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Desempenho perceptivo-auditivo em crianças com e sem transtorno fonológico na classe das oclusivas

RESUMO

Objetivo

Comparar o desempenho perceptivo-auditivo de crianças com e sem transtorno fonológico (TF) na tarefa de identificação dos contrastes entre os fonemas oclusivos.

Método

Foram selecionadas, de um banco de dados, informações referentes ao desempenho perceptivo-auditivo de 46 crianças (23 com diagnóstico de TF com acometimento nas oclusivas (G1) e 23 com desenvolvimento típico de fala (G2)), entre quatro e oito anos de idade, em uma tarefa de identificação na classe das consoantes oclusivas do Português Brasileiro, a partir do instrumento de avaliação de percepção de fala (PERCEFAL). O tempo de reação, os números de erros e acertos, bem como o padrão de erro perceptual foram considerados na análise.

Resultados

Com relação à acurácia perceptivo-auditiva o Test-T mostrou uma diferença estatisticamente significante, em que as crianças típicas tiveram uma média de acerto maior do que as crianças com TF e um tempo de reação menor para os acertos. No tocante ao padrão de erro a ANOVA de medidas repetidas mostrou um efeito significativo para o grupo e padrão de erro, mas não para a interação entre grupo e padrão de erro. O teste Post Hoc de Tukey mostrou para ambos os grupos que os erros envolvendo ponto articulatório foram superiores aos erros de vozeamento e vozeamento + ponto articulatório.

Conclusão

crianças com transtorno fonológico apresentam pior acurácia em relação às crianças sem alteração e, ainda, um maior tempo de resposta para os acertos. Erros envolvendo o ponto de articulação entre as oclusivas foram os mais frequentes em ambos os grupos.

Descritores
Transtorno Fonológico; Criança; Percepção Auditiva; Avaliação; Fala

ABSTRACT

Purpose

To compare the auditory-perceptual performance of children with and without phonological disorder (PD) in the identification task of contrasts between stops phonemes.

Methods

Information was selected from a database regarding the auditory-perceptual performance of 46 children (23 with a diagnosis of PD with involvement in the stops (G1) and 23 with typical speech development (G2)), aged 4 and eight years old, in an identification task of the class of stops consonants in Brazilian Portuguese, using the speech perception assessment instrument (PERCEFAL). The reaction time, the number of errors and correctness, as well as the pattern of perceptual error were considered in the analysis.

Results

Regarding the auditory-perceptual accuracy, T-Test showed a statistically significant difference, in which typical children had a higher average of correctness than children with PD and shorter reaction time for correct answers. Regarding the error pattern, repeated measures ANOVA showed a significant effect for the group and error pattern, but not for the interaction between group and error pattern. Tukey's Post Hoc test showed for both groups that errors involving place of articulation were superior to voicing and voicing + place of articulation errors.

Conclusion

children with phonological disorders have worse accuracy in relation to children without disorders and, also, longer response time for correctness. Errors involving the place of articulation between the stops were the most frequent for both groups.

Keywords
Phonological Disorder; Child; Auditory Perception; Evaluation; Speech

INTRODUÇÃO

O transtorno fonológico (TF) é caracterizado por uma inadaptação, desorganização ou anormalidade no sistema de sons da criança em relação ao padrão-alvo adulto, sem qualquer comprometimento orgânico por parte das crianças(11 Keske-Soares M, Mota H, Pagliarin K, Ceron M. Estudo sobre os ambientes favoráveis à produção da líquida não-lateral /r/ no tratamento do desvio fonológico. Rev Soc Fonoaudiol. 2007;12(1):48-54. http://dx.doi.org/10.1590/S1516-80342007000100010.
http://dx.doi.org/10.1590/S1516-80342007...
).Observa-se neste quadro a presença de erros de produção dos sons da fala não mais esperados para a idade da criança, sugerindo um problema de base cognitiva que envolve um déficit na categorização linguística dos sons(22 Swedo S, Cook E, Happé F, Harris J. Kawfmann W, King B, et al. Transtornos da fala. In: Baird G, editor. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais. Porto Alegre: Armed; 2014. p. 44-5.).Como este transtorno não apresenta uma causa bem definida, alguns estudos, tanto no âmbito nacional quanto no internacional, têm buscado identificar quais fatores poderiam estar correlacionados a ocorrência de tal transtorno(33 Rvachew S, Jamieson DG. Perception of voiceless fricatives by children with a functional articulation disorder. J Speech Hear Disord. 1989;54(2):193-208. http://dx.doi.org/10.1044/jshd.5402.193. PMid:2709838.
http://dx.doi.org/10.1044/jshd.5402.193...

4 Brown C. The interrelation between speech perception and phonological acquisition from infant to adult. In: Archibald J, editor. Second language grammars. Oxford: Blackwell; 2000. p. 4-63.

