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Estilo e formação na filosofia do jovem Nietzsche: o caso Schopenhauer

Style and formation in the philosophy of the young Nietzsche: the Schopenhauer case

Resumo:

O escopo desta investigação consiste em averiguar em que medida o estilo (Stil), para o jovem Nietzsche, consiste num meio através do qual o filósofo realiza a suprema tarefa da filosofia: a formação (Bildung). Parto da afirmação de que o problema estilístico compõe um dos principais elementos da avaliação que o jovem filósofo faz da formação e da cultura (Kultur) alemãs de seu tempo para, por fim, apresentar de que modo Nietzsche encontra no caráter extemporâneo do estilo e da filosofia de Schopenhauer o caminho para a superação da barbárie (Barbarei).

Palavras-chave:
Estilo; Filosofia; formação; cultura; Schopenhauer

Abstract:

The scope of this investigation is to find out to what extent the style (Stil), for the young Nietzsche, consists of a means through which the philosopher accomplishes the supreme task of philosophy: the formation (Bildung). I start from the statement that the stylistic problem composes one of the main elements of the evaluation that the young philosopher makes of the German formation and culture (Kultur) of his time to, finally, present how Nietzsche finds in the extemporaneous character of style and in the Schopenhauer's philosophy the way to overcome the barbarism (Barbarei).

Keywords:
Style; philosophy; formation; culture; Schopenhauer

No que diz respeito à filosofia de Nietzsche, o tema do estilo não é um tema menor. Amplo e diversificado, o conjunto dos comentários que tratam desse assunto atestam a sua relevância e, por conseguinte, sua importância para todos os que pretendem ler o autor de Assim falava Zaratustra. Grande foi o interesse dos intérpretes em encontrar um sentido filosófico para a peculiar estilística nietzschiana, sobretudo, para os textos a partir de Humano, demasiado humano, primeira obra aforística do filósofo alemão1 1 Sobre a concepção nietzschiana de estilo nas obras tardias, Cf. NEHAMAS, A. Nietzsche: life as literature. Cambridge/Massachusetts: Harvard University Press, 1985; ITAPARICA, André. Nietzsche: estilo e moral. São Paulo: Discurso Editorial, 2002. . Por outro lado, pouco foi o interesse em averiguar, na obra de Nietzsche, como ele mesmo pensou a relação entre estilo e filosofia. Contudo, no que concerne ao pensamento de Nietzsche, a preocupação com a temática do estilo precede em muito a redação de Humano, demasiado humano e, como atestam fragmentos póstumos da década de 1870, antes mesmo da publicação de sua primeira obra, O nascimento da tragédiaNIETZSCHE, F. W. O nascimento da tragédia. Trad. J. Guinsburg. São Paulo: Companhia das Letras, 1992., o filósofo já se ocupava com o tema do estilo na filosofia. Como se pode observar num fragmento póstumo deste período, Nietzsche pensa este tema sob a perspectiva da valoração do problema estilístico. O filósofo escreve:

O estilo nos escritos filosóficos.

A valoração do problema estilístico depende do que se exija ao filósofo.

Se o fim é o puro conhecimento científico ou se se quer divulgar conhecimentos filosóficos.

Se a finalidade é a instrução [Belehrung]ou a edificação [Erbauung], etc. [...] (Nachlass/FP 1869, 75[20], KWGI. 5. 241).

Com efeito, o melhor estilo deve ser aquele que melhor corresponde à respectiva exigência. Neste caso, é necessário indagar acerca dessa exigência, isto é, questionar acerca da tarefa do filósofo e, por conseguinte da meta da filosofia: se é produzir puro conhecimento científico à instrução do indivíduo, ou divulgar conhecimentos filosóficos tendo em vista a sua edificação. O escopo desta investigação consiste em averiguar em que medida o estilo, para o jovem Nietzsche, consiste num meio através do qual o filósofo realiza a suprema tarefa da filosofia: a formação. Parto da afirmação de que o problema estilístico constitui um dos principais elementos da avaliação que o jovem filósofo faz da formação e da cultura alemãs de seu tempo para, por fim, apresentar de que modo Nietzsche encontra no caráter extemporâneo do estilo e da filosofia de Schopenhauer o caminho para a superação da barbárie (Barbarei) de seu tempo.

O objetivo da filosofia é a formação

Em sua Terceira Consideração Extemporânea, acerca do papel do filósofo, Nietzsche escreve: “Para mim, um filósofo é importante na justa medida em que está em condições de dar exemplo (Beispiel). Não há dúvida alguma de que, mediante o exemplo, pode arrastar atrás de si povos inteiros; a história da Índia, que é praticamente a história da filosofia hindu, o prova” (SE/Co. Ext. III § 3, KSA 1.350). Como indivíduo modelar, o filósofo é um educador (Erzieher) por excelência. Contudo, a tarefa de educar, na acepção nietzschiana, é algo radicalmente diferente e, num certo sentido, oposto à de instruir.

Para o jovem Nietzsche, educar não é um processo que ocorre pela via teórica da ilustração (Aufkärung)2 2 Utilizaremos a palavra “ilustração” como correspondente em nosso vernáculo para o termo alemão Aufkärung. Sobre o conceito de Aufkärung, seguimos a interpretação de Rubens Rodrigues Torres Filho em que escreve: “Luzes (Século das): com essa metáfora de claridade (Lumières, Iluminismo, Enlightenment, Ilustración, Aufklärung), o pensamento europeu do século XVIII formou sua auto-imagem, caracterizada pela confiança no poder da luz natural, da razão, contra todas as formas de obscurantismo (TORRES FILHO, 1987, p. 84). , mas que se dá através do contato com modelo exemplar, o próprio educador, sendo assim, ele acontece por uma via ao mesmo tempo estética e ética. Neste sentido, num póstumo do verão de 1872 - começo de 1873, Nietzsche afirma:

a formação (Bildung) não é necessariamente conceitual (begriffliche), mas sobretudo é intuitiva (anschauende), e elege corretamente (...) A educação (Erziehung) de um povo para a formação é essencialmente o acostumar-se a bons modelos (gute Vorbilder) e uma formação de necessidades nobres” (Nachlass/FP 1872 - 1873, 19 [299], KSA, 7.511)

Uma vez que não se trata de um processo de ilustração do homem, a educação não tem como meta a erudição do indivíduo e o acúmulo de saberes científicos, mas sim a edificação estética e moral do indivíduo, o que significa, em última análise, realizar a sua plena formação3 3 No sentido aqui empregado, os conceitos nietzschianos de formação (Bildung) e de educação (Erziehung) se encontram particularmente imbricados. Enquanto o termo Erziehung alude a um processo pedagógico ao qual uma pessoa ou grupo se submete a outro seguindo o aspecto normativo de um modelo determinado, a Bildung diz respeito ao processo de autoformação do indivíduo. Neste sentido, Erziehung e Bildungsão termos convergentes na medida em que a autoformação indicada pela Bildung requer um modelo a ser fornecidopela Erziehung. . Na busca pela formação, cabe ao indivíduo encontrar o seu educador e formador (Bildner), aquele que, em última análise, é o seu descobridor e libertador. Nietzsche escreve:

[...] descobre o verdadeiro sentido originário e a matéria fundamental do teu ser, algo que é totalmente ineducável e imodelável, mas que em todo caso também é dificilmente acessível e que está atado e paralisado: os únicos que podem ser seus educadores são teus libertadores. E este é o segredo de toda formação [Bildung] (SE/Co. Ext. III § 1, KSA 1.337).

Assim, com o exemplo do educador, o educando tem a possibilidade de vislumbrar e de acessar o seu ser mais íntimo e aquilo que ele verdadeiramente é. Neste sentido, a educação deve ocorrer em duas vias, uma crítica e libertadora e outra propositiva. No que diz respeito ao primeiro sentido, a educação (Erziehung) tem a ver com as ideias de liberdade e emancipação. Segundo NietzscheNIETZSCHE, F. W. Sämtliche Werke. Kritische Studienausgabe. Hg. G. Colli e M. Montinari. Berlin: Walter de Gruyter, 1980, 15v., ela “é libertação (Befreiung), limpeza de todas as ervas daninhas, dos escombros, dos vermes que querem atacar os ternos gérmenes das plantas”(SE/Co. Ext. III § 1, KSA 1.337). O papel do filósofo educador é, portanto, o emancipador o indivíduo; aquele que o liberta de todas as amarras que o impedem de se elevar até si mesmo. Nietzsche escreve: “teu verdadeiro ser não se encontra oculto no fundo de ti, mas imensamente elevado acima de ti, ou pelo menos acima do que considera habitualmente como o seu eu” (SE/Co. Ext. III § 1, KSA 1.337).

