USO DE SUBSTÂNCIAS PSICOATIVAS E RENDIMENTO ACADÊMICO DE UNIVERSITÁRIOS DA ÁREA DE SAÚDE

RESUMO

Objetivo:

verificar as substâncias psicoativas mais prevalentes entre alunos de cursos de graduação da área de saúde e a interferência destas no desempenho acadêmico.

Métodos:

115 acadêmicos de Enfermagem e Educação Física de Universidade pública do interior do Ceará, Brasil, responderam ao questionário Drug Use Screening Inventory, em 2021. Para análise dos resultados, utilizaram-se dos testes estatísticos de qui-quadrado de Pearson e da razão de verossimilhança.

Resultados:

65 (56%) alunos usavam analgésicos; 54 (47%) o álcool e 14 (12,2%) a maconha. Não houve associação estatística entre o uso de substâncias psicoativas e o desempenho acadêmico. Todavia, dentre aqueles que utilizavam analgésicos ou álcool, mais de 1/3 analisaram o desempenho como ruim/péssimo ou regular e metade dos que usavam maconha analisaram da mesma maneira o desempenho acadêmico.

Conclusão:

o estudo contribuiu para o entendimento sobre as substâncias psicoativas prevalentes no contexto universitário e os aspectos associados, enfatizando a necessidade de intervenções.

DESCRITORES:
Estudantes de Ciências da Saúde; Estudante de Enfermagem; Álcool; Tabaco; Cannabis

ABSTRACT

Objective:

to verify the most prevalent psychoactive substances used among undergraduate students in the health area and their interference in academic performance.

Methods:

a total of 115 Nursing and Physical Education students from a public university in inland Ceará, Brazil, answered the Drug Use Screening Inventory questionnaire in 2021. To analyze the results, Pearson’s chi-square and likelihood ratio statistical tests were used.

Results:

a total of 65 (56%) students used analgesics, 54 (47%) drank alcohol and 14 (12.2%) smoked marijuana. There was no statistical association between use of psychoactive substances and academic performance. However, among those who used analgesics or alcohol, more than 1/3 analyzed their performance as poor/terrible or fair, and half of those who smoked marijuana analyzed it in the same way.

Conclusion:

the study contributed to understanding the psychoactive substances prevalent in the university context and associated aspects, emphasizing the need for interventions.

DESCRIPTORS:
Health Sciences Students; Nursing Student; Alcohol; Tobacco; Cannabis

RESUMEN

Objetivo:

determinar las sustancias psicoactivas más prevalentes en los estudiantes de grado del área de la salud y su interferencia en el rendimiento académico.

Métodos:

115 estudiantes de Enfermería y Educación Física de una universidad pública del interior de Ceará, Brasil, respondieron el cuestionario Drug Use Screening Inventory, en 2021. Para analizar los resultados se utilizaron las pruebas estadísticas chi-cuadrado de Pearson y de razón de verosimilitud.

Resultados:

65 (56%) estudiantes utilizaron analgésicos; 54 (47%) alcohol y 14 (12,2%) marihuana. No hubo asociación estadística entre el uso de sustancias psicoactivas y el rendimiento académico. Sin embargo, más de 1/3 de los que consumía analgésicos o alcohol, consideró que el desempeño era malo/pésimo o regular, al igual que la mitad de los que consumía marihuana.

Conclusión:

el estudio contribuyó a comprender cuales son las sustancias psicoactivas prevalentes en el contexto universitario y los aspectos asociados, y destacó la necesidad de intervenciones.

