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"Discreto e fora do meio" - Notas sobre a visibilidade sexual contemporânea*

Resumos

A partir de uma etnografia conduzida com homens paulistanos que usam mídias digitais em busca de parceiros do mesmo sexo, este artigo discute as razões que os levam a adotar o uso de plataformas tecnológicas. Trago elementos sociológicos e históricos para refletir sobre o caráter social do desejo que alimenta essa procura e o novo regime de visibilidade em que esses homens se inserem. Por fim, analiso as restrições morais, simbólicas e materiais que configuram a economia do desejo que lhes demanda discrição e segredo.

Mídias Digitais; Mercado; Plataformas de Busca de Parceiros do Mesmo Sexo; Economia do Desejo; Regimes de Visibilidade


Based on an ethnography with men that use digital media in search of same sex partners in São Paulo, Brazil, this paper discusses what motivates their use of technological platforms. It also employs sociological and historical elements to reflect upon the social aspects of desire that fuel this search and the new visibility regime in which these men live. Finally, it analyses the moral, symbolic and material restrictions that mold an economy of desire demanding their discretion and secrecy.

Digital Media; Market; Gay Dating Apps; Economy of Desire; Visibility Regimes


Recentemente, em meio a um oceano de perfis similares em aplicativos de busca de parceiros do mesmo sexo, encontrei um com a seguinte afirmação: "Você é discreto, não afeminado e fora do meio? Uma dica cara... vai procurar mulher!!! Você tem o perfil ideal para isso". O sarcasmo pouco usual nesse meio tecnológico em que preponderam justamente as afirmações criticadas pelo usuário - e a busca por esse perfil de homem - serviu de ponto de partida para as reflexões deste artigo. Por que a busca por um parceiro online é guiada pela discrição, pela masculinidade e pela recusa de qualquer lugar claramente gay? Quais as continuidades, mas sobretudo as rupturas que os termos dessa busca trazem para compreender o contexto social e histórico em que se inserem esses usuários?

As respostas exigem ouvir e compreender quem participa da busca nesses termos:

Eu uso todos os aplicativos [risos] Comecei com o Grindr, depois eu passei a usar também o Scruff e o Hornet. Mais recentemente o Tinder. [...] É mais fácil do que sair, já começar uma conversa, ver se flui e partir para o encontro,

relata Lucas,1 1 Nome fictício. No longo trajeto etnográfico de minha investigação, entrevistei um grande número de sujeitos assim como acompanhei mais de perto alguns deles em sua vida cotidiana. Desde o princípio me apresentei como pesquisador e mantive o compromisso ético de preservar seu anonimato, por isso troquei todos os nomes de meus interlocutores. paulistano de 29 anos, branco, profissional da área de Marketing, que se define como gay e é usuário de aplicativos de busca de parceiros amorosos e sexuais que rodam em dispositivos móveis como smartphones e tablets.

Aplicativos são programas disponíveis nas lojas online em versões gratuitas ou pagas, as mais completas. Para começar a usá-los, a pessoa os baixa em seu dispositivo, cria um perfil com foto e passa a visualizar os outros usuários de acordo com a distância em que se encontram. Graças ao GPS, os aplicativos podem mostrar quão próximo alguém está de parceiros em potencial. A interface dos aplicativos costuma ser a da exposição de um conjunto de fotos, cada uma de um usuário. Ao tocar na foto de alguém, é possível ler seu perfil com dados como idade, altura, peso, autodescrição e que tipo de pessoa procura. Também há como mandar mensagens privadas para cada usuário e, caso ambos queiram, marcar um encontro face a face.

O primeiro aplicativo desse tipo foi o Grindr, criado em 2009 por Joel Simkhai, um empresário de 38 anos, nascido em Israel, mas baseado em Los Angeles, cidade conhecida por "não ter centro", ou seja, por ser espalhada e sem pontos de referência para a sociabilidade cotidiana em espaços públicos. Segundo Simkhai, em uma de suas entrevistas, o aplicativo surgiu por causa da questão: "como encontro outros gays?" O Grindr foi sua resposta tecnológica para uma problemática que, para outros homens e em outros contextos, serviu a diferentes propósitos e reapropriações.2 2 Desenvolvi pesquisa etnográfica em San Francisco, com Bolsa de Pesquisa no Exterior FAPESP, entre janeiro e agosto de 2013. Os resultados preliminares da investigação originaram o artigo "San Francisco e a Nova Economia do Desejo" (Miskolci, 2014b), texto em que analiso sociológica e historicamente alguns determinantes da criação e do uso das mídias digitais por homossexuais norte-americanos.

Em pesquisa sobre o uso do Grindr no contexto de Los Angeles, Rice et alii (2012)RICE, Eric et alii . Sex risk among young men who have sex with men who use Grindr, a smartphone geosocial networking application. In: AIDS and Clinical Research. Special Issue 4, 2012 [http://omicsonline.org/sex-risk-among-young-men-who-have-sex-with-men-who-use-grindr-a-smartphone-geosocial-networking-application-2155-6113.S4-005.php?aid=7436 - visitado em: 27 jan 2015].
http://omicsonline.org/sex-risk-among-yo...
quantificaram as principais razões apontadas para seu uso. A principal razão foi porque permite manipular e revelar a identidade sexual de forma personalizada (22,23%) e a segunda foram a segurança e a conveniência (21%). Algo que reconheci, em termos qualitativos, na maioria de meus interlocutores paulistanos e não apenas no uso do aplicativo citado. Ultimamente, Lucas mesmo afirma preferir usar o Tinder porque:

nele as pessoas mostram o rosto, você consegue ver se há amigos de Facebook em comum para evitar encontrar alguém que já conhece outras pessoas e pode vir a falar algo... Não que eu seja escondido, mas também eu não sou assumido totalmente. Eu não carrego uma bandeira na rua e tal. Eu fico na minha. É o meio que eu escolhi viver. Não quero ficar me expondo. Assim, quanto menos pessoas em comum eu tiver com alguém eu me sinto mais seguro pra encontrá-la.

Assim como Lucas, a grande maioria de meus entrevistados na pesquisa que desenvolvo desde fins de 2007, na cidade de São Paulo, afirma usar, há muitos anos, mídias digitais em busca de parceiros amorosos e sexuais do mesmo sexo por razões que envolvem similar negociação da visibilidade de seu desejo por outros homens. Quase todos começaram usando as salas de bate-papo online voltadas ao público gay e/ou bissexual nos anos 1990, passaram a associar a esse hábito o uso de sites de busca de parceiros na década seguinte até que, em graus variados, aderiram ao uso dos aplicativos desde sua maior disseminação no Brasil, a partir de 2010.

Alguns, com mais de quarenta e cinco anos, chegam a estender essa linha evolutiva do uso das mídias em busca de parceiros para antes, recordando-se do uso dos programas IRC e MIRC, de serviços de telefonia no estilo "Disque Amizade" ou ainda de classificados em jornais e revistas. Dos classificados aos aplicativos há tanto continuidades quanto profundas mudanças, não apenas no meio utilizado, mas também na própria busca, seus critérios e objetivos.

Tiago, um músico de 33 anos, natural do Rio de Janeiro, mas radicado em São Paulo há quatro anos, considera que as pessoas usam os aplicativos por carência, porque é "tão difícil e complicado poder paquerar outros homens já que quase todo tempo a gente está entre heteros, em locais heteros." No entanto, ao ser perguntado se considerava que a tecnologia servia apenas para facilitar ele acrescentou

Também, mas além de prático, o aplicativo parece mais seguro do que sair por aí paquerando a esmo, já que nele todo mundo está a fim de outro cara. E nele você não precisa se expor tanto como se fosse em algum lugar do meio gay. E eu odeio o meio gay!