Completa a tarefa da libertação, o filósofo educador passa a operar numa via propositiva, pois, uma vez emancipado, o indivíduo se encontra livre para realizar de modo pleno a sua formação. É neste sentido que o filósofo educador é também o formador do homem, pois é por intermédio de sua vida e obra exemplar que o educando encontra os meios para realizar em sua vida uma transfiguração (Verklärung)4 4 Cf. SE/Co. Ext. III § 4, KSA 1.363. , o que significa realizar o aperfeiçoamento de si mesmo de modo a fazer de si um todo harmônico e coeso: eis o sentido de uma autêntica formação. Em relação a este caráter propositivo, Nietzsche escreve: “(...) a tarefa de sua educação consistiria melhor, a meu ver, em remodelar (umbilden) o ser humano inteiro em um sistema solar e em um sistema planetário dotados de vivos movimentos” (SE/Co. Ext. III § 2, KSA 1.341). Se assim for, a filosofia, para o jovem Nietzsche, vem a ser o meio pelo qual o filósofo realiza sua tarefa educativa visando ao mesmo tempo à libertação e à formação do homem como uma totalidade, como um sistema solar em que todas as forças girem em torno e em prol de uma força central5 5 Cf. SE/Co. Ext. III § 2, KSA 1.341. ; ou, nos termos da antiga retórica, totum ponere6 6 A noção de totum ponere é proveniente da estética clássica, particularmente das artes poética e retórica. Nesta acepção, a realização do belo na obra de arte depende da capacidade do artista em criar uma totalidade, uma obra de arte em que as partes estejam ordenadas de modo a compor um todo harmônico. O ideal clássico do totum ponere influenciará de maneira decisiva a crítica nietzschiana aos escritores alemães de sua época e, de modo particular,ao teólogo e escritor David Strauss em sua Primeira consideração extemporânea. Sobre a noção de belo no classicismo antigo, Cf. Tringali, 1993, p. 540. : fazer do homem um todo; uma unidade a partir da relação harmônica entre as partes. Mas porque é o indivíduo uma parte de um todo social, também deve alcançar a plena harmonia com as outras partes de modo a formar uma cultura (Kultur) una e coesa.

Não obstante, embora o conceito de formação tenha a ver diretamente com o auto aperfeiçoamento do indivíduo, isto é, com o seu aperfeiçoamento estético e moral, este conceito não deixa de se comunicar com o todo social e a cultura à qual pertence. Assim, ainda que os conceitos de formação e cultura apareçam num primeiro momento como conceitos antagônicos, já que com o primeiro Nietzsche geralmente se refere ao indivíduo e com o segundo à coletividade, esta oposição é apenas secundária. A formação e a cultura, para o jovem NietzscheNIETZSCHE, F. W. Obras completas V.1: escritos de juventude. Trad. Joan. B. Llinares, Diogo Sánchez Meca e Luis E. de Santiago Guervós. Madrid: Techos, 2011., são instâncias em permanente comunicação, pois para que haja uma autêntica formação do indivíduo é necessário que o mesmo esteja inserido em uma autêntica cultura, ou pelo menos tenha sido formado seguindo os preceitos da mesma7 7 Neste sentido, concordamos com a posição de Wotling quando este escreve: “a Cultur não é Bildung. Mas os dois conceitos não se opõem simplesmente como uma determinação individual e subjetiva a uma determinação coletiva, embora a Bildung remeta sobretudo à formação intelectual de um indivíduo particular, e a Cultur se aplique, geralmente, em compensação, a um povo ou a um grupo humano relativamente grande. O caráter relativamente secundário dessa oposição se mostra particularmente, quando se considera o exemplo de Goethe, celebrado por Nietzsche não pela qualidade de sua Bildung, mas, ao contrário, porque ele encarna, enquanto indivíduo singular, a Cultur” (WOTLING, 2013, p. 55). .

Desse modo, se a tarefa do filósofo é educar o homem e não apenas instruí-lo; e se esta educação não se dá pela via da ilustração, mas sim da apreensão estética, então o estilo sob o qual o discurso filosófico se apresenta terá de corresponder à finalidade do filósofo educador, ou seja, deve ter em vista à formação do homem e não à divulgação de conhecimentos científicos. Em linhas gerais, o filósofo deverá promover a transfiguração do leitor assim de modo a formá-lo como uma totalidade em si mesmo, porém que se reconheça como parte de uma totalidade cultural. Por isso, o nexo que é estabelecido por Nietzsche entre o estilo e a filosofia não pode ser analisado de modo satisfatório senão à luz dos temas da formação e da cultura.

É na Primeira Consideração Extemporânea que os conceitos de estilo e cultura aparecem pela primeira vez relacionados na obra de NietzscheNIETZSCHE, F. W. Fragmentos Póstumos (1869 - 1874). V. 1.Trad. Luis E. de Santiago Guervós. Madrid: Techos , 2007.. O polêmico ensaio contra David Strauss apresenta uma definição de cultura (Kultur) como sendo uma “unidade de estilo artístico” (Einheit des künstlerischen Stiles) no âmbito das manifestações da vida de um povo8 8 Cf. DS/Co. Ext. I § 1, KSA 1.159. . Imbricados deste modo, os conceitos de estilo e cultura recebem uma determinação recíproca, uma vez que já não é possível pensar um sem pensar o outro9 9 Sobre esta relação de interdependência entre os conceitos de Kultur e Stil, Cf. GENTILE, 2010, p. 56. . Assim, no que diz respeito ao alemão de seu tempo, se não há unidade estilística na vida do povo alemão, não há também uma cultura original alemã10 10 Cf. DS/Co. Ext. I § 1, KSA 1.159. , pois o que o povo alemão denomina cultura é exatamente o seu oposto, a barbárie (Barbarei), ou seja, a ausência de um estilo ou a confusão caótica de todos os estilos11 11 Cf. DS/Co. Ext. I § 1, KSA 1.159. . Na ausência de uma autêntica cultura alemã, portanto, o alemão não pôde se formar senão enquanto um bárbaro. O alvo dos ataques nietzschianos é aquilo que em sua Primeira Extemporânea o jovem filósofo designou por formação de filisteu12 12 Cf. DS/Co. Ext. I § 2, KSA 1.164 , uma pseudoformação ilustrada predominante na Alemanha pós-Revolução Francesa e que valoriza o acúmulo de saber e a erudição do indivíduo em detrimento de uma autêntica formação.

A formação de filisteu

A formação de filisteu se apresenta, para Nietzsche, como uma força inibidora que interdita a constituição de uma autêntica formação alemã (deutsche Bildung) e, dessa forma, um “inimigo interno” do povo alemão. Em outros termos, na medida em que sua ampla disseminação desenvolve no alemão a falsa ideia de ter uma cultura, esta tendência à erudição se mostra perigosa para a constituição do povo alemão, pois impede o surgimento de uma autêntica formação alemã e consequentemente de uma verdadeira cultura alemã. Os responsáveis pela disseminação e manutenção deste tipo de formação teórica perigo são os “filisteus da formação” (Bildungsphilister)13 13 Por utilizarmos “formação” como correspondente em nosso vernáculo ao termo alemão Bildung, justificamos nossa opção pela expressão “filisteus da formação” para traduzir o termo nietzschiano Bildungsphilister. Em textos posteriores, Nietzsche tecerá algumas considerações acerca da origem e do uso deste termo. Em Ecce homo, num capítulo designado à primeira extemporânea, o filósofo escreve: “a palavra Bildungsphilister ficou na linguagem a partir do meu escrito” (EH/EH As extemporâneas § 2, KSA 6. 317). No conhecido prólogo de 1886 à Humano, demasiado humano II, o filósofo escreve: “reivindico a paternidade da expressão Bildungsphilisterque se usa e abusa atualmente” (HHII, prólogo, KSA 2.370). Em nota à tradução de Ecce homo para o idioma inglês, Walter Kaufmann afirma que a palavra Bildungsphilister teria sido já utilizada anteriormente por Gustav Teichmüller (1832 - 1888), no entanto, na opinião do pesquisador americano, a reivindicação nietzschiana é legítima pois, segundo Kaufmann, Nietzsche não diria tudo isso caso se recordasse de que a cunhagem do termo é de Teichmüller (Cf. Nietzsche, F. Ecce homo. Trad. Walter Kaufmann, New York: The Modern Library, 1992). , uma classe de homens eruditos e de natureza essencialmente antiestética, mas que a despeito disso se considera artista e homem da cultura14 14 Cf. DS/Co. Ext. I § 2, KSA 1.164. .

O filisteu da formação

Segundo NietzscheNIETZSCHE, F. W. Ecce Homo. In: Basic Writings of Nietzsche. Trans. Walter Kaufmann, New York: The Modern Library, 1992, a palavra filisteu “designa o contrário do filho das musas, do artista, do verdadeiro homem da cultura” (DS/Co. Ext. I § 2, KSA 1.164). O que difere esta noção geral de filisteu daquilo que o jovem Nietzsche chama de filisteu da formação é o fato deste último “ter a ilusão de que é filho das Musas e homem de cultura” (DS/Co. Ext. I § 2, KSA 1.164), enquanto interfere em questões estéticas e culturais pois acredita que “sua ‘formação’ é justamente a viva expressão da verdadeira cultura” (DS/Co. Ext. I § 2, KSA 1.164). Em um póstumo da época da redação da primeira extemporânea, o jovem filósofo tece algumas observações acerca do surgimento desta nova classe de filisteu, a do filisteu da formação. Neste fragmento, Nietzsche avalia o modo como o autêntico filisteu, homem alheio às Musas, converte-se em filisteu da formação e toma gosto pela arte e pelas questões em torno da estética e da cultura:

O filisteu é justamente o ἃμουσος [alheio às Musas]: é notável observar como ele apesar disso quer intervir em questões estéticas e culturais. Creio que o que serviu aqui de intermediário tem sido o pedagogo: ele, que por ofício se ocupava da Antiguidade clássica, e que pouco a pouco acreditou que por isso também devia ter um gosto clássico (Nachlass/FP 1873, 27 [56], KSA 7.603).