DESCRIPTORES:
Estudiantes de Ciencias de la Salud; Estudiante de Enfermería; Alcohol; Tabaco; Cannabis

HIGHLIGHTS

1. Identifica drogas utilizadas entre universitários da área de saúde.

2. Amplia a compreensão sobre uso de drogas entre universitários.

3. Analisa a influência das drogas no desempenho acadêmico.

4. Estimula a prevenção do uso de drogas entre universitários.

HIGHLIGHTS

1. Identifica drogas utilizadas entre universitários da área de saúde.

2. Amplia a compreensão sobre uso de drogas entre universitários.

3. Analisa a influência das drogas no desempenho acadêmico.

4. Estimula a prevenção do uso de drogas entre universitários.

INTRODUÇÃO

O ingresso na universidade é um marco na vida do indivíduo, impactando diretamente na rotina e nos hábitos diversos. Geralmente, esse evento costuma ocorrer ainda na fase da adolescência, período em que ocorrem diversas mudanças físicas e psicossociais, estando os jovens expostos a muitas situações de vulnerabilidades e mudanças de hábitos e comportamentos, dentre eles, destaca-se o uso de substâncias psicoativas, que constitui problema de saúde pública no Brasil e no mundo. E, entre os universitários, isso não é diferente¹.

Ao ingressar na universidade, muitas vezes, os jovens passam a residir em cidades diferentes de onde encontram-se seus pais e/ou responsáveis, em residências universitárias ou dividindo moradias com colegas². Essas mudanças geram processo de autonomia e emancipação nos jovens, possibilitando novas experiências, oportunidades e estabelecimento de novos vínculos sociais que influenciam o comportamento desses acadêmicos^3-4.

Para outros jovens, entretanto, este momento pode constituir período de grande vulnerabilidade, que podem ser geradores de estresse, ansiedade e cobranças, causando impacto do bem-estar⁵. Esses fatos contribuem para insegurança e instabilidade na vida, deixando-os mais suscetíveis à influência dos pares e em busca de diversão e descontração em ambientes em que há substâncias psicoativas. Enfatiza-se que uso de substâncias psicoativas pode estar associado a outros comportamentos de risco, como dirigir sob efeito do álcool, manter relações sexuais sem proteção, pois encontram-se, muitas vezes, em situações de conflitos internos e externos^2-3,5-6.

Assim, infere-se que o uso e o abuso de álcool e/ou de outras drogas é uma realidade no contexto universitário. Contudo, esse uso nem sempre tem origem na universidade, pois a maioria dos estudantes já experimentaram antes do ingresso no ensino superior⁴. Esses jovens usam o álcool, muitas vezes, para lidar com as dificuldades decorrentes do transtorno de estresse pós-traumático⁷.

Outra questão é que a vida universitária, por vezes, tem obstáculos de cunho emocional que podem interferir inclusive no rendimento do discente, como desmotivação em continuar os estudos, ansiedade, perturbações no sono, seguido pelo pressentimento de abandono e tristeza⁸. Observou-se que, no cotidiano da vida universitária, determinados estudantes apresentam mudanças de comportamento, mostram-se tristes, deprimidos, revoltados, eufóricos ou até mesmo indiferentes, inclusive, faltam às atividades acadêmicas⁴. Deve-se destacar, ainda, que o uso abusivo de álcool, tabaco e outras drogas é um fator de risco para ideação suicida entre os universitários^6,9.

Esses fatores, além de contribuir para um baixo rendimento acadêmico dos jovens, tornam-se preocupantes quando considera-se que muitos jovens, ao ingressarem na universidade, passam a residir sozinhos ou com colegas de turma, distantes dos pais e responsáveis, passando a tomar decisões sozinhos, em uma fase de grande vulnerabilidade, que é a adolescência¹⁰. A Política Nacional do Ministério da Saúde para Atenção Integral aos usuários de álcool e outras drogas ressalta a existência de vinculação familiar e a intensificação do contato entre os componentes de cada núcleo familiar como fator de proteção ao uso de álcool e outras drogas¹¹, suporte que para grande parte dos universitários pode estar prejudicado.

É possível encontrar taxas mais elevadas de consumo excessivo de álcool e problemas correlatos entre os que são colegas de faculdade do que entre aqueles que não o são¹². O uso de álcool e/ou de outras drogas entre universitários remete ao prazer, à felicidade, à facilitação das interações sociais e à fuga dos problemas⁴, há indícios de que os estudantes sejam influenciados a fazer uso de substâncias, considerando muito mais os benefícios do que os risco.