5 Freitas C, Mezzomo C, Vidor D. Phonemic discrimination and the relationship with other linguistic levels in children with typical phonological development and phonological disorder. CoDAS. 2015;27(3):236-41. http://dx.doi.org/10.1590/2317-1782/20152014168. PMid:26222939.
http://dx.doi.org/10.1590/2317-1782/2015...

6 Brancalioni AR, Bertagnolli APC, Bonini JB, Gubiani MB, Keske-Soares M. The relation between auditory discrimination and phonological disorder. J Soc Bras Fonoaudiol. 2012;24(2):157-61. http://dx.doi.org/10.1590/S2179-64912012000200012. PMid:22832684.
http://dx.doi.org/10.1590/S2179-64912012...

7 Attoni T, Quintas V, Mota H. Avaliação do processamento auditivo e da discriminação fonêmica em crianças com desenvolvimento fonológico normal e desviante. Rev Bras Otorrinolaringol. 2010;76(6):762768. http://dx.doi.org/10.1590/S1808-86942010000600015.
http://dx.doi.org/10.1590/S1808-86942010...

8 Barrozo TF, Pagan-Neves L, Vilela N, Carvallo R, Wertzner H. The influence of (central) auditory processing disorder in speech sound disorders. Rev Bras Otorrinolaringol. 2016;82(1):56-64. http://dx.doi.org/10.1016/j.bjorl.2015.01.008. PMid:26612604.
http://dx.doi.org/10.1016/j.bjorl.2015.0...

9 Leite R, Wertzner H, Matas C. Potenciais evocados auditivos de longa latência em crianças com transtorno fonológico. Pró-Fono R Atual Cient. 2010;22(4):561-6. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-56872010000400034. PMid:21271117.
http://dx.doi.org/10.1590/S0104-56872010...
-1010 Hearnshaw S, Baker E, Munro N. The speech perception skills of children with and without speech sound disorder. J Commun Disord. 2018;71:61-71. http://dx.doi.org/10.1016/j.jcomdis.2017.12.004. PMid:29306068.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jcomdis.2017...
).

Dentre os possíveis fatores etiológicos, alguns autores(33 Rvachew S, Jamieson DG. Perception of voiceless fricatives by children with a functional articulation disorder. J Speech Hear Disord. 1989;54(2):193-208. http://dx.doi.org/10.1044/jshd.5402.193. PMid:2709838.
http://dx.doi.org/10.1044/jshd.5402.193...
,44 Brown C. The interrelation between speech perception and phonological acquisition from infant to adult. In: Archibald J, editor. Second language grammars. Oxford: Blackwell; 2000. p. 4-63.) destacam o fato de que crianças com transtorno fonológico também poderiam apresentar dificuldades no domínio perceptivo-auditivo, em que a dificuldade de compreender os sons da fala poderia estar relacionada com a ocorrência de alterações fonológicas durante o período da infância(55 Freitas C, Mezzomo C, Vidor D. Phonemic discrimination and the relationship with other linguistic levels in children with typical phonological development and phonological disorder. CoDAS. 2015;27(3):236-41. http://dx.doi.org/10.1590/2317-1782/20152014168. PMid:26222939.
http://dx.doi.org/10.1590/2317-1782/2015...
).Um estudo prévio, por exemplo, avaliou o desempenho na habilidade de discriminação auditiva de crianças com desenvolvimento fonológico típico e desviante. Como resultado, os autores verificaram que as crianças com TF frequentemente apresentam dificuldade na habilidade de discriminação auditiva evidenciando dificuldades em discriminar o vozeamento e o ponto de articulação dos fonemas. A conclusão deste estudo foi a de que indivíduos com TF apresentam dificuldades em perceber diferenças acústicas mínimas no discurso, fundamental para produção correta dos sons da fala(66 Brancalioni AR, Bertagnolli APC, Bonini JB, Gubiani MB, Keske-Soares M. The relation between auditory discrimination and phonological disorder. J Soc Bras Fonoaudiol. 2012;24(2):157-61. http://dx.doi.org/10.1590/S2179-64912012000200012. PMid:22832684.
http://dx.doi.org/10.1590/S2179-64912012...
).