Num primeiro momento, Nietzsche identifica o pedagogo como o elo entre o filisteu e o filisteu da formação. O ofício da pedagogia, por exigir o contato com a antiguidade clássica e com a autêntica cultura dos gregos, leva o filisteu não só à ilusão de que possui um gosto artístico, mas que este gosto é clássico. Não obstante, ele não percebe a distinção entre uma autêntica formação artística, como a dos clássicos gregos, e a erudição artística moderna. Em outro apontamento póstumo, também de 1873, Nietzsche esboça uma nova hipótese sobre a origem do filisteu da formação, na qual reconhece no erudito o intermediário entre o autêntico filisteu e o da formação. O filósofo escreve:

Origem do filisteu da formação [Entstehung des Philisters der Bildung]. Em si a formação sempre se reduz a círculos muito exclusivos. O autêntico filisteu se mantém distante deles. O erudito se faz de intermediário, ele acreditava na Antiguidade clássica e valorava os artistas como tipos suspeitos. Hegel pôs em circulação nas universidades muita estética. O público dos “Almanaques” é o público de sempre, jornais da tarde. Nos anos cinquenta os realistas, Julian Schmidt. Pouco a pouco se forma o público das conferências populares, é como um poder, tem simpatias, pressupostos etc. [...] (Nachlass/FP 1873, 27 [52], KSA 7.602).

Com efeito, Nietzsche reconhece no erudito o elo entre o filisteu e o filisteu da formação. São escritores, jornalistas, artistas e outros homens cultos que, por ignorar sua condição mesquinha de filisteu, toma sua erudição como expressão viva de uma cultura autêntica. Nos termos do próprio filósofo: “se sente firmemente convencido de que sua ‘formação’ é justamente a viva expressão da verdadeira cultura alemã” (DS/Co. Ext. I § 2, KSA 1.164). Na avaliação do jovem Nietzsche, a ampliação das discussões sobre estética nas universidades, realizada por filósofos como Hegel; a forte influência do realismo literário, bem como de escritores e jornalistas como Julian Schmidt15 15 Heinrich Julian Schmidt (1818-1886) foi um escritor, jornalista, crítico e historiador da literatura prussiano. Em Leipzig, Junto com Gustav Freytag, outro jornalista atacado por Nietzsche, Schmidt editou periódico Die Grenzbotende 1848 a 1861. Neste ano, se mudou para Berlim onde trabalhou como editor chefe doBerliner allgemeine Zeitung, um dos jornais mais influentes da Alemanha deste período. que, através de almanaques e periódicos levam a arte e a crítica da arte ao grande público dos jornais, fez com que aos poucos se formasse o público das conferências populares e, com ele, a perigosa confusão entre as noções de erudição e de cultura.

Na Alemanha moderna, afirma Nietzsche, o tipo do filisteu da formação está por toda parte e, aonde quer que vá, tem a impressão de si mesmo no contato frequente com as pessoas cultas de sua espécie. Também se reconhece nas instituições públicas e nos centros escolares, de cultura e de arte, espaços que se organizam em consonância com sua erudição e de acordo com suas necessidades16 16 Cf. DS/Co. Ext. I § 2, KSA 1.164. . Da constante impressão de si mesmo em todos os lugares, o filisteu da formação “deduz uma unidade de estilo na formação alemã, enfim, uma cultura” (DS/Co. Ext. I § 2, KSA 1.164). Haja vista que a cultura pressupõe “uma diversidade que conflua na harmonia de um único estilo” (DS/Co. Ext. I § 2, KSA 1.164), ele toma aquela unidade da impressão de si mesmo como uma unidade de estilo na formação, ou seja, como uma autêntica cultura. No entanto, a uniformidade que ele constata não consiste numa autêntica unidade estilística, mas, pelo contrário, na repetição consistente da barbárie. Nietzsche escreve:

O que vê ao seu redor são necessidades exatamente iguais e opiniões similares; aonde vai, lhe envolve de imediato a atadura de uma convenção tácita acerca de muitas coisas, em particular os assuntos da religião e da arte: esta imponente uniformidade, este tutti uníssono que, sem mediar voz de mando, estala ao instante, lhe induz a crer que aqui há uma cultura. Mas pelo fato de ter um sistema, o filisteíssimo sistemático e predominante não é todavia cultura, e nem sequer má cultura, mas seguirá sendo só o contrário, isto é, barbárie com fundamentos consistentes (DS/Co. Ext. I § 2, KSA 1.164).

Com efeito, a imponente uniformidade da formação de filisteu se confirma no círculo cada vez mais amplo de homens semelhantes a ele. Por onde quer que vá, depara-se com uma rígida convenção e padronização de ideias e opiniões consoantes a sua, seja em questões estéticas, ou religiosas. No entanto, o que o filisteu da formação toma por cultura é justamente o seu contrário, a barbárie, ainda que sistematizada. Para Nietzsche, tal processo de uniformidade e padronização deste tipo de formação se dá quando se exclui e se recusa o verdadeiro estilo. O filósofo escreve:

Pois toda essa unidade da impressão que constantemente nos salta aos olhos em toda pessoa culta da Alemanha atual só chega a ser unidade por meio da exclusão e negação, consciente ou inconsciente, de todas as formas e exigências artisticamente produtivas de um verdadeiro estilo [wahren Stils] (DS/Co. Ext. I § 2, KSA 1.164).

Que a falsa ideia de unidade na formação do filisteu derive deste seu deslumbre de ver as suas opiniões e o seu gosto se multiplicarem e protagonizarem no âmbito da vida cultural, Nietzsche, não tem dúvidas. Não obstante, trata-se de uma unidade e consonância de atos e opiniões que expressão a barbárie e não de uma verdadeira unidade estilística. Aliás, se esta manifestação caótica chega a causar no filisteu a impressão de unidade é por negar e excluir exatamente aquilo que é a condição para a cultura: a unidade de estilo (Einheit des Stiles).

Por unidade de estilo, Nietzsche entende uma totalidade, uma forma geral para a qual as partes individuais confluam de modo a constituir um todo estilístico coeso, ao que o filósofo designa por uma cultura. Ao negar as formas e exigências artísticas de um verdadeiro estilo, o filisteu da formação nega o princípio formador do homem e, por conseguinte, da cultura. Assim, se Nietzsche entende a cultura como unidade de estilo artístico em todas as manifestações da vida de um povo, isto só é possível se se partir de um critério estilístico objetivo que funcione como parâmetro para a ação dos homens individuais. Em outros termos, cada homem, ao agir de acordo com um estilo único e objetivo, constitui-se como um povo e reafirma a totalidade estilística que é a cultura. Na medida em que suas ações negam qualquer critério estilístico objetivo, o filisteu da formação não constitui uma cultura, mas seu oposto, uma “não-cultura” (Nicht-Kultur) ou, quando muito, uma “barbárie estilizada” (stilisirten Barbarei) (DS/Co. Ext. I § 2, KSA 1.164)

Assim, por não concorrerem para um todo estilístico; por sobrevalorizarem as manifestações estilísticas autônomas e subjetivas em detrimento da submissão a um estilo único e objetivo, as ações do filisteu da formação se constituem como uma antítese à ideia nietzschiana de cultura. O filósofo escreve: “Se lhe dá (ao filisteu da formação) a liberdade de eleger entre uma ação conforme a um estilo e a oposta, agarra sempre a última, e como a agarra sempre, todas suas ações ficam marcadas com o selo negativamente uniforme. Neste selo reconhece o caráter da ‘cultura’ alemã por ele patenteada” (DS/Co. Ext. I § 2, KSA 1.164). Em suma, por negar repetidamente qualquer estilo objetivo o filisteu da formação acaba por desenvolver um sistema coerente de ações negativas, um “sistema da não-cultura” (System der Nicht-Kultur) (DS/Co. Ext. I § 2, KSA 1.164), pois, segundo o filósofo, ele passa a ter “precisamente por cultura o que nega a cultura” (DS/Co. Ext. I § 2, KSA 1.164), isto é, a barbárie: a confusão caótica de todos os estilos ou a ausência de um estilo.

Se há um lugar em que a aversão do filisteu pela ideia de convenção e pela ideia de forma se torna manifesta este lugar é a literatura alemã moderna, cuja marca mais evidente é o constante processo de dilapidação das estruturas da língua alemã em nome de uma linguagem do “tempo atual” (Jetztzeit). Para o jovem Nietzsche, as origens desta tendência estão relacionadas com a profunda influência que o estilo hegeliano exerceu sobre o filisteu da formação. Nietzsche escreve:

Uma filosofia que, entre pregas e franjas, ao estilo das transparências de Coos17 17 Dentre os trajes utilizados pelas cortezãs de Atenas, o mais conhecido é a coa, que recebe esse nome da ilha grega de Coos. , encobria o credo filisteu de seu autor, inventou ademais uma fórmula para divinizar a vida cotidiana: esta filosofia falava da racionalidade de todo o real, e assim captou as simpatias do filisteu da formação, a quem também lhe agrada as pregas e franjas, mas que, sobretudo, só se concebe a si mesmo como real e trata sua realidade como medida e razão do mundo (DS/Co. Ext. I § 2, KSA 1.164).