Dentre os universitários, os da área de saúde merecem destaque em relação ao uso de substâncias psicoativas, considerando que no dia a dia, enquanto futuros profissionais, eles deverão ser totalmente prudentes pelo reconhecimento e seguimento ao tratamento de pacientes com problemas relacionados ao uso de substâncias psicoativas⁸. Assim, este estudo teve como objetivo verificar as substâncias psicoativas mais prevalentes entre alunos de cursos de graduação da área de saúde e a interferência destas no desempenho acadêmico.

METODOLOGIA

Estudo descritivo, exploratório, de abordagem quantitativa, com delineamento transversal, desenvolvido no Centro de Ciências da Saúde (CCS) de uma Universidade Estadual, com sede no interior do Ceará, Brasil, no Semiárido do Sertão Nordestino. Esse município tem população estimada em 197.663 habitantes, em espaço territorial de 2.122,897 km², segundo informações do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística¹³. O CCS congrega dois cursos da área de saúde: graduação em enfermagem (bacharelado) e educação física (licenciatura e bacharelado).

Participaram do estudo 115 alunos do ensino superior de cursos da área de saúde, de ambos os sexos, matriculados em todos os semestres ativos dos cursos de enfermagem e educação física. Os critérios de inclusão foram: estar matriculado nos cursos selecionados e desejar participar do estudo. Excluíram-se alunos com algum tipo de deficiência ou disfunção que impossibilitasse o autopreenchimento do questionário. Como critérios de descontinuidade, citam-se aqueles alunos com 20% ou mais de questões não respondidas.

Ao considerar a pandemia da COVID-19, as aulas ocorriam de maneira remota, pois havia a necessidade de manter o distanciamento social como forma de prevenção da doença, uma vez que muitos universitários e/ou familiares foram acometidos pela doença. Assim, optou-se pela amostra não probabilística e por conveniência.

Devido a pandemia da COVID-19, o curso de enfermagem não ofereceu vestibular para ingresso durante dois semestres. No período do estudo, estavam matriculados 270 alunos no curso de enfermagem, destes, 79 (29,2%) participaram do estudo. No curso de educação física (licenciatura), estavam matriculados 171 alunos, destes, 25 (14,6%) participaram. Já no curso de bacharelado em educação física, havia 198 alunos matriculados, sendo que 11 (9,9%) participaram do estudo.

A coleta de dados ocorreu no primeiro semestre de 2021, por meio de questionário on-line no Google Forms, enviado aos discentes por meio de um grupo de WhatsApp, em que participam os estudantes de enfermagem. O Centro Acadêmico intermediou a abordagem para o curso de educação física, divulgando o estudo, os objetivos e enviando o questionário aos alunos.

O questionário foi dividido em três partes, composto por questões objetivas: 1) Informações sociodemográficas; 2) Autoavaliação do desempenho acadêmico dos universitários no semestre atual do curso de graduação (escala que varia de muito baixa - 1 a excelente - 10); e 3) o questionário DUSI (Drug Use Screening Inventory) para investigar o uso de drogas e os fatores associados entre os universitários.

O DUSI foi traduzido e validado no Brasil¹⁴, ele avalia a frequência do consumo de álcool, tabaco e drogas ilícitas (anfetamina, ecstasy, cocaína, crack, maconha, alucinógenos, tranquilizantes, ansiolíticos, esteroides, inalantes e solventes) nos 30 dias anteriores à entrevista e os fatores relacionados ao uso, seguido por 15 perguntas que abordam problemas associados ao uso de substâncias. As questões do DUSI são respondidas com “SIM” ou “NÃO”, sendo que as respostas afirmativas equivalem a presença de problemas.