Outro estudo, por sua vez, avaliou o processamento auditivo das crianças com TF a fim de observar algum fator de etiologia orgânico-fisiológico que pudesse estar relacionado a tal desvio. Como resultado geral, os autores reportaram um alto percentual de erro, por parte das crianças desviantes, nos testes de escuta dicótica: teste de dissílabos alternados (TDDA), teste dicótico de dígitos e avaliação simplificada de dígitos, na medida em que os dados quantitativos foram bastante abaixo do esperado para o padrão de normalidade, identificando-se grande número de omissões e trocas para as palavras apresentadas no teste. Além disso, as crianças com TF necessitaram de um tempo maior para emitir as respostas, sugerindo assim, que crianças com TF apresentariam dificuldades nas habilidades auditivas relacionadas à análise e síntese auditiva, ordenação temporal e memória, já que neste teste os participantes foram orientados a repetir as palavras/dígitos na ordem em que foram apresentados(77 Attoni T, Quintas V, Mota H. Avaliação do processamento auditivo e da discriminação fonêmica em crianças com desenvolvimento fonológico normal e desviante. Rev Bras Otorrinolaringol. 2010;76(6):762768. http://dx.doi.org/10.1590/S1808-86942010000600015.
http://dx.doi.org/10.1590/S1808-86942010...
). Tais achados convergem para resultados similares de estudos anteriores, os quais apontam para a presença de alteração de processamento auditivo central em crianças com transtorno fonológico verificando alterações na onda P300, com predomínio no aumento de sua latência(88 Barrozo TF, Pagan-Neves L, Vilela N, Carvallo R, Wertzner H. The influence of (central) auditory processing disorder in speech sound disorders. Rev Bras Otorrinolaringol. 2016;82(1):56-64. http://dx.doi.org/10.1016/j.bjorl.2015.01.008. PMid:26612604.
http://dx.doi.org/10.1016/j.bjorl.2015.0...
), bem como a presença de correlação entre alteração de processamento auditivo e gravidade do transtorno fonológico, na qual crianças com alteração de processamento auditivo tendem a apresentar maior gravidade no transtorno fonológico(99 Leite R, Wertzner H, Matas C. Potenciais evocados auditivos de longa latência em crianças com transtorno fonológico. Pró-Fono R Atual Cient. 2010;22(4):561-6. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-56872010000400034. PMid:21271117.
http://dx.doi.org/10.1590/S0104-56872010...
).

Recentemente, um estudo cujo um dos objetivos foi o de investigar se crianças australianas com e sem TF diferiam na acurácia geral da percepção de fala, verificaram uma acurácia perceptiva auditiva significativamente pior por parte das crianças com TF quando comparadas ao grupo controle, em tarefa de julgamento lexical e fônico, sugerindo, assim, que as crianças com TF percebem a fala com menor precisão do que seus pares com desenvolvimento típico. Outro aspecto observado neste mesmo estudo foi a existência de uma correlação entre os erros de produção e os erros de percepção apresentados pelos grupos (controle e experimental). Os fonemas / ɹ / e / s / apresentaram pior acurácia em ambos os grupos, tanto em termos de produção, quanto em termos de percepção(1010 Hearnshaw S, Baker E, Munro N. The speech perception skills of children with and without speech sound disorder. J Commun Disord. 2018;71:61-71. http://dx.doi.org/10.1016/j.jcomdis.2017.12.004. PMid:29306068.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jcomdis.2017...
).

Em suma, os estudos realizados convergem para uma possível relação entre a percepção auditiva e o TF, à medida que déficits nas habilidades perceptivo-auditivas poderiam acarretar prejuízos na capacidade de discriminar e processar os sons da fala repercutindo, possivelmente, na emissão destes sons. No entanto, existem poucos estudos que avaliam como as crianças com TF lidam com estímulos auditivos em outras habilidades perceptivas, particularmente na identificação de contrastes fonológicos, que podem estar correlacionadas a esse transtorno.

Ressalta-se que a classe das oclusivas, em termos acústicos, apresenta um grande período de silêncio, correspondente ao bloqueio dos articuladores, e um tempo bastante reduzido de informações acústicas que as diferenciam (explosão e transição formante), o que torna esta classe sonora bastante interessante para a investigação.

Assumindo que o TF afetaria a percepção dos contrastes fonológicos, espera-se que o desempenho perceptual na tarefa de identificação de crianças com TF seja mais laborioso e menos acurado. Consequentemente, estima-se um desempenho das crianças com TF caracterizado por pior acurácia e tempo de reação mais longo.

O objetivo do estudo, portanto, é o de (a) comparar o desempenho perceptivo-auditivo de crianças com e sem transtorno fonológico em tarefa de identificação sonora, envolvendo os fonemas oclusivos do português brasileiro; (b) identificar a similaridade (ou não) do padrão de erro apresentado pelas crianças com e sem TF na tarefa de identificação das oclusivas.

Acredita-se que os alcances desses objetivos podem levar a ganhos científicos, como: identificar os fatores correlacionados ao Transtorno Fonológico, particularmente em relação à habilidade de identificação de contrastes oclusivos, bem como fornecer subsídios que possam auxiliar na prática terapêutica.

MÉTODO

Estudo transversal retrospectivo, aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Faculdade de Filosofia e Ciências – Unesp, Campus Marília, sob Certificado de Apresentação para Apreciação Ética (CAAE):67549317.5.0000.5406, realizado após todos os responsáveis pelos participantes do estudo terem assinado o termo de consentimento livre e esclarecido.

Sujeitos

O estudo foi conduzido com 46 crianças (34 do sexo masculino e 12 do sexo feminino), entre 4 e 8 anos de idade, sendo 23 diagnosticadas com transtorno fonológico com acometimento na classe das oclusivas (G1) e 23 com desenvolvimento típico de fala (G2). As crianças do G1 foram selecionadas do Estágio Supervisionado de Terapia Fonoaudiológica: Fonologia Clínica do centro de Estudos da Educação da Saúde (CEES), UNESP Marília; enquanto os dados relativos às crianças com desenvolvimento típico de linguagem foram selecionados do banco de dados referente ao desempenho perceptivo-auditivo no tocante à classe das oclusivas.