Tal como Eurípedes, acusado por Nietzsche de ter levado o espectador e a vida cotidiana à cena realizando com isso o ocaso da tragédia18 18 Cf. GT/NT §11. , Hegel foi quem deu cidadania filosófica à linguagem e ao realismo cotidiano. O autor de A fenomenologia do espírito teria introduzido a ideia de que a linguagem deve ser a expressão racional e subjetiva do seu tempo, ou melhor, de um modo de perceber o tempo, um tempo fugaz com o qual ele designou por modernidade19 19 Acompanhamos aqui a interpretação de Habermas (2000, p. 09) acerca do conceito de modernidade. Para o filósofo de Frankfurt, Hegel foi o primeiro filósofo a desenvolver um conceito claro de modernidade, isto é, a elevar o termo modernidade a um estatuto conceitual. Segundo ele, a utilização hegeliana desse conceito teria ocorrido num contexto sobretudo histórico, no qual o irromper dos “novos tempos” fora identificado com a expressão “tempos modernos”. No entanto, se para o Ocidente cristão a expressão “novos tempos” remete a uma experiência escatológica do tempo, configurada na espera pelo Juízo Final, o conceito secular de tempos modernos expressa, segundo Habermas, a convicção de um futuro que já se iniciou e que se faz presente, em suma, de uma época orientada para o novo. Com o conceito de modernidade, Hegel teria traduzido filosoficamente uma experiência inédita do tempo entendido como passagem e transição para um novo período. O Zeitgeist (espírito do tempo) hegeliano, expressa justamente esta caracterização do presente “como uma transição que se consome na consciência da aceleração e na experiência da heterogeneidade do futuro” (HABERMAS, 2000, p. 10). Modernidade, portanto, não é uma época, mas o modo de se perceber tempo de uma dada época. . Antes de Nietzsche, Schopenhauer já havia denunciado esta nociva valorização da “atualidade”, característica da modernidade, em detrimento do ideal clássico, o que culminou no abandono do ensino das línguas clássicas e dos escritores clássicos20 20 Segundo Schopenhauer, o cultivo deste estilo da “atualidade” na Alemanha é um indício de barbárie e decadência do gosto cuja causa está relacionada ao abandono do ensino das línguas antigas neste país. O filósofo escreve: “Mas se alguma vez, tal e como ameaça nossa época, se deixem de ensinar as línguas antigas, surgirá uma nova literatura constituída de escritos tão bárbaros, vulgares e indignos como jamais houve” (SCHOPENHAUER, 2009, p. 571). Cada vez mais mutilada e empobrecida, afirma o filósofo, a língua alemã “vai degenerando pouco a pouco em um miserável jargão” (SCHOPENHAUER, 2009, p. 571).O declínio do ensino das línguas antigas também fomenta cada vez mais o mercado das traduções das obras clássicas, o que, para Schopenhauer também é um sintoma da iminente barbárie alemã. Em Parerga e Paralipomena, o filósofo considera a tradução feita em 1830 para o alemão do Corpus Juris (Corpo de lei) como “um sinal inequívoco da ignorância na base de toda erudição que é a língua latina; isto é, um sinal de barbárie” (SCHOPENHAUER, 2009, p. 498-499). As traduções para o alemão de obras antigas, segundo o filósofo, é um péssimo sintoma e, ao chegar a esse extremo, afirma: “então adeus ao humanismo, ao gosto nobre e o sentido elevado! A barbárie volta apesar das ferrovias, da eletricidade e dos dirigíveis” (SCHOPENHAUER, 2009, p. 498-499). .

De maneira peremptória, Schopenhauer acusa os filósofos do idealismo alemão de terem introduzido na Alemanha esta linguagem da “atualidade”, uma linguagem caracterizada pelo estilo afetado e prolixo ao qual ele designou stile empesé21 21 Cf. Schopenhauer, 2009, p. 534-535. . Fichte foi o responsável por iniciá-lo, Schelling por aperfeiçoá-lo e Hegel por levá-lo ao extremo22 22 Cf. Schopenhauer, 2009, p. 529. . Tal influência teria desencadeado um processo de vulgarização da língua alemã e, ao mesmo tempo, um profundo desprezo pelos escritores clássicos alemães em nome de uma linguagem da “atualidade”: “Nobre atualidade”, escreve Schopenhauer, “magníficos epígonos, um gênero que cresceu com o leite materno da filosofia hegeliana”. Por escreverem de modo pesado e confuso, Schopenhauer se refere a estes filósofos como “paquidermes do estilo”. E acrescenta de maneira enérgica: “(...) Fora, paquidermes, fora! Isto é a língua alemã! Nela se expressaram homens, nela cantaram grandes poetas e escreveram grandes pensadores (...)23 23 Nietzsche reproduz literalmente esta última passagem em DS/Co. Ext. I § 12, KSA: 1.227. ” (SCHOPENHAUER, 2009SCHOPENHAUER, A. Parerga y paralipómena II.Trad. Pilar López de Santa María. Madrid: Editorial Trotta, 2009, p. 527., p. 553-554).

Em contraste com esta tendência literária da modernidade, Schopenhauer destaca o engenho, a sabedoria e o rigor com os seus antepassados, os clássicos alemães, trataram a língua alemã. Entretanto, o que ele observa nas novas gerações de escritores é o predomínio de uma tendência radicalmente oposta, a de degeneração da língua alemã. O filósofo escreve: “Mas a eles (os clássicos alemães) seguem em nossos dias uma geração de rascunhadores rudes, ignorantes e incapazes que, com suas forças e união, fazem negócio destruindo aquela antiga obra de arte com a dilapidação das palavras” (SCHOPENHAUER, 2009SCHOPENHAUER, A. Parerga y paralipómena II.Trad. Pilar López de Santa María. Madrid: Editorial Trotta, 2009, p. 527., p. 553). Unidos em nome da fama e do dinheiro, os escritores alemães da “atualidade” mantêm-se cúmplices do grosseiro anseio popular por uma linguagem do “tempo atual”(Jetztzeit). Segundo Schopenhauer: “uma grande quantidade de escritores vive exclusivamente da extravagância do público de não querer ler nada além do que se imprime hoje: os jornalistas (Journalisten)” (SCHOPENHAUER, 2009SCHOPENHAUER, A. Parerga y paralipómena II.Trad. Pilar López de Santa María. Madrid: Editorial Trotta, 2009, p. 527., p. 514)24 24 No entanto, a despeito do alto apreço do público em relação à linguagem do “tempo atual”, Schopenhauer afirma: “não existe maior erro que crer que a última palavra pronunciada é sempre a mais correta, que todo escrito com posteridade é uma melhora do que se escreveu antes, e que toda transformação é um progresso” (SCHOPENHAUER, 2009, p. 515). Ademais, para o autor de O mundo como vontade e representação, “o novo raramente é o bom; porque o bom é o novo só por um breve tempo”(SCHOPENHAUER, 2009, p. 517). Nesta perspectiva, o que torna latente a diferença entre a grande literatura, como a dos clássicos alemães, da literatura vulgar dos alemães da “atualidade” é, sobretudo, o seu poder de permanência no tempo, o que exige, por conseguinte, uma outra percepção do tempo. .

Superando a tendência à modernidade de sua época, foi por meio do estudo atento dos clássicos, cujo procedimento poético visa à transfiguração da realidade em um estilo artístico ideal e objetivo, que Goethe se tornou um clássico e eternizou a sua poesia, procedimento oposto ao dos escritores da “atualidade”, cujo estilo subjetivo visa a expressar a fugacidade do “tempo atual”. Alinhado ao classicismo de Goethe, Schopenhauer considera a subjetividade no estilo um defeito nativo da Alemanha moderna:

A subjetividade é um defeito estilístico que hoje em dia se faz cada vez mais frequente devido ao estado decadente da literatura e ao abandono das línguas antigas, mas que somente é nativo da Alemanha. Consiste em que ao escritor lhe basta saber ele mesmo o que opina e quer dizer; o leitor já verá como averiguá-lo (SCHOPENHAUER, 2009SCHOPENHAUER, A. Parerga y paralipómena II.Trad. Pilar López de Santa María. Madrid: Editorial Trotta, 2009, p. 527., p. 517).

Para Schopenhauer, escrever subjetivamente é como criar um monólogo quando, na verdade, o dever do escritor é estabelecer um diálogo o mais claro e objetivo possível com o leitor. Dessa maneira, deve-se evitar a prolixidade na escrita e, para tanto: “o estilo não deve ser subjetivo, mas objetivo; para isso é necessário colocar as palavras de modo que obriguem diretamente o leitor a pensar exatamente o mesmo que o autor pensou” (SCHOPENHAUER, 2009SCHOPENHAUER, A. Parerga y paralipómena II.Trad. Pilar López de Santa María. Madrid: Editorial Trotta, 2009, p. 527., p. 517).

Na esteira da crítica schopenhaueriana da linguagem e da literatura, Nietzsche considera que a ausência de uma unidade estilística na Alemanha decorre, sobretudo, do fato de que o alemão moderno já não tem apreço e não cultiva a língua alemã falada, o que compromete a instituição de um estilo alemão e, por conseguinte, de uma cultura alemã. Em sua Primeira Extemporânea, Nietzsche escreve:

Falta aqui um terreno natural, o apreço, o manejo e o cultivo artístico da linguagem falada. Posto que isto, como os próprios termos “conversa de salão”, “sermão”, “discurso parlamentário” expressam, não constituiu todavia um estilo nacional em todas as manifestações públicas, e, ademais, nem sequer se chegou a sentir a necessidade de que haja um estilo [...] (DS/Co. Ext. I § 11, KSA 1.220).

Quando negligencia o caráter objetivo da língua, indiferente aos seus aspectos formais e normativos, cada indivíduo, autonomamente, regula o seu modo de falar de acordo com suas necessidades. A falta de rigor e os maneirismos linguísticos são indícios do pouco apreço que o alemão tem por sua língua materna, bem como do seu descompromisso com a busca de um estilo artístico autenticamente alemão. Como Schopenhauer, Nietzsche associará essa autonomia no modo de falar do alemão com a dilapidação da linguagem na literatura alemã moderna. O filósofo escreve:

[...] e posto que todos aqueles que falam na Alemanha não foram além de alguns ingênuos experimentos com a língua, o caso é que o escritor não tem nenhuma norma unitária e sim certo direito de lutar por sua conta com a língua: e daí provém, como consequência, a dilapidação sem limites da língua alemã do “tempo atual” [deutschen Sprache derJetztzeit], que Schopenhauer descreveu de maneira mais enérgica (DS/Co. Ext. I § 11, KSA 1.220).