Os dados foram analisados no programa computacional Statistical Pacckage for the Social Sciences (SPSS), versão 20.0, e estão apresentados em tabelas. O nível de significância foi de 5%. Realizou-se a análise descritiva para caracterização da amostra. A análise univariada foi utilizada para verificar a associação entre o consumo de drogas lícitas (tabaco e álcool) e ilícitas, além das variáveis independentes, adotando-se o teste do Qui-quadrado de Pearson e a razão de verossimilhança (p < 0,05).

O estudo foi norteado pela Resolução 466/12, do Conselho Nacional da Saúde, que estabelece as diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas que envolvem seres humanos. Foi aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade Estadual Vale do Acaraú-UVA, conforme parecer: 4.433.295.

RESULTADOS

Entre os participantes, predominou o sexo feminino, com 75 participantes (65,2%); 111 (96,6 %) tinham idade entre 18 e 30 anos, 64 (55,7%) declaravam-se pardos e 70 (60,9%) tinham como renda familiar entre um a dois salários mínimos. 92 (80%) participantes afirmavam ter religião, sendo que 87 (75,7%) declararam-se católicos. Sobre o local de residência, 52 (45,2%) alunos residiam na cidade onde estava localizada a Universidade, do mesmo modo, 51 (44,3%) moravam com os pais. Sobre a situação conjugal, 66 (57,4%) alunos eram solteiros(as) e sem parceiro fixo. Em relação à orientação sexual, 88 (76,5%) participantes afirmaram ser heterossexuais; 112 (97,4%) não tinham filhos.

Na Tabela 1, estão apresentados os dados relacionados ao número de discentes e a quantidade de vezes que eles consumiram substâncias psicoativas nos últimos 30 dias.

Tabela 1
Distribuição do número de discentes, segundo o uso de substâncias psicoativas nos últimas 30 dias. n=115. Sobral, Ceará, Brasil. 2021

Características	n	%
Álcool
Não usei	61	53
Usei entre 1-2 vezes	34	29,6
Usei entre 3-9 vezes	20	17,4
Tenho problemas com essa substância	2	1,7
Aprecio essa droga	48	41,7
Tabaco
Não usei	109	94,8
Usei entre 1-2 vezes	4	3,5
Usei entre 3-9 vezes	2	1,7
Tenho problemas com essa droga	3	2,6
Aprecio essa droga	2	1,7
Maconha
Não usei	101	87,8
Usei entre 1-2 vezes	9	7,8
Usei entre 3-9 vezes	5	4,3
Tenho problemas com essa substância	2	1,7
Aprecio essa droga	11	9,6
Inalantes/Solventes
Não usei	111	96,5
Usei entre 1-2 vezes	4	3,5
Aprecio essa droga	1	0,9
Tranquilizantes
Não usei	107	93
Usei entre 1-2 vezes	6	5,2
Usei entre 3-9 vezes	1	0,9
Usei mais de 20 vezes	1	0,9
Tenho problemas com essa substância	1	0,9
Aprecio essa droga	6	5,2
Analgésicos
Não usei	50	43,5
Usei entre 1-2 vezes	41	35,7
Usei entre 3-9 vezes	23	20
Usei entre 10-20 vezes	1	0,9
Tenho problemas com essa substância	1	0,9
Aprecio essa droga	10	8,7
Opioides
Não usei	114	99,1
Usei entre 1-2 vezes	1	0,9
Anabolizantes
Não usei	113	98,3
Usei entre 1-2 vezes	2	1,7
Tenho problemas com essa substância	2	1,7
Aprecio essa droga	2	1,7
Outras drogas
Não usei	114	99,1
Usei entre 1-2 vezes	1	0,9
Tenho problemas com essa substância	1	0,9
Aprecio essa droga	1	0,9
Total	115	100

• Fonte: Os Autores (2022).

