudes são mais comuns em jornais de alto fator de impacto. A necessidade de publicações nesses periódicos pode levar alguns investigadores a forjarem dados para conseguir resultados e trabalhos "perfeitos" e com alguma novidade para serem aceitos. Essa necessidade pode ser a pressão para galgar, ou se manterem, altos postos ou mesmo em busca de incentivo financeiro, que é dado por muitas instituições e governos quando se "publica em jornais de alto impacto".

Descobrir uma fraude não é fácil e pode demorar até cerca de 5 anos(2), pois, na maioria das vezes, são arquitetadas por pessoas inteligentes, que conseguem enganar seus pares que fazem as revisões e serão descobertas por alguma denúncia após a publicação. O blog Retraction Watch (http://retractionwatch.wordpress.com) publica continuamente os artigos que são retratados e algumas denúncias.

Dessa maneira, o trabalho do editor, revisor e mesmo do leitor tem que ser redobrado. Como disse a Dra. Wager, coordenadora do COPE, durante o I SCOPE, "desconfiem das pesquisas muito perfeitas".

REFERÊNCIAS

  • 1. Wager E. The Committee on Publication Ethics (COPE): objectives and achievements 1997-2012. Presse Med. 2012;41(9 pt1):861-6.
  • 2. Fang FC, Steen RG, Casadevall A. Misconduct accounts for the majority of retracted scientific publications. Proc Natl Acad Sci USA. 2012;109(42):17028-33.
  • 3. Fanelli D. How many scientists fabricate and falsify research? A systematic review and meta-analysis of survey data. PLoS ONE. 2009;4(5):e5738. Review.
  • 4. Stretton S, Brammich NJ, Keys JR, Monk JA, Ely JA, Haley C, et al. Publication misconduct and plagiarism retractions: a systematic, retrospective study. Curr Med Res Opin. 2012;28(10):1575-83.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Jan 2013
  • Data do Fascículo
    Dez 2012
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