A partir das falas acima, é possível reconhecer diferentes usos dos aplicativos em São Paulo, uma cidade com um vasto circuito comercial voltado a homossexuais. Há desde homens integrados a esse circuito que associam a frequência a locais gays, como boates, com o uso dos aplicativos, caso de Lucas, quanto aqueles que os usam como alternativa ao "meio", como Tiago. A despeito dos diferentes usos, e reconhecendo a necessidade de ponderar afirmações categóricas sobre eles e os usuários, neste artigo pretendo reconstituir preliminarmente alguns elementos históricos e sociais que explicam o uso dessas ferramentas tecnológicas assim como o que estrutura as interações dentro delas.

O foco de minha pesquisa são as experiências de homens que buscam por parceiros do mesmo sexo - por meio dessas mídias - quer se compreendam como homossexuais ou não. E a principal questão que buscarei responder é: por que eles passaram a priorizar o contato mediado pelas mídias digitais? A seguir, busco responder esta questão por meio de duas discussões articuladas.

A primeira é sobre a emergência de um novo regime de visibilidade sexual, no qual as sexualidades se dividiram em um espectro de reconhecimento que vai das socialmente mais aceitas (as heterossexuais, especialmente as em pares monogâmicos com filhos), passando pelas que começaram a negociar sua visibilidade (como as gays e lésbicas socioeconomicamente privilegiadas) até as que foram mantidas ou relegadas à abjeção. A segunda discussão é sobre como esse novo regime de visibilidade sexual se relaciona intrinsecamente com a centralidade do trabalho e da manutenção da segurança em suas vidas, moldadas pelo que denomino de uma nova economia do desejo, a qual incentiva a busca de sexo sem compromisso com parceiros "discretos". A partir dessas discussões busco desconstruir as representações hegemônicas e as práticas sociais que engendram os sujeitos neste contexto sociotécnico. Por fim, apresentarei algumas reflexões teórico-políticas sobre como essas mudanças históricas têm sido negociadas a partir da hegemonia heterossexual masculina.

Regimes de Visibilidade

A progressiva separação entre sexualidade e reprodução iniciada na segunda metade do século XX, trouxe consigo demandas políticas como a asserção feminista de que o pessoal é político e os diferentes movimentos envolvendo as homossexualidades trouxeram demandas que hoje permitem reconhecer uma forma de desigualdade antes ignorada: a da distribuição desigual do amor, do afeto e até mesmo do sexo. Ainda que os feminismos e os movimentos homossexuais e de dissidência de gênero tenham se tornado socialmente mais visíveis a partir da década de 1960, é possível afirmar que, após o período da Revolução Sexual e a do pânico sexual da aids, é que suas demandas tornam-se mais disseminadas nas sociedades ocidentais.

No que se refere especificamente às relações entre pessoas do mesmo sexo, há elementos históricos e sociológicos que permitem reconhecer, na segunda metade da década de 1990, que as representações midiáticas de gays e lésbicas passam a definir modelos para seu reconhecimento social. É como se as homossexualidades passassem a ser reconhecidas como uma espécie de estilo de vida vinculado a interesses mercadológicos, novas formas de comunicação e demandas políticas de apagamento das suas diferenças em relação às heterossexualidades. Algo evidente na emergência do então chamado Pink Money que, no Brasil, foi marcada pela popularização de negócios classificados como GLS, sigla para gays, lésbicas e simpatizantes. Surgia um circuito comercial segmentado para um público homossexual socioeconomicamente privilegiado e com aspirações integracionistas, ou seja, que buscava serviços que permitissem a socialização com heterossexuais em um processo que permitiria a indiferenciação a partir do desejo sexual.

No que toca à pauta política emergente, o ano de 1995 marca transformações profundas no ativismo homossexual e a apresentação, pela deputada federal Marta Suplicy, do Projeto de Lei que propunha a parceria civil entre pessoas do mesmo sexo. A centralidade dessa demanda política, parcialmente alcançada com o reconhecimento das uniões entre pessoas do mesmo sexo pelo Supremo Tribunal Federal, em maio de 2011, é uma das pedras de toque da nova estratégia de visibilidade que busca direitos e cidadania por meio da adesão a modelos relacionais tradicionais (Beleli, 2009BELELI, Iara. "Eles(as) parecem normais": visibilidade de gays e lésbicas na mídia. Bagoas - Estudos gays, gêneros e sexualidades, vol.3, nº4, Natal, UFRN, 2009, pp.113-130.; Miskolci, 2007______ Pânicos Morais e Controle Social - reflexões sobre o casamento gay. cadernos pagu, (28), Campinas-SP, Núcleo de Estudos de Gênero Pagu-Unicamp, 2007, pp.101-128.). Na mesma época dessa inflexão no movimento social e em suas pautas, surgem mais colunas e publicações voltadas ao público homossexual criando uma nova imagem midiática, mais positiva e integrada comercialmente. Associa-se a este novo momento, a disseminação da internet comercial no Brasil, a primeira Parada do Orgulho de São Paulo e a distribuição gratuita do coquetel antirretroviral para portadores do hiv.3 3 Simone Ávila (2014) acrescenta que foi, também em 1997, que o Conselho Federal de Medicina brasileiro criou o primeiro protocolo médico sobre as cirurgias transexualizadoras.

A rede mundial de computadores permitiu a socialização em rede - de forma anônima e relativamente segura - para pessoas que temiam retaliações sociais afastando-as da solidão e permitindo o contato efetivo e modulado com eventuais parceiros e amigos. A Parada do Orgulho consolidou uma nova forma de ativismo e visibilidade para aqueles e aquelas que passaram progressivamente a serem chamados de sujeitos LGBT. A distribuição pública da terapia antirretroviral pouco a pouco modificou a percepção de que a soropositividade seria mortal chegando, atualmente, a um contexto em que ela é vista como uma espécie de doença crônica, com tratamento efetivo e disponível. Essas transformações, cujos efeitos foram progressivos e mais sensíveis já no século XXI, modificaram a compreensão social das homossexualidades e, também, as características segundo as quais elas mesmas passaram a se entender. Em termos sociológicos, emergia um novo regime de visibilidade que renegociava o nível de aceitação social das homossexualidades em nosso país. Como observei noutro lugar (2014a:62):

Na esfera da sexualidade, regime de visibilidade é uma noção que busca sintetizar a maneira como uma sociedade confere reconhecimento e torna visível certos arranjos amorosos enquanto controla outras maneiras de se relacionar por meio de vigilância moral, da coibição de sua expressão pública, em suma, pela manutenção dessas outras formas amorosas e sexuais em relativa discrição ou invisibilidade. Um regime de visibilidade traduz uma relação de poder sofisticada, pois não se baseia em proibições diretas, antes em formas indiretas, mas altamente eficientes, de gestão do que é visível e aceitável na vida cotidiana.

Portanto, não me refiro ao novo regime de visibilidade como sendo algo apenas positivo tampouco denotando uma exposição pública generalizada das homossexualidades na vida social cotidiana. Ao contrário, o que se passou envolveu a eleição de uma forma "correta" de se tornar visível vinculada diretamente à circulação de imagens midiáticas e também uma cisão interna às homossexualidades, na qual algumas passaram a ser mais reconhecidas, visíveis e se tornaram modelares enquanto outras foram mantidas ou relegadas ao repreensível mesmo não sendo necessariamente invisibilizadas.

Dentro de um regime de visibilidade, a hipervisibilidade - e não o ocultamento - pode se revelar a principal armadilha. A homossexualidade continuou a ser avaliada negativamente em homens femininos, travestis e associada - muitas vezes de forma mecânica e equivocada - a transexuais e crossdressers. Dessa maneira, é perceptível uma continuidade da recusa social à homossexualidade compreendida como alguma forma de deslocamento de gênero, sobretudo quando evidenciada publicamente. O que é corroborado pela patente valorização, nas diferentes plataformas de busca de parceiros, daqueles socialmente reconhecidos como "masculinos".