Para composição do Grupo 1 (G1) foram selecionadas as crianças que obtiveram o diagnóstico de Transtorno Fonológico com acometimento nas oclusivas sem qualquer alteração auditiva associada e as que realizaram o teste PERCEFAL para as oclusivas; enquanto no Grupo 2 (G2) foram selecionadas as crianças que pudessem ser pareadas às crianças do grupo 1 quanto à idade e gênero e as que tivessem realizado uma triagem auditiva prévia com resultado normal.

Como critério de exclusão da amostra adotou-se parâmetros semelhantes para ambos os grupos, sendo excluídas, portanto, as crianças com distúrbio fonológico associado a outras alterações de linguagem, alterações neurológica e/ou auditiva e aquelas cujo desempenho na fase de reconhecimento de palavras, do teste aplicado, não atingiu 80% de acertos diante dos estímulos apresentados.

Materiais

Os dados referentes ao desempenho perceptivo auditivo das oclusivas foram obtidos a partir instrumento PERCEFAL(1111 Berti LC. PERCEFAL: instrumento de avaliação da identificação de contrastes fonológicos. Audiol Commun Res. 2017;22(0). http://dx.doi.org/10.1590/2317-6431-2016-1727.
http://dx.doi.org/10.1590/2317-6431-2016...
) com uso do software PERCEVAL (Perception Evalution Auditive & Visuelle)(1212 André C, Ghio A, Cave C, Teston B. Perceval: perception evaluation auditive & visuelle (versão 5.0.30) [Programa de computador]. Aix-en-Provence; 2009.), o mesmo utilizado em estudos anteriores(1111 Berti LC. PERCEFAL: instrumento de avaliação da identificação de contrastes fonológicos. Audiol Commun Res. 2017;22(0). http://dx.doi.org/10.1590/2317-6431-2016-1727.
http://dx.doi.org/10.1590/2317-6431-2016...
,1212 André C, Ghio A, Cave C, Teston B. Perceval: perception evaluation auditive & visuelle (versão 5.0.30) [Programa de computador]. Aix-en-Provence; 2009.).

A realização deste experimento envolve 30 palavras (15 pares contrastivos) familiares ao vocabulário infantil, passíveis de representação por meio de figuras, dissilábicas paroxítonas, com as consoantes oclusivas na sílaba tônica. Ex: Berço, Pote, Ducha, Cola, Gola.

Este instrumento é composto por estímulos visuais e auditivos. Os estímulos auditivos compreendem as edições de gravações das palavras alvo por um adulto falante típico do PB, enquanto os estímulos visuais compreendem as figuras recuperadas do site de busca do Google(1313 Google [Internet]. 2019 [citado em 2019 Nov 4]. Disponível em: httpp://images.google.com.br/). Tais figuras fazem correspondência direta às palavras alvo constituintes do teste, ou seja, para cada palavra alvo existe uma imagem correspondente.

Procedimento

O teste perceptivo-auditivo proposto para o estudo se refere a um teste de identificação, em que é feita uma escolha por meio da relação som-gravura. O experimento apresenta 3 etapas: reconhecimento de palavra, fase treino e fase teste.

Na 1º etapa, denominada de fase de reconhecimento são apresentados aos participantes os inputs visuais e auditivos presentes no teste. Tal processo investiga a familiaridade da criança com os estímulos. Caso a criança não reconheça 80% dos estímulos apresentados, esta foi excluída do experimento.

A fase treino corresponde a 2º etapa do teste. Esta fase é executada de modo automático pelo software, com intuito de garantir a compreensão da tarefa de identificação, são selecionados de modo aleatório 10 estímulos pelo software. Os inputs auditivos e visuais são apresentados quase simultaneamente, de modo que logo após a apresentação do estímulo sonoro (palavra alvo), duas figuras (correspondentes a pares mínimos) são dispostas na tela do computador, sendo somente uma correspondente ao estímulo sonoro. Após a apresentação dos estímulos a criança deve escolher qual a gravura correspondente, pressionando uma tecla previamente acordada. Contudo, nesta fase, os resultados obtidos não são computados pelo software. Garantida a compreensão da tarefa pelos participantes, inicia-se a fase teste propriamente dita.

A fase teste corresponde à última etapa do experimento, onde as crianças continuavam dispostas de modo confortável à frente de uma tela de computador com fones Koss acoplados aos seus ouvidos, na sala de tratamento acústico no laboratório de análise acústica do CEES. As crianças ouviram individualmente (com apresentação binaural, em uma intensidade de 50 DB NPS), uma das palavras do par mínimo e, em seguida, tiveram que decidir e indicar uma gravura, diante de duas dispostas na tela do computador, apertando uma tecla previamente combinada.