Ao principiar na dilapidação sem limites da língua, os defensores da linguagem alemã do “tempo atual” se apresentam em oposição radical à tradição, em particular ao estilo dos grandes escritores da língua alemã, como Lessing, Winckelmann, Goethe, Schiller, aos quais Nietzsche se refere como os “nossos clássicos” (unsere Klassiker). Quando se refere a Schopenhauer, o jovem filósofo escreve: “Se isto segue assim - disse em certa ocasião (Schopenhauer) -, no ano de 1900 já não se entenderá bem os clássicos alemães (deutschen Klassiker), posto que a única língua alemã que se conhecerá será o jargão miserável do nobre ‘tempo atual’ (Jetztzeit)” (DS/Co. Ext. I §11, KSA 1.220). Segundo Nietzsche, a opinião desses novos “árbitros da língua e da gramática alemãs” do “tempo atual” é a de que o estilo desses escritores é ultrapassado e, por isso, não pode servir de parâmetro para os escritores atuais. Ao seguir esta sugestão, afirma Nietzsche: “os nossos clássicos não podem seguir sendo modelo de nosso estilo (unseren Stil), porque empregam uma grande quantidade de termos, expressões e construções sintáticas que nós já perdemos” (DS/Co. Ext. I § 11, KSA 1.220). Assim, Schiller, os clássicos alemães constituem-se como imprescindíveis, uma vez que a superação da moderna condição alemã, a condição de barbárie, deve passar necessariamente por uma educação clássica. Em Sobre o futuro de nossas instituições de formação, Nietzsche escreve:

Uma vez mais necessitamos desses mesmos guias, esses mesmos mestres, nossos clássicos alemães, para que o bater das asas de suas aspirações até a antiguidade leve também a nós... até a terra da nostalgia, a Grécia. Dessa relação - a única possível entre nossos clássicos e a educação clássica, não se vislumbra nada entre os velhos muros das escolas de bacharelado (BA/EE § 2, KSA 1.672)

Contra as tendências modernas de formação, Nietzsche sugere uma pedagogia clássica pautada no estudo meticuloso da língua materna a partir dos escritos dos clássicos alemães. Uma proposta de ousada de reconstrução dos meios educacionais na Alemanha que, naquele momento, se encontrava sob a influência do filisteu da formação e das tendências modernas.

As instituições de formação alemãs

No centro da crítica nietzschiana às instituições de formação alemãs de sua época está o problema da linguagem. Na avaliação de Nietzsche, as escolas de bacharelado alemãs deixaram de se comprometer com a formação do homem quando deixou de lado a rígida disciplina linguística passando a desvalorizar e desfigurar a língua alemã. Para o filósofo, o aprendizado profundo da língua materna é uma condição, ou melhor, um “dever sagrado” para todo aquele que almeja ao ensino superior. Em tom de exortação, Nietzsche escreve: “Levar a sério vossa língua! Quem não consegue sentir nisso um dever sagrado, não terá em si nem sequer o gérmen para uma educação superior” (BA/EE § 2, KSA 1.672). A maneira como a língua materna é tratada por um povo, afirma Nietzsche, diz muito acerca do seu apreço pela arte, bem como de sua aptidão para perseguir a cultura: “Se não chegais a tanto como a sentir asco ante certas palavras e certas distorções linguísticas de nosso condicionamento jornalístico então podeis deixar já de perseguir a cultura” (BA/EE § 2, KSA 1.672).

Sendo o meio para realizar a verdadeira formação do homem, a valorização da língua materna é também um elemento fundamental para a constituição de uma autêntica cultura. Nietzsche atribui ao professor de alemão, no bacharelado, a incumbência de chamar a atenção dos alunos sobre as distorções linguísticas atuais em que os proíbe de utilizar, em seu vocabulário, tais distorções. Por outro lado, afirma Nietzsche, o mesmo professor deveria se utilizar dos autores clássicos alemães, percorrendo “linha a linha com quanto cuidado e rigor há que tomar as expressões quando no coração se tem o sentimento artístico correto e diante dos olhos a completa compreensibilidade de tudo o que escreve”(BA/EE § 2, KSA 1.672). Segundo Nietzsche, este ensino rigoroso e exaustivo da língua alemã é um modo de separar os alunos mais bem dotados e aptos para o ensino superior, dos menos dotados, que desistirão no meio do caminho. Porém, não é este o método que Nietzsche vê aplicado nas escolas de bacharelado alemãs. Nelas, o ensino rigoroso da língua materna, antes baseado nos escritores clássicos, fora substituído pelas características repugnantes da estética jornalística: “Na escola de bacharelado se imprimem as repugnantes características de nossa estética jornalística sobre os espíritos não formados dos adolescentes” (BA/EE § 2, KSA 1.672).

Para o filósofo alemão, a tendência jornalística, ao prescindir dos ensinamentos dos grandes clássicos alemães, como Goethe, Schiller, Winckelmann e Lessing, se desviou da única via que conduz à autêntica formação clássica, a saber, a antiguidade, pois “toda a assim chamada educação clássica só tem um ponto de partida são e natural: o hábito artisticamente sério e rigoroso no uso da língua materna” (BA/EE § 2, KSA 1.672). Nesta tarefa de formação, os clássicos são imprescindíveis, pois são como guias e mestres que conduzirão o aluno à verdadeira formação e à cultura. Não obstante, nas instituições de formação tanto a língua alemã quanto os autores clássicos são banalizados pelos próprios professores, filisteus da formação. Para Nietzsche, estes são os responsáveis por disseminar um “grosseiro querer-mal-interpretar (Mißverstehen-wollen)” dos clássicos alemães” (BA/EE § 2, KSA 1.672), pois afirmam efetuar uma crítica estética quando o que fazem não é outra coisa senão uma “descarada barbárie” (BA/EE § 2, KSA 1.672).

O problema deste tipo de abordagem dos clássicos alemães não é apenas a banalização de suas obras e da própria língua materna, mas o falso sentimento de autonomia e autossuficiência que é produzido no aluno. Em disciplinas como “composição em alemão”, incita-se a personalidade do aluno, ou seja, sua própria individualidade. Nietzsche escreve: “A composição em alemão é uma chamada ao indivíduo” (BA/EE § 2, KSA 1.672). Ora, para Nietzsche, incitar a personalidade e originalidade do aluno na escrita é cometer um afrontamento diante da sagrada língua materna, e, neste sentido, é cometer “um pecado contra o espírito”. (BA/EE § 2, KSA 1.672). Para Nietzsche, a originalidade e a personalidade são atributos que poucos homens maduros conseguem ter, portanto, incitar um adolescente a ter personalidade é um grande equívoco da educação alemã de sua época. Ao se considerar que um adolescente é capaz de compor um texto literário original e com personalidade, as instituições de formação também considera que este adolescente tem o direito de emitir opiniões e juízos próprios sobre os assuntos e as pessoas mais sérias. Assim, Nietzsche entende que tais instituições cometem um equívoco ao ensinar a autonomia quando deveria se ensinar a obediência. O filósofo alemão escreve:

[...] um ensino de verdade deveria reprimir com todos seus esforços as ridículas pretensões de uma autonomia de juízo e habituar o jovem a uma obediência estrita sob o cetro do gênio. Se está pressupondo a capacidade de representar o grande a uma idade em que qualquer frase, falada ou escrita, constitui um barbarismo (BA/EE § 2, KSA 1.672).

Segundo Nietzsche, ao fomentar este tipo de formação as instituições de educação alemãs engendram uma situação perigosa para o futuro. Nietzsche enumera os males que o culto da personalidade e a autonomia de juízo na formação escolar geraram no ambiente literário e artístico alemão de sua época, quais sejam: a produção apressada e vaidosa, a completa falta de estilo, a ausência de caráter e refinamento na expressão, a perda de todo cânon estético, e, por fim, o prazer na anarquia e no caos. Estes são, em resumo, os traços literários do que Nietzsche chama de jornalismo estético, ou, numa palavra, da condição bárbara da Alemanha de seu tempo. As instituições de formação alemãs, na acepção nietzschiana, ainda não possuem condições de implantar uma rigorosa e verdadeira formação, a que, segundo o filósofo, consiste, antes de tudo, na obediência e no hábito, especialmente no que se refere ao cultivo da língua materna.