Quanto ao uso de substâncias psicoativas no último mês pelos discentes, destacou-se na Tabela 1 que 65 (56,5%) referiram uso de analgésicos, 54 (47%) usaram álcool, 14 (12,1%) maconha, oito (7%) tranquilizantes, seis (5,2%) tabaco, quatro (3,5%) usaram inalantes. Acerca da maioria das substâncias, os participantes usaram pelo menos uma ou duas vezes nos últimos 30 dias. Destacou-se que 48 (41%) discentes afirmaram apreciar o álcool, 11 (9,6%) a maconha e 10 (8,7%) os analgésicos. As substâncias psicoativas, cocaína, anfetamina/estimulantes, ecstasy e alucinógenos não foram relatadas pelos alunos.

A Tabela 2 apresenta a utilização dessas substâncias pelos acadêmicos nos últimos 12 meses, apontando a intensidade do envolvimento com substâncias.

Tabela 2
Uso de substâncias psicoativas nos últimos 12 meses e a intensidade do envolvimento com substâncias pelos discentes. n=115. Sobral, Ceará, Brasil. 2021.

Envolvimento com álcool e outras drogas	nº	%
Fissura/desejo forte
Sim	33	28,7
Não	82	71,3
Necessidade de aumentar o consumo para o conseguir o efeito desejado
Sim	35	30,4
Não	80	69,6
Uso descontrolado
Sim	4	3,5
Não	111	96,5
Dependência
Sim	8	7
Não	107	93
Deixa de realizar alguma atividade por ter gasto dinheiro com drogas
Sim	12	10,4
Não	103	89,6
Desobedece a Lei por estar sob efeito
Sim	26	22,6
Não	89	77,4
Muda de feliz para triste em decorrência do efeito
Sim	9	7,8
Não	106	92,2
Muda de triste para feliz em decorrência do efeito
Sim	31	27
Não	84	73
Acidente automobilístico por estar sob efeito
Sim	9	7,8
Não	106	92,2
Machucou acidentalmente alguém ou a si próprio sob efeito
Sim	11	9,6
Não	104	90,4
Conflito com amigos e/ou familiar por conta do uso
Sim	10	8,7
Não	105	91,3
Problema de relacionamento com amigos devido ao uso
Sim	16	13,9
Não	99	86,1
Sintomas de abstinência após o efeito
Sim	9	7,8
Não	106	92,2
Colapso de memória para lembrar-se o que fez sob efeito
Sim	44	38,3
Não	71	61,7
Brincadeiras que inclui bebidas quando vai às festas
Sim	47	40,9
Não	68	59,1
Problemas para resistir ao desejo de consumo
Sim	5	4,3
Não	110	95,7
Desempenho acadêmico prejudicado
Sim	26	22,6
Não	89	77,4

• Fonte: Os Autores (2022).

Dentre os resultados, destacaram-se que 47 (40,9%) participantes manifestaram gostar de brincadeiras que envolvam álcool e outras drogas; 44 (38,3%) referiram colapso de memória para lembrar-se do que fez sob efeito das substâncias; para 35 (30,4%) fez-se necessário usar mais álcool e outras drogas para alcançar o efeito desejado; 33 (28,7%) expressaram sentir fissura e forte desejo por essas substâncias; 31 (27%) mudaram o comportamento de aparentemente triste para feliz sob efeito das substâncias psicoativas; 26 (22,6%) discentes desobedeceram leis sob efeito de álcool e outras drogas. Ademais, 26 (22,6%) graduandos expressaram que o uso de substâncias lícitas e ilícitas prejudicou o desempenho acadêmico no semestre atual.

Sobre o desempenho acadêmico, a Tabela 3 apresenta a distribuição do número de discentes, de acordo com o curso de graduação e a análise do desempenho acadêmico (autoavaliação).