Por exemplo, foi apresentada auditivamente a palavra “pato” e em seguida eram dispostas na tela do computador gravuras correspondentes às palavras “pato” e “gato”, para que o participante decidisse e indicasse qual das gravuras corresponderia ao estímulo auditivo apresentado.

Tanto o tempo de apresentação dos estímulos auditivos e visuais, quanto o tempo de resposta foram mensurados automaticamente pelo software PERCEVAL.

O experimento durou em média 15 minutos por criança considerando as três etapas.

Análise dos dados

Tal como proposto no instrumento PERCEFAL(1111 Berti LC. PERCEFAL: instrumento de avaliação da identificação de contrastes fonológicos. Audiol Commun Res. 2017;22(0). http://dx.doi.org/10.1590/2317-6431-2016-1727.
http://dx.doi.org/10.1590/2317-6431-2016...
),foram utilizados os seguintes critérios para análise: (a) acurácia perceptivo-auditiva (porcentagem de erros, acertos e não resposta); (b) tempo de reação dos erros e acertos; e (c) padrão de erro caracterizado por (Vozeamento / Ponto articulatório / Vozeamento + Ponto articulatório).Padrão de erro por vozeamento são caracterizados por erros envolvendo exclusivamente os contrastes entre os fonemas surdos e sonoros, por exemplo, [p] e [b], [t] e [d], [k] e [g] enquanto padrões de erros envolvendo ponto articulatório são caracterizados por erros de contraste entre os pontos articulatórios, por exemplo, [p] e [t], [b] e [d], [g] e [b] .Já nos erros envolvendo vozeamento + ponto articulatório, como o próprio nome sugere, o erro é caracterizado por padrões de erro tanto em nível de ponto articulatório quanto de vozeamento, por exemplo, [p] e [d], [g] e [t], [b] e [t].

Após a tabulação dos dados e sua organização em planilha do Excel, foi realizado um tratamento estatístico descritivo e inferencial. Na análise inferencial foram comparados os tempos de reação dos erros e acertos, bem como a acurácia perceptivo-auditiva entre os dois grupos de crianças (G1 e G2), com o uso do teste T. Para análise do padrão dos erros, foi utilizada a ANOVA de Medidas Repetidas, considerando como fator entre-grupo a condição clínica das crianças (típicas e com TF) e como fator intra-grupo o tipo de erro: vozeamento, ponto e ponto+vozeamento. Adotou-se um valor de alfa ≤0,05.

RESULTADOS

Para apresentação dos resultados, retomaremos o objetivo da pesquisa. O objetivo do presente estudo foi, comparar o desempenho perceptivo-auditivo de crianças com e sem transtorno fonológico, bem como identificar a similaridade (ou não) do padrão de erro apresentado pelas crianças com e sem TF em tarefa de identificação sonora, envolvendo os fonemas oclusivos do Português Brasileiro.

Este estudo foi conduzido com 46 crianças (34 do sexo masculino e 12 do sexo feminino), entre 4 e 8 anos de idade, sendo 23 diagnosticadas com transtorno fonológico com acometimento na classe das oclusivas (G1) e 23 com desenvolvimento típico de fala (G2).

Conforme indica a Tabela 1, o Test T mostrou uma diferença estatisticamente significante entre os grupos de crianças para porcentagem de erros e acertos, bem como para o tempo de reação relacionado ao acerto (todos com p<0,05). Particularmente, as crianças típicas tiveram uma média de acerto maior (90,3%) do que as crianças com TF (81,5%) e um tempo de reação menor para os acertos (diferença de 233 ms).

Tabela 1
Acurácia perceptivo-auditivo relativo ao grupo controle (G1) e experimental (G2)

Para os dados referentes ao padrão de erro, ilustrado na Tabela 2, a ANOVA de medidas repetidas mostrou um efeito significante para grupo (F(1,12,)= 8,32, p=0,01) e para o padrão de erro (F(2,24)= 10,33, p<0,01), mas não houve efeito significante para a interação entre grupo e padrão de erro (F(2,24)= 2,42, p=0,10). Mais uma vez, crianças com TF apresentaram um maior número de erros comparativamente às crianças típicas.

Tabela 2
Acurácia referente ao padrão de erro relativo ao grupo controle (G1) e experimental (G2)

Com relação ao padrão de erro, o teste Post Hoc de Tukey mostrou, para ambos os grupos, tal como ilustra a Figura 1, que os erros de identificação perceptual envolvendo o ponto articulatório foi superior aos erros de vozeamento e erros envolvendo vozeamento e ponto articulatório (p<0,01).

Figura 1
Padrão de Erro entre os Grupos

DISCUSSÃO

O presente estudo teve por objetivo comparar o desempenho perceptivo-auditivo de crianças com e sem transtorno fonológico (TF) na tarefa de identificação dos contrastes entre os fonemas oclusivos. Hipotetizou-se que o desempenho perceptivo-auditivo das crianças com TF seria caracterizado por pior acurácia e tempo de reação mais longo.