O ensino da língua materna é uma chave de acesso ao espírito do povo e, sendo assim, fazer concessão à modismos linguístico e estilísticos estrangeiros significa, na perspectiva de Nietzsche, assentir à barbárie, o inimigo mais perigoso do espírito de um povo. Conservar a língua alemã, neste sentido, é conservar a própria cultura e o espírito alemão, mas o que se promove nas instituições de formação alemãs não é o cultivo da língua materna, mas o seu extermínio. Ao fomentar a extirpação da língua alemã, as instituições contribuem para o desaparecimento do próprio espírito alemão. Num póstumo de 1873, o filósofo escreve: “O alemão será logo um mosaico de palavras sem alma e com uma sintaxe europeia. Perdemos cada vez mais a linguagem e deveríamos saber que valor tem para nós - o alemão! Conseguimos um império alemão, no momento em que estamos a ponto de deixar de sermos alemães” (Nachlass/FP 1873, 27 [24], KSA 7.593). Próximo do pensamento de Burckhardt25 25 Sobre a influência de Burckhardt no pensamento de Nietzsche ver: ANDLER, Charles. Nietzsche, sa vie et sa pensée; GONTIER, Thierry. Nietzsche, Burckhardt et la ‘question’ de la Renaissance.Noesis, Paris, nº 10, p. 49 - 71, 2006; LARGE, Duncan. Nosso maior mestre: Nietzsche, Burckhardt e o conceito de cultura. Cadernos Nietzsche. São Paulo, n..9, p. 3-39, 2000. CHAVES, Ernani. Cultura e política: o jovem Nietzsche e Jacob Burckhardt. Cadernos Nietzsche. São Paulo, n.9, p. 41-66, 2000. , Nietzsche entende a linguagem como a expressão mais direta e ideal do espírito de um povo e, se assim for, ao dilapidar a língua alemã o alemão aniquila aquilo que faz dele o que ele é: o espírito alemão. Nietzsche escreve:

Pois quem pecou contra a língua alemã profanou o mysterium de nossa germanidade: é somente ela que através de toda a mescla e as modificações das nacionalidades e dos costumes, como por milagre metafísico, se salvou a si mesma e desse modo salvou também o espírito alemão. É somente ela que garante ademais esse espírito para o futuro, sempre que não pereça ela mesma nas mãos perversas do “presente” (DS/Co Ext. I § 12, KSA 1. 227).

Como produto da intuição humana, a língua de um povo guarda um potencial artístico e inconsciente que é ativado e ampliado pela atividade do escritor, assim, ao dilapidar a língua alemã o alemão aniquila aquilo que o faz propriamente alemão. Ao pensar a língua como o fundamento do espírito de um povo, Nietzsche não pode deixar de entender o texto filosófico sob a perspectiva da formação e da cultura, o que exige do filósofo alemão pensar uma concepção de estilo na filosofia que seja capaz de superar a barbárie e constituir a cultura. Contra o predomínio e a influência deste modelo de linguagem do “tempo atual” que predominou na Alemanha de seu tempo sobretudo a partir da filosofia do idealismo alemão, mas também contra o modelo de educação propagado pelas instituições de ensino alemãs, Nietzsche encontra no classicismo estilístico e na filosofia de Schopenhauer o caminho para a educação e superação da barbárie de seu tempo.

Schopenhauer: estilista e educador

Para o jovem Nietzsche, Schopenhauer é uma exceção entre os escritores alemães26 26 Um filósofo cometa, cf. PHG/FT §2, KSA 1.809. de seu tempo. A linguagem simples e substancial em que transcreve o seu sóbrio pessimismo são aspectos que fazem da sua filosofia da vontade um evento sem paralelo na cena filosófica da Alemanha de sua época. Nesse ambiente cultural, em que a utilização arbitrária da língua alemã pelos escritores modernos desencadeia um processo de fragmentação da linguagem e caos estilístico27 27 Cf. DS/CO ext.I § 1, KSA 1.159. , Nietzsche encontra na escrita schopenhaueriana a simplicidade de estilo que própria do gênio28 28 Cf. DS/CO ext.I § 10, KSA 1.216. .

Com efeito, o estilo é um fator determinante na avaliação que o jovem Nietzsche faz acerca do filósofo de seu tempo e, de modo particular, de Schopenhauer. Primeiramente, é um critério segundo o qual o autor de O nascimento da tragédia opõe o mestre pessimista aos seus pares: “há nele estilo: enquanto a maioria dos filósofos não o tem [...]”(Nachlass/FP 1868 - 1869, 75[20], KWGI. 5. 241). E ainda: “É sumamente notável o fato de que Schopenhauer escreva de uma maneira bela! Também sua vida tem mais estilo que a dos docentes universitários - mas os ambientes em que ele se move são ambientes raquíticos! (Nachlass/FP 1872 - 1874, 19[22], KSA 7.423).

Ora, o que Nietzsche acha notável, em primeiro lugar, é o fato de Schopenhauer escrever com estilo, isto é, de uma “maneira bela”. Portanto, sua escrita não está a serviço da verdade, mas da beleza, ou seja, o seu propósito não é realizar o esclarecimento, mas provocar um efeito estético no leitor. Notável também é o fato de que a vida de Schopenhauer também tenha mais estilo do que a dos seus pares. Ainda no ímpeto de distinguir Schopenhauer dos filósofos de seu tempo, Nietzsche afirma: “no que diz respeito à Kant, é ingênuo (naïf) e clássico (klassisch)” (Nachlass/FP 1868 - 1869, 75[20], KWGI. 5. 241), é “o filósofo de uma reanimada classicidade, de uma grecidade alemã” (Nachlass/FP 1868 - 1869, 75[20], KWGI. 5. 241).

Mais do que um cânone estético da antiguidade, clássico, para Nietzsche, tem a ver com a ideia de compor uma totalidade29 29 Em sua Primeira Extemporâneas, Nietzsche tende a identificar o escritor clássico (klassischer Schriftsteller) a partir desta capacidade para compor um todo. Questionando a possibilidade de David Strauss ser um escritor clássico ou não, o filósofo escreve: “Assim, pois, o que nós perguntamos é se Strauss tem a força artística para traçar um todo, um totum ponere” (Cf. DS/Co. Ext. I § 9, KSA 1.208). . Um escritor clássico, portanto, é aquele cuja potência artística é capaz de criar uma obra enquanto um todo coeso para o qual é necessário ser simples e ingênuo. Como artista ingênuo30 30 O conceito de ingênuo (naïf) é tomado por Nietzsche do ensaio Poesia ingênua e sentimental de Schiller. O conceito de ingênuo, para Schiller, está relacionado com a sua ideia de natureza. Tomando a arte poética como exemplo, uma poesia será ingênua se não guardar traços de sua técnica de execução, parecendo ter sido gerada pela natureza e não pelo homem. Contudo, é preciso demarcar esta aproximação bem como a distância entre a utilização deste conceito pelos dois autores. Sobre o conceito de ingênuo em Schiller, Cf. SCHILLER, F. Poesia ingênua e sentimental. Trad. Márcio Suzuki. São Paulo: Iluminuras, 1991. , deve ordenar o caos dos elementos linguísticos e rítmicos ao impor à obra uma unidade de estilo artístico. Simplicidade de estilo (Simplicität des Stil) e ingenuidade são as principais características do escritor clássico, bem como os indícios de sua genialidade, haja vista que o gênio é o único capaz de se expressar de maneira simples, natural e ingênua31 31 Cf. DS/Co. Ext. I §10, KSA 1.216. .

Com efeito, Schopenhauer é, para o jovem Nietzsche, o gênio ingênuo de seu tempo. Na sua escrita, afirma Nietzsche “se pode reconhecer com frequência onde estabelece um novo começo, onde adquire um genial impulso” (Nachlass/FP 1868 - 1869, 75[20], KWGI. 5. 241). A ingenuidade e a simplicidade de estilo do autor de O mundo como vontade e representação está relacionada com a sua capacidade de engendrar sempre um novo começo, um novo mundo, uma nova criação artística. Sobre este impulso criador, Nietzsche escreve: “também os juízos de Schopenhauer tem uma originalidade clássica: grande parte do patrimônio universal, já deteriorado e esmagado, reaparece nele como uma nova criação. Tem obtido brilho de moedas depreciadas e revelado seu áureo esplendor” (Nachlass/FP 1868 - 1869, 75[20], KWGI. 5. 241).

O poder edificador ou formador de um filósofo, portanto, encontra-se diretamente relacionado à dimensão estética de sua escrita, que é o resultado imediato da sua ingenuidade e classicidade, isto é, da simplicidade de seu estilo e da força para criar uma plenitude a partir do caos um mundo. É pela sua simplicidade de estilo que Schopenhauer se distingue de todos os seus pares; um clássico entre os modernos; um estilo que se faz belo e saudável num ambiente cultural absolutamente degenerado. Sua escrita é a escrita extemporânea e a sua verdade é a verdade eterna do gênio que deve ser conduzida à posteridade e eternizada pela humanidade. Nesta acepção, Nietzsche escreve:

Schopenhauer é o filósofo de uma Alemanha regenerada; por isso estava tão acima de seu tempo, tempo que agora começa a se aproximar. É mais sóbrio que sua época e, ao mesmo tempo, mais são, ainda que também mais belo e ideal, sobretudo mais verdadeiro (Nachlass/FP 1868 - 1869, 75[20], KWGI. 5. 241).

Ser sóbrio, sadio e belo são os indícios da saúde e do caráter, qualidades que se traduzem num estilo simples e coeso, numa palavra, “clássico”. Em outros termos, o estilo de Schopenhauer se revela como uma expressão de sua potência e como força de seu caráter, de onde deriva a sua capacidade para impor a medida e a proporção ao caos. Deste modo, a grandiosidade de um sistema filosófico é sempre derivada do caráter grande (grossen Character) do gênio, pois, se a escrita tem unidade de estilo é porque na vida ele também o tem. Dessa forma, o potencial formador da linguagem não emana do desenvolvimento lógico dos argumentos, mas do contato afetivo com o caráter que está configurado no estilo e na linguagem. Em um póstumo intitulado Sobre a linguagem e o estilo de Schopenhauer, Nietzsche escreve:

Aquela força vigorosa e viril, e sua linguagem que alcança a profunda intuição artística até a altura solar da mística, com a qual nosso filósofo “atual” [philosophischer „Gegenwärtiger“] busca designá-las mediante o termo depreciável de “elegância”. Ah, estes “elegantes”! Falta-lhes completamente esse pathos moral [sittliche Pathos] e esse tom uniformemente elevado. (Nachlass/FP 1869 - 1872, 7[159], KSA 7.200).