Ainda que a maioria de meus interlocutores corroborem visões naturalizadas sobre o gênero, também é perceptível como muitos - com maior ou menor grau de consciência - adotam tecnologias generificadoras, ou, mais claramente, masculinizantes. A partir de Teresa de Lauretis (1987)LAURETIS, Teresa de. Technologies of Gender: essays on theory, film, and fiction. Bloomington: Indiana University Press, 1987., é possível compreender como certas práticas sociais e até mesmo a exposição a representações sociais hegemônicas constituem o que ela denomina de tecnologias de gênero. Dentre elas, destaco como o uso das mídias digitais expõe usuários a modelos regulatórios sobre como ser, a quem desejar e o que fazer. É patente como o uso de aplicativos de busca de parceiros, por serem fortemente centrados na imagem, incentivam e se associam a práticas corporais como a musculação ou a corporificação de tipos eróticos criados pela indústria pornográfica como "ursos".

Parte considerável dos perfis nessas plataformas contém imagens de corpos definidos ou mesmo de dorsos, costas e bíceps musculosos, ou ainda de abdomens definidos. Nas entrevistas foi frequente a descrição de perfis de homens "masculinos" como os mais desejáveis, em especial porque eram vistos como "discretos", "passarem por hetero" ou "terem jeito de homem". As falas de meus entrevistados permitem inferir que a erotização dos corpos tidos como mais masculinos vai ao encontro do desejo de se relacionar com outro homem sem que isso implique a exposição pública do seu desejo. Fato compreensível em uma sociedade que tem acolhido homossexuais nos espaços públicos demandando que não sejam reconhecíveis como tais.

Não por acaso, nas mídias digitais em geral, e de forma ainda mais evidente nos aplicativos, predomina uma percepção de que a homossexualidade é uma característica individual cuja visibilidade deve ser gerida por cada um no cotidiano. Essa expectativa é traduzida nas expressões mais replicadas dos perfis online que envolvem valores como discrição e sigilo. Nesses meios, ser discreto ou se relacionar em segredo não equivale a ocultar a homossexualidade, como na velha expressão "estar no armário", antes negociar - em cada contexto - o grau de sua visibilidade de forma a maximizar a segurança e evitar retaliações morais e materiais.4 4 Para uma discussão crítica da persistência da noção de armário e suas insuficiências para a compreensão da forma como atualmente homens negociam seus desejos por pessoas do mesmo sexo veja Miskolci (2014 a).

A manutenção do rosto invisível na maioria dos perfis e a exibição de corpos ou partes corporais pauta uma forma de visibilizar-se em que a parte que identifica a pessoa é reservada como "prêmio" apenas para aquele(s) que também interessam ao usuário. O que faz constatar que, a despeito das conquistas políticas recentes, ainda vivemos sob um regime de representação centrado na hegemonia heterossexual.5 5 Agradeço a Felipe André Padilha por ter me apontado a relação entre o que denomino de regime de visibilidade com o que Stuart Hall chama de regime de representação. Acrescento que Hall desenvolve o conceito de regime de representação para abarcar analiticamente a cultura de forma ampla substituindo e/ou refinando o conceito foucaultiano de regime de verdade, o qual se originou - principalmente - da análise de discursos peritos como os médicos, jurídicos e religiosos. Assim, a despeito da existência de sites e aplicativos voltados para sujeitos não heterossexuais, seu uso ainda gira em torno de padrões imagéticos e comportamentais que reverenciam os padrões heterossexuais.

É nesse contexto cultural que tecnologias comunicacionais recentes se associam às corporais produzindo sujeitos subjetiva e fisicamente. Não se trata de algo que coage ou oprime, antes de uma forma mais sutil de sujeição que envolve a adesão dos próprios sujeitos. As mídias digitais induzem usuários em busca de parceiros sexuais ou amorosos a imaginarem que o sucesso da busca dependerá - em parte ou completamente - da criação de um corpo que exige técnicas masculinizantes. Tudo com o intuito de ser desejável na arena de competição por parceiros em que se está inserido.

O uso de meios digitais para a criação de contatos sexuais e amorosos não equivale apenas à adoção de uma ferramenta tecnológica para uma busca pré-existente, pois, ao entrar online, o usuário das plataformas é induzido a operar segundo os padrões de competição ali vigentes e sua busca tende a ser moldada por critérios próprios a estes meios tecnológicos regidos por uma lógica mercadológica. Constatação que não deveria levar a uma idealização da busca off-line como desprovida de regulações, filtros e interesses, antes a refletir como a online potencializa uma tendência histórica sociologicamente já observada no que se refere à estrutura da busca e da escolha de um parceiro sexual ou amoroso (Illouz, 2012______. Why love hurts: a sociological explanation. London: Polity Press, 2012.).

Reconheço no uso das diferentes plataformas de comunicação mediada uma forma estratégica de socialização que busca driblar a continuidade da restrição à expressão pública e livre do desejo por pessoas do mesmo sexo. Por meio do uso de aplicativos, homens que mantém uma apresentação e comportamento discreto em locais de trabalho, na família e em ambientes educacionais, conseguem expressar seu desejo sem se expor a possíveis retaliações sociais, repreensões morais ou mesmo violências. Trata-se de um uso da tecnologia para lidar com a ausência (ou insuficiência) de segurança e reconhecimento para a expressão do desejo por pessoas do mesmo sexo. 6 6 Agradeço Raewyn Connell por ter me sugerido dar mais atenção a esse aspecto de meu campo de pesquisa.

Após sete anos de pesquisa colhi evidências empíricas para afirmar que - ao menos entre meus interlocutores de classe-média e alta - não é a violência, antes a insegurança a principal companheira de suas vidas. O risco de perder o emprego, o temor da repreensão moral ou ainda do rompimento de laços familiares impele meus interlocutores a buscarem um parceiro de forma que seja possível negociar a visibilidade de seus desejos com segurança.

Ainda que as novas tecnologias comunicacionais provenham contatos e experiências de socialização mais numerosas e, para alguns, melhores do que as alcançáveis off-line, elas treinam seus usuários para uma forma de se apresentar, se comportar e se relacionar que pode corroborar o contexto sociopolítico hostil em que vivem. Induzidos, regulados e até mesmo controlados pelas demandas coletivas de que não publicizem seu desejo e não permitam que ele seja reconhecível têm tolerada sua existência desde que subjetivem segundo os padrões que corroboram a hegemonia política e cultural da heterossexualidade.

Em outras palavras, a adesão dos sujeitos ao regime de visibilidade aqui esboçado não é opcional, antes o resultado de diferentes constrangimentos institucionais que regulam suas vidas a partir de um de seus elementos mais centrais e sensíveis: o desejo, a possibilidade de amar e ser amado, ou seja, de ser reconhecido - por si mesmo e pela sociedade - como sujeito. Afinal, esses sujeitos continuam, off-line ou online, em condições desiguais de acesso ao afeto e ao amor, em suma, a elementos que têm se tornado cada vez mais valorizados por nossa cultura como meio de reconhecimento social e mesmo pessoal.

Eva Illouz (2012:241)______. Why love hurts: a sociological explanation. London: Polity Press, 2012. observou que, a partir da década de 1960, há uma mudança progressiva no que denomina de "nova ecologia e arquitetura da escolha" amorosa:

A busca e a escolha de um parceiro mudaram profundamente por razões que são normativas (a revolução sexual), sociais (o enfraquecimento da endogamia de classe, racial e étnica) e tecnológicas (a emergência das tecnologias da internet e dos sítios de busca de parceiros).