Tabela 3
Distribuição do número de alunos, segundo o curso de graduação e as variáveis de rendimento acadêmico. n=115. Sobral, Ceará, Brasil. 2021

Variáveis	Ruim/Péssimo		Regular		Bom		Excelente		P*
	n	%	n	%	n	%	n	%	0,000
Educação Física-Bacharelado	2	18,2	0	0,0	9	81,8	0	0
Educação Física-Licenciatura	6	24	12	48	5	20	2	8
Enfermagem	2	2,5	22	27,8	45	57	10	12,7%

• Fonte: Os Autores (2022).
• * Qui-quadrado de Pearson

Evidenciou-se que no curso de educação física - bacharelado, nove (81,8%) discentes avaliaram o desempenho acadêmico no semestre atual como bom. Contudo, no curso de educação física - licenciatura, 12 (48%) discentes avaliaram como regular o próprio desempenho acadêmico. No curso de enfermagem, 55 (69,7%) discentes avaliaram o desempenho como bom ou excelente.

A Tabela 4 apresenta a relação entre o uso das três substâncias psicoativas mais utilizadas pelos participantes do estudo nos últimos trinta dias e a associação com o desempenho acadêmico.

Tabela 4
Distribuição do número de discentes, segundo o uso de analgésicos sem prescrição médica, álcool e maconha, nos últimos 30 dias, e o rendimento acadêmico. n=115. Sobral, Ceará, Brasil.

Uso de analgésicos nos últimos 30 dias
	Sim		Não
Rendimento Acadêmico	n	%	n	%	P1
Ruim/Péssimo	7	10,8	3	6	0,816
Regular	18	27,7	16	32
Bom	33	50,8	26	52
Excelente	7	10,8	5	10
Uso do álcool nos últimos 30 dias
	Sim		Não
Rendimento Acadêmico	n	%	n	%	P1
Ruim/Péssimo	5	9,3	5	8,2	0,785
Regular	18	33,3	16	26,2
Bom	25	46,3	34	55,7
Excelente	6	11,1	6	9,8
Uso da maconha nos últimos 30 dias
	Sim		Não
Rendimento Acadêmico	n	%	n	%	P2
Ruim/Péssimo	4	28,6	6	5,9	0,095
Regular	3	21,4	31	30,7
Bom	5	35,7	54	53,5
Excelente	2	14,3	10	9,9

• Fonte: Os Autores (2022).
• ¹Qui-quadrado de Pearson
• ² Razão de verossimilhança

Não houve associação estatisticamente significante entre o uso das três substâncias psicoativas (analgésico, álcool e maconha) mais utilizadas pelos universitários e o rendimento acadêmico dos participantes do estudo. Todavia, dentre aqueles que usavam analgésicos, 25 (38,5%) analisaram o desempenho como ruim/péssimo ou regular; entre os que faziam uso de álcool, 23 (42,6%) referiram que o desempenho era ruim/péssimo ou regular; e, entre os que usavam maconha, sete (50%) fizeram essa mesma avaliação do desempenho acadêmico.

DISCUSSÃO

Os analgésicos utilizados sem prescrição médica foram a substância psicoativa mais prevalente entre os participantes do estudo. Mais da metade desses alunos referiram ter usado essa substância nos últimos 30 dias. Dentre estes, mais de 1/3 avaliaram o desempenho acadêmico como ruim/péssimo ou regular. O achado revela uma prática de automedicação entre os estudantes universitários da área de saúde. Todavia, as motivações desse uso não foram pesquisadas, desta forma, não se pode afirmar relação com os estudos.

A prática da automedicação foi identificada num estudo realizado em Fortaleza-CE, com universitários de instituição privada, quando 99,5% dos universitários alegaram se automedicar¹⁵. É comum a utilização imoderada de substâncias controladas. Muitas vezes e especialmente em ambientes competitivos, para tentar potencializar o desempenho acadêmico¹¹.

Assim como demonstrado em outros estudos, o álcool foi a substância psicoativa lícita mais consumida pelos estudantes, tendo o uso prevalente em quase metade dos participantes. Foi a substância psicoativa mais apreciada pelos participantes do estudo. Outro estudo realizado em uma Universidade Pública do Nordeste também identificou o uso expressivo do álcool, pois 70% dos participantes ingeriram bebida alcoólica sendo a diversão com amigos o seu principal motivo¹⁶. Essa droga também foi a mais consumida no meio universitário por estudantes de psicologia².

