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Risco cardiovascular e uso do índice de conicidade em pacientes submetidos ao transplante autólogo de células-tronco hematopoiéticas

RESUMO

Objetivo

Analisar a prevalência de excesso de peso e a utilização do índice de conicidade para a avaliação do risco cardiovascular em indivíduos submetidos ao transplante autólogo de células-tronco hematopoiéticas.

Métodos

A amostra foi composta por 91 pacientes, de ambos os sexos, submetidos ao transplante autólogo de células-tronco hematopoiéticas, de setembro de 2008 a dezembro de 2013, com idade igual ou superior a 18 anos. Para traçar o perfil nutricional, foram coletados dados antropométricos, como peso, altura e circunferência da cintura, na admissão hospitalar. Calcularam-se o índice de massa corporal e o índice de conicidade.

Resultados

Foram avaliados 91 pacientes, diagnosticados com mieloma múltiplo, linfoma de Hodgkin, linfoma não Hodgkin e outras patologias. A média de idade foi de 43,5 (14,2) anos, e 63,7% eram do sexo masculino. Verificou-se que, de acordo com o índice de massa corporal, 63,7% apresentavam excesso de peso e, segundo a circunferência da cintura, 74,7% possuíam maior risco para doenças cardiovasculares. De acordo com o cálculo do índice de conicidade, constatou-se que 92,3% dos pacientes apresentavam risco cardiovascular aumentado. Os pacientes com mieloma múltiplo apresentaram índice de conicidade mais elevado, se comparado aos outros pacientes (p<0,01).

Conclusão

Este estudo revelou alta prevalência de excesso de peso e de risco cardiovascular. Salienta-se que o índice de conicidade se mostrou um bom método para avaliação do risco cardiovascular e que novos estudos utilizando este índice devem ser realizados.

Descritores
Transplante de células-tronco hematopoiéticas; Transplante autólogo; Obesidade abdominal; Doenças cardiovasculares; Índice de massa corporal; Circunferência da cintura

ABSTRACT

Objective

To analyze the prevalence of overweight and the use of conicity index for cardiovascular risk assessment in individuals submitted to autologous hematopoietic stem cell transplantation.

Methods

The sample comprised 91 patients of both sexes, who underwent autologous hematopoietic stem cell transplantation from September 2008 to December 2013, aged 18 years or over. To determine the nutritional profile, we collected anthropometric data on weight, height, waist circumference upon hospital admission. The body mass index and the conicity index were calculated.

Results

A total of 91 patients diagnosed with multiple myeloma, Hodgkin's lymphoma, non-Hodgkin's lymphoma and other conditions were evaluated. The mean age was 43.5 (14.2) years, 63.7% were male. We verified that according to the body mass index, 63.7% were overweight and, according to waist circumference, 74.7% had a higher risk for cardiovascular diseases. According to the calculation of the conicity index, 92.3% of patients presented increased cardiovascular risk. Patients with multiple myeloma had a higher conicity index when compared to other patients (p<0.01).

Conclusion

This study revealed a high prevalence of overweight and cardiovascular risk. It should be noted that the conicity index was a good method to evaluate cardiovascular risk and that new studies using this index should be performed.

Keywords
Hematopoietic stem cell transplantation; Transplantation; autologous; Obesity; abdominal; Cardiovascular diseases; Body mass index; Waist circumference

INTRODUÇÃO

Alguns parâmetros, como ganho de peso e aumento da circunferência da cintura (CC), estão associados com maior risco de surgimento de vários tipos de câncer. O risco de desenvolver câncer pode se elevar de 9 a 56% para cada aumento de 5kg/m2 no índice de massa corporal (IMC).(11. Kyrgiou M, Kalliala I, Markozannes G, Gunter MJ, Paraskevaidis E, Gabra H, et al. Adiposity and cancer at major anatomical sites: umbrella review of the literature. BMJ. 2017;356:j477. Review.) Ainda, a obesidade está associada ao aumento da morbimortalidade cardiovascular, sendo, em grande parte, decorrente de anormalidades vasculares e, como consequência, há elevação do risco de doenças cardíacas e acidentes vasculares cerebrais.(22. Reho JJ, Rahmouni K. Oxidative and inflammatory signals in obesity-associated vascular abnormalities. Clin Sci (Lond). 2017;131(14):1689-700. Review.)