Contexto em que surgem o que ela denomina de campos sexuais: "arenas em que a sexualidade se torna uma dimensão autônoma da formação de casais, uma área da vida social que é intensamente comodificada e um critério autônomo de avaliação" (Eva Illouz, 2012:242______. Why love hurts: a sociological explanation. London: Polity Press, 2012.).

A nova economia do desejo

Sob uma perspectiva atenta ao papel que as diferenças têm na regulação da vida social, e em especial no caso as diferenças de sexualidade e gênero, é necessário reconhecer que um regime de visibilidade não se apresenta a sujeitos previamente concebidos, antes os engendra ou recria por meio da maleabilidade do próprio desejo em sua inserção cultural e material.

No item anterior, dei ênfase aos elementos simbólicos, em especial os que envolvem a insegurança daqueles que vivem sob o escrutínio moral cotidiano. Agora associarei à discussão prévia elementos de ordem material de maneira dissidente em relação à bibliografia e às pesquisas que têm compreendido o que se passa como a emergência do que denominam como "sexualidade recreativa" (Laumann et alii, 1994LAUMANN, Edward et alii. The social organization of sexuality. Chicago: The Chicago University Press, 1994.; Illouz, 2012______. Why love hurts: a sociological explanation. London: Polity Press, 2012.) ou de protagonismo do mercado na vida dos sujeitos, o que desvincula-os de suas bases materiais, em especial do trabalho. Seguindo a tradição da teoria crítica e marxista, pretendo sublinhar a articulação entre os constrangimentos materiais e morais no cenário contemporâneo analisando-a a partir do que, em outro artigo (2014b:273), denomino de nova economia do desejo7 7 Entre os precursores na reflexão sobre a existência de uma economia do desejo destaco Wilhelm Reich. O sociólogo austro-húngaro, já em 1929, em seu ensaio "Materialismo Dialético e Psicanálise" propunha uma sociologia da economia sexual que associasse Marx a Freud, portanto a sociologia à psicanálise (2013). : "a forma como as relações entre afeto, sexo e amor passam a se dar em uma nova configuração econômica, de trabalho e de consumo, em que as relações sociais são mediadas digitalmente."

De forma geral, refiro-me à maneira como as vidas sexuais e amorosas e o próprio desejo das pessoas passam a se expressar no contexto contemporâneo, em que passamos a viver em uma sociedade pós-industrial, centrada em serviços, no consumo, na segmentação midiática e em formas de trabalho "flexíveis". Economia aqui se refere tanto ao universo da produção e do consumo quanto à forma como se regula o desejo, mas enfatiza os intercâmbios simbólicos em que o sexo e a coerência de gênero são meios para adquirir, por exemplo, reconhecimento social.

Na esteira da obra de Eva Illouz (1997)ILLOUZ, Eva. Consuming the romantic utopia: love and the cultural contradictions of capitalism. Berkeley: University of California Press, 1997., busco sublinhar as relações entre desejo e capitalismo, mas ponderando que a economia desejante envolve elementos de ordem moral e simbólica, assim como tem variações de acordo com o tipo de desejo, se por pessoas do sexo oposto ou do mesmo.

Compreendo o desejo de forma social e histórica, portanto como regulável segundo interesses coletivos que envolvem aspectos morais, políticos e econômicos. Partilho da visão de Judith Butler (2014:259-260)BUTLER, Judith. Regulações de Gênero. cadernos pagu, vol.(42), Campinas-SP, Núcleo de Estudos de Gênero Pagu-Unicamp, 2014, pp.249-274.:

Pode-se certamente admitir que o desejo é radicalmente condicionado sem alegar que ele é radicalmente determinado, e pode-se reconhecer que existem estruturas que tornam o desejo possível sem alegar que essas estruturas sejam atemporais e resistentes, impermeáveis às mudanças e deslocamentos.

A maior parte de meus interlocutores na pesquisa paulistana é formada por profissionais liberais que lutaram para adquirir independência financeira, a qual descrevem como tendo gerado o reconhecimento familiar, as condições materiais e a segurança mínima para vivenciarem relações com outros homens. Seu trabalho é elemento-chave em suas vidas e, não por acaso, sempre mencionado como algo a preservar com a manutenção do sigilo e/ou discrição sobre essas relações ou até mesmo com uma presumida heterossexualidade. Os que também se envolvem com mulheres fazem questão de se referir à namorada, noiva ou esposa no trabalho.

Como profissionais de classe-média e alta, todos dispõem de acesso a equipamentos conectados à rede, muitos inclusive como meio de trabalho cotidiano. Assim, o que é usado para trabalhar também provê acesso a sites e aplicativos de busca de parceiros amorosos borrando uma fronteira antes existente entre público e privado. Tendo a maior parte de seu tempo tomada pelas obrigações de trabalho, às vezes estudo, e também por relações sociais e familiares em que predominam demandas próprias à heterossexualidade, as mídias digitais adentram em suas vidas como elemento que distende a pressão heterossexista cotidiana e permite o contato modulado com outros homens.

A busca online se insere em um contexto em que, da expansão da internet comercial até hoje, predomina uma divisão entre plataformas de busca amorosa voltadas predominantemente para heterossexuais (especialmente mulheres) e ambientes online que associam o desejo homoerótico masculino com a busca por sexo. A divisão binária entre amor/heterossexualidade e sexo/homossexualidade não é neutra tampouco construída em um vácuo cultural. Ela purifica o sexo heterossexual por meio de sua associação com o amor, a reprodução e/ou a constituição de famílias enquanto reatualiza concepções arraigadas socialmente que associam a homossexualidade masculina com o desejo sexual desprovido de vínculos, mantendo a associação histórica da masculinidade como sendo o próprio desejo e a homossexualidade masculina como apenas desejo sexual.

A centralidade da busca do sexo sem compromisso revela-se um a priori que faz com que os usuários, até mesmo sem perceber, adentrem nesses espaços seguindo suas premissas. Um dos elementos mais evidentes está no design das plataformas e aplicativos dirigidos a esse público, o qual valoriza a imagem em detrimento da escrita. Ainda que a parte escrita não seja o grande atrativo dessas plataformas, elas disponibilizam diversos formulários para autoidentificação e busca que seguem as categorias criadas pela indústria pornográfica. Trata-se de expediente comercial compreensível, já que os sites e aplicativos são negócios lucrativos e frequentemente tem entre seus anunciantes os provedores de pornografia, assessórios eróticos, clubes noturnos, saunas e outros serviços voltados a homossexuais. Além disso, como discute Sharif Mowlabocus (2010:102)MOWLABOCUS, Sharif. Gaydar Culture: gay men, technology and embodiment in the digital age. Farnham/Burlington: Ashgate, 2010., a pornografia gay foi - e em certa medida ainda é - um dos únicos provedores de imagens positivas e erotizadas de não heterossexuais, já que socialmente predominam estereótipos desqualificadores que associam homossexuais ao indesejável em formas variadas.8 8 Larissa Pelúcio (2009) e Tiago Duque (2011) observaram como, entre travestis, algo similar se passa e a "pista" (termo êmico para os locais de prostituição) era o principal local em que elas eram reconhecidas como admiráveis, belas e desejáveis.

Nesse contexto, qualquer que seja o intuito inicial do usuário, ao entrar online ele será facilmente induzido a criar um perfil em que comodificará a si mesmo para entrar em uma espécie de mercado sexual. Piscitelli, Assis e Olivar (2011:10)PISCITELLI, Adriana; ASSIS, Gláucia Oliveira de; OLIVAR, José Miguel. Introdução: transitando através das fronteiras. In: Gênero, sexo, amor e dinheiro: mobilidades transnacionais envolvendo o Brasil. Campinas, Núcleo de Estudos de Gênero Pagu-Unicamp, 2011, pp.5-30. consideram que

O termo mercado pode remeter a diferentes significados: ao terreno abstrato do intercâmbio de bens, à organização das relações sociais constitutivas da esfera da produção e ainda ao âmbito no qual tem lugar o consumo.