O início do uso dessas substâncias não ocorre, necessariamente, ao ingressar na universidade. Porém, esse consumo pode ser intensificado ou, até mesmo, estimulado, em razão do processo de mudança que perpassa a vida dos jovens universitários¹⁷. Muitas vezes, o álcool é inserido na vida dos jovens em idade precoce pela família e pelos amigos, aspirando o prazer e a felicidade. Os jovens universitários elegem o álcool como droga de escolha para minimizar a pressão do dia-a-dia e os problemas vivenciados⁴.

Diante dessa realidade, o uso de álcool e outras drogas devem ser tratados como um problema concernente à infância, à adolescência e à juventude, evitando o seu ingresso, além de garantir o tratamento, a assistência e o cuidado aos usuários dessas substâncias. Neste sentido, em 2019, foi aprovada a Política Nacional sobre Drogas, que dentre os objetivos, visa conscientizar e proteger a sociedade brasileira dos prejuízos sociais, econômicos e de saúde pública representados pelo uso, utilização indevida e pela dependência de drogas lícitas e ilícitas¹⁸.

A maconha foi a droga ilícita mais utilizada pelos participantes do estudo nos últimos 30 dias, corroborando outro estudo desenvolvido com estudantes de medicina de uma Universidade Pública do semiárido brasileiro, expondo a prevalência para o uso de bebidas alcoólicas 80,2% e maconha 32,67% ¹⁹. A maconha é uma das drogas ilícitas mais consumida na sociedade atual e cerca de 9% de todos os consumidores de maconha tornam-se dependentes em algum momento da vida. Essa taxa ascende para 17% nos usuários precoces²⁰.

Também no Brasil, a maconha é a substância ilícita de maior consumo entre a população, especialmente no público adolescente. Gerando alerta pelas consequências nocivas do uso crônico, como maiores dificuldades de concentração, aprendizagem e memória, sintomas de depressão e ansiedade, diminuição da motivação, sintomas psicóticos, esquizofrenia, entre outros prejuízos¹⁸.

O uso pelos estudantes universitários torna-se ainda mais preocupante, devido a influência no rendimento acadêmico dos futuros profissionais. Entre os participantes do estudo que utilizaram a maconha nos últimos 30 dias, metade analisou o desempenho acadêmico como ruim/péssimo ou regular. Esse achado pode sinalizar a influência dessa substância no desempenho acadêmico, embora esse resultado não tenha sido estatisticamente significante.

Em relação ao uso do tabaco, considera-se como positivo o fato de pouquíssimos universitários afirmarem a utilização da substância nos últimos 30 dias, haja vista que é uma droga lícita utilizada na sociedade atual e de fácil comercialização. Esses achados discordam de outros estudos realizados com estudantes da área de saúde¹⁹. Também, ponderado como evento positivo o fato de os participantes terem negado o uso de cocaína, anfetaminas/estimulantes, ecstasy, alucinógenos, nos últimos 30 dias, sinalizando que essas substâncias não estão presentes ainda no ambiente universitário, foco deste estudo.

Identificou-se que o uso dessas substâncias psicoativas traziam problemas associados para os universitários. Quase a metade dos universitários manifestaram gostar de brincadeiras que envolvam álcool e outras drogas; mais de um terço referiram colapso de memória para lembrarem do que fizeram sob efeito das substâncias e tiveram necessidade de usar mais álcool e outras drogas para alcançar o efeito desejado, além de expressarem sentir fissura e forte desejo por essas substâncias. Esses achados são preocupantes, pois podem interferir no rendimento acadêmico dos universitários, considerando que cerca de um quarto dos participantes expressaram que o uso de substâncias lícitas e ilícitas comprometia o desempenho acadêmico no semestre vigente.