Ao buscar a eterna grandeza e a profunda intuição artística, a força e a virilidade do estilo de Schopenhauer se opõem radicalmente à “elegância” do filósofo “atual”. Seu tom uniformemente elevado revela o pathos moral e o caráter legislador de sua filosofia que busca no grande e no nobre a elevação do homem. É neste sentido que Nietzsche o tomará como educador.

Não obstante, como afirmamos de início, da perspectiva nietzschiana o ato de educar não tem a ver com doutrinar ou instruir o indivíduo, mas em libertá-lo para que ele encontre o seu próprio caminho, o único que o levará a si mesmo e a sua plena formação. Para Nietzsche, a filosofia de Schopenhauer se revelou desde cedo como sendo um caminho para a sua própria formação. Foi no contato com essa filosofia que o filósofo afirma ter tido, pela primeira vez, o pressentimento de ter encontrado este filósofo educador32 32 Cf. SE/Co. Ext. III § 2, KSA 1.341. , mais foi sobretudo na naturalidade do estilo de Schopenhauer que Nietzsche constatou a honestidade, a serenidade e a constância do seu caráter exemplar, bem como o poder educador de sua filosofia:

Eu não descrevo outra coisa que a primeira impressão de certo modo fisiológica que Schopenhauer produziu em mim, essa mágica difusão da força íntima de uma criatura da natureza sobre outra que acontece com o primeiro e mais leve dos contatos; e se agora analiso retrospectivamente essa impressão, a encontro composta em três elementos, da impressão de sua honestidade, da sua serenidade e da sua constância. Schopenhauer é honesto porque fala a si mesmo e porque escreve para si mesmo, é sereno, porque mediante o pensamento venceu o mais difícil, e é constante, porque tem a obrigação de ser assim (Cf. SE/Co. Ext. III § 2, KSA 1.337).

Como expressão de seu caráter simples e ingênuo, o estilo de Schopenhauer se revela como o princípio educador de sua filosofia a partir do qual o seu leitor formará a si próprio como uma totalidade. Assim, se a meta da filosofia, para o jovem Nietzsche, não deve ser o puro conhecimento científico, mas a plena formação do homem para a cultura, tampouco o lugar do filósofo deve ser o do erudito, mas sim o do educador.

Considerações finais

Neste texto, procurei apresentar em que medida, para Nietzsche, a tarefa do filósofo deve se afastar dos ideais modernos da erudição teórica e da instrução para assumir os objetivos da educação e da formação do homem. Entretanto, o que o jovem filólogo constata na Alemanha de seu tempo é exatamente o oposto disso, ou seja, o predomínio de uma pseudo-formação filistéia que, ao fomentar a barbárie, interdita o advento de uma autêntica cultura. Vimos que, ao propor a sua concepção de cultura como unidade de estilo artístico em todas as manifestações da vida de um povo, Nietzsche estabelece um nexo entre as noções de estilo e cultura passando a avaliar a Alemanha de seu tempo a partir do critério da unidade estilística. Assim, constatou-se que as críticas que o jovem Nietzsche dirige aos filisteus da formação, bem como às instituições de formação alemãs encontram aporte na relação estabelecida entre os conceitos de estilo, cultura e formação. Observou-se também que, no que se refere às instituições de formação, o incentivo à autonomia dado aos jovens alunos e futuros escritores é o que faz com que a barbárie, isto é, a confusão caótica de todos os estilos comprometa o presente e o futuro da literatura alemã, o que, para Nietzsche, consiste num perigo para a língua alemã e, por conseguinte, para a cultura alemã. Contra esta pseudo-formação de filisteu, Nietzsche apresenta a proposta de uma formação clássica, uma pedagogia de caráter estético e exemplar que consiste num rigoroso estudo da língua alemã a partir do estilo simples e ingênuo dos autênticos clássicos alemães. Tendo em vista o pressuposto de que a meta da filosofia é a formação do homem e, ao entender que esta formação tem um caráter intuitivo e não teórico, procurou-se apresentar a ideia de que o estilo, para Nietzsche, consiste num instrumento fundamental para que a filosofia realize a sua meta: a formação. Não qualquer estilo, mas o estilo simples e natural produzido pelo gênio ingênuo e cuja expressão maior o jovem filósofo encontra no classicismo extemporâneo de Schopenhauer, seu educador por excelência.