Pacientes submetidos ao transplante de células-tronco hematopoiéticas (TCTH) apresentam aumento do risco de morte por doença cardiovascular em comparação com indivíduos saudáveis.(33. Baker KS, Chow E, Steinberger J. Metabolic syndrome and cardiovascular risk in survivors after hematopoietic cell transplantation. Bone Marrow Transplant. 2012;47(5):619-25. Review.) Atualmente, sabe-se que pacientes sobreviventes ao TCTH podem estar sob risco aumentado de desenvolverem prematuramente doenças cardiovasculares (DCV) e síndrome metabólica.(44. Ragbourne SC, Crook MA. The Metabolic Syndrome in long-term survivors of Haematopoietic Stem Cell Transplantation. Clin Lymphoma Myeloma Leuk. 2017;17(6):340-6. Review.)

O excesso de peso é considerado fator de risco para infecções agudas, aumento das complicações e mortalidade no pós-transplante.(55. Weiss BM, Vogl DT, Berger NA, Stadtmauer EA, Lazarus HM. Trimming the fat: obesity and hematopoietic cell transplantation. Bone Marrow Transplant. 2013;48(9):1152-60. Review.) Desta forma, o manejo nutricional oferecido a esses pacientes deve ser iniciado precocemente, objetivando a redução das complicações metabólicas; a manutenção ou melhora do estado nutricional; e o fornecimento adequado de nutrientes e de calorias para a recuperação hematopoiética.(66. Brasil. Ministério da Saúde. Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (INCA). Consenso Nacional de Nutrição Oncológica [Internet]. 2a ed. rev. ampl. atual. Rio de Janeiro: INCA; 2015 [citado 2018 Jan 9]. Disponível em: https://www.sbno.com.br/UploadsDoc/consensonacional-de-nutricao-oncologica-2-edicao_2015_completo.pdf
https://www.sbno.com.br/UploadsDoc/conse...
)

Diversas medidas antropométricas podem ser utilizadas na avaliação nutricional desses pacientes.(77. Sommacal HM, Jochims AM, Schuch I, Silla LM. [Comparison of nutritional assessment methods employed to monitor patients undergoing allgeneic stem cell transplantation]. Rev Bras Hematol Hemoter. 2010;32(1):50-5. Portuguese.) Para avaliação da obesidade corporal total, o indicador mais utilizado é o IMC.(88. World Health Organization (WHO). Obesity: preventing and managing the global epidemic. Report of a WHO Consultation. Geneva; WHO; 2000. [WHO Technical Report Series 894].) Sabe-se, porém, que este não avalia a distribuição da gordura corporal, mas analisa o corpo como um todo (tecido adiposo e tecido muscular).(99. Pitanga FJ, Lessa I. [Association of anthropometric indicators of obesity with coronary risk in adults in the city of Salvador, Bahia, Brazil]. Rev Bras Epidemiol. 2007;10(2):239-48. Portuguese.)

A CC é outra medida amplamente utilizada de obesidade, citada na literatura como bom indicador de obesidade abdominal, sendo medida fácil de aferir e altamente associada à DCV.(1010. Silveira SL, Ledoux TA, Robinson-Whelen S, Stough R, Nosek MA. Methods for classifying obesity in spinal cord injury: a review. Spinal Cord. 2017;55(9): 812-7. Review.)

No início da década de 1990, foi proposto o índice de conicidade (índice C), que avalia a obesidade e a distribuição do tecido adiposo, considerando que a obesidade central, mais do que a obesidade corpórea total, está associada ao aumento no surgimento das DCV.(1111. Valdez R. A simple model-based index of abdominal adiposity. J Clin Epidemiol. 1991;44(9):955-6.)

O índice C é um parâmetro relativamente novo, mas já foi utilizado para a avaliação da adiposidade abdominal em pacientes transplantados de órgãos sólidos,(1212. Roshdy A, Okash H, Soliman A, Maamoun H, Shaker O, Soliman M, et al. Serum fetuin a levels: are they a reliable marker for hepatic steatosis and regional adiposity in renal transplant recipients? Transplantation Proc. 2015; 47(9):2703-6.) mas nenhum estudo analisou o uso do índice C em pacientes submetidos ao TCTH.