Destaca-se que não houve associação estatisticamente significante entre o uso das três substâncias psicoativas mais prevalentes (analgésicos, álcool e maconha) e o desempenho acadêmico. Todavia, dentre aqueles que faziam uso de analgésicos ou álcool, mais de um terço analisaram o desempenho como ruim/péssimo ou regular, e metade dos que usavam maconha analisaram da mesma maneira o desempenho acadêmico.

Enfatiza-se que os resultados obtidos no estudo se restringem apenas à amostra de universitários da área de saúde de uma Universidade Pública localizada na sede de um Município no interior do Ceará, Brasil. Portanto, não devem ser generalizados devido aos divergentes contextos brasileiros.

Como limitações, cita-se a pandemia da COVID-19, com as aulas acontecendo de maneira remota, podendo ter contribuído para que alguns universitários não tenham participado da coleta de dados por meio do questionário on-line, por diversas razões, dentre as quais menciona-se não terem tido conhecimento do estudo, limitações de internet ou até terem sido acometidos pela COVID ou terem algum familiar sob essa condição, bem como o excesso de atividades acadêmicas, num momento em que a saúde mental estava afetada pela pandemia. Ademais, por se tratar de tema envolto por tabus, é possível que alguns universitários, possam ter negado o consumo das substâncias psicoativas no questionário, mesmo sob a garantia do anonimato.

CONCLUSÃO

Os resultados do estudo desvelaram a prática do uso de substâncias psicoativas entre universitários dos cursos de enfermagem e educação física de uma Universidade Pública do interior do Ceará, Brasil, bem como os fatores associados e a relação com o rendimento acadêmico. Constatou-se que os analgésicos, o álcool e a maconha estiveram presentes no contexto universitário, ocasionando problemas associados ao uso. Por outro lado, houve pouco uso do tabaco nos últimos 30 dias. As substâncias cocaína, anfetaminas/estimulantes, ecstasy e alucinógenos não foram usadas nos últimos 30 dias. Esses achados corroboram outros estudos e apontam que trata-se de fenômeno multifatorial.

Não houve associação estatisticamente significante entre o uso de substâncias psicoativas e o desempenho acadêmico dos universitários da área de saúde participantes do estudo. Embora uma parcela dos alunos tenha considerado que o uso de substâncias psicoativas prejudica o desempenho acadêmico. Constatou-se que os usuários de analgésicos, álcool e maconha analisaram o desempenho acadêmico como ruim/péssimo ou regular.

Os resultados indicam um desafio a ser enfrentado pelos governos, pelas universidades e pelos demais atores envolvidos no contexto universitário. Desafio que também inclui a família, na prevenção ou redução sobre o uso abusivo dessas substâncias psicoativas, principalmente entre tais jovens - futuros profissionais da saúde.

O estudo contribuirá para melhor compreensão do uso de substâncias psicoativas no meio universitário e das vulnerabilidades desse público, que constitui parcela importante da sociedade. Ademais, poderá nortear a tomada de decisões da gestão superior da universidade na mudança dessa realidade, a partir da criação e/ou adequação dos programas de prevenção do uso dessas substâncias psicoativas e redução de danos. Assim, contribuindo para a promoção da saúde e melhoria da qualidade de vida dos universitários.

AGRADECIMENTOS

À Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico - FUNCAP, pela bolsa de Iniciação Científica concedida ao autor Francisco Matheus Azevedo de Sousa, no período 2020-2021.

REFERÊNCIAS

• ¹
  Silva ML da, Rosa SS. Games and music: Therapeutic occupational resources in the treatment of teenagers users of psychoactive substances. Adolesc Saúde. [Internet]. 2017 [access on 2020 oct 6];14(4):58-65. Available in: http://hdl.handle.net/11449/175688
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Editado por

Editora associada:

Dra. Virginia Souza

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  07 Ago 2023
• Data do Fascículo
  2023

Histórico

• Recebido
  02 Ago 2022
• Aceito
  31 Mar 2023