Em relação à amostra, em termos de percepção da fala a literatura reporta que a idade influencia no desempenho perceptual na medida em que para adquirir a fonologia de uma língua, a criança não somente deverá aprender a discriminar os padrões sonoros de sua língua, como também organizar, consistentemente, esses padrões sonoros em suas categorias fônicas apropriadas. Esta habilidade é referida como identificação fônica(1414 Berti L. Desempenho perceptivo-auditivo de crianças na identificação de contrastes fônicos. Alfa Rev Linguist. 2017;61(1):81-103. http://dx.doi.org/10.1590/1981-5794-1704-4.
http://dx.doi.org/10.1590/1981-5794-1704...
), há uma discrepância na literatura com relação à idade em que a habilidade perceptual de fala é estabilizada variando de 6 a 12 anos(1515 Penido F, Rui R. Percepção da fala em desenvolvimento: uma retrospectiva. Verba Volant. 2013;4(1):117-40.). Não há evidencia de que o sexo influencie no desempenho perceptual. Desta forma, nota-se que a partir da faixa etária avaliada neste estudo (4 à 8 anos) a habilidade perceptual de fala, do grupo investigado, ainda está em desenvolvimento.

Em relação à acurácia perceptivo-auditiva os resultados mostraram diferença estatisticamente significante entre os grupos de criança, tanto para porcentagem de erros quanto para a porcentagem de acertos, em que as crianças com TF apresentaram pior acurácia comparado ao grupo-controle, confirmando integralmente a primeira hipótese.

Estudos existentes(1010 Hearnshaw S, Baker E, Munro N. The speech perception skills of children with and without speech sound disorder. J Commun Disord. 2018;71:61-71. http://dx.doi.org/10.1016/j.jcomdis.2017.12.004. PMid:29306068.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jcomdis.2017...

11 Berti LC. PERCEFAL: instrumento de avaliação da identificação de contrastes fonológicos. Audiol Commun Res. 2017;22(0). http://dx.doi.org/10.1590/2317-6431-2016-1727.
http://dx.doi.org/10.1590/2317-6431-2016...
-1212 André C, Ghio A, Cave C, Teston B. Perceval: perception evaluation auditive & visuelle (versão 5.0.30) [Programa de computador]. Aix-en-Provence; 2009.,1414 Berti L. Desempenho perceptivo-auditivo de crianças na identificação de contrastes fônicos. Alfa Rev Linguist. 2017;61(1):81-103. http://dx.doi.org/10.1590/1981-5794-1704-4.
http://dx.doi.org/10.1590/1981-5794-1704...

15 Penido F, Rui R. Percepção da fala em desenvolvimento: uma retrospectiva. Verba Volant. 2013;4(1):117-40.

16 Berti L, Falavigna A, Santos J, Oliveira R. Desempenho perceptivo-auditivo de crianças na identificação de contrastes fonológicos entre as oclusivas. J Soc Bras Fonoaudiol. 2012;24(4):348-54. http://dx.doi.org/10.1590/S2179-64912012000400010. PMid:23306685.
http://dx.doi.org/10.1590/S2179-64912012...

17 Roque L, Berti L. O efeito da idade em uma tarefa de identificação das vogais tônicas do Português Brasileiro. Audiol Commun Res. 2015;20(4):349-54. http://dx.doi.org/10.1590/2317-6431-2015-1536.
http://dx.doi.org/10.1590/2317-6431-2015...
-1818 Nijland L. Speech perception in children with speech output disorders. Clin Linguist Phon. 2009;23(3):222-39. http://dx.doi.org/10.1080/02699200802399947. PMid:19283579.
http://dx.doi.org/10.1080/02699200802399...
) também têm confirmado que crianças com TF apresentam dificuldades na precisão de percepção da fala, sugerindo que dificuldades perceptivas poderiam interferir na representação fonológica, reforçando que, problemas perceptivos de fala poderiam preceder ou interagir com os distúrbios de produção.

Particularmente, um recente estudo(1010 Hearnshaw S, Baker E, Munro N. The speech perception skills of children with and without speech sound disorder. J Commun Disord. 2018;71:61-71. http://dx.doi.org/10.1016/j.jcomdis.2017.12.004. PMid:29306068.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jcomdis.2017...
) investigou a acurácia geral da percepção da fala em crianças falantes de inglês e australiano, em tarefa de julgamento lexical e fônico, em que os resultados mostraram um desempenho perceptivo-auditivo significativamente inferior por parte das crianças com TF. Outro estudo, por sua vez, investigou a percepção de fala em crianças com apraxia de fala e com TF, por meio de tarefas de discriminação auditiva não verbal e verbal, rima de palavras e classificação categórica. Hipotetizou-se que a natureza dos distúrbios de produção estaria correlacionada a maior/menor dificuldade perceptual percepção. Como resultado, observou-se um baixo desempenho perceptivo para ambos os grupos, sugerindo assim que, problemas de produção estariam associados a alterações em nível de percepção corroborando, portanto, a hipótese levantada por esses autores(1818 Nijland L. Speech perception in children with speech output disorders. Clin Linguist Phon. 2009;23(3):222-39. http://dx.doi.org/10.1080/02699200802399947. PMid:19283579.
http://dx.doi.org/10.1080/02699200802399...
).