Ainda que meu campo de pesquisa não seja o do sexo comercial, ele é atravessado pelo mercado por meio de intercâmbios materiais e simbólicos.

É possível usar sem pagar as mídias digitais em busca de parceiros sexuais e amorosos, mas além das restrições ao uso sem pagamento o usuário continuará exposto aos anúncios de serviços relacionados. De forma ou de outra, estará no mercado e, no que se refere à sua inserção no amoroso, será induzido a apresentar-se de forma desejável, comodizar-se segundo os termos mais valorizados naquela arena de franca competição. Uso o termo comodificação porque se trata de uma espécie de metamorfose em "mercadoria" vendável em um mercado regido pela desejabilidade sexual ou amorosa. Tal intuito exigirá ter fotos em que apareça atraente segundo os critérios vigentes no universo da publicidade voltada para um público homossexual masculino.

A centralidade do corpo nesse processo de comodização é facilmente reconhecível. Um típico perfil bem-sucedido nos aplicativos tende a ser o que torna o usuário atraente eroticamente, o que pode ser feito por meio da exposição de fotos com dorsos à mostra, músculos, pelos faciais, abdomens definidos. Tais fotos evocam não apenas a pornografia gay, mas também a imagem de garotos de programa. A distinção borrada entre profissionais do sexo e usuários comuns nos perfis dos aplicativos é de tal grau que cada vez mais surgem perfis com o alerta "Não sou Garoto de Programa". A fronteira incerta não é apenas entre o sexo comercial e o sem trocas financeiras, já que é perceptível que muitos usuários tendem a adotar critérios de busca que evocam os do mercado sexual.

Os perfis têm variações, mas no que se refere ao tipo de busca tendem a se dividir entre os que buscam sexo imediato, aqueles que buscam possibilidades intermediárias entre isso e os relacionamentos e os que recusam o sexo sem compromisso, o qual, nos Estados Unidos, denominam de hookup e, no Brasil, chamam de fast foda. O hookup é uma categoria local norte-americana para designar formas de busca sexual sem compromisso, a qual, segundo autores como Michael Kimmel (2008)KIMMEL, Michael. Guyland: the perilous world where boys become men. Harper: Collins Ebooks, 2008., ganharam popularidade a partir dos ambientes universitários e entre jovens de classe-média que buscam adiar comprometimentos em benefício da dedicação aos estudos, encontrar emprego e adquirir estabilidade profissional.

No Brasil, e especificamente em meu campo paulistano, o fast foda denomina negativamente o sexo sem compromisso compreendido como sinal de promiscuidade. Entre homens que buscam por outros homens, essa forma de busca de parceiros e se relacionar sexualmente evoca em muitos uma possível continuidade do antigo cruising gay, algo que aqui foi mais conhecido como "pegação" em locais públicos como parques, banheiros e estacionamentos. Minha pesquisa permite questionar essa percepção reconhecendo que a atual forma de busca tende a ser descrita em termos como segura, prática e objetiva assim como as relações que ela provê são marcadas por seleções e filtros, em suma, maneiras diversas de higienização da busca sexual, de forma que os parceiros potenciais tendem a ser resultado de um escrutínio raro - ou mesmo impossível - no antigo cruising/pegação.

Em entrevistas conduzidas com usuários com mais de 50 anos, foi mencionada diversas vezes a diferença entre as formas de busca de parceiro sublinhando que o cruising exigia mais tempo e imersão, já que a pessoa tinha que ir a lugares públicos, procurar até encontrar um parceiro potencial, o que a maioria afirmou que exigia mais engajamento e energia do que o uso das mídias digitais. Sem contar os riscos de exposição, de ser visto por pessoas de sua rede, de ser extorquido por algum "parceiro" e até agredido. Segundo esses interlocutores mais velhos, as mídias permitem a busca a partir do trabalho e do lar assim como maior objetividade e eficiência nos encontros face a face. Um de meus interlocutores, com 55 anos, pós-graduação e de perfil intelectualizado, chegou a associar a emergência das plataformas midiáticas com o neoliberalismo, a demanda de mais dedicação ao trabalho e por parceiros que qualificou de "burgueses".

As ferramentas providas pelas plataformas envolvem a possibilidade de visualizar parceiros com determinadas características físicas assim como a partir de informações pessoais que também revelam aspectos socioeconômicos. Nas entrevistas que colhi desde o final de 2007, é comum a valorização dessas ferramentas ainda que - entre meus interlocutores de classe-média e alta - tenham sido muito frequente reclamações sobre a falta de pessoas "interessantes". O termo "interessante" se refere a perfis de usuários com características valorizadas em termos sociais e econômicos como formação universitária, independência financeira e uma apresentação física que denota inserção em um mercado de consumo sofisticado.

Em suma, entre a maioria de meus interlocutores na pesquisa, homens brancos predominantemente com mais de 30 anos, nível universitário, em profissões liberais que descrevem como "conservadoras", é possível reconhecer no trabalho o centro-gravitacional de suas vidas, sua base financeira e de reconhecimento simbólico a partir da qual mantém sua relativa independência e buscam negociar seus desejos evitando rompimentos familiares e retaliações sociais. Negociação em que as mídias digitais entram como tecnologia disponível para que tenham acesso a parceiros sem que suas relações com outros homens coloquem em risco sua imagem pública heterossexual, a qual - muitas vezes - é apenas presumida.

De qualquer maneira, segundo suas visões, ser encarado como presumidamente heterossexual se revela mais seguro do que viver sob a suspeita ou, pior, ser declarado como homossexual, condição que poderia interferir em seu reconhecimento no trabalho, nas condições para desenvolvê-lo, mantê-lo ou ainda gerar obstáculos à ascensão profissional. O uso das mídias digitais, e dos aplicativos em particular, envolve alocar o desejo por outros homens em um espaço e tempo que não interfiram em vidas vividas dentro das premissas heterossexuais.

Nessa economia do desejo, as relações amorosas e sexuais são moldadas pelo mercado, mas têm revelado características pouco ou nada "recreativas". Há mais de trinta anos, em seu clássico "Capitalism and Gay Identity", John D'Emilio (1982)D'EMILIO, John. Capitalism and Gay Identity In: SNITOW, Anna et alii. Powers of Desire. New York, Monthly Review Press, 1983, pp.100-113. defendeu a tese de que as homossexualidades como as compreendemos emergiram graças ao desenvolvimento do mercado de trabalho individualizado, no qual pessoas puderam ter condições de - com relativa independência familiar - desenvolver relações com outras do mesmo sexo. Atualmente, há evidências empíricas de que a rotatividade e a flexibilidade das vidas amorosas e sexuais de meus interlocutores têm relação direta com o heterossexismo de seus trabalhos e ocupações.

As variações do sexo sem compromisso respondem às restrições materiais e morais em que se inserem os sujeitos. Homens que buscaram a independência familiar geralmente para deixar de estar sob seu escrutínio moral passaram a fazer frente a demandas similares na esfera do trabalho. Assim, o que alguns definiram como "sentir-se sob observação" ou "vigiado" tem relação com um escrutínio similar, mais impessoal, mas não menos eficiente. O qual ajuda a compreender o uso das tecnologias midiáticas para negociar a visibilidade do desejo por outros homens, o que se articula a técnicas corporais que - ao mesmo tempo - permitiriam construir uma apresentação modelar ou que apague traços socialmente reconhecíveis de homossexualidade.