Devido à importância da associação de mais de um marcador antropométrico na determinação de risco cardiovascular(1313. Caitano Fontela P, Winkelmann ER, Nazario Viecili P. Study of conicity index, body mass index and waist circumference as predictors of coronary artery disease. Rev Port Cardiol. 2017;36(5):357-64.) e tendo em vista o aumento do risco para o desenvolvimento de DCV em indivíduos submetidos ao TCTH,(33. Baker KS, Chow E, Steinberger J. Metabolic syndrome and cardiovascular risk in survivors after hematopoietic cell transplantation. Bone Marrow Transplant. 2012;47(5):619-25. Review.,44. Ragbourne SC, Crook MA. The Metabolic Syndrome in long-term survivors of Haematopoietic Stem Cell Transplantation. Clin Lymphoma Myeloma Leuk. 2017;17(6):340-6. Review.) torna-se importante analisar a prevalência de excesso de peso e a utilização do índice C em indivíduos submetidos ao TCTH autólogo.

OBJETIVO

Analisar a prevalência de excesso de peso e a utilização do índice de conicidade para a avaliação do risco cardiovascular em indivíduos submetidos ao transplante autólogo de células tronco hematopoiéticas.

MÉTODOS

Trata-se de pesquisa quantitativa, com delineamento transversal, utilizando dados secundários de prontuários, realizada em um hospital universitário em Fortaleza (CE), Brasil, e tendo sido aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa, sob o número de parecer 1.603.999, CAAE: 54190616.4.0000.5045.

A amostra foi composta por 91 pacientes de ambos os sexos, submetidos ao TCTH autólogo no período de setembro de 2008 a dezembro de 2013, que corresponde aos primeiros cinco anos de TCTH na instituição. Foram incluídos pacientes com idade igual ou superior a 18 anos. Foram excluídos do estudo dois indivíduos com idade inferior a 18 anos e não foram encontrados 16 prontuários, totalizando perda de 18 indivíduos.

A coleta dos dados foi feita por um único pesquisador, utilizando formulário preestabelecido, com dados sociodemográficos, como sexo e idade, data do TCTH, diagnóstico clínico e antropometria − sendo esta última composta por peso, altura e CC na admissão hospitalar.

Com os dados de peso e altura, calculou-se o IMC, que consiste no peso em quilograma, dividido pelo quadrado da altura em metros. Os pontos de corte para população adulta foram determinados pela Organização Mundial da Saúde (OMS),(1414. World Health Organization (WHO). Physical Status: the use and interpretation of anthropometry. Report of a WHO Expert Committee. Geneva: WHO; 1995. [Technical Report Series n° 854].) a saber: <18,5kg/m2 indica desnutrição; entre 18,5 e 24,9kg/m2, eutrofia; e ≥25kg/m2, excesso de peso. Para a população idosa, utilizaram-se os critérios propostos por Lipschitz:(1515. Lipschitz DA. Screening for nutritional status in the elderly. Prim Care. 1994; 21(1):55-67. Review.) <22kg/m2 para baixo peso; entre 22 e 27kg/m2 para eutrofia; e >27kg/m2 para excesso de peso. A classificação quanto à CC obedeceu às recomendações da OMS(88. World Health Organization (WHO). Obesity: preventing and managing the global epidemic. Report of a WHO Consultation. Geneva; WHO; 2000. [WHO Technical Report Series 894].) (Tabela 1).

Tabela 1
Valores de circunferência da cintura considerados como de risco para doenças associadas à obesidade

Para o cálculo do índice C, utilizaram-se as medidas de peso, estatura e CC, de acordo com Valdez,(1111. Valdez R. A simple model-based index of abdominal adiposity. J Clin Epidemiol. 1991;44(9):955-6.) sendo calculado por meio da seguinte equação matemática:

Í ndice C = Circunferência da cintura ( m ) 0 , 109 Peso corporal ( kg ) Estatura ( m )

Para a classificação do risco cardiovascular, foram usados os valores propostos por Pitanga et al., que correspondem a ≥1,18 para mulheres e ≥1,25 para homens.(1616. Pitanga FJ, Lessa I. [Sensitivity and specificity of the conicity index as a coronary risk predictor among adults in Salvador, Brazil]. Rev Bras Epidemiol. 2004;7(3):259-69. Portuguese.)