Desta forma, o resultado encontrado no presente estudo, pode ser mais uma evidência de que as crianças com transtorno fonológico podem ter também uma alteração na percepção da fala, o que poderia relacionar-se a sua própria dificuldade de produção. Ou seja, as crianças do presente estudo tiveram tanto problemas na produção de oclusivas quanto na percepção de oclusivas.

No tocante ao tempo de reação, os resultados obtidos demonstraram que as crianças com transtorno fonológico apresentam, para o acerto, um tempo de reação mais laborioso quando comparado ao grupo-controle; porém, para o tempo de reação envolvendo os erros não houve diferença estatística entre os grupos, confirmando parcialmente a nossa hipótese.

O fato de o grupo de crianças com TF ter apresentado um tempo de reação dos acertos superior ao grupo de crianças típicas, pode evidenciar uma maior demanda de processamento por parte das crianças com TF, podendo assim refletir a dificuldade perceptual apresentada por este grupo, tal como verificada em estudo anterior(77 Attoni T, Quintas V, Mota H. Avaliação do processamento auditivo e da discriminação fonêmica em crianças com desenvolvimento fonológico normal e desviante. Rev Bras Otorrinolaringol. 2010;76(6):762768. http://dx.doi.org/10.1590/S1808-86942010000600015.
http://dx.doi.org/10.1590/S1808-86942010...
).

O tempo de reação dos erros, entretanto, demandou maior tempo de processamento para ambos os grupos, fato já descrito em outros estudos conduzidos com crianças típicas(1111 Berti LC. PERCEFAL: instrumento de avaliação da identificação de contrastes fonológicos. Audiol Commun Res. 2017;22(0). http://dx.doi.org/10.1590/2317-6431-2016-1727.
http://dx.doi.org/10.1590/2317-6431-2016...
), o qual o tempo de resposta dos erros é significativamente superior ao tempo de reposta dos acertos, sugerindo que os contrastes oclusivos que apresentaram erros na tarefa de identificação impõem maior dificuldade perceptivo-auditiva (ou maior similaridade perceptivo-auditiva), exigindo, consequentemente, maior tempo para a tomada de decisão.

Essa similaridade perceptivo-auditiva dos contrastes que apresentaram erros afetou, de modo semelhante, ambos os grupos deste estudo, uma vez que eles não apresentaram diferença estatística entre si. Sugere-se, portanto, que embora as crianças com TF apresente uma menor acurácia perceptivo-auditiva (maior porcentagem de erros), o tempo de processamento para a tomada de decisão são semelhantes para ambos os grupos. Ou seja, a dificuldade imposta para a detecção de um contraste com grande similaridade perceptual foi à mesma para ambos os grupos, refletida na não diferenciação dos tempos de reação dos erros.

Finalmente, em relação ao padrão de erro, houve diferença entre os grupos. Mais uma vez, crianças com TF apresentaram uma maior frequência de erros comparada ao grupo de crianças típicas concordando com resultados de estudos anteriores, os quais descreveram um pior desempenho perceptivo por parte de crianças com TF(1010 Hearnshaw S, Baker E, Munro N. The speech perception skills of children with and without speech sound disorder. J Commun Disord. 2018;71:61-71. http://dx.doi.org/10.1016/j.jcomdis.2017.12.004. PMid:29306068.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jcomdis.2017...

11 Berti LC. PERCEFAL: instrumento de avaliação da identificação de contrastes fonológicos. Audiol Commun Res. 2017;22(0). http://dx.doi.org/10.1590/2317-6431-2016-1727.
http://dx.doi.org/10.1590/2317-6431-2016...
-1212 André C, Ghio A, Cave C, Teston B. Perceval: perception evaluation auditive & visuelle (versão 5.0.30) [Programa de computador]. Aix-en-Provence; 2009.,1414 Berti L. Desempenho perceptivo-auditivo de crianças na identificação de contrastes fônicos. Alfa Rev Linguist. 2017;61(1):81-103. http://dx.doi.org/10.1590/1981-5794-1704-4.
http://dx.doi.org/10.1590/1981-5794-1704...

15 Penido F, Rui R. Percepção da fala em desenvolvimento: uma retrospectiva. Verba Volant. 2013;4(1):117-40.

16 Berti L, Falavigna A, Santos J, Oliveira R. Desempenho perceptivo-auditivo de crianças na identificação de contrastes fonológicos entre as oclusivas. J Soc Bras Fonoaudiol. 2012;24(4):348-54. http://dx.doi.org/10.1590/S2179-64912012000400010. PMid:23306685.
http://dx.doi.org/10.1590/S2179-64912012...