Fora do meio e sarado: representações hegemônicas e tecnologias corporais

A primeira coisa que se percebe ao adentrar na esfera dos bate-papos, sites e aplicativos para dispositivos móveis voltados para a busca de parceiros do mesmo sexo é uma desqualificação do meio gay ou - quando se compreende estes programas como extensão dele - também dessas plataformas. As apresentações na maioria dos perfis tendem a repetir frases como "não sou do meio e procuro alguém como eu" passando por descrições desqualificadoras sobre os outros usuários, em especial aqueles descritos como "afeminados", "fúteis", "drogados" ou "passivos".

A sucessão de apresentações ou textos nos perfis que enumeram o que é considerado inaceitável e, sobretudo, aqueles dos quais buscam se distanciar torna perceptível um contexto de socialização marcado por uma forma de violência simbólica que replica preconceitos correntes sobre as homossexualidades no cotidiano brasileiro. O aparente paradoxo sobre estes homens estarem em busca de outros homens desqualificando as plataformas e a maioria dos usuários se desfaz quando se leva em consideração que, socializados na cultura hegemônica, tendem a partilhar das imagens correntes sobre as homossexualidades em nosso país. De forma geral, essas representações ainda associam a homossexualidade com potencial forma de desvio comportamental ou de caráter assim como com o "efeminamento".

Além do apontado acima, a rejeição ao meio e a um amplo perfil de homossexuais também se relaciona à lógica que rege a entrada e as interações criadas nas plataformas online. Primeiro, a escolha dessas plataformas pode ser - como no caso de Tiago - uma opção ou alternativa à sociabilidade face a face em espaços offline nos quais a pessoa teria que ir pessoalmente, expor-se e conviver com um amplo espectro de perfis de homossexuais. Em outras palavras, ao usar plataformas de busca online o usuário já pode ter se predisposto a recusar estes espaços e o contato com vários tipos de pessoas fazendo uso da tecnologia para interagir de forma individualizada.

Ser usuário implica se expor a um público desconhecido,9 9 Invisible public na literatura sobre mídias sociais disponível em língua inglesa. Vide Light, 2013. Prefiro adaptar o termo ao contexto de minha investigação, onde o público não é exatamente invisível, mas supostamente desconhecido do usuário em suas relações cotidianas, o que lhe inculca cautelas na exposição pessoal, filtros nas buscas e procedimentos de triagem de possíveis contatos. o qual - em minha investigação - costuma ser imaginado por cada um segundo referências culturais dominantes sobre como seriam as homossexualidades. Dado o fato da maioria dessas referências ser negativa, torna-se compreensível que o usuário descreva - inclusive enumere - as características que despreza, com as quais não quer se associar tampouco se relacionar com alguém que as exiba. Essas plataformas, são um contexto em que o usuário, nos termos de Tiago, "entra na defensiva", mas como ele mesmo acrescenta "na expectativa de que aí seja mais seguro encontrar um parceiro". A segurança se expressa no fato de que a exposição é controlada, pois o público, ainda que desconhecido, partilha de um mesmo objetivo constituindo uma rede que gira em torno da busca por parceiros do mesmo sexo.

Quer tenham tido experiências prévias em locais voltados ao público homossexual ou não, a maioria de meus interlocutores afirma que usam estas plataformas porque elas permitiriam buscar outros homens que supostamente não frequentariam o meio gay. A recusa do meio gay data do auge da epidemia de aids, no final da década de 1980 e começo da de 1990, quando buscar parceiros fora do circuito das boates e bares voltadas para homossexuais equivalia a buscar homens com menor probabilidade de estarem contaminados com o vírus hiv (Miskolci, 2013:55______ Networks of Desire: the specter of AIDS and the use of digital media in the quest for secret same-sex relations in São Paulo. Vibrant - Virtual Brazilian Anthropology, vol.10, nº1, Brasília, 2013, pp.40-70.). Vale recordar que, então, não havia tratamento efetivo e a aids era considerada uma doença mortal. Ser diagnosticado como hiv positivo era receber uma sentença de morte. Assim, não é de se estranhar que ao surgir a internet comercial, em meados dos anos noventa, os homossexuais a tenham usado como meio de busca de parceiros "fora do meio".

Data desse período, também, a emergência de um modelo corporal hegemônico, o do homem malhado ou "sarado", termo que evoca a ideia de que um corpo trabalhado por exercícios físicos seria a prova da saúde, de não estar doente, possivelmente não ter o vírus hiv. Na verdade, há pesquisas em diferentes contextos nacionais que afirmam que esses corpos musculosos foram criados como consequência da própria epidemia de aids, pois sem medicação efetiva, médicos receitavam esteroides e recomendavam a prática de musculação para evitar a perda de peso e incentivar um estilo de vida "saudável" aos portadores do hiv (Peterson e Anderson, 2012PETERSON, Grant T. e Anderson, Eric. Queering masculine peer culture: softning gender performances on the university floor. In: LAUNDREAY, John et alii (orgs.) Queer masculinities: a critical reader in education London/New York, Springer, 2012, pp.119-138.; Masseno, 2011MASSENO, André. O rosto do desejo: posições e (en)cantos. In: Anais do XV Encontro Nacional de Linguística e Filologia Rio de Janeiro, CiFeFil, 2011, pp.2215-2522.).

Torna-se compreensível a desqualificação e recusa do meio gay (e mesmo das plataformas quando vistas como sua extensão online). Além disso, hoje em dia, em que a aids não é mais compreendida como mortal e o vírus hiv é controlado por meio do uso do coquetel de remédios antirretrovirais, o culto aos corpos sarados tende a ser cada vez mais associado à discrição, a não ser reconhecido publicamente como homossexual.

Durante anos de pesquisa duelei com o enigma de como, nas plataformas online, meus interlocutores afirmavam buscar por homens discretos e másculos que supostamente seriam vistos como heterossexuais, mas ao pedir que descrevessem ou mostrassem imagens desses homens me apresentavam as daqueles que - ao menos em contextos metropolitanos - também poderiam ser reconhecíveis como gays. São imagens criadas pela publicidade e pela pornografia voltada a homossexuais como "modelares", de homens bem sucedidos e, portanto, "bonitos". A disciplina corporal transferiria qualidades de caráter a estes sujeitos erotizando-os, mas também os tornando socialmente respeitáveis já que apresentados como bem-ajustados.

A despeito do que afirmações diretas online podem fazer pensar, a busca por homens discretos materializados em corpos sarados pode se relacionar menos ao fato deles serem realmente confundidos com heterossexuais no cotidiano e mais como modelares. A disciplina corporal que envolve exercícios, dieta e hábitos supostamente saudáveis distancia esses homens de estereótipos ainda correntes de homossexuais como sem disciplina, desviantes sociais adeptos de hábitos reprováveis ou perigosos. O corpo musculoso é o oposto do magro e frágil10 10 Segundo o historiador francês Jean-Jacques Courtine (2013), ao menos desde a década de 1930, em meio à Grande Depressão e as altas taxas de desemprego, que a prática da musculação emergiu como uma forma de exorcizar temores sociais sobre a perda da masculinidade. que emascularia denunciando a homossexualidade compreendida como afeminamento e falta de força, talvez mesmo uma tendência a adoecer. No final do século passado, imagens de corpos esmaecidos retratavam os doentes de aids na mídia, o que assombrou toda uma geração de homens que passaram, simbólica e possivelmente de forma inconsciente, a associar o desejo homossexual com uma ameaça, uma propensão a se contaminar, adoecer e morrer.