Os dados foram organizados em tabelas e gráficos. A análise estatística foi feita por meio do programa Statistical Package for the Social Science (SPSS), versão 22.0. Foi utilizado o teste de Kolmogorov-Smirnov para a análise de normalidade e, para testar homogeneidade, utilizou-se o teste de Levene. Foi utilizado o teste de Spearman para as correlações e o teste χ2 para verificar associações. Utilizou-se o teste de análise de variância (ANOVA) para verificar diferenças entre as médias e, para o pós-teste, utilizou-se Tukey. O nível de significância foi fixado em 0,05 para todos os testes realizados.

RESULTADOS

O estudo foi composto por 91 pacientes; destes 63,7% eram do sexo masculino. A média de idade foi de 43,5 (14,2) anos, sendo a idade mínima 19 e a máxima 69 anos. Quanto ao diagnóstico de base dos pacientes, a maior prevalência foi de mieloma múltiplo. A média de idade dos pacientes diferiu entre aqueles diagnosticados com mieloma múltiplo, linfoma de Hodgkin e linfoma não Hodgkin, sendo maior a média de idade nos pacientes com mieloma múltiplo (Tabela 2).

Tabela 2
Diagnóstico de pacientes submetidos ao transplante de células-tronco hematopoiéticas autólogo

Segundo a avaliação antropométrica, a média de IMC dos indivíduos foi de 27,28 (±4,47) kg/m2; da CC foi de 96,83 (±11,27) cm; e do índice C foi de 1,34 (±0,79). A média de IMC e de CC não diferiu entre os diferentes diagnósticos. A média do índice C foi significativamente maior entre nos indivíduos com mieloma múltiplo se comparada aos pacientes com linfoma de Hodgkin (Tabela 3).

Tabela 3
Média de índice de massa corporal, circunferência da cintura e índice de conicidade de acordo com o diagnóstico em pacientes submetidos ao transplante de células tronco hematopoiéticas autólogo

Conforme o cálculo do índice C, constatou-se que 92,3% dos pacientes apresentavam risco cardiovascular aumentado (Tabela 4). Houve também correlação significativa entre o índice C e a idade dos pacientes (r=0,418; p<0,001). Não foram encontradas associações significativas entre o sexo e as classificações do IMC, CC e índice C.

Tabela 4
Caracterização do estado nutricional e do risco cardiovascular de pacientes submetidos ao transplante de células tronco hematopoiéticas autólogo

DISCUSSÃO

A maioria dos participantes era do sexo masculino, e a patologia de maior prevalência foi o mieloma múltiplo, assim como encontrado por Pereira et al.,(1717. Pereira AZ, Victor ES, Vidal Campregher P, Piovacari SM, Bernardo Barban JS, Pedreira WL Jr, et al. High body mass index among patients undergoing hematopoietic stem cell transplantation: results of a cross-sectional evaluation of nutritional status in a private hospital. Nutr Hosp. 2015;32(6):2874-9.) que avaliaram o estado nutricional de pacientes submetidos ao TCTH autólogo.

Neste estudo foi detectada alta prevalência de excesso de peso nos pacientes submetidos ao TCTH (63,7%), corroborando evidências crescentes de associação entre o excesso de peso e o surgimento de câncer hematológico.(11. Kyrgiou M, Kalliala I, Markozannes G, Gunter MJ, Paraskevaidis E, Gabra H, et al. Adiposity and cancer at major anatomical sites: umbrella review of the literature. BMJ. 2017;356:j477. Review.,1717. Pereira AZ, Victor ES, Vidal Campregher P, Piovacari SM, Bernardo Barban JS, Pedreira WL Jr, et al. High body mass index among patients undergoing hematopoietic stem cell transplantation: results of a cross-sectional evaluation of nutritional status in a private hospital. Nutr Hosp. 2015;32(6):2874-9.)