17 Roque L, Berti L. O efeito da idade em uma tarefa de identificação das vogais tônicas do Português Brasileiro. Audiol Commun Res. 2015;20(4):349-54. http://dx.doi.org/10.1590/2317-6431-2015-1536.
http://dx.doi.org/10.1590/2317-6431-2015...
-1818 Nijland L. Speech perception in children with speech output disorders. Clin Linguist Phon. 2009;23(3):222-39. http://dx.doi.org/10.1080/02699200802399947. PMid:19283579.
http://dx.doi.org/10.1080/02699200802399...
).

Em ambos os grupos, erros envolvendo o ponto de articulação foram os mais frequentes, corroborando os estudos anteriores em que demonstraram semelhanças para as características dos erros apresentados entre grupo de crianças com TF e sem alteração de fala(1010 Hearnshaw S, Baker E, Munro N. The speech perception skills of children with and without speech sound disorder. J Commun Disord. 2018;71:61-71. http://dx.doi.org/10.1016/j.jcomdis.2017.12.004. PMid:29306068.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jcomdis.2017...
).

Uma possível explicação para as semelhanças do padrão de erro entre os grupos, em que erros envolvendo o ponto articulatório apresentaram-se superior aos erros de vozeamento e erros envolvendo vozeamento e ponto articulatório, poderia ser justificado pelo fato de que as pistas acústicas que marcam o ponto articulatório serem menos robustas, interferindo, deste modo, na identificação dos contrastes entre as oclusivas(1414 Berti L. Desempenho perceptivo-auditivo de crianças na identificação de contrastes fônicos. Alfa Rev Linguist. 2017;61(1):81-103. http://dx.doi.org/10.1590/1981-5794-1704-4.
http://dx.doi.org/10.1590/1981-5794-1704...
,1919 Miller G, Nicely P. An analysis of perceptual confusions among some english consonants. J Acoust Soc Am. 1955;27(2):338-52. http://dx.doi.org/10.1121/1.1907526.
http://dx.doi.org/10.1121/1.1907526...
,2020 Wang M, Bilger R. Consonant confusions in noise: a study of perceptual features. J Acoust Soc Am. 1973;54(5):1248-66. http://dx.doi.org/10.1121/1.1914417. PMid:4765809.
http://dx.doi.org/10.1121/1.1914417...
).

Tendo em vista que os grupos de crianças analisadas no presente estudo fazem parte constitutiva da mesma língua, ambas estão expostas aos mesmos fenômenos acústicos, o que explicaria, portanto, a similaridade encontrada para este tópico.

Apesar de não ter sido considerada a interferência o grau de gravidade do TF no desempenho perceptivo-auditivo das crianças, os resultados deste estudo mostram importantes implicações clínica para a avaliação e reabilitação de crianças com TF; tanto no que se refere à acurácia perceptual, quanto no que se refere à natureza do erro. Em relação à acurácia, estima-se um valor médio para o grupo de crianças com TF de aproximadamente 81,5% de acertos; enquanto no tocante ao padrão do erro deve-se considerar a natureza do mesmo, ou seja, se envolve o contraste de vozeamento, ponto articulatório ou ponto articulatório + vozeamento. Erros perceptuais envolvendo vozeamento, por exemplo, poderiam ser considerados mais graves do que erros perceptuais de identificação de oclusivas envolvendo apenas o ponto, uma vez que esses erros foram os menos frequentes.

Em termos de contribuições, acredita-se que os achados deste estudo podem (1) fornecer informações a respeito do desempenho perceptual de crianças com TF e (2) auxiliar a clínica fonoaudiológica na análise do desempenho perceptivo de indivíduos com alterações fonoaudiológicas. Alertamos como limitação desse estudo o fato de não ser considerado a gravidade do TF, nem mesmo o subtipo de TF. Além disso, a investigação perceptiva-auditiva foi restrita à classe das oclusivas.

Desta forma, para estudos futuros sugere-se, a investigação perceptiva-auditiva para as demais classes fonológicas do PB.

CONCLUSÃO

Crianças com transtorno fonológico, para a classe das oclusivas, apresentaram pior acurácia perceptivo-auditiva do que crianças sem alteração e, ainda, um maior tempo de resposta para os acertos. Isso significa dizer que embora as crianças com TF apresentem audição normal, seu desempenho perceptual parece estar comprometido, evidenciando a necessidade de uma avalição desse aspecto. Não houve diferença entre os grupos na comparação do padrão de erros. Um possível desdobramento deste estudo seria considerar não apenas a correlação entre os erros de produção e os de percepção de fala, mas também a influência do grau de gravidade do TF no desempenho perceptual.

AGRADECIMENTOS

À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), pelo apoio financeiro (nº 2017/04968-0).

  • Trabalho realizado no Departamento de Fonoaudiologia, Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – UNESP – Marília (SP), Brasil.
  • Fonte de financiamento: FAPESP nº 2017/04968-0.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Abr 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    04 Nov 2019
  • Aceito
    10 Abr 2020
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