A despeito da hegemonia do corpo musculoso,11 11 Florence Tamagne (2013) explora historicamente o que denomina de "virilidades homossexuais" assim como David M. Halperin discute o tema em seu livro mais recente, How to be gay (2012). Ambos analisam a emergência e disseminação cultural da representação do "gay macho" na década de 1970, modelo de masculinidade adotado por jovens brancos de classe-média, mas cujas referencias eram homens das classes trabalhadoras. Halperin analisa mais criticamente como esse culto buscava apagar a iconoclastia queer com relação às normas de gênero. existe um espectro de corporalidades nos aplicativos. Rodrigo C. Melhado (2014)MELHADO, Rodrigo C. Vitrine do Desejo: um estudo sobre os perfis online de homens que buscam relações com outros homens em Araraquara e São Carlos. Monografia de Conclusão de Curso de C. Sociais, UFSCar, São Carlos, 2014. analisou mais de 700 perfis de homens que buscam homens em um site de busca de parceiros.12 12 A pesquisa de iniciação científica foi desenvolvida com financiamento da FAPESP e seguiu seus critérios éticos. O banco de perfis compilados não conteve nenhuma informação que pudesse identificar usuários e sua análise foi feita por meio de critérios despersonalizados. Seus dados quantitativos mostram uma quase equivalência entre os que se declaram musculosos, malhados ou sarados e a porcentagem dos que buscam este tipo corporal. Os dados, recolhidos a partir de um banco de dados com perfis de usuários de duas cidades médias do interior paulista, permitem aventar a hipótese de que o corpo malhado seja hegemônico nas representações comerciais, mas não necessariamente o almejado para si tampouco o mais desejado em um parceiro. As porcentagens próximas entre os que se definem corporalmente dessa forma e os que buscam esse tipo corporal no parceiro permitem aventar a hipótese de que o que se passa é a busca de parceiros com o mesmo estilo de vida e valores.

Em outras palavras, o evidente não é a preponderância efetiva de musculosos e sim a hegemonia da masculinidade nas autorrepresentações e no perfil dos parceiros procurados. Vale notar que até recentemente não havia perfis de transgêneros nos aplicativos e raríssimos são os perfis de homens buscando femininos/as. Além dessa centralidade do gênero masculino no regime de representação vigente nessas mídias, mas também associada a ela, é crescente a recusa à afirmação da "passividade" sexual, potencialmente associada à feminilidade.

Nos últimos anos, por meio da observação e análise de centenas de perfis de usuários, além da já conhecida busca por "passivos machos", testemunhei a emergência de perfis de "ativos buscando ativos", de homens que se apresentam online como heterossexuais que buscam relações com outros homens ou mesmo de homens que "dispensam passivos", uma maneira estratégica de se apresentar como "másculo" sem necessariamente ser "ativo" tampouco "versátil". De forma astuciosa, a recusa da passividade no perfil pode ser a própria afirmação do desejo de ser penetrado na relação sexual evitando eventuais estigmas ainda vigentes sobre preferências eróticas.

De forma sintética - e talvez um tanto impressionista - é possível especular se a economia do desejo brevemente descrita gira em torno da recusa e do apagamento da "bicha", o estereótipo culturalmente arraigado em nossa sociedade como a quintessência do homossexual. Não por acaso, uma das marcas associadas à "bicha" é a origem nas classes populares expressa nas variações de injúrias como "bicha pão-com-ovo" ou "bichinha poc-poc". A bicha é o homossexual reconhecido em sua feminilidade, portanto aquele que - nos termos preponderantes nos aplicativos - teria fracassado em gerir o segredo sobre sua sexualidade. Um fracasso frequentemente associado ao espalhafato, uma forma supostamente inconveniente de se comportar expressa em gestos e voz "femininos" ou, ao menos, insuficientemente viris para os padrões da masculinidade hegemônica.

O descrito não denota apenas a recusa de um estereótipo e/ou forma de viver a homossexualidade, mas dela própria, cada vez mais recusada como um meio de autocompreensão, relegada àqueles que supostamente falham em gerir a visibilidade do desejo por outros homens. Fato que permite reconhecer tanto a manutenção de um contexto social heterossexista quanto a criação de tecnologias de gênero que buscam tornar os homens que desejam outros homens capazes de manter seu desejo em relativo segredo.

Sobretudo, esse regime de visibilidade se assenta em uma economia do desejo que premia a discrição alocando os bem-sucedidos em manter seu desejo e suas práticas sexuais em segredo em uma posição que os aproxima da heterossexualidade. No contexto de franca competição normativa das plataformas online, o parecer (e até mesmo se declarar) hetero equivale a ocupar uma posição de sujeito almejada por efetivamente conferir reconhecimento moral e segurança material.

Conclusões

Neste artigo, busquei discutir as razões culturais, políticas e materiais que levam os sujeitos de minha investigação a adotarem o uso de tecnologias midiáticas como forma privilegiada da busca de parceiros amorosos e sexuais. Também trouxe elementos históricos e sociológicos para refletir sobre o caráter social do desejo que alimenta essa procura e no tipo de economia que ele se insere no presente. Argumentei também que a busca amorosa/sexual contemporânea não pode ser desvinculada da demanda por reconhecimento.

Ao lidar com experiências de sujeitos historicamente subalternizados por buscarem parceiros do mesmo sexo, associei às fontes empíricas de pesquisa uma reflexão de ordem teórica e conceitual que pretende contribuir para tornar possível sua análise em termos sociológicos. Daí ter conceituado, ainda de forma preliminar, o que denomino de regime de visibilidade assim como descrevi a forma como ele opera associado à nova economia do desejo que caracteriza nosso cenário contemporâneo. A importância de refletir sobre contextos históricos como regimes de visibilidade também está no fato de que eles delimitam os limites do pensável. Os estudos queer e de gênero podem problematizar esses limites para incorporar ausências na teoria social canônica que, historicamente, não atentou suficientemente para o papel do desejo, da sexualidade e do gênero na vida social, mantendo-os fora de seu espectro de análise.

Espero ter explicitado como, nas últimas duas décadas, transformações econômicas, político-culturais e tecnológicas associadas criaram uma nova realidade social em que a sexualidade e o desejo têm papel mais central do que no passado. Em contextos pós-industriais, portanto, centrados nos serviços e no consumo, a vida pessoal ganha centralidade na autocompreensão assim como nos termos de reconhecimento pelos outros. Neles o trabalho continua a ter papel central em suas vidas, mesmo porque permite as condições materiais para inserção no consumo segmentado e em rede que tem cada vez mais dado protagonismo a um novo espaço relacional online.

Sem deixar de fazer parte de outros, meus interlocutores na pesquisa se inserem em um segmento específico desse espaço relacional, o provido pelas diferentes plataformas online de busca de parceiros amorosos e sexuais do mesmo sexo. Aí adentram em uma arena de competição que pode ser descrita como uma espécie de mercado amoroso e sexual, no qual aprendem a operar segundo os valores e técnicas que permitem tornar-se desejável nos termos ali vigentes. Ainda que estes valores advenham de fontes off-line prévias, adquirem novas características online e passam a moldar formas de subjetivação e mesmo corporalidades. Assim, se transformam - subjetiva e corporalmente - pela utilização dessas mídias, frequentemente aderindo ao regime de visibilidade pautado na discrição e no sigilo.

Minha pesquisa sugere que o que se passa é uma transformação do espaço que as expressões do desejo por pessoas do mesmo sexo ocupam na vida social contemporânea. Transformação que se dá por meio da negociação de sua visibilidade pública em termos que envolvem uma troca entre exposição segura desde que em termos que não abalam concepções arraigadas sobre a hegemonia heterossexual, sobretudo forcluem qualquer forma de deslocamento de gênero.13 13 Nesse aspecto, minha pesquisa reitera a análise de Luiz Felipe Zago (2013) sobre um dos sites mais populares de busca de parceiros. Segundo ele, é central a forclusão da feminilidade nesses espaços online assim como a construção do que denomina de "corpos currículo".