Hadjibabaie et al.,(1818. Hadjibabaie M, Iravani M, Taghizadeh M, Ataie-Jafari A, Shamshiri AR, Mousavi SA, et al. Evaluation of nutritional status in patients undergoing hematopoietic SCT. Bone Marrow Transplant. 2008;42(7):469-73.) avaliaram o estado nutricional de pacientes submetidos ao TCTH autólogo ou alogênico, e encontraram prevalência de excesso de peso em 28% dos pacientes, ou seja, inferior ao encontrado neste estudo (63,7%). Vogl et al.,(1919. Vogl DT, Wang T, Pérez WS, Stadtmauer EA, Heitjan DF, Lazarus HM, et al. Effect of obesity on outcomes after autologous hematopoietic stem cell transplantation for multiple myeloma. Biol Blood Marrow Transplant. 2011; 17(12):1765-74.) porém, verificaram elevada prevalência de excesso de peso em pacientes com mieloma múltiplo (73,1%), de acordo com o IMC. Apesar disto, é importante considerar que o IMC não distingue o excesso de gordura corporal da massa magra, sendo mais fidedigno quando associado a outras medidas antropométricas.(2020. Heymsfield SB, Cefalu WT. Does body mass index adequately convey a patient's mortality risk? JAMA. 2013;309(1):87-8. Erratum in: JAMA. 2013; 309(5):442.)

Nos últimos anos, o diagnóstico da obesidade tem evoluído, mostrando que a utilização do IMC pode não identificar com precisão o risco cardiovascular relacionado com a obesidade. Indivíduos com IMC de eutrofia e elevado conteúdo de gordura corporal apresentam alto risco para inflamação, desregulação metabólica e aumento da mortalidade.(2121. Oliveros E, Somers VK, Sochor O, Goel K, Lopez-Jimenez F. The concept of normal weight obesity. Prog Cardiovasc Dis. 2014;56(4):426-33. Review.)

A CC também mostrou alta prevalência do excesso de tecido adiposo abdominal nestes pacientes. Além disto, esta medida antropométrica é um método simples e eficaz para aferir a gordura corporal total e intra-abdominal.(2222. Ford ES, Maynard LM, Li C. Trends in mean waist circumference and abdominal obesity among US adults, 1999-2012. JAMA. 2014;312(11):1151-3.) Liu et al.,(2323. Liu P, Wang B, Yan X, Cai J, Wang Y. Comprehensive evaluation of nutritional status before and after hematopoietic stem cell transplantation in 170 patients with hematological diseases. Chin J Cancer Res. 2016;28(6):626-33.) investigaram o estado nutricional de pacientes chineses antes e depois do TCTH, sendo encontrada, no período pré-transplante, média de CC (84,9cm) de baixo risco para doenças relacionadas à obesidade. Já no estudo de Bhansali et al.,(2424. Bhansali A, Asokumar P, Walia R, Bhansali S, Gupta V, Jain A, et al. Efficacy and safety of autologous bone marrow-derived stem cell transplantation in patients with type 2 diabetes mellitus: a randomized placebo-controlled study. Cell Transplant. 2014;23(9):1075-85.) que avaliaram pacientes submetidos ao TCTH autólogo na Índia, foi observada média aumentada da CC (103cm) - valor superior ao encontrado no presente trabalho (96,83cm).

A obesidade central tem se mostrado mais efetiva para avaliar o risco cardiovascular, se comparada com a obesidade corporal total.(2525. Sahakyan KR, Somers VK, Rodriguez-Escudero JP, Hodge DO, Carter RE, Sochor O, et al. Normal-Weight Central Obesity: implications for Total and Cardiovascular Mortality. Ann Intern Med. 2015;163(11):827-35.) Ressalta-se ainda que o acúmulo de tecido adiposo na região abdominal tem sido mencionado como fator de risco para DCV e para o aumento da mortalidade, mesmo na ausência de excesso de peso.(2626. Coutinho T, Goel K, Corrêa de Sá D, Carter RE, Hodge DO, Kragelund C, et al. Combining body mass index with measures of central obesity in the assessment of mortality in subjects with coronary disease: role of “normal weight central obesity”. J Am Coll Cardiol. 2013;61(5):553-60. Erratum in: J Am Coll Cardiol. 2013;62(3):261.)