Referências

  • GENTILE, C. Os gregos aprenderam aos poucos a organizar o caos: os conceitos de estilo e cultura na Segunda consideração extemporânea de F. Nietzsche. Cadernos Nietzsche São Paulo, n.º 27, p. 51-71, 2010.
  • HABERMAS, J. O discurso filosófico da modernidade Trad. Luiz Sérgio Repa e Rodnei Nascimento. São Paulo: Martins Fontes, 2000.
  • NIETZSCHE, F. W. Sämtliche Werke. Kritische Studienausgabe Hg. G. Colli e M. Montinari. Berlin: Walter de Gruyter, 1980, 15v.
  • NIETZSCHE, F. W. Obras completas V.1: escritos de juventude. Trad. Joan. B. Llinares, Diogo Sánchez Meca e Luis E. de Santiago Guervós. Madrid: Techos, 2011.
  • NIETZSCHE, F. W. Fragmentos Póstumos (1869 - 1874). V. 1Trad. Luis E. de Santiago Guervós. Madrid: Techos , 2007.
  • NIETZSCHE, F. W. O nascimento da tragédia Trad. J. Guinsburg. São Paulo: Companhia das Letras, 1992.
  • NIETZSCHE, F. W. Ecce Homo In: Basic Writings of Nietzsche Trans. Walter Kaufmann, New York: The Modern Library, 1992
  • SCHILLER, F. Poesia ingênua e sentimental Trad. Márcio Suzuki. São Paulo: Iluminuras, 1991.
  • SCHOPENHAUER, A. Parerga y paralipómena IITrad. Pilar López de Santa María. Madrid: Editorial Trotta, 2009, p. 527.
  • TORRES, Rubens R. Ensaios de filosofia ilustrada São Paulo: Editora Brasiliense, 1987.
  • TRINGALI, D. A arte poética de Horácio São Paulo: Musa Editora, 1993.
  • WOTLING, P. Nietzsche e o problema da civilização Trad. Vinícius de Andrade. São Paulo: Editora Barcarolla, 2013.
  • 1
    Sobre a concepção nietzschiana de estilo nas obras tardias, Cf. NEHAMAS, A. Nietzsche: life as literature. Cambridge/Massachusetts: Harvard University Press, 1985; ITAPARICA, André. Nietzsche: estilo e moral. São Paulo: Discurso Editorial, 2002.
  • 2
    Utilizaremos a palavra “ilustração” como correspondente em nosso vernáculo para o termo alemão Aufkärung. Sobre o conceito de Aufkärung, seguimos a interpretação de Rubens Rodrigues Torres Filho em que escreve: “Luzes (Século das): com essa metáfora de claridade (Lumières, Iluminismo, Enlightenment, Ilustración, Aufklärung), o pensamento europeu do século XVIII formou sua auto-imagem, caracterizada pela confiança no poder da luz natural, da razão, contra todas as formas de obscurantismo (TORRES FILHO, 1987TORRES, Rubens R. Ensaios de filosofia ilustrada. São Paulo: Editora Brasiliense, 1987., p. 84).
  • 3
    No sentido aqui empregado, os conceitos nietzschianos de formação (Bildung) e de educação (Erziehung) se encontram particularmente imbricados. Enquanto o termo Erziehung alude a um processo pedagógico ao qual uma pessoa ou grupo se submete a outro seguindo o aspecto normativo de um modelo determinado, a Bildung diz respeito ao processo de autoformação do indivíduo. Neste sentido, Erziehung e Bildungsão termos convergentes na medida em que a autoformação indicada pela Bildung requer um modelo a ser fornecidopela Erziehung.
  • 4
    Cf. SE/Co. Ext. III § 4, KSA 1.363.
  • 5
    Cf. SE/Co. Ext. III § 2, KSA 1.341.
  • 6
    A noção de totum ponere é proveniente da estética clássica, particularmente das artes poética e retórica. Nesta acepção, a realização do belo na obra de arte depende da capacidade do artista em criar uma totalidade, uma obra de arte em que as partes estejam ordenadas de modo a compor um todo harmônico. O ideal clássico do totum ponere influenciará de maneira decisiva a crítica nietzschiana aos escritores alemães de sua época e, de modo particular,ao teólogo e escritor David Strauss em sua Primeira consideração extemporânea. Sobre a noção de belo no classicismo antigo, Cf. Tringali, 1993TRINGALI, D. A arte poética de Horácio. São Paulo: Musa Editora, 1993., p. 540.
  • 7
    Neste sentido, concordamos com a posição de Wotling quando este escreve: “a Cultur não é Bildung. Mas os dois conceitos não se opõem simplesmente como uma determinação individual e subjetiva a uma determinação coletiva, embora a Bildung remeta sobretudo à formação intelectual de um indivíduo particular, e a Cultur se aplique, geralmente, em compensação, a um povo ou a um grupo humano relativamente grande. O caráter relativamente secundário dessa oposição se mostra particularmente, quando se considera o exemplo de Goethe, celebrado por Nietzsche não pela qualidade de sua Bildung, mas, ao contrário, porque ele encarna, enquanto indivíduo singular, a Cultur” (WOTLING, 2013WOTLING, P. Nietzsche e o problema da civilização. Trad. Vinícius de Andrade. São Paulo: Editora Barcarolla, 2013., p. 55).
  • 8
    Cf. DS/Co. Ext. I § 1, KSA 1.159.
  • 9
    Sobre esta relação de interdependência entre os conceitos de Kultur e Stil, Cf. GENTILE, 2010GENTILE, C. Os gregos aprenderam aos poucos a organizar o caos: os conceitos de estilo e cultura na Segunda consideração extemporânea de F. Nietzsche. Cadernos Nietzsche. São Paulo, n.º 27, p. 51-71, 2010., p. 56.
  • 10
    Cf. DS/Co. Ext. I § 1, KSA 1.159.
  • 11
    Cf. DS/Co. Ext. I § 1, KSA 1.159.
  • 12
    Cf. DS/Co. Ext. I § 2, KSA 1.164
  • 13
    Por utilizarmos “formação” como correspondente em nosso vernáculo ao termo alemão Bildung, justificamos nossa opção pela expressão “filisteus da formação” para traduzir o termo nietzschiano Bildungsphilister. Em textos posteriores, Nietzsche tecerá algumas considerações acerca da origem e do uso deste termo. Em Ecce homo, num capítulo designado à primeira extemporânea, o filósofo escreve: “a palavra Bildungsphilister ficou na linguagem a partir do meu escrito” (EH/EH As extemporâneas § 2, KSA 6. 317). No conhecido prólogo de 1886 à Humano, demasiado humano II, o filósofo escreve: “reivindico a paternidade da expressão Bildungsphilisterque se usa e abusa atualmente” (HHII, prólogo, KSA 2.370). Em nota à tradução de Ecce homo para o idioma inglês, Walter Kaufmann afirma que a palavra Bildungsphilister teria sido já utilizada anteriormente por Gustav Teichmüller (1832 - 1888), no entanto, na opinião do pesquisador americano, a reivindicação nietzschiana é legítima pois, segundo Kaufmann, Nietzsche não diria tudo isso caso se recordasse de que a cunhagem do termo é de Teichmüller (Cf. Nietzsche, F. Ecce homo. Trad. Walter Kaufmann, New York: The Modern Library, 1992).
  • 14
    Cf. DS/Co. Ext. I § 2, KSA 1.164.
  • 15
    Heinrich Julian Schmidt (1818-1886) foi um escritor, jornalista, crítico e historiador da literatura prussiano. Em Leipzig, Junto com Gustav Freytag, outro jornalista atacado por Nietzsche, Schmidt editou periódico Die Grenzbotende 1848 a 1861. Neste ano, se mudou para Berlim onde trabalhou como editor chefe doBerliner allgemeine Zeitung, um dos jornais mais influentes da Alemanha deste período.
  • 16
    Cf. DS/Co. Ext. I § 2, KSA 1.164.
  • 17
    Dentre os trajes utilizados pelas cortezãs de Atenas, o mais conhecido é a coa, que recebe esse nome da ilha grega de Coos.
  • 18
    Cf. GT/NT §11.
  • 19
    Acompanhamos aqui a interpretação de Habermas (2000HABERMAS, J. O discurso filosófico da modernidade. Trad. Luiz Sérgio Repa e Rodnei Nascimento. São Paulo: Martins Fontes, 2000., p. 09) acerca do conceito de modernidade. Para o filósofo de Frankfurt, Hegel foi o primeiro filósofo a desenvolver um conceito claro de modernidade, isto é, a elevar o termo modernidade a um estatuto conceitual. Segundo ele, a utilização hegeliana desse conceito teria ocorrido num contexto sobretudo histórico, no qual o irromper dos “novos tempos” fora identificado com a expressão “tempos modernos”. No entanto, se para o Ocidente cristão a expressão “novos tempos” remete a uma experiência escatológica do tempo, configurada na espera pelo Juízo Final, o conceito secular de tempos modernos expressa, segundo Habermas, a convicção de um futuro que já se iniciou e que se faz presente, em suma, de uma época orientada para o novo. Com o conceito de modernidade, Hegel teria traduzido filosoficamente uma experiência inédita do tempo entendido como passagem e transição para um novo período. O Zeitgeist (espírito do tempo) hegeliano, expressa justamente esta caracterização do presente “como uma transição que se consome na consciência da aceleração e na experiência da heterogeneidade do futuro” (HABERMAS, 2000HABERMAS, J. O discurso filosófico da modernidade. Trad. Luiz Sérgio Repa e Rodnei Nascimento. São Paulo: Martins Fontes, 2000., p. 10). Modernidade, portanto, não é uma época, mas o modo de se perceber tempo de uma dada época.
  • 20
    Segundo Schopenhauer, o cultivo deste estilo da “atualidade” na Alemanha é um indício de barbárie e decadência do gosto cuja causa está relacionada ao abandono do ensino das línguas antigas neste país. O filósofo escreve: “Mas se alguma vez, tal e como ameaça nossa época, se deixem de ensinar as línguas antigas, surgirá uma nova literatura constituída de escritos tão bárbaros, vulgares e indignos como jamais houve” (SCHOPENHAUER, 2009, p. 571). Cada vez mais mutilada e empobrecida, afirma o filósofo, a língua alemã “vai degenerando pouco a pouco em um miserável jargão” (SCHOPENHAUER, 2009, p. 571).O declínio do ensino das línguas antigas também fomenta cada vez mais o mercado das traduções das obras clássicas, o que, para Schopenhauer também é um sintoma da iminente barbárie alemã. Em Parerga e Paralipomena, o filósofo considera a tradução feita em 1830 para o alemão do Corpus Juris (Corpo de lei) como “um sinal inequívoco da ignorância na base de toda erudição que é a língua latina; isto é, um sinal de barbárie” (SCHOPENHAUER, 2009, p. 498-499). As traduções para o alemão de obras antigas, segundo o filósofo, é um péssimo sintoma e, ao chegar a esse extremo, afirma: “então adeus ao humanismo, ao gosto nobre e o sentido elevado! A barbárie volta apesar das ferrovias, da eletricidade e dos dirigíveis” (SCHOPENHAUER, 2009, p. 498-499).
  • 21
    Cf. Schopenhauer, 2009, p. 534-535.
  • 22
    Cf. Schopenhauer, 2009, p. 529.
  • 23
    Nietzsche reproduz literalmente esta última passagem em DS/Co. Ext. I § 12, KSA: 1.227.
  • 24
    No entanto, a despeito do alto apreço do público em relação à linguagem do “tempo atual”, Schopenhauer afirma: “não existe maior erro que crer que a última palavra pronunciada é sempre a mais correta, que todo escrito com posteridade é uma melhora do que se escreveu antes, e que toda transformação é um progresso” (SCHOPENHAUER, 2009, p. 515). Ademais, para o autor de O mundo como vontade e representação, “o novo raramente é o bom; porque o bom é o novo só por um breve tempo”(SCHOPENHAUER, 2009, p. 517). Nesta perspectiva, o que torna latente a diferença entre a grande literatura, como a dos clássicos alemães, da literatura vulgar dos alemães da “atualidade” é, sobretudo, o seu poder de permanência no tempo, o que exige, por conseguinte, uma outra percepção do tempo.
  • 25
    Sobre a influência de Burckhardt no pensamento de Nietzsche ver: ANDLER, Charles. Nietzsche, sa vie et sa pensée; GONTIER, Thierry. Nietzsche, Burckhardt et la ‘question’ de la Renaissance.Noesis, Paris, nº 10, p. 49 - 71, 2006; LARGE, Duncan. Nosso maior mestre: Nietzsche, Burckhardt e o conceito de cultura. Cadernos Nietzsche. São Paulo, n..9, p. 3-39, 2000. CHAVES, Ernani. Cultura e política: o jovem Nietzsche e Jacob Burckhardt. Cadernos Nietzsche. São Paulo, n.9, p. 41-66, 2000.
  • 26
    Um filósofo cometa, cf. PHG/FT §2, KSA 1.809.
  • 27
    Cf. DS/CO ext.I § 1, KSA 1.159.
  • 28
    Cf. DS/CO ext.I § 10, KSA 1.216.
  • 29
    Em sua Primeira Extemporâneas, Nietzsche tende a identificar o escritor clássico (klassischer Schriftsteller) a partir desta capacidade para compor um todo. Questionando a possibilidade de David Strauss ser um escritor clássico ou não, o filósofo escreve: “Assim, pois, o que nós perguntamos é se Strauss tem a força artística para traçar um todo, um totum ponere” (Cf. DS/Co. Ext. I § 9, KSA 1.208).
  • 30
    O conceito de ingênuo (naïf) é tomado por Nietzsche do ensaio Poesia ingênua e sentimentalSCHILLER, F. Poesia ingênua e sentimental. Trad. Márcio Suzuki. São Paulo: Iluminuras, 1991. de Schiller. O conceito de ingênuo, para Schiller, está relacionado com a sua ideia de natureza. Tomando a arte poética como exemplo, uma poesia será ingênua se não guardar traços de sua técnica de execução, parecendo ter sido gerada pela natureza e não pelo homem. Contudo, é preciso demarcar esta aproximação bem como a distância entre a utilização deste conceito pelos dois autores. Sobre o conceito de ingênuo em Schiller, Cf. SCHILLER, F. Poesia ingênua e sentimental. Trad. Márcio Suzuki. São Paulo: Iluminuras, 1991.
  • 31
    Cf. DS/Co. Ext. I §10, KSA 1.216.
  • 32
    Cf. SE/Co. Ext. III § 2, KSA 1.341.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Dez 2022
  • Data do Fascículo
    Sep-Nov 2022

Histórico

  • Recebido
    15 Jun 2022
  • Aceito
    17 Ago 2022
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