No regime da discrição e do sigilo, as relações homossexuais não são mais proibidas desde que não expressem uma ameaça ao que denomino de hegemonia heterossexual, ou seja, o contexto cultural e político que mantém o acesso desigual a direitos e reconhecimento privilegiando os sujeitos que mantém, ao menos publicamente, relações com pessoas do sexo oposto. Em termos queer, passamos de uma sociedade heterossexista para uma heteronormativa ou de uma sociedade que pressupunha a heterossexualidade para uma que exige que sujeitos não heterossexuais adotem seus padrões estético-políticos. Das margens ao centro, do gueto ao mercado, da abjeção ao reconhecimento, o caminho tem sido trilhado sem desconstruir a heterossexualidade compreendida como um regime político e cultural, mesmo porque ainda é a provedora das representações hegemônicas.

O novo regime de visibilidade tem se associado a uma nova economia sexual em que o desejo de reconhecimento é moldado por valores baseados no regime de representação heterossexual e seu culto à generificação binária e intransitiva. Mesmo com algumas mudanças, o domínio da masculinidade heterossexual tende a ser preservado em termos simbólicos, políticos e econômicos. Na era das mídias digitais, ele é, inclusive, erotizado e serve de modelo representacional nos quais se espelham os usuários que buscam - em sigilo - por um homem masculino e discreto.

É discutível se, nas plataformas online se busca realmente o homem heterossexual, e mais provável que elas constituem uma arena sexual específica em que se expressa o partilhamento de uma fantasia coletiva na qual representações hegemônicas do homem heterossexual masculino ocupam o posto máximo no desejo. E se o desejo pode ser compreendido como busca de reconhecimento de si por meio do desejo do outro, é na busca pelo reconhecimento pelo homem heterossexual másculo que atualmente funcionam essas plataformas. Ainda que ele não esteja presente ali - ou talvez nem mesmo exista - por meio de um deslocamento imaginário ele passa a ser corporificado nos sujeitos "masculinos" e que "passam por hetero" das plataformas, os quais têm transferidos para si - mesmo que de forma efêmera e contestável no mundo off-line - o poder de separar os eleitos para o amor e o prazer dos relegados à abjeção e ao desprezo.

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  • 1
    Nome fictício. No longo trajeto etnográfico de minha investigação, entrevistei um grande número de sujeitos assim como acompanhei mais de perto alguns deles em sua vida cotidiana. Desde o princípio me apresentei como pesquisador e mantive o compromisso ético de preservar seu anonimato, por isso troquei todos os nomes de meus interlocutores.
  • 2
    Desenvolvi pesquisa etnográfica em San Francisco, com Bolsa de Pesquisa no Exterior FAPESP, entre janeiro e agosto de 2013. Os resultados preliminares da investigação originaram o artigo "San Francisco e a Nova Economia do Desejo" (Miskolci, 2014b______ San Francisco e a Nova Economia do Desejo. Lua Nova - Revista de Cultura e Política, (91), São Paulo, CEDEC, 2014b, pp.269-295.), texto em que analiso sociológica e historicamente alguns determinantes da criação e do uso das mídias digitais por homossexuais norte-americanos.
  • 3
    Simone Ávila (2014)ÁVILA, Simone. Transmasculinidades: a emergência de novas identidades políticas e sociais. Rio de Janeiro: Editora Multifoco, 2014. acrescenta que foi, também em 1997, que o Conselho Federal de Medicina brasileiro criou o primeiro protocolo médico sobre as cirurgias transexualizadoras.
  • 4
    Para uma discussão crítica da persistência da noção de armário e suas insuficiências para a compreensão da forma como atualmente homens negociam seus desejos por pessoas do mesmo sexo veja Miskolci (2014 a)MISKOLCI, Richard. Negociando visibilidades: segredo e desejo em relações homoeróticas masculinas criadas por mídias digitais. Bagoas - Estudos gays, gêneros e sexualidades, vol.8, nº11, Natal, UFRN, 2014a, pp.51-78..
  • 5
    Agradeço a Felipe André Padilha por ter me apontado a relação entre o que denomino de regime de visibilidade com o que Stuart Hall chama de regime de representação. Acrescento que Hall desenvolve o conceito de regime de representação para abarcar analiticamente a cultura de forma ampla substituindo e/ou refinando o conceito foucaultiano de regime de verdade, o qual se originou - principalmente - da análise de discursos peritos como os médicos, jurídicos e religiosos.
  • 6
    Agradeço Raewyn Connell por ter me sugerido dar mais atenção a esse aspecto de meu campo de pesquisa.
  • 7
    Entre os precursores na reflexão sobre a existência de uma economia do desejo destaco Wilhelm Reich. O sociólogo austro-húngaro, já em 1929, em seu ensaio "Materialismo Dialético e Psicanálise" propunha uma sociologia da economia sexual que associasse Marx a Freud, portanto a sociologia à psicanálise (2013).
  • 8
    Larissa Pelúcio (2009)PELÚCIO, Larissa. Abjeção e Desejo - uma etnografia travesti sobre o modelo preventivo de aids. São Paulo: Annablume/FAPESP, 2009. e Tiago Duque (2011)DUQUE, Tiago. Montagens e Desmontagens. São Paulo: Annablume, 2011. observaram como, entre travestis, algo similar se passa e a "pista" (termo êmico para os locais de prostituição) era o principal local em que elas eram reconhecidas como admiráveis, belas e desejáveis.
  • 9
    Invisible public na literatura sobre mídias sociais disponível em língua inglesa. Vide Light, 2013. Prefiro adaptar o termo ao contexto de minha investigação, onde o público não é exatamente invisível, mas supostamente desconhecido do usuário em suas relações cotidianas, o que lhe inculca cautelas na exposição pessoal, filtros nas buscas e procedimentos de triagem de possíveis contatos.
  • 10
    Segundo o historiador francês Jean-Jacques Courtine (2013)COURTINE, Jean-Jacques. Robustez na cultura: mito viril e potência muscular In: COURBIN, Alain;; COURTINE, Jean-Jacques VIGARELLO, Georges. História da Virilidade vol.3 - A virilidade em crise? Séculos XX-XXI. Petrópolis, Vozes, 2013, pp.554-578., ao menos desde a década de 1930, em meio à Grande Depressão e as altas taxas de desemprego, que a prática da musculação emergiu como uma forma de exorcizar temores sociais sobre a perda da masculinidade.
  • 11
    Florence Tamagne (2013)TAMAGNE, Florence. Mutações Homossexuais. In:; COURBIN, Alain; COURTINE, Jean-Jacques. VIGARELLO, Georges História da Virilidade vol.3 - A virilidade em crise? Séculos XX-XXI. Petrópolis, Vozes, 2013, pp.424-453. explora historicamente o que denomina de "virilidades homossexuais" assim como David M. Halperin discute o tema em seu livro mais recente, How to be gay (2012). Ambos analisam a emergência e disseminação cultural da representação do "gay macho" na década de 1970, modelo de masculinidade adotado por jovens brancos de classe-média, mas cujas referencias eram homens das classes trabalhadoras. Halperin analisa mais criticamente como esse culto buscava apagar a iconoclastia queer com relação às normas de gênero.
  • 12
    A pesquisa de iniciação científica foi desenvolvida com financiamento da FAPESP e seguiu seus critérios éticos. O banco de perfis compilados não conteve nenhuma informação que pudesse identificar usuários e sua análise foi feita por meio de critérios despersonalizados.
  • 13
    Nesse aspecto, minha pesquisa reitera a análise de Luiz Felipe Zago (2013)ZAGO, Luiz Felipe. Os Meninos - Corpo, gênero e sexualidade através de um site de relacionamentos. Tese de Doutorado, Educação, UFRGS, 2013. sobre um dos sites mais populares de busca de parceiros. Segundo ele, é central a forclusão da feminilidade nesses espaços online assim como a construção do que denomina de "corpos currículo".

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Jun 2015

Histórico

  • Recebido
    29 Jan 2015
  • Aceito
    16 Abr 2015
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