Ainda sobre o risco cardiovascular, os valores foram maiores segundo o índice C (92,3%), mostrando-se como bom método antropométrico para avaliar este risco, apesar de menos prático que a CC, devido à necessidade de cálculo. O índice C considera que os indivíduos que acumulam gordura ao redor da região central do tronco possuem a forma corporal cônica, enquanto que pessoas com menor quantidade de gordura na região central teriam aparência cilíndrica.(2727. Pitanga FJ. Anthropomerty fot yhe assessment of abdominal obesity and coronary risk. Rev Bras Cineantropom Desempenho Hum. 2011;13(3):238-41.) Pitanga et al.,(2828. Pitanga FJ, Lessa I. Anthropometric Indexes of Obesity as an Instrument of Screening for High Coronary Risk in Adults in the City in Salvador – Bahia. Arq Bras Cardiol. 2005;85(1):26-31.) observaram que o índice C foi o melhor preditor para agravos cardiovasculares, comparando-o com outras medidas antropométricas, como o IMC e a CC, podendo-se utilizar este parâmetro para determinação da obesidade abdominal na prática clínica, associado às outras medidas.

Além de sua importância para avaliação da obesidade central, o índice C vem sendo negativamente associado às concentrações de biomarcadores de proteção cardiovascular, como o HDL colesterol.(2929. Andrade MD, Freitas MC, Sakumoto AM, Pappiani C, Andrade SC, Vieira VL, et al. Association of the conicity index with diabetes and hypertension in Brazilian women. Arch Endocrinol Metab. 2016;60(5):436-42.) Não foram encontrados trabalhos que utilizassem o índice C na avaliação antropométrica em indivíduos submetidos ao TCTH ou em doenças onco-hematológicas, sendo este estudo inédito.

Nesse sentido, a partir dos resultados obtidos, a verificação do risco cardiovascular nos pacientes candidatos ao TCTH é de suma importância, tendo em vista que estes pacientes são submetidos a lesões cardiovasculares diretas e indiretas, e a DCV é uma complicação frequente e devastadora, que resulta em baixa qualidade de vida e aumento da morbimortalidade.(3030. Scott JM, Armenian S, Giralt S, Moslehi J, Wang T, Jones LW. Cardiovascular disease following hematopoietic stem cell transplantation: pathogenesis, detection, and the cardioprotective role of aerobic training. Crit Rev Oncol Hematol. 2016;98:222-34. Review.)

Ciente de que todos os candidatos ao TCTH autólogo são considerados de alto risco nutricional, a terapia nutricional é um grande desafio. De acordo com o consenso nacional de nutrição oncológica, os pacientes devem receber suporte nutricional adequado e efetivo durante todas as fases do transplante, além de acompanhamento periódico das comorbidades e complicações comuns no TCTH.(66. Brasil. Ministério da Saúde. Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (INCA). Consenso Nacional de Nutrição Oncológica [Internet]. 2a ed. rev. ampl. atual. Rio de Janeiro: INCA; 2015 [citado 2018 Jan 9]. Disponível em: https://www.sbno.com.br/UploadsDoc/consensonacional-de-nutricao-oncologica-2-edicao_2015_completo.pdf
https://www.sbno.com.br/UploadsDoc/conse...
)

Algumas limitações deste estudo são referentes à coletada dos dados, que ocorreu em prontuários escritos manualmente, dificultando a obtenção de todas as informações, devido à perda de prontuários.

Os dados apresentados contribuem para adoção de métodos de avaliação e abordagem nutricional em todas as etapas do TCTH. Novos estudos, utilizando o índice C, precisam ser realizados, a fim de verificar a interpretação deste instrumento na avaliação nutricional e acompanhamento do risco cardiovascular.

CONCLUSÃO

Este estudo revelou alta prevalência de excesso de peso, segundo o índice de massa corporal, em pacientes submetidos ao transplante autólogo de células-tronco hematopoiéticas. O risco cardiovascular aumentado foi detectado em grande parte dos pacientes, tanto por meio da circunferência da cintura, quanto da medida do índice C. Ressalta-se que o índice C se mostrou um bom método para avaliação do risco cardiovascular, podendo ser utilizado em conjunto com as medidas de circunferência da cintura e índice de massa corporal.

AGRADECIMENTOS

Agradeço aos funcionários do SAME (Serviço de Arquivo Médico e Estatística) e da Unidade de Pesquisa Clínica do Hospital Universitário Walter Cantídio pela separação e auxílio na localização dos prontuários.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2018

Histórico

  • Recebido
    27 Ago 2017
  • Aceito
    09 Jan